RCED - 0600389-70.2020.6.21.0056 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/09/2021 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

O presente Recurso contra Expedição de Diploma (RCED) preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço, passando à análise.

 

Da Preliminar de Nulidade da Prova Produzida pelo Ministério Público Eleitoral

Em contestação, a parte recorrida suscitou preliminar de ilicitude de “todos os documentos juntados pelo recorrente, uma vez que foram produzidos no Ministério Público, sem dar chance para Vítor participar da produção das provas”.

Outrossim, alega que os documentos, bem como os prints e áudios de conversas no aplicativo Whatsapp foram entregues pelos denunciantes de má-fé, “somente para prejudicar Vítor”, que angariou desafetos em sua atuação sindical.

O procedimento preparatório eleitoral (PPE) no âmbito do Ministério Público Eleitoral está regulamentado na Portaria n. 692/2016, da Procuradoria-Geral da República, que estabelece o seguinte:

Art. 2º O Procedimento Preparatório Eleitoral, de natureza facultativa, administrativa e unilateral, será instaurado para coletar subsídios necessários à atuação do Ministério Público Eleitoral perante a Justiça Eleitoral, visando à propositura de medidas cabíveis em relação aos ilícitos eleitorais de natureza não criminal.

Como se percebe, o PPE representa um expediente administrativo visando à colheita de elementos que possibilitem a apuração inicial dos fatos e o cumprimento das funções institucionais do Ministério Público Eleitoral.

É certo que cabe ao Ministério Público Eleitoral, de ofício, agir para esclarecer o ilícito que lhe foi comunicado ou de que tomou conhecimento, por qualquer meio, e, para tanto, pode adotar as medidas persecutórias previstas na lei, idôneas a confirmar ou repelir a denúncia realizada.

Portanto, nesse contexto, o contraditório será diferido, por ocasião do processamento judicial da demanda, tal como ocorrido nos presentes autos, por meio da abertura de prazo para contrarrazões, inclusive requerimentos de produção probatória, da instrução e das alegações finais.

Nessa linha, o colendo Tribunal Superior Eleitoral tem encampado o entendimento segundo o qual é lícita a prova colhida por meio de PPE, no âmbito do Ministério Público Eleitoral.

Nesse sentido os seguintes precedentes da Corte Superior: AI 69274/GO, Relator: Min. OG FERNANDES, DJE 08.06.2020; AgR-AI 693-54/RJ, Rel. Min. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO, DJe 27.3.2019; RO 1220-86/TO, Rel. designado Min. LUIZ FUX, DJe de 27.3.2018; AgR-RO 72013, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 16.06.2017; AgR-REspe 1314-83/PI, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 11.3.2016; AgR-RO 4981-09/AM, Rei. Min. LUIZ FUX, DJe 27.10.2016.

Ademais, a questão alusiva à idoneidade ou valor da prova deve ser resolvida no julgamento do caso, em cotejo com todo o acervo de probatório amealhado durante a instrução.

Diante do exposto, rejeito a preliminar de nulidade das provas obtidas em Procedimento Preparatório Eleitoral.

Superada a matéria preliminar, passo ao exame do mérito.

 

Do Mérito

No mérito, trata-se de Recurso Contra a Expedição de Diploma interposto pelo Ministério Público Eleitoral em face de VÍTOR JORGE ESPINOZA, diplomado primeiro suplente de vereador, sob alegação de que o recorrido não se desincompatibilizou, de fato, do cargo de Diretor do Sindicato dos Empregados no Comércio de Taquari, embora tenha apresentado o documento formal de seu afastamento por ocasião do pedido de registro de candidatura.

De acordo com o art. 262 do Código Eleitoral, o Recurso contra Expedição de Diploma é cabível nos casos de inelegibilidade superveniente ou de natureza constitucional e de falta de condição de elegibilidade, sendo pacífico que, apesar da nomenclatura legal, trata-se, na verdade, de ação judicial, de competência originária dos tribunais eleitorais.

Dentre as hipóteses de inelegibilidade, encontra-se o exercício de cargo ou função ou cargo público de direção, administração ou representação em entidades representativas de classe, nos termos do art. 1º, inc. VII, al. “b”, c/c o inc. II, al. “g” e o inc. IV, al. “a”, todos da LC n. 64/90, verbis:

Art. 1º São inelegíveis:

[…]

II - para Presidente e Vice-Presidente da República:

[...]

g) os que tenham, dentro dos 4 (quatro) meses anteriores ao pleito, ocupado cargo ou função de direção, administração ou representação em entidades representativas de classe, mantidas, total ou parcialmente, por contribuições impostas pelo poder Público ou com recursos arrecadados e repassados pela Previdência Social;

[...].

IV - para Prefeito e Vice-Prefeito:

a) no que lhes for aplicável, por identidade de situações, os inelegíveis para os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal, observado o prazo de 4 (quatro) meses para a desincompatibilização;

[...].

VII - para a Câmara Municipal:

[...].

b) em cada Município, os inelegíveis para os cargos de Prefeito e Vice-Prefeito, observado o prazo de 6 (seis) meses para a desincompatibilização.

 

A jurisprudência consolidou-se no sentido de exigir ao candidato, ocupante de cargo ou função de direção em entidade de classe, a observância do prazo de 4 (quatro) meses a que alude o inc. II, al. “g”, referido, para concorrer aos cargos de prefeito ou vereador, na linha de julgados deste Tribunal:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. IMPUGNAÇÃO AO REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPROCEDENTE. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. DIRIGENTE SINDICAL. ART. 1º, INC. II, AL. “G”, DA LC N. 64/90. ATENDIDO REQUISITO LEGAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE DEFERIMENTO DO REGISTRO. DESPROVIMENTO.

1. Irresignação contra sentença que julgou improcedente impugnação e deferiu registro de candidatura, diante do cumprimento do prazo de quatro meses de desincompatibilização do cargo de dirigente sindical.

2. O entendimento jurisprudencial firmou-se no sentido de exigir ao candidato, ocupante de cargo ou função de direção em entidade de classe, a observância do prazo de 4 (quatro) meses a que alude o inc. II, al. “g”, do art. 1º, da LC n. 64/90.

3. O pedido de afastamento da candidata, ocupante do cargo de dirigente sindical, foi datado de 2 de junho de 2020, ou seja, dentro do prazo de quatro meses antes do pleito. Restou cumprido o prazo estabelecido pela norma regente, portanto, tempestivo o desligamento ocorrido. Manutenção da sentença de deferimento do registro de candidatura.

4. Desprovimento.

(TRE-RS; REl 0600136-98.2020.6.21.0083; Rel.: Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, sessão de 11.11.2020.) Grifei.

 

Na hipótese, o pedido de afastamento do candidato, ocupante do cargo de Tesoureiro do sindicato, foi datado de 02.06.2020 (ID 18779133, fl. 32), ou seja, dentro do prazo de quatro meses anteriores ao pleito.

Entretanto, o autor da peça inicial alega que o recorrido, embora formalmente afastado de suas atividades (desincompatibilização de direito), esteve no exercício fático de seu cargo após o prazo de impugnação ao registro de candidatura, incidindo, assim, em inelegibilidade infraconstitucional superveniente apta a fundamentar a presente demanda, nos termos do art. 262, caput, do Código Eleitoral.

A prova juntada com a exordial consiste em prints e áudios de conversas mantidas por Vitor Jorge Espinoza com a proprietária do Supermercado Dia, Gisele Lemos, e alguns funcionários do mesmo estabelecimento, a respeito do processo de Tutela Cautelar Antecedente n. 0020392-72.2020.5.04.0761, em tramitação na Justiça do Trabalho, envolvendo a rescisão dos contratos de trabalho em razão do encerramento das atividades da aludida empresa.

Da prova apresentada, destaca-se uma conversa, com mensagens nos dias 27, 29 e 30 de julho e 3 de agosto, nas quais se constata a iniciativa e insistência de Vítor em tratar sobre “as contribuições em aberto” havidas por Gisele Lemos (ID 18779233, fl. 6-7):

27 DE JULHO DE 2020

VÍTOR: bom dia / como vai? / podemos ver hoje sobre as contribuições em aberto?

 

29 DE JULHO DE 2020

VÍTOR: oii / bom dia / podemos ver hoje sobre as contribuições em aberto?

 

30 DE JULHO DE 2020

VÍTOR: oiii / boa tarde / precisamos ver as pendências das contribuições

GISELE: Oi / Estava em celular / Pode ver amanhã a tarde

VÍTOR: Ok

 

3 DE AGOSTO DE 2020

VÍTOR: oiii / bom dia

GISELE: Bom dia

VÍTOR: que horas podemos ir no mercado ver as pendencias

GISELE: Te esperei aquele dia e vc não apareceu / Hoje estou ruim da sinusite não sei que vou ir / Mas lhe aviso a tardd

VÍTOR: Ok

 

No dia 17.08.2020, Vítor novamente procura Gisele Lemos para tratar de pendências financeiras envolvendo o Mercado Dia, oportunidade em que envia um documento anexo contendo o timbre do Sindicato dos Empregados no Comércio de Taquari (ID 18779233, fl. 9):

17 DE AGOSTO DE 2020

VÍTOR: OII / Boa tarde / vou te mandar por aqui o que tem em aberto do Mercado Dia % e da GUGU DADA

 

18 DE AGOSTO DE 2020

VÍTOR: oiii / boa tarde / como podemos fazer para acertar estas pendencias

GISELE: Da gugudada já passei p as meninas / Do mercado nós últimos meses eu paguei / Vou te mandar os comprovantes / Assim que eu chegar no mercado

 

Em mensagem de 08.09.2020, Vítor questiona Gisele sobre um médico cirurgião plástico e explica sobre o interesse do sindicato em realizar um convênio, falando claramente como representante da entidade (ID 18779233, fl. 8):

8 DE SETEMBRO DE 2020

VÍTOR: Oiii / Desculpa a hora

GISELE: Pode falar

VÍTOR: Mas o médico que faz cirurgia plástica / Nós do Sindicato temos interesse em fazer convenio com ele também / Para nossas associadas

GISELE: Vamos sim / Te aviso quando ele marcar

VÍTOR: Sim

GISELE: Para vir

VÍTOR: Boa noite

[...].

 

Na conversa de 22.09.2020, Vítor orienta Gisele acerca do comparecimento dos funcionários ao sindicato para assinatura dos “avisos”, solicitando que lhe sejam enviados os documentos para as providências pertinentes (ID 18779233, fl. 17-18):

22 DE SETEMBRO DE 2020

GISELE: Vitor qual horário posso falar para o pessoal ir no sindicato assinar os avisos

VÍTOR: qualquer hora / só me mandar os avisos e dá o tempo de assinar

GISELE: Pode ser as 14 h ? Das 14h as 16h ?

[...].

VÍTOR: sim

GISELE: Ok / Vitor lhe enviei por e-mail uma prévia de rescisão para homologação judicial / E já avisei o pessoal para ir lá assinar das 14h as 16h

VÍTOR: ok

 

Na sequência do diálogo acima transcrito, Gisele envia a imagem de um documento com a seguinte anotação anexa: “Levar no sindicato as 13h30min p/ o Vitor”. A conversa prossegue no dia seguinte:

23 DE SETEMBRO DE 2020

VÍTOR: Oiii

GISELE: Oi

VÍTOR: Não largaram nada aqui ainda

GISELE: Eles estão indo / O Luciano está muito ruim, meu irmão esta indo levar

 

No dia 23.10.2020, registra-se o seguinte (ID 18779233, fl. 27, e 18779933):

23 DE OUTUBRO DE 2020

VÍTOR: Bom dia / Vc pode falar com teu advogado / PARA PARAR DE ATRAPALHAR O PROCESSO / Para os funcionários receberam

GISELE: Pode falar vc com ele / (anexa contato do Dr. RAFAEL)

VÍTOR: Tentei / Falei / Caiu a ligação

GISELE: Ele estava no telefone comigo

VÍTOR: E ele não me atende !!

 

Segue-se uma mensagem de áudio, com o seguinte teor:

VÍTOR: oh Gisele nós tivemos o trabalho de conferir todos os números de todas as contas dos funcionários para mandar os números certinhos das contas aí o teu advogado foi lá e juntou a lista errada de novo e a justiça pegou a lista errada dele de novo e mandou para a caixa errada se isso não é para atrapalhar não sei o que é para ajudar e a questão dos extratos do FGTS até agora nada e os funcionários até agora sem a multa do FGTS também que tá lá o dinheiro disponível olha eu acho que você tem que repensar a questão desse teu advogado que ele tá só atrapalhando ou talvez ele está fazendo o que tu está mandando que é fazer atrapalhar esse processo que eu imagino que não seja o que tu quer só que esse teu advogado tá atrapalhando o processo agora e tá bem claro isso.

 

Continuam as mensagens de texto:

VÍTOR: Liguei de novo !! Não atende !!!

 

Em contestação, o recorrido assevera que foi chamado por meio do WhatsApp para prestar informações sobre o funcionamento do sindicato, “tendo encaminhado para o Presidente, Sr. Raul Cerveira, evitando ser indelicado com as pessoas com quem mantinha contato”.

Para corroborar suas alegações, o candidato acosta prints de mensagens do WhatsApp trocadas por Raul Cerveira com Gisele Lemos, bem como de diálogos ocorridos em um grupo de conversas criado por Tamires Carvalho para tratar de assuntos ligados ao Supermercado Dia e seus trabalhadores, salientando que não fazia parte do referido grupo, no qual foi, porém, adicionado o presidente Raul Cerveira.

A defesa narra, ainda, que, em razão de desentendimentos pretéritos havidos pela atuação do recorrido no sindicato, Gisele “tem interesse em prejudicar Vítor”, bem como que é possível “verificar pelos prints juntados aos autos, que Gisele procurava Vítor para tratar dos assuntos, podendo concluir-se que estava produzindo provas com o único intuito de prejudicar sua candidatura”.

Por sua vez, as testemunhas ouvidas em juízo (ID 41836283 e seguintes), arroladas pela defesa, quais sejam, Raul da Cruz Cerveira Neto, presidente do sindicato; Jesus Augusto Mattos, assessor jurídico do sindicato; Ivan Vargas da Silva Junior, gerente comercial da Loja Taquari, e Jonas Azambuja, dirigente sindical, afirmaram, em síntese, que Vítor se afastou das atividades do sindicato durante a campanha eleitoral e que não tinham conhecimento acerca das conversas mantidas entre ele e Gisele.

Contudo, o conjunto de mensagens trocadas por Vítor com Gisele e funcionários do Mercado Dia comprova que o primeiro, para muito além do mero aconselhamento pontual, permaneceu atuando como dirigente do sindicado e intermediou as questões trabalhistas envolvendo a rescisão dos contratos de trabalho daquela empresa, entre julho a outubro de 2020.

Percebe-se que, em diversas mensagens, a iniciativa das tratativas é do então candidato Vítor, que, inclusive solicita documentos, reclama sobre situações que dificultavam o andamento da demanda e a rescisão dos contratos e, claramente, utiliza-se de documentos e da estrutura física da entidade sindical para as suas atividades.

As evidências de que o presidente Raul também se envolvia nas discussões atinentes ao supermercado não suplanta ou reduz a nítida atuação paralela de Vítor sobre as mesmas circunstâncias.

Outrossim, a suposta inimizade nutrida por Gisele Lemos em relação ao recorrido, por si só, não teria aptidão para enfraquecer a prova documental sobre os diálogos travados, a qual se extrai objetivamente das mensagens colacionadas.

Da mesma forma, as testemunhas arroladas pela defesa, negando a continuidade do exercício sindical pelo recorrido durante a campanha, não têm o condão de afastar a conclusão vertida dos documentos acostados pelo Ministério Público Eleitoral de que Vítor não se afastou de fato de suas atividades no Sindicato dos Empregados no Comércio de Taquari e atuou como representante sindical nas questões trabalhistas envolvendo os empregados do Supermercado Dia.

Entretanto, na hipótese concreta, o provimento do recurso não fica condicionado somente à comprovação da ausência de desincompatibilização no plano fático, mas se deve perquirir, previamente, acerca da efetiva necessidade de afastamento no plano jurídico, ou seja, da própria incidência da causa de inelegibilidade insculpida no art. 1º, inc. II, al. “g”, da LC n. 64/90 ao caso em análise.

Isso porque, não há comprovação de que a referida entidade de classe seja mantida, total ou parcialmente, por contribuições impostas pelo Poder Público ou com recursos arrecadados e repassados pela Previdência Social, requisito legal indispensável para a configuração da causa de inelegibilidade em tela.

Consoante bem apontou a douta Procuradoria Regional Eleitoral em razões finais, “a presunção é exatamente no sentido oposto, ou seja, de que o aludido sindicato é remunerado não por contribuições impostas pelo poder público, mas sim por contribuições facultativas dos sindicalizados, haja vista as alterações trazidas pela Lei 13.467/2017 no tocante à contribuição sindical”.

Com efeito, um dos requisitos para a necessidade de afastamento temporário, sob pena de inelegibilidade, é o fato de a entidade de classe receber contribuições impostas pelo Poder Público ou arrecadados e repassados pela Previdência Social, conforme explicita a al. "g" do inc. II do art. 1º da LC n. 64/90.

Nesse sentido, já decidiu o TSE que “a regra do art. 1º, inciso II, alínea g, da Lei Complementar 64/90 pressupõe seja a entidade de classe mantida, total ou parcialmente, por contribuições impostas pelo poder público ou com recursos arrecadados e repassados pela Previdência Social. Não demonstrado que a entidade sindical percebe valores oriundos das fontes preconizadas pela norma, descabe exigir a desincompatibilização para concorrer a cargo eletivo” (TSE, AgR-RO n. 060189058, Rel. Min. Admar Gonzaga, acórdão de 25.10.2018).

De seu turno, a partir da Lei n. 13.467/17 (Reforma Trabalhista), não há de se cogitar mais em “contribuições impostas pelo poder público”, pois houve a adoção de um novo modelo de financiamento sindical, afastando a compulsoriedade das contribuições, consoante alteração trazida aos arts. 545, 578 e 579 da CLT, verbis:

Art. 545. Os empregadores ficam obrigados a descontar da folha de pagamento dos seus empregados, desde que por eles devidamente autorizados, as contribuições devidas ao sindicato, quando por este notificados.

Art. 578.  As contribuições devidas aos sindicatos pelos participantes das categorias econômicas ou profissionais ou das profissões liberais representadas pelas referidas entidades serão, sob a denominação de contribuição sindical, pagas, recolhidas e aplicadas na forma estabelecida neste Capítulo, desde que prévia e expressamente autorizadas.

Art. 579. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no art. 591 desta Consolidação.

 

Analisando as referidas normas no julgamento da ADI 5794-DF, o Min. Luiz Fux, redator do acórdão, ao ratificar a constitucionalidade das novas disposições, consignou que, a partir da Lei n. 13.467/17, a contribuição sindical perdeu, inclusive, a sua natureza tributária, para a qual a compulsoriedade é requisito indispensável, nos termos o art. 3º do CTN, consoante ementa que transcrevo:

DIREITO CONSTITUCIONAL E TRABALHISTA. REFORMA TRABALHISTA. FACULTATIVIDADE DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. CONSTITUCIONALIDADE. INEXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR. DESNECESSIDADE DE LEI ESPECÍFICA. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À ISONOMIA TRIBUTÁRIA (ART. 150, II, DA CRFB). COMPULSORIEDADE DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL NÃO PREVISTA NA CONSTITUIÇÃO (ARTIGOS 8º, IV, E 149 DA CRFB). NÃO VIOLAÇÃO À AUTONOMIA DAS ORGANIZAÇÕES SINDICAIS (ART. 8º, I, DA CRFB). (...).

(...).

4. A Lei nº 13.467/2017 emprega critério homogêneo e igualitário ao exigir prévia e expressa anuência de todo e qualquer trabalhador para o desconto da contribuição sindical, ao mesmo tempo em que suprime a natureza tributária da contribuição, seja em relação aos sindicalizados, seja quanto aos demais, motivos pelos quais não há qualquer violação ao princípio da isonomia tributária (art. 150, II, da Constituição), até porque não há que se invocar uma limitação ao poder de tributar para prejudicar o contribuinte, expandindo o alcance do tributo, como suporte à pretensão de que os empregados não-sindicalizados sejam obrigados a pagar a contribuição sindical. (...).

(STF/Pleno, ADI 5794-DF, Red. Min. Luiz Fux, DJ 23.04.2019.)

 

Conforme bem rememorou a Procuradoria Regional Eleitoral, este Tribunal já teve a oportunidade de analisar as repercussões da Lei n. 13.467/17 sobre a espécie de inelegibilidade em comento ao julgar o processo de registro de candidatura n. 0600056-18.2020.6.21.0057, sessão de 13.11.2020, sob a relatoria do Des. Eleitoral Miguel Antônio Silveira Ramos.

Na oportunidade, decidiu a Corte pelo afastamento da exigência de desincompatibilização do dirigente sindical, diante da ausência de prova de que o sindicato é mantido com recursos públicos, confirmando, ainda, os termos da sentença no sentido de que o custeio realizado pelas contribuições dos sindicalizados é, atualmente, voluntário e facultativo, não aperfeiçoando a hipótese prevista no art. 1º, inc. II, al. “g”, da LC n. 64/90.

Por pertinente, reproduzo a ementa do aludido julgado:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. IMPUGNAÇÕES AO REGISTRO DE CANDIDATURA. VICE-PREFEITO. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. PRELIMINARES. VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. NÃO DEMONSTRADO. ILEGITIMIDADE ATIVA. PARTIDO POLÍTICO COLIGADO. INTERESSE RECURSAL INSUBSISTENTE. CAUSA DE INELEGIBILIDADE. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. CONHECIMENTO DE OFÍCIO. SÚMULA N. 45 DO TSE. CARGOS DIRIGENTE SINDICAL. RECURSOS DE ORIGEM PÚBLICA. INEXISTENTES. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. INEXIGÍVEL. NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 1º. II, AL “G” DA LC 64/90. SUPLENTE DE MEMBRO DE CONSELHO MUNICIPAL. DESNECESSIDADE. AUSENTE COMPROVAÇÃO DE EFETIVO EXERCÍCIO DO CARGO. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

1. Recurso do Ministério Público contra sentença que julgou extinta, por ilegitimidade de parte, a impugnação proposta pelo partido, julgou improcedente a sua impugnação e deferiu o registro de candidatura ao cargo de vice-prefeito, entendendo ausente a incidência da hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. II, al. "g", da LC n. 64/1990.

2. Matéria preliminar. Nulidade. 2.1. Participação regular no feito. O Ministério Público Eleitoral participou regularmente do feito, e a Procuradoria Regional Eleitoral, em 2º grau, apresentou seu parecer, suprindo qualquer possível prejuízo. A matéria relativa à desincompatibilização pode ser realizada exclusivamente pela apresentação da prova documental, sendo desnecessária a oitiva de testemunhas e a apresentação de alegações finais. 2.2 Partido político coligado não tem legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral, exceto se a impugnação tiver como objeto o questionamento da validade da própria coligação.

3. Sindicato não mantido com recursos de origem pública, o que afasta a incidência da regra acima transcrita.

4. Os julgados do TSE que equiparam os membros dos Conselhos Municipais a servidores públicos, não se aplicam ao recorrido porque este exerce a função de suplente. Não demonstrado nos autos a sua efetiva atuação no cargo durante o período em que exigida a desincompatibilização.

5. Desprovimento. Registro Deferido.

Grifei.

 

Nesse trilhar, levando-se em consideração a circunstância de que a contribuição sindical perdeu seu caráter compulsório e não existem elementos que autorizem a conclusão de que a entidade de classe recebeu recursos de natureza pública a qualquer título, torna-se desnecessária, in casu, a desincompatibilização prevista no art. 1º, inc. II, al. “g”, da LC n. 64/90, seja formal ou fática, impondo-se o julgamento pela improcedência da demanda.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO por julgar improcedente o Recurso contra Expedição de Diploma.