REl - 0600177-94.2020.6.21.0041 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/09/2021 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas porque o candidato aplicou na campanha recursos próprios no valor R$ 1.600,00, excedendo em R$ 369,22 o limite de gastos para o cargo em disputa, no patamar de R$ 1.230,78, previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme refere a sentença do juízo a quo:

No exame técnico, em que pese as receitas declaradas estarem em conformidade com os créditos bancários devidamente identificados, não havendo indícios do recebimento de fontes vedadas de forma direta e indireta e que os cruzamentos eletrônicos realizados pelo sistema disponibilizado pelo TSE não identificaram omissões de receitas e gastos, foi apontada a irregularidade referente à extrapolação de limite de arrecadação com recursos próprios realizados pelo candidato em R$ 369,22 (trezentos e sessenta e nove reais e vinte e dois centavos).

Assim, de acordo com a análise técnica, concluo pela desaprovação das contas, nos termos do art. 74, inciso III, da Resolução 23.607/2019.

Cabe ressaltar, ainda, que o descumprimento do limite de gastos gera a consequência prevista no art. 27, § 4º, da Res. TSE n. 23.607/2019 e sujeita o infrator ao pagamento da multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso.

Pelo exposto, julgo DESAPROVADAS as contas do candidato a vereador EDELMAR FIORAVANTE pelo Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB – de Silveira Martins, relativas às Eleições Municipais de 2020.

Aplico, por conseguinte, a multa prevista no art. 27, § 4º, da Res. TSE n. 23.609/2019, no valor de 30% do limite excedido, ou seja, R$ 110,76 (cento e dez reais e setenta e seis centavos) em favor do Tesouro Nacional, por  meio do recolhimento da GRU e comprovação nos autos, no prazo de cinco dias úteis contados da data do trânsito em julgado da decisão judicial.

A unidade técnica, em seu parecer conclusivo, manifesta-se da seguinte forma (ID 28659333):

[...]
No entanto, foi constatada a inconsistência relativa a extrapolação de limite de gastos, que afeta a regularidade da prestação de contas apresentada, conforme segue:

- O valor dos recursos próprios supera em R$ 369,22 (soma dos Recursos Próprios menos 10% do limite de gastos fixado para a candidatura) o limite previsto no art. 27, §1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019:

A sanção pelo descumprimento está prevista no art. 27, §4º, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Observa-se que, até o momento, não houve comunicação de indício de irregularidade pelo Ministério Público Eleitoral à autoridade judicial, nos termos do art. 91 da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Destaca-se que a análise técnica das contas está adstrita às informações declaradas pelo prestador de contas e à movimentação financeira apurada nos extratos bancários vinculados à campanha eleitoral, não se esgotando a possibilidade de surgirem informações, a qualquer momento, por conta da fiscalização ou investigação de outras esferas do poder público.

As razões recursais não afastam a irregularidade, pois o entendimento do recorrente quanto aos dispositivos violados não encontra amparo legal.

Além disso, ressalto que a Resolução TSE n. 23.463/15, invocada pelo recorrente, é aplicável somente para as contas relativas às eleições de 2016, pois as contas da campanha do pleito de 2020 são reguladas pela Resolução TSE n. 23.607/19.

No caso em tela, o candidato aplicou recursos financeiros próprios na campanha, em espécie, no valor de R$ 1.600,00 e, dessa quantia, alega que a quantia de R$ 1.200,00 atendeu ao pagamento de honorários de prestação de serviços contábeis, defendendo que essas despesas não podem ser computadas no cálculo do limite.

Não assiste razão ao recorrente.

Como o limite de gastos para o cargo em tela, no Município de Silveira Martins, era de R$ 12.307,75, estava o candidato limitado ao uso de 10% deste valor em recursos próprios, ou seja, R$ 1.203,78, tendo sido verificado o excesso de autofinanciamento de R$ 369,22.

A tese de que não se deve somar às receitas financeiras honorários contábeis para verificação do limite do uso de recurso próprio não prospera, porque o art. 25, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, invocado nas razões recursais, trata tão somente do total de despesas que um candidato pode arcar durante a campanha, para cuja soma fica dispensada a inclusão de honorários advocatícios e contábeis.

Esse regramento é geral, pois o total de despesas poder ser custeado com receitas de doações, do Fundo Partidário e do FEFC, além de financiamento com recursos do próprio candidato (§ 4º do art. 35 da resolução supramencionada).

No entanto, a regra aplicada no parecer conclusivo e na sentença é a do art. 27, § 1º, do mesmo diploma, que se refere ao limite de gastos que o candidato pode adimplir com recursos próprios, conforme se depreende do texto das normas elencadas, litteris:

Art. 25. Os bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro doados por pessoas físicas devem constituir produto de seu próprio serviço, de suas atividades econômicas e, no caso dos bens, devem integrar seu patrimônio.

§ 1º O pagamento efetuado por pessoas físicas de honorários de serviços advocatícios e de contabilidade, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político, não constitui doação de bens e serviços estimáveis em dinheiro (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 10).

(…)

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

(...)

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

§ 4º Para fins de pagamento das despesas de que trata o parágrafo anterior, poderão ser utilizados recursos da campanha, do candidato, do Fundo Partidário ou do FEFC (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 5º).

A diferença de regulamentação é significativa para gastos com recursos do próprio candidato e aqueles oriundos de outras fontes, pois em relação ao autofinanciamento há limite isonômico de 10% do gasto para todos os concorrentes no pleito, de acordo com o cargo pleiteado.

Ao não excepcionar os gastos, inclusive de honorários, a norma visa à igualdade, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais prévios dos candidatos, que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

Nessa linha, oportuno reproduzir as considerações da douta Procuradoria Regional Eleitoral:

Contudo, o § 1º do art. 25 da Resolução TSE nº 23.607/2019 não diz que os honorários de serviços advocatícios e de contabilidade não integrarão a prestação de contas, limitando-se a estabelecer que tais recursos não constituirão doação de bens e serviços estimáveis em dinheiro.

Outrossim, a inteligência que o recorrente tenta extrair do dispositivo em tela contrasta com disposição expressa do art. 35, § 3º, da mesma Resolução, que dispõe que “as despesas com consultoria, assessoria e pagamento de honorários realizadas em decorrência da prestação de serviços advocatícios e de contabilidade no curso das campanhas eleitorais serão consideradas gastos eleitorais, mas serão excluídas do limite de gastos de campanha”. Tal norma repete literalmente o disposto no § 4º do art. 26 da Lei nº 9.504/97. Ou seja, uma vez constituindo gastos eleitorais, tais despesas devem integrar a prestação de contas, somente devendo ser excluídas do limite de gastos.

Por outro lado, existem regras distintas a fim de disciplinar situações distintas. Uma delas trata do limite global de gastos, ao qual, de fato, não se encontram sujeitos “os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político”, nos termos do § 5º do art. 4º da Resolução TSE nº 23.607/2019. Tal norma se refere ao plano da despesa. Já a outra regra é aquela aplicada no caso, pertinente ao âmbito das receitas de campanha, e que estabelece, de maneira objetiva, que “o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer”.

Como referido, a regra prevista no art. 23, § 2-A, da Lei 9.504/97 é objetiva, somente é possível o autofinanciamento que importe em 10% do limite previsto para gastos nas campanhas dos diversos cargos. Esse limite, por sua vez, é estabelecido de acordo com a previsão contida no art. 18-C da Lei das Eleições. Definido o limite para o cargo em relação a determinado município, automaticamente está estabelecido o valor que o candidato pode aportar para sua campanha.

A regra que exclui dos limites de gastos as despesas com advogado e contador é uma exceção e, como tal, deve ser interpretada restritivamente. Assim, aplicável apenas para permitir que o candidato, no tocante ao total de suas despesas extrapole o limite legal no que diz com os referidos gastos.

Aqui, impõe-se a aplicação do princípio da igualdade na disputa eleitoral. Outros candidatos certamente cumpriram o dispositivo legal e limitaram seus gastos de campanha com recursos próprios, o(a) recorrente não o fez, desequilibrando a disputa de forma ilícita, daí a necessidade de aplicação da sanção prevista no art. 27, § 4º, da Resolução 23.607/2019 (art. 23, § 3º, da Lei das Eleições).

Não se trata de verificação de boa ou má-fé, nem de análise sobre a ilicitude da origem dos valores, mas de mera verificação de descumprimento de norma que deve ser observada por todos os candidatos no pleito.

Assim, impõe-se a confirmação da irregularidade, consubstanciada no valor de R$ 369,22 em excesso de gastos operados com recursos próprios do candidato, que representa 20,51% das receitas declaradas (R$ 1.800,00).

Apesar do percentual acima dos 10% frente ao somatório arrecadado, o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Acerca da incidência dos aludidos princípios sobre irregularidades nominalmente diminutas, cumpre trazer à colação precedente do Tribunal Superior Eleitoral apontando a possibilidade de aprovação das contas com ressalvas:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.
1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).
2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".
3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.
4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.
Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.
(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.9.2017.) (Grifei.)

Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar o severo juízo de desaprovação das contas quando, a despeito da elevada equivalência relativa da falha frente ao conjunto das contas, o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10, verbis:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.
1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.
2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.
3. Aprovação com ressalvas.
(TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020.) (Grifei.)

Destarte, tendo em vista que a irregularidade representa quantia pouco expressiva, o recurso comporta provimento parcial para que as contas sejam aprovadas com ressalvas. Tal conclusão, entretanto, não afasta a condenação ao pagamento de multa, que decorre exclusiva e diretamente do uso de recursos próprios acima do limite legal, na forma do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

A penalidade de multa fixada na sentença no percentual de 30% da quantia em excesso, equivalente ao valor de R$ 110,76, encontra previsão no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e o patamar se afigura razoável, adequado e proporcional à falha verificada.

Ressalto que deve ser corrigido, de ofício, o erro material da sentença ao destinar o valor da multa para o Tesouro Nacional, pois a sanção por excesso do limite de autofinanciamento deve ser recolhida ao Fundo Partidário, na forma do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar as contas com ressalvas e manter a sanção de multa de R$ 110,76, retificando a destinação da multa a fim de que seja recolhida ao Fundo Partidário, nos termos da fundamentação.