REl - 0600412-30.2020.6.21.0019 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/09/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é regular e tempestivo, comportando conhecimento.

 

Mérito

VANESSA VIEGAS DA SILVA interpôs recurso contra a sentença que aprovou com ressalvas a sua contabilidade de campanha relativa às eleições de 2020, determinando, no entanto, o recolhimento da quantia de R$ 1.421,25 ao Tesouro Nacional, em virtude de violação ao disposto no art. 21, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, a seguir transcrito:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

 

Na dicção do art. 21, § 1º, da citada resolução, as doações financeiras de pessoas físicas, em valores iguais ou superiores a R$ 1.064,10, devem ser efetivadas por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, ou mediante compensação de cheque cruzado e nominal.

Por força do § 2º daquele mesmo dispositivo legal, o regramento também se aplica às doações sucessivas feitas por um mesmo doador em um mesmo dia, como no caso dos autos, em que foram efetuados dois depósitos em dinheiro, pela própria candidata, na sua conta de campanha, no dia 13.11.2020, nas quantias de R$ 1.061,25 e R$ 360,00, as quais, somadas (R$ 1.421,25), ultrapassaram o valor de R$ 1.064,10.

Dessa forma, embora a candidata tenha alegado que o valor adveio de economia realizada por ela e seu marido, bem como tenha reconhecido que, “por conveniência e por descuido, achando que necessitaria do valor rapidamente, acabou por efetuar depósito acima do limite legal”, é indubitável a ocorrência de violação ao comando legal, porquanto, em operações dessa natureza, são lançadas as informações declaradas pelo depositante (doador imediato), inviabilizando a identificação da real origem dos recursos (doador mediato). Ou seja, não há controle da instituição financeira sobre a veracidade dessa informação e, por conseguinte, quanto à real origem dos valores. Daí a razão da exigência legal para que depósitos superiores a R$ 1.064,10 sejam realizados por meio de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, formas de doação que asseguram de qual conta partiu o recurso.

Por consequência, não restou observado o disposto no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, caracterizando-se os recursos como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do § 4º do art. 21 da Resolução n. 23.607/19, o qual estabelece que, “no caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução”.

Assim, como os recursos financeiros foram empregados na campanha da candidata, a inobservância da normativa implica a sua caracterização como de origem não identificada, impondo-se o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, nos moldes do art. 21, § 4º, c/c o art. 32, § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, que reproduzo na sequência:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(...)

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

(…).

 

Em relação à jurisprudência deste Tribunal (RE 229-93.2016.6.21.0134, da relatoria do Des. Jorge Luís Dall’Agnol) trazida pela recorrente, a qual entende se referir a caso análogo ao seu, onde foi afastada a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, forçoso reconhecer que se trata de situação distinta.

Diversamente da hipótese dos autos, o referido julgado trazido à colação versava sobre ausência de demonstração da capacidade financeira da então candidata para efetuar doação à sua campanha eleitoral, no montante de R$ 610,00, valor considerado como recurso de origem não identificada. Ou seja, houve incompatibilidade entre o patrimônio da candidata – declarado por ocasião do registro de candidatura – e os recursos financeiros próprios empregados na campanha, cuja soma totalizava R$ 610,00, valor inferior a R$ 1.064,10, piso relativo à obrigatoriedade de transferência bancária de valores, indicado no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15, norma que regulava a arrecadação e aplicação de recursos de campanha nas eleições municipais de 2016.

No caso sob análise, a situação é diversa, pois o montante empregado em desacordo com a legislação eleitoral se deu em patamar superior ao valor de R$ 1.064,10. Isso porque foi desrespeitado justamente o art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual prevê que as doações financeiras de pessoas físicas, em valores iguais ou superiores a R$ 1.064,10, devem ser efetivadas por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, ou mediante compensação de cheque cruzado e nominal. Vê-se que o legislador estipulou este patamar justamente para possibilitar a legalidade de doações em espécie em valores inferiores a R$ 1.064,10. Contudo, no caso dos autos, houve a incontroversa extrapolação do limite, tendo a recorrente realizado, no mesmo dia, depósitos em espécie que totalizaram a quantia de R$ 1.421,25.

Portanto, a jurisprudência trazida pela recorrente não se aplica à espécie, seja em razão do seu enquadramento legal, seja pela discrepância do valor impugnado.

 

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso, mantendo a sentença que aprovou com ressalvas as contas de VANESSA VIEGAS DA SILVA, relativas ao pleito de 2020, determinando-lhe o recolhimento da quantia de R$ 1.421,25 ao Tesouro Nacional, com fundamento nos arts. 21, §§ 1º, 2º e 4º, e 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

É como voto, Senhor Presidente.