REl - 0600727-77.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/09/2021 às 14:00

 VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

O recorrente, após a prolação da sentença, realizou a juntada de dezenas de documentos comprobatórios da prestação de contas.

Como bem observado pelo douto Procurador Eleitoral, foram apresentados mais de 40 ID, verdadeira prestação de contas retificadora.

Assim, como a análise desses documentos demandaria novo exame técnico, na esteira do entendimento desta Corte, não conheço da documentação.

Nesse sentido:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR. JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS COM A PEÇA RECURSAL. ACOLHIDA. MÉRITO. AUSENTE OMISSÃO. DIVERGÊNCIA ENTRE OS DÉBITOS CONSTANTES NOS EXTRATOS E OS INFORMADOS NA CONTABILIDADE. PAGAMENTO DESPESAS SEM TRÂNSITO NA CONTA DE CAMPANHA. IMPOSSIBILIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA MEDIANTE A JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS. INVIÁVEL NOS ACLARATÓRIOS. REJEIÇÃO.

1. Preliminar. Admitida a apresentação de novos documentos com o recurso, quando capazes de esclarecer irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares.

2. Inviável o manejo dos aclaratórios para o reexame da causa. Remédio colocado à disposição da parte para sanar obscuridade, contradição, omissão ou dúvida diante de uma determinada decisão judicial, assim como para corrigir erro material do julgado. Presentes todos os fundamentos necessários no acórdão quanto às falhas envolvendo divergência entre a movimentação financeira escriturada e a verificada nos extratos bancários bem como do pagamento de despesas sem o trânsito dos recursos na conta de campanha. Não caracterizada omissão. Rejeição.

(TRE-RS - RE: 50460 PASSO FUNDO - RS, Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 25.01.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 13, Data 29.01.2018, Página 4.) (Grifei.)

 

No mérito, as seguintes irregularidades conduziram à desaprovação da prestação de contas: a) não entrega, por meio digitalizado, em mídia eletrônica, de diversos documentos indispensáveis para a análise das contas; b) omissão de despesas no valor de R$ 302,38, realizadas com o fornecedor FACEBOOK SERVIÇOS ONLINE DO BRASIL LTDA.; c) a movimentação financeira declarada na prestação, referente à arrecadação de Outros Recursos, não registra o crédito de R$ 302,50 verificado nos extratos eletrônicos.

A sentença (ID 28075233) foi assim fundamentada:

No tocante ao item 4, foram identificadas a omissão de registro, na prestação de contas final, de 2 (duas) notas fiscais eletrônicas, identificadas por meio da circularização de informações, no valor total de R$ 302,38. Desse modo, pode-se dizer que foram utilizados recursos que não transitaram pela conta bancária, o que é, por si só, bastante grave, configurando-se como recursos de origem não identificada.

O apontamento 5 informa que foram declaradas duas despesas, na prestação de contas, no somatório de R$ 302,50, que não foram observadas nos extratos bancários eletrônicos, da conta de Outros Recursos. Considera-se este apontamento como uma inconsistência grave, pois os extratos bancários não fazem prova da alegada movimentação financeira havida na campanha eleitoral.

[…]

Com efeito, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/2019, quando verificadas falhas que comprometam a regularidade das contas, a sua desaprovação é medida que se impõe.

Isso posto, julgo DESAPROVADAS as contas do candidato DOUGLAS BARBOSA PINTO DE MOURA, relativas às eleições municipais de 2020, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/2019 ante os fundamentos declinados. Determino, ainda, o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de origem não identificada, no montante de R$ 302,38, no prazo de até 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, nos termos do art. 32, §§ 2º e 3º, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

 

Em relação à não entrega, por meio digitalizado em mídia eletrônica, de diversos documentos indispensáveis para a análise das contas, tenho que o vício remanesce, na medida em que não aceita a documentação acostada.

Não houve comprovação da despesa eleitoral no valor total de R$ 302,38, que foi paga pelo candidato para o fornecedor FACEBOOK SERVICOS ONLINE DO BRASIL LTDA. (NF 23198577 e NF 24205476).

A omissão dos registros financeiros no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE-Cadastro) torna impossível identificar a origem dos recursos que foram utilizados para o pagamento dessas despesas, circunstância que ocasiona o recolhimento da importância ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

 

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador;

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras recebidas de outros candidatos ou partidos políticos;

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político;

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

V - as doações recebidas sem a identificação do número de inscrição no CPF/CNPJ no extrato eletrônico ou em documento bancário;

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

VII - doações recebidas de pessoas físicas com situação cadastral na Secretaria da Receita Federal do Brasil que impossibilitem a identificação da origem real do doador; e/ou

VIII - recursos utilizados para quitação de empréstimos cuja origem não seja comprovada.

 

Por derradeiro, a movimentação financeira declarada na prestação de contas, referente à arrecadação de Outros Recursos, não registra o crédito de R$ 302,50 verificado nos extratos eletrônicos, falha que remanesce.

Contudo, tenho que a importância total das irregularidades (R$ 604,88), embora represente 36,37% das receitas (R$ 1.663,00), é de valor absoluto reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Nessas hipóteses, cabível a incidência dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, na esteira do que constou na decisão monocrática proferida pelo Ministro Luiz Edson Fachin, nos autos do RESPE n. 37447, em 13.06.2019:

Entendo que o limite percentual de 10% (dez por cento) adotado por este Tribunal Superior revela-se adequado e suficiente para limitar as hipóteses de incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

É de se harmonizar, contudo, a possibilidade de sobreposição dos critérios do valor diminuto e da aplicação dos princípios já citados. Em casos tais, deve prevalecer, até o limite aqui indicado, o critério de valor absoluto, aplicando-se o critério principiológico de forma subsidiária.

Assim, se o valor da irregularidade está dentro do máximo valor entendido como diminuto, é desnecessário aferir se é inferior a 10% (dez por cento) do total da arrecadação ou despesa, devendo se aplicar o critério do valor diminuto.

Apenas se superado o valor máximo absoluto considerado irrisório, aplicar-se-á o critério da proporcionalidade e da razoabilidade, devendo ser considerado o valor total da irregularidade analisada, ou seja, não deve ser desconsiderada a quantia de 1.000 UFIRs alcançada pelo critério do valor diminuto.

 

Nessa linha, a jurisprudência tem afastado o severo juízo de desaprovação das contas quando, a despeito da elevada equivalência relativa da falha diante do conjunto das contas, o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10.

A ilustrar, destaco o seguinte julgado, no qual o somatório das irregularidades alcançou a pequena cifra de R$ 694,90:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020.) (grifo nosso)

 

Transcrevo, ainda, ementa de decisão do Plenário do TSE:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data 29.09.2017.) (grifo nosso)

 

 

Dessarte, tenho ser possível a aprovação das contas com ressalvas em homenagem aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade. Tal conclusão, cabe ressaltar, não afasta o dever de recolhimento ao erário.

Diante do exposto, VOTO pelo não conhecimento dos documentos juntados na fase recursal e, no mérito, pelo provimento parcial do recurso, para aprovar a prestação de contas com ressalvas, mantendo o dever de recolhimento do valor de R$ 302,38 ao Tesouro Nacional.