REl - 0600529-44.2020.6.21.0173 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/09/2021 às 14:00

VOTO

 

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e reúne os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

Preliminar de ofício

Preliminarmente, tenho por excluir de ofício as agremiações DEM e PSD do feito.

Isso porque, nas eleições majoritárias do pleito de 2020, o DEM e o PSD de Gravataí concorreram de maneira coligada. Assim, a legitimada passiva haveria de ser a Coligação TODA FORÇA PARA GRAVATAÍ (PSD/PV/DEM/PATRIOTA/SOLIDARIEDADE/DC/PROS).

Como consabido, segundo o disposto no art. 6º, § 4º, da Lei n. 9.504/97, o partido político não possui legitimidade para atuar de forma individualizada, nas demandas concernentes às eleições majoritárias, quando se coligou a outras agremiações, exceto na hipótese de questionar a validade da própria coligação.

Tanto assim, que o § 1º daquele mesmo dispositivo legal confere, às coligações, o direito de utilizar uma denominação própria, atribuindo-lhes prerrogativas e obrigações de partido político no que se refere ao processo eleitoral, devendo atuar como uma única agremiação no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários, por meio de seus respectivos representantes.

Nessa senda, conclui-se que o PARTIDO SOCIALISTA DEMOCRÁTICO (PSD) e o DEMOCRATAS (DEM) de Gravataí, por participarem do pleito majoritário como integrantes da Coligação TODA FORÇA PARA GRAVATAÍ, não têm legitimidade para atuar isoladamente no presente feito, que versa sobre representação eleitoral por divulgação de pesquisa eleitoral irregular atribuída à chapa majoritária.

Dessa sorte, tenho por excluir o DEM e o PSD de Gravataí do polo passivo da presente ação, extinguindo o feito sem resolução do mérito, relativamente aos dois representados.

Mérito

No mérito, a decisão do juízo a quo reconheceu a irregularidade das pesquisas impugnadas pela ora recorrente deixando, contudo, de proibir a sua divulgação e de aplicar sanção pecuniária, nos seguintes termos:

Decido.

Tenho por julgar procedente a presente representação para IMPUGNAÇÃO À DIVULGAÇÃO DAS PESQUISAS ELEITORAIS registradas sob os números: RS 08188/2020 e RS 05626 /2020.

Explico.

Inicialmente, pelas bem fundamentadas razões do Ministério Público Eleitoral, tenho por mudar meu entendimento com relação à extinção da representação referente à pesquisa registrada sob o número RS-08188/2020, para, em adotando o parecer Ministerial, passar a julgar o mérito das duas pesquisas impugnadas, pois a matéria impugnada é a mesma.

Diante da importância da lisura das pesquisas eleitorais, entendo pelo cumprimento da lei estrita, o que não ocorreu nas pesquisas impugnadas. Vejamos.

Tanto na pesquisa RS 08188/2020, quanto na RS 05626 /2020, não há referência à ponderação em relação à área física de realização do trabalho a ser executado. Sem parâmetros e dados destacados em cada uma das áreas das respectivas pesquisas, o prejuízo é evidente.

A apresentação apenas da área geográfica, como fizeram os representados, sem o devido detalhamento das amostras obtidas, não há possibilidade de se extrair a mínima confiança nos resultados extraídos, induzindo em erro a margem de confiança das pesquisas.

Apenas com a rígida observância dos critérios estabelecidos nas Resoluções do TSE é que se pode permitir a divulgação das pesquisas eleitorais, sob pena de estarmos dando aval a resultados manipulados e distorcidos de forma dolosa, o que não se permite, pois as pesquisas eleitorais têm uma grande influência sobre os eleitores.

Nesse sentido, em não tendo sido atendido o requisito referente à ponderação das áreas abrangidas em ambas as pesquisas impugnadas (RS 08188/2020 e RS 05626 /2020), tenho por considerá-las como não registradas, bem como por proibir a divulgação destas, proibição a qual resta prejudicada, diante da data da presente decisão, pois o pleito eleitoral já foi encerrado em Gravataí.

ISSO POSTO: JULGO procedente a presente representação para impugnação às pesquisas eleitorais registradas sob os números: RS 08188/2020 e RS 05626 /2020, para considerá-las como não registradas. Deixo de determinar a proibição de divulgação ou de menção às pesquisas, pois prejudicadas pelo encerramento das eleições nesta Comarca. Da mesma forma, diante da ausência de divulgação, deixo de aplicar a multa prevista no artigo 17 da Resolução 23.600/2019. (grifei)

Consideradas não registradas as pesquisas por infração ao art. 2º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.600/19, a questão, agora em sede recursal, cinge-se a apurar a indevida divulgação do seu conteúdo em favor de candidato ao cargo de prefeito, por meio de sua página no Facebook, conforme alegado pela recorrente.

A divulgação de pesquisa eleitoral irregular, sem registro, constitui conduta apta a ensejar a aplicação da multa prevista no § 3º do art. 33 da Lei das Eleições, regulamentado no art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19. Vejamos:

Lei n. 9.504/97

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

[…]

IV – plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

[…]

§ 3º A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações de que trata este artigo sujeita os responsáveis a multa no valor de cinquenta mil a cem mil UFIR.

 

Resolução TSE n. 23.600/19

Art. 17. A divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações constantes do art. 2º desta Resolução sujeita os responsáveis à multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais) (Lei nº 9.504/1997, arts. 33, § 3º, e 105, § 2º).

Sobre o tema, assim leciona José Jairo Gomes (Direito Eleitoral. 15. ed. São Paulo: Atlas, 2019, p. 526):

É certo que os resultados, divulgados com alarde pelos interessados e ecoados pela mídia, podem influir de modo relevante e perigoso na vontade dos eleitores. Por serem psicologicamente influenciáveis, muitos indivíduos tendem a perfilhar a opinião da maioria. Daí votarem em candidatos que supostamente estejam “na frente” ou “liderando as pesquisas”. Por isso, transformaram-se as pesquisas eleitorais em relevante instrumento de marketing político, que deve ser submetido a controle estatal, sob pena de promoverem grave desvirtuamento na vontade popular e, pois, na legitimidade das eleições.

In casu, observa-se a efetiva realização de postagens (ID 11707933 e ID 11708683), durante o período eleitoral, publicadas na “timeline” do candidato a prefeito da chapa dos partidos recorridos, com os seguintes dizeres:

“PESQUISA CONFIRMA:

A população de Gravataí tem a maior expectativa de vitória na eleição de domingo em Dimas. Para 41% dos entrevistados, Dimas vence!

Expectativa de vitória dos demais candidatos: Luiz Zaffalon 25%; Anabel Lorenzi 7%; Jairo Carneiro 1%; Claiton Manfro 1%; Tamires Paveglio 0%; Não sabe 26%

Pesquisa Estimulada:

Dimas 37%

Luiz Zaffalon 26%

Anabel Lorenzi 11%

Jairo Carneiro 2%

Tamires Paveglio 1%

Claiton Manfro 0%

Brancos/Nulos 9%

Não sabe 15%

Pesquisa realizada pela empresa ABC Dados, ouviu 400 eleitores de Gravataí, entre os dias 8 e 10 de novembro e tem uma margem de erro total, para mais ou para menos, de 5% considerando-se um nível de confiança de 95%. A pesquisa foi registrada no TSE sob o número RS-05626/2020 e foi contratada pelo PSD de Gravataí.

ELEIÇÕES 2020 DIMAS SOUZA COSTA CNPJ: 38.526.719/0001-33

COLIGAÇÃO TODA FORÇA PARA GRAVATAÍ: PSD, DEM, PV, SOLIDARIEDADE, PATRIOTA, DEMOCRACIA CRISTÃ, PROS”.

A publicação vem acompanhada da imagem de um gráfico contendo percentuais de alguns candidatos e da seguinte inscrição: “DIMAS VAI GANHAR. AGORA É DIMAS 55”.

Em outra divulgação, observa-se o texto:

PESQUISA COMPROVA: Dimas dispara na frente, com 37% das intenções de voto!

Agradeço muito a confiança da população de Gravataí até aqui. Estamos na reta final, mas ainda não ganhamos nada. Falta pouco para transformarmos Gravataí!

Pesquisa realizada pela empresa ABC Dados, ouviu 600 eleitores de Gravataí, entre os dias 1º e 5 de novembro e tem uma margem de erro total, para mais ou para menos, de 4% considerando-se um nível de confiança de 95%. A pesquisa foi registrada no TSE sob o número Nº RS-08188/2020 e foi contratada pelo Diretório do Democratas de Gravataí.

Dados dos demais candidatos: Jairo Carneiro 2%; Tamires Paveglio 2%; Claiton Manfro 1%; Brancos/Nulos 10%; Não sabe 10%.

ELEIÇÕES 2020 DIMAS SOUZA COSTA CNPJ: 38.526.719/0001-33

COLIGAÇÃO TODA FORÇA PARA GRAVATAÍ: PSD, DEM, PV, SOLIDARIEDADE, PATRIOTA, DEMOCRACIA CRISTÃ, PROS

Da mesma forma que a anterior, esta publicação traz consigo imagem gráfica com índices percentuais e os dizeres: “DIMAS DISPARA NA FRENTE. AGORA É DIMAS 55”

Da análise das postagens no Facebook, verifico que as mesmas trazem informações de ordem técnica própria de levantamentos estatísticos, assim como citam o instituto responsável pela pesquisa.

Além da referência a percentuais, fez-se menção também à margem de erro, número de entrevistados, período de realização da pesquisa, número de registro no TSE, contratante, entre outros, equiparando-se, portanto, à divulgação de pesquisa eleitoral.

Presentes, na espécie, portanto, os critérios técnicos e elementos mínimos para caracterização de divulgação de pesquisa eleitoral, na forma do art. 33 da Lei das Eleições.

Nesse sentido a jurisprudência:

RECURSO ELEITORAL – REPRESENTAÇÃO POR DIVULGAÇÃO DE PESQUISA, EM REDE SOCIAL, SEM O PRÉVIO REGISTRO DAS INFORMAÇÕES – ELEIÇÕES DE 2020 – Prejudicial de ausência de pressuposto processual – Inocorrência – Mérito – Pesquisa com gráfico contendo informações minuciosas sobre a porcentagem de cada candidato, sem o registro legal – Autoria suficientemente demonstrada – Ilícito caracterizado – Exegese do artigo 33, § 3º, da Lei nº 9.504/97 – Precedentes – Multa aplicada, aquém do mínimo legal – Impossibilidade – Majoração da multa aplicada ao mínimo legal – Possibilidade – Sentença reformada somente em relação à sanção aplicada – Matéria preliminar afastada – Recurso de Orlando Silva de Bulhões desprovido e recurso do Ministério Público Eleitoral provido. (TRE-SP – REl 060002056 – Rel. Des. Mauricio Fiorito – Acórdão de 30.09.2020)

 

Recurso eleitoral. Representação. Divulgação de pesquisa irregular em perfil no facebook. Sentença que aplicou multa no patamar mínimo. 1 – Incidência do art. 33, § 3º, da lei 9.504/97. Norma que visa evitar que pesquisas irregulares, ou até mesmo fraudulentas sejam difundidas entre os eleitores, influenciando indevidamente o ânimo destes, a fim de que votem no candidato mais bem colocado, em prejuízo à isonomia entre os aspirantes aos cargos eletivos. Conotação político-eleitoral da pesquisa veiculada. Ausência de boa-fé. Direito à livre manifestação do pensamento que encontra claros limites na legislação eleitoral. 2 – Impossibilidade de redução do valor da penalidade de multa para aquém do mínimo legal. Precedentes do TSE.3 – Desprovimento do recurso. (TRE-RJ – RE 6266 – Rel. Des. Cristiane de Medeiros Brito Chaves Frota – PSESS 12.09.2016)

Da mesma forma, o precedente do TSE:

ELEIÇÕES 2014. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. DIVULGAÇÃO DE PESQUISA ELEITORAL SEM O PRÉVIO REGISTRO. INTERNET. FACEBOOK. CONFIGURAÇÃO. ART. 33, 5 3", DA LEI No 9.504/97. MULTA. MÍNIMO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE DE REDUÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. In casu, da leitura do conteúdo da postagem transcrita no acórdão, verifica-se que houve a publicação de dados de pesquisa eleitoral na página pessoal do Recorrente no Facebook.

2. A divulgação, na rede social Facebook, de pesquisa sem o registro insere-se na vedação prevista no art. 33 da Lei no 9.504/97, sujeitando o responsável ao pagamento da multa prescrita no § 3º do referido dispositivo legal.

(…)

(AgReg em REsp no 93359, Relator: Min. Luiz Fux, Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico de 16/2/2016).

O objetivo da norma é impedir que os eleitores sejam influenciados por publicações inverídicas, falsas ou irregulares, a comprometer o equilíbrio da disputa eleitoral, punindo a conduta de qualquer pessoa que divulgue pesquisa eleitoral irregular.

Nesse sentido, considerando a interferência que pesquisas exercem sobre o eleitorado, há de ser observada a forma como será divulgada. E, no caso, não se pode fugir do fato de que a pesquisa foi divulgada no Facebook, rede social de repercussão e abrangência globais, em perfil de campanha de candidato a prefeito do município, com potencialidade de atingir os eleitores que viessem a acessar a página em busca de informações acerca dos candidatos.

Importante reconhecer que o compartilhamento dos dados extraídos das pesquisas (não registradas) em perfil de candidato ao pleito municipal, além de satisfazer os requisitos caracterizadores do tipo, tem potencialidade de influenciar o eleitorado local a ponto de impactar na sua vontade.

Registro, ainda, que a norma proibitiva trazida no art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19, destina-se justamente aos protagonistas do pleito, como os partidos, candidatos, coligações, institutos de pesquisa e aos meios de comunicação de massa, que auferem ganhos diretos e indiretos com a produção, contratação e divulgação das pesquisas eleitorais.

Assim, forçoso concluir que a recorrida ABC DADOS PESQUISAS E PLANEJAMENTO LTDA. divulgou pesquisa eleitoral na internet, em desacordo com a legislação eleitoral, com o que se sujeita ao pagamento da respectiva multa prevista na norma.

Ainda, embora inafastável a responsabilização da recorrida, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, tenho que a sanção pecuniária deve ser fixada no valor mínimo legal de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais).

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto, preliminarmente, para extinguir o processo sem resolução de mérito referente ao Democratas – DEM e ao Partido Social Democrático – PSD ambos de Gravataí por ilegitimidade passiva, e, no mérito, pelo provimento do recurso interposto pela Coligação Gravataí Não Pode Parar (MDB/REPUBLICANOS/PSDB/PP/PTB/PSL/PRTB/PSB), para, reformando parcialmente a sentença, condenar a recorrida ABC Dados Pesquisa e Planejamento LTDA. ao pagamento de multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais), nos termos do art. 17 da Res. TSE n. 23.600/2019.