REl - 0600533-53.2020.6.21.0150 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/08/2021 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em face da aplicação de recursos próprios no valor de R$ 8.000,00, excedendo em R$ 5.267,73 o limite de gastos para o cargo em disputa, no patamar de R$ 2.732,37, previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme refere a bem-lançada sentença, cujas razões cumpre transcrever:

Contudo, realizada análise técnica, foi verificada extrapolação do limite de utilização de recursos próprios, o qual foi introduzido no ordenamento jurídico pela Lei 13.878/19, que acrescentou o art. 2º-A ao art. 23 da Lei das Eleições.

Em atendimento ao princípio do contraditório, o prestador foi intimado a fim de prestar esclarecimentos e/ou sanar as falhas apontadas.

Contudo, não trouxe aos autos elementos a fim de afastar a falha apontada, alegando que não ultrapassou o limite de doação para pessoa física (10% dos rendimentos tributáveis), nem o limite de gastos para o cargo o qual concorreu, tendo agido com boa-fé e transparência.

O parecer acostado pelo Cartório Eleitoral (ID 74832413) informa que extrapolação ocorreu no montante de R$ 5.267,73, representando 40,97% do total de recursos registrados na prestação de contas (R$ 12.856,68).

Inaplicável, portanto, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, pois, conforme entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (Recurso Especial Eleitoral nº 060130661, Acórdão, Relator(a) Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 242, Data 23/11/2020, Página 0), a aplicação dos referidos princípios pressupõe:

(a) os valores considerados irregulares não ultrapassem o valor nominal de 1.000 Ufirs (R$ 1.064,00);

(b) as irregularidades, percentualmente, não podem superar 10% do total; e

(c) as irregularidades não podem ter natureza grave.

Em que pese não haver julgados dando conta da gravidade da irregularidade verificada, tendo em vista a alteração legislativa recente, os valores considerados irregulares ultrapassam o valor nominal de 1.000 Ufirs (R$ 1.064,00) e a extrapolação verificada supera 10% do total de recursos arrecadados.

Nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE 23.607/19, quando constatadas falhas que comprometam sua regularidade devem ser desaprovadas as contas apresentadas.

Por outro lado, identificada infração ao art. 27, §1º, da Resolução TSE 23.607/19, é aplicável a multa prevista no §4º do referido dispositivo legal, a qual arbitro no valor de R$ 2.633,87, equivalente a 50% da quantia em excesso.

 

As razões recursais não têm o condão de afastar a falha, pois o recorrente não contribuiu para campanha diversa da sua e, portanto, não se enquadra no texto do § 1º do art. 23 da Lei n. 9.504/97, pessoa física doadora, e sim no § 2º-A, por tratar-se de autofinanciamento de candidato.

Ademais, verifica-se que a irregularidade atingiu o importe de R$ 5.267,73, que representa 40,97% da receita total declarada pelo prestador de contas, a saber, R$ 12.856,68, percentual e valor acima do admissível, o que impossibilita a aprovação das contas, mesmo com ressalvas, conforme pugna o recorrente.

Assim, uma vez que o candidato extrapolou os recursos próprios que poderia aplicar em sua campanha, está adequada a determinação de recolhimento da multa de R$ 2.633,87, conforme fixada na sentença, que representa 50% do excesso de R$ 5.267,73, a qual poderia chegar a 100%, conforme o art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

...

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

Saliente-se que a inclusão de limite ao autofinanciamento visa assegurar o princípio da isonomia entre os concorrentes, regra estabelecida um ano antes das eleições e passível de conhecimento por todos os candidatos. Assim se manifestou o Parquet:

Ao contrário do entendimento do recorrente, aqui impõe-se a aplicação do princípio da igualdade na disputa eleitoral. Outros candidatos certamente cumpriram o dispositivo legal e limitaram seus gastos de campanha, o recorrente não o fez, desequilibrando a disputa de forma ilícita, daí a necessidade de desaprovação das contas e aplicação da sanção prevista no art. 27, § 4º, da Resolução 23.607/2019 (art. 23, § 3º, da Lei das Eleições).

Desse modo, diferentemente do alegado pelo recorrente, a irregularidade ultrapassa o valor de parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Assim, torna-se inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar a prestação de contas, ainda que com ressalvas. Acerca da incidência dos aludidos princípios sobre irregularidades, cumpre trazer à colação a ementa de julgado proferido por este Regional:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATOS. PREFEITO E VICE. ELEIÇÕES 2016. DOAÇÃO IRREGULAR. DEPÓSITOS EM ESPÉCIE NA CONTA DE CAMPANHA ACIMA DO LIMITE REGULAMENTAR. NÃO IDENTIFICADA A ORIGEM MEDIATA DAS DOAÇÕES. ART. 18, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. RECOLHIMENTO DOS VALORES AO TESOURO NACIONAL. EXISTÊNCIA DE DÍVIDA DE CAMPANHA SEM COMPROVAÇÃO DA ASSUNÇÃO DO DÉBITO PELO PARTIDO POLÍTICO. ART. 27, §§ 2º e 3º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. FALHAS DE VALOR ABSOLUTO SIGNIFICATIVO. INVIÁVEL A APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE DESAPROVAÇÃO. AFASTADO O APONTAMENTO RELATIVO À REALIZAÇÃO DE DESPESA ANTERIOR AO REGISTRO DE CANDIDATURA. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Doações realizadas por pessoas físicas em valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente são permitidas na modalidade de transferência eletrônica direta, conforme o disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. O objetivo legal é impedir operações transversas que ocultem ou dissimulem eventuais ilicitudes, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação. Incontestável o recebimento de depósitos em dinheiro cuja soma extrapola o limite normativo e sem a comprovação da origem mediata dos recursos. Montante efetivamente empregado na campanha. Irregularidade que compromete a confiabilidade das contas. Mantido o recolhimento do valor correspondente ao Tesouro Nacional. 2. A teor do art. 27, §§ 2º e 3º, da Resolução TSE n. 23.463/15, as despesas de campanha de candidato não adimplidas até o prazo de apresentação das contas podem ser assumidas pelo partido político, por meio de decisão do órgão nacional da grei partidária. Ausente prova da assunção da dívida, a falha deve ser aferida na oportunidade do julgamento, no conjunto da prestação de contas. 3. O valor total das irregularidades atinge 25,22% da arrecadação, sendo inviável a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Manutenção da sentença de desaprovação. Afastada, contudo, a apontada falha com referência à realização de despesa anterior ao registro de candidatura. 4. Provimento parcial.

(TRE-RS – Rel n. 58564 SANTO ÂNGELO - RS, Relator: JORGE LUÍS DALL’AGNOL, Data de Julgamento: 09.4.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 59, Data: 11.4.2018, p. 3.) (Grifei.)

Destarte, tendo em vista que a irregularidade representa quantia expressiva, o recurso não comporta provimento, devendo ser mantida a desaprovação das contas e o recolhimento do valor exorbitante.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para desaprovar as contas, mantendo a multa no valor de R$ 2.633,87, nos termos da fundamentação.