REl - 0600195-18.2020.6.21.0041 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/09/2021 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas porque o candidato aplicou na campanha recursos próprios no valor R$ 1.952,53, excedendo em R$ 721,75 o limite de gastos para o cargo em disputa, no patamar de R$ 1.230,78, previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme refere a sentença do juízo a quo:

Após o exame técnico conclusivo, foi apontada a irregularidade referente à extrapolação de limite de arrecadação com recursos próprios realizados pelo candidato em dinheiro em R$ 721,75 (setecentos e vinte e um reais e setenta e cinco centavos).

Em que pesem as alegações contidas na resposta, não pode ser acolhida a argumentação do candidato, pois, como demonstrado na análise técnica das contas, a violação ao art. 27, §1º, da Resolução nº 23.607/19 ocorre quando o candidato arrecada recursos próprios em limite superior a 10% estipulado para a candidatura e não no que tange à destinação dos recursos, que, no caso, em parte foi utilizada para pagar gastos contábeis. O art. 27, §1º, da Resolução em comento é cristalino, neste sentido:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

Além disso, cabe ressaltar que os gastos eleitorais estão vinculados ao teto do cargo, ou seja, R$ 12.307,75 (doze mil, trezentos e sete reais e setenta e cinco centavos), mais os honorários advocatícios e contábeis. Não se confunde, portanto, com as possibilidades de arrecadação de recursos para a campanha.

Assim, de acordo com a análise técnica e acolhendo o parecer ministerial, concluo pela desaprovação das contas, nos termos do art. 74, III, da Resolução 23.607/2019.

Cabe ressaltar, ainda, que o descumprimento do limite de gastos gera a consequência prevista no art. 27, § 4º, da Res. TSE n. 23.607/2019 e sujeita o infrator ao pagamento da multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso.

Pelo exposto, julgo DESAPROVADAS as contas do candidato a vereador SILVIO PAULO GABBI pelo Movimento Democrático Brasileiro – MDB – de Silveira Martins, relativas às Eleições Municipais de 2020, nos termos do art.74, III, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Aplico, por conseguinte, a multa prevista no art. 27, § 4º, da Res. TSE n. 23.609/2019, no valor de 30% do limite excedido, ou seja, R$ 216,52 (duzentos e dezesseis reais e cinquenta e dois centavos) em favor do Tesouro Nacional, por  meio do recolhimento da GRU e comprovação nos autos, no prazo de cinco dias úteis contados da intimação da decisão judicial.

A unidade técnica em seu parecer conclusivo manifesta-se da seguinte forma:

[...]
O único reparo a ser feito é quanto ao recurso estimável em dinheiro (R$ 200,00) que deve ser retirado do montante excedido pois está dentro da legalidade conforme o §3º do art.27. Assim o valor excedido é de R$721,75 em vez de R$921,75.

Conclusão

Ante as considerações supra, retifico o parecer ID 74499363 somente no tocante ao valor excedido que é de R$721,75, mantendo a recomendação pela desaprovação das contas.

Como se vê, o candidato aplicou recursos financeiros próprios na campanha, em espécie, no valor de R$ 1.952,53, bem como realizou a cessão do veículo particular estimada em R$ 200,00, mas observa-se que a sentença, seguindo o exame técnico, excluiu do cálculo para a análise da extrapolação do limite do autofinanciamento a quantia de R$ 200,00, relativa à doação estimável em dinheiro recebida durante a campanha.

Merece ser ressaltado que não encontra amparo legal ou jurisprudencial o entendimento de que não devem ser somadas as receitas em dinheiro e as estimáveis para contabilizar o limite de autofinanciamento, já tendo o Tribunal Superior Eleitoral definido que os recursos próprios em espécie e os estimáveis em dinheiro devem integrar o cálculo do limite legal, com o escopo de assegurar tratamento isonômico aos candidatos, conforme ilustra o seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE DE GASTOS. BENS ESTIMÁVEIS. FALHA GRAVE. MULTA. DESPROVIMENTO.
1.  Autos recebidos no gabinete em 25.8.2017.
2.  No caso, o TRE/SE julgou desaprovadas contas do agravante por exceder em R$ 1.805,12 o limite de gastos de campanha estipulado pelo TSE em R$ 10.803,91.
3.  É falha grave a atrair multa e rejeição do ajuste contábil ultrapassar em quase 18% o limite de gasto previsto no pedido de registro de candidatura, sem justificativas plausíveis para prática do ilícito, ainda que os valores em excesso se refiram a bens estimáveis em dinheiro. Precedentes.
4.  Agravo regimental desprovido.
(Recurso Especial Eleitoral n. 16966, Relator Min. Herman Benjamin, Publicação: DJE de 15.6.2018.) (Grifei.)

 

Com efeito, o art. 5º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe expressamente sobre a contabilização das doações estimáveis em dinheiro para efeito de cálculo do limite de gastos realizados pelo candidato, litteris:

Art. 5º Os limites de gastos para cada eleição compreendem os gastos realizados pelo candidato e os efetuados por partido político que possam ser individualizados, na forma do art. 20, II, desta Resolução, e incluirão:
[…].
III - as doações estimáveis em dinheiro recebidas.

(Grifei.)

Ao não excepcionar os recursos estimáveis em dinheiro do parâmetro para aferição do limite de gastos de cada cargo em disputa, a norma visa à igualdade, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais prévios dos candidatos, que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

Todavia, considerando que o presente recurso foi interposto apenas pelo candidato, deve ser mantido o entendimento exarado na sentença, que excluiu do somatório da irregularidade a importância de R$ 200,00.

Quanto ao pedido de reforma da decisão, o prestador defende, nas razões recursais, que as despesas com serviços advocatícios e contábeis de R$ 1.500,00 sejam excluídas do cálculo do limite de autofinanciamento e invoca o art. 29, § 1º-A, da Resolução TSE n. 23.463/15.

O argumento não prospera, merecendo anotação que a Resolução TSE n. 23.463/15 é aplicável somente para as contas relativas às eleições de 2016, pois as contas da campanha do pleito de 2020 são reguladas pela Resolução TSE n. 23.607/19.

A tese de que não se deve somar às receitas financeiras os honorários contábeis para verificação do limite do uso de recurso próprio não prospera, visto que o art. 26, § 4º, da Lei n. 9.504/97, invocado nas razões recursais, trata tão somente do total de despesas permitido ao candidato durante a campanha, em cuja soma fica dispensada a inclusão de honorários advocatícios e contábeis.

Este regramento é geral e pode ser adimplido com receitas da campanha, do Fundo Partidário e do FEFC, além de financiamento com valores do próprio candidato (§ 5º). No entanto, a regra aplicada no parecer conclusivo e na sentença é a do art. 23, § 2º-A, do mesmo diploma, que se refere ao limite de gastos em que podem ser empregados recursos do próprio candidato, conforme se depreende do texto, litteris:

Art. 23.  Pessoas físicas poderão fazer doações em dinheiro ou estimáveis em dinheiro para campanhas eleitorais, obedecido o disposto nesta Lei. (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)

(…)

§ 2º-A.  O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer. (Incluído pela Lei nº 13.878, de 2019)

(...)

Art. 26.  São considerados gastos eleitorais, sujeitos a registro e aos limites fixados nesta Lei: (Redação dada pela Lei nº 11.300, de 2006)

(…)

§ 4º  As despesas com consultoria, assessoria e pagamento de honorários realizadas em decorrência da prestação de serviços advocatícios e de contabilidade no curso das campanhas eleitorais serão consideradas gastos eleitorais, mas serão excluídas do limite de gastos de campanha. (Incluído pela Lei nº 13.877, de 2019)

§ 5º  Para fins de pagamento das despesas de que trata este artigo, inclusive as do § 4º deste artigo, poderão ser utilizados recursos da campanha, do candidato, do fundo partidário ou do FEFC. (Incluído pela Lei nº 13.877, de 2019)

A diferença de regulamentação é significativa para as despesas com recursos do próprio candidato e `àquelas oriundas de outras fontes, pois em relação ao autofinanciamento há limite isonômico de 10% do gasto para todos os concorrentes no pleito, de acordo com o cargo pleiteado.

Ao não excepcionar os dispêndios, inclusive de honorários, a norma visa à igualdade, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais prévios dos candidatos, que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

Nessa linha, oportuno reproduzir as considerações trazidas pela douta Procuradoria Regional Eleitoral:

Consoante muito bem frisado na sentença, existem regras distintas a fim de disciplinar situações distintas. Uma delas trata do limite global de gastos, ao qual, de fato, não se encontram sujeitos “os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político”, nos termos do § 5º do art. 4º da Resolução TSE nº 23.607/2019. Tal norma se refere ao plano da despesa. Já a outra regra é aquela aplicada no caso, pertinente ao âmbito das receitas de campanha, e que estabelece, de maneira objetiva, que “o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer”.

 

Assim, impõe-se a confirmação da irregularidade, consubstanciada no valor de R$ 721,75 em excesso de gastos operados com recursos próprios do candidato, que representa 33,53% das receitas declaradas (R$ 2.152,53).

Apesar do percentual acima dos 10% diante do somatório arrecadado, o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Acerca da incidência dos aludidos princípios sobre irregularidades nominalmente diminutas, cumpre trazer à colação precedente do Tribunal Superior Eleitoral apontando a possibilidade de aprovação das contas com ressalvas:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.
1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).
2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".
3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.
4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.
Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.9.2017.) (Grifei.)

 

De igual modo, a jurisprudência do TRE-RS admite a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas quando o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.
1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.
2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.
3. Aprovação com ressalvas.
(TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020.) (Grifei.)

 

Destarte, tendo em vista que a irregularidade representa quantia pouco expressiva, o recurso comporta provimento parcial para que as contas sejam aprovadas com ressalvas. Tal conclusão, entretanto, não afasta a condenação ao pagamento de multa, que decorre exclusiva e diretamente do uso de recursos próprios acima do limite legal, na forma do art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

A penalidade de multa encontra previsão no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e foi  fixada na sentença no percentual de 30% da quantia em excesso, equivalente ao valor de R$ 216,52, que se afigura razoável, adequado e proporcional à falha verificada.

Ressalto que deve ser corrigido, de ofício, o erro material da sentença ao destinar o valor da multa para o Tesouro Nacional, pois a sanção por excesso do limite de autofinanciamento deve ser recolhida ao Fundo Partidário, na forma do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar as contas com ressalvas e manter a sanção de multa de R$ 216,52, e retifico a destinação da multa ao Tesouro Nacional, a fim de que seja recolhida ao Fundo Partidário, nos termos da fundamentação.