REl - 0600433-51.2020.6.21.0004 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/09/2021 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas devido ao excesso de autofinanciamento de campanha de R$ 69,23, uma vez que o candidato aplicou recursos próprios no valor de R$ 1.300,00, enquanto o limite era de R$ 1.230,78, e em razão do recebimento de recursos estimáveis em dinheiro, procedentes do FEFC, no valor de R$ 500,00, repassados ao candidato pelo Diretório Municipal do PTB, os quais não foram declarados nas contas da agremiação.

Observa-se que o recurso não se insurge contra a primeira irregularidade referida na sentença, a qual merece ser mantida, pois foi constatado que o recorrente declarou ter recebido do Diretório Municipal do PTB de Campos Borges doação estimável em dinheiro no valor de R$ 500,00, procedente do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, a qual não foi declarada pela agremiação no Sistema de Prestação de Contas – SPCE e na contabilidade da campanha.

Considerando que, nas contas do candidato, foi declarado esse valor, mas que não é possível à Justiça Eleitoral efetuar o rastreamento do recurso e confirmar a identidade do doador originário, a doação configura receita de origem não identificada, a qual enseja o recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Todavia, o dever de recolhimento é solidário entre o candidato e a agremiação, conforme expressa determinação do art. 17, § 9º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Tal dispositivo prevê que, na hipótese de repasse de recursos do FEFC em desacordo com as regras legais, “configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidato que realizou o repasse irregular, respondendo solidariamente pela devolução o recebedor, na medida dos recursos que houver utilizado”.

Assim, correta a sentença ao determinar que o recorrente, em solidariedade do partido, efetue o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

O candidato recorreu apenas da irregularidade quanto à utilização de recursos financeiros próprios, afirmando ter aplicado na sua campanha o montante de R$ 1.354,56, mas que empregou somente a quantia de R$ 926,81, pois o valor de R$ 373,19 caracterizou-se como sobra de campanha.

Em verdade, observa-se que o exame técnico e a sentença verificaram que a arrecadação de recursos próprios foi de R$ 1.300,00, relativa a um depósito em cheque, e não de R$ 1.354,56 como alegado no recurso.

Considerando que para o cargo de vereador do Município de Campos Borges o limite de autofinanciamento era de R$ 1.230,78, houve excesso no valor de R$ 69,23.

Em suas razões, o candidato defende que, para o cálculo de autofinanciamento, deveria ser computada apenas a quantia de R$ 926,81, por ser o valor efetivamente utilizado, o que atenderia ao disposto no § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, litteris:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990  (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

(…)

Sem razão o recorrente.

O parâmetro para aferição do limite de autofinanciamento de cada cargo em disputa visa à igualdade de oportunidades, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais prévios dos candidatos, que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

Da leitura do art. 27, e seus parágrafos, da Resolução TSE n. 23.607/19, não se pode inferir que o limite de autofinanciamento se aplica exclusivamente para despesas realizadas, ou seja, somente para o uso de valores no pagamento dos gastos eleitorais, uma vez que a norma se dirige a nivelar a receita financeira, o limite de arrecadação própria, haja vista que o § 4º estabelece multa para as doações acima dos limites fixados no artigo, sem ressalvas quanto ao efetivo uso no custeio da candidatura.

Portanto, não procede a alegação de que a penalidade de multa deve ser aplicada somente nos casos em que houver efetivo uso, ou seja, pagamento de despesas custeadas com recursos próprios em excesso do limite de autofinanciamento. É no momento da doação, ou seja, do repasse dos recursos para a campanha e da disponibilização desses valores para custeio da candidatura, que se perfectibiliza a infração, ainda que, eventualmente, o valor não seja utilizado e caracterize sobra de campanha.

A Procuradoria Regional Eleitoral lançou parecer com o mesmo entendimento, no sentido de que o excesso de autofinanciamento não resta sanado, ainda que uma parcela dos recursos próprios aplicados pelo candidato não seja utilizada e se classifique como sobra de campanha:

Cumpre apontar, de início, que o valor de R$ 373,19 que o recorrente afirma ter pago a título de sobras de campanha, foram transferidas ao órgão partidário, na forma exigida pelo § 1º do art. 50 da Resolução TSE nº 23.607/2019. 

Todavia, a mera existência de sobra de campanha não é incompatível com a regra do art. 27, § 1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, pois a utilização de recursos próprios a que se refere o dispositivo não se refere ao plano da despesa, e sim ao plano da receita. É dizer, para fins de incidência do referido dispositivo, basta que se tenha colocado recursos próprios acima do limite legal à disposição da campanha, sendo este o uso a que se reporta o dispositivo, não importando, pois, que tal recurso tenha sido efetivamente gasto. Outrossim, dada a fungibilidade ínsita ao dinheiro, muitas vezes não é possível saber se o valor que estava na conta outros recursos constituía recurso próprio ou doação de campanha.

Aqui, impõe-se a aplicação do princípio da igualdade na disputa eleitoral. Com efeito, o desequilíbrio na disputa já decorre do mero fato de ter à sua disposição recursos vultosos, não importando, para tal efeito, se, por uma contingência qualquer, tais recursos não tenham sido dispendidos em sua totalidade.

De rigor, pois, a incidência da pena de multa, no valor de até 100% da quantia em excesso, prevista no art. 27, §4º, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

De fato, a existência de sobras de campanha não interfere no cálculo do excesso de limite de doações eleitorais, seja de recursos próprios, seja de eleitores que financiam parte das campanhas e somente podem doar 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos do ano-calendário anterior à eleição (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 1º).

Desse modo, as razões recursais são insuficientes para infirmar a conclusão da sentença no sentido de que o candidato excedeu em R$ 69,23 o limite de recursos próprios que poderia ter doado para a sua campanha.

As duas irregularidades, relativas à receita de origem não identificada no valor de R$ 500,00 e ao excesso de autofinanciamento de R$ 69,23, totalizam R$ 569,23, montante que representa 24,74% das receitas declaradas (R$ 2.300,00).

Contudo, tendo em vista que a quantia absoluta das falhas é pouco expressiva, o recurso comporta provimento parcial para que as contas sejam aprovadas com ressalvas, em atenção aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade.

Tal conclusão, entretanto, não afasta a condenação ao pagamento de multa, que decorre exclusiva e diretamente do uso de recursos próprios acima do limite legal, na forma do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, bem como o dever de recolhimento ao erário, em solidariedade com o partido, dos recursos de origem não identificada verificados nas contas.

A penalidade de multa fixada na sentença, no percentual de 100% da quantia em excesso, equivalente ao valor de R$ 69,23, encontra previsão no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e se afigura razoável, adequada e proporcional à falha verificada.

Todavia, ressalto que deve ser corrigido, de ofício, o erro material da sentença ao destinar o valor da multa para o Tesouro Nacional, pois a sanção por excesso do limite de autofinanciamento deve ser recolhida ao Fundo Partidário, na forma do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas, manter a determinação solidária, entre o recorrente e o Diretório Municipal do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) de Campos Borges, de recolhimento de R$ 500,00 ao Tesouro Nacional, e a fixação de multa no valor de R$ 69,23, a qual deve ser recolhida ao Fundo Partidário, nos termos da fundamentação.