REl - 0601024-54.2020.6.21.0055 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/08/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de ELARIO CARLOS JAHN ao cargo de vereador nas eleições de 2020, no Município de Parobé, e o condenou ao recolhimento de R$ 4.900,00 em favor do Tesouro Nacional.

As falhas glosadas pelo juízo a quo consistiram em (1) recebimento de depósito bancário em dinheiro acima de R$ 1.064,10, (2) despesas com combustíveis sem o correspondente registro de veículo na prestação de contas e (3) excesso na utilização de recursos próprios em campanha.

Passa-se a analisar, a seguir, pormenorizadamente, cada uma das irregularidades.

1. Do recebimento de depósito bancário em espécie acima de R$ 1.064,10

A unidade técnica, na origem, verificou que o candidato recebeu depósito em dinheiro, no valor de R$ 4.900,00, no dia 16.10.2020, consoante tabela abaixo (ID 28683583):

 

 

Em face disso, o juízo monocrático entendeu caracterizada afronta ao art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e determinou ao candidato o ressarcimento ao erário do montante correspondente, com fulcro no § 4º do mencionado art. 21.

Como referido, a matéria objeto de exame encontra-se disciplinada no art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

(...)

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

(...)

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

(...).

Dessa maneira, segundo dispõem os §§ 1º e 4º em testilha, as doações em soma igual ou superior a R$ 1.064,10 devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal, devendo os valores ser recolhidos ao Tesouro Nacional caso haja utilização dos recursos recebidos em desacordo com o estabelecido no dispositivo.

O escopo da norma é possibilitar o cruzamento de informações com o Sistema Financeiro Nacional, de modo a permitir que a fonte declarada seja confirmada por meio dos mecanismos técnicos de controle da Justiça Eleitoral.

Embora o depósito tenha sido realizado com a anotação do CPF do presumido doador, ELARIO CARLOS JAHN, é firme o posicionamento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato bancário:

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.

2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.

3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.

4. Concluir em sentido diverso especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.

6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.

7. Agravo regimental desprovido.

(TSE – AgR-REspe n. 251-04, Relator Min. Jorge Mussi, julgado em 19.3.2019, publicado no DJE, tomo 66, de 05.4.2019, pp. 68-69). Grifei.

 

Consigno, a tal respeito, que a Corte Superior entende que a obrigação de as doações acima de R$ 1.064,09 serem realizadas mediante transferência bancária não se constitui em mera exigência formal, sendo que o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas, consoante precedente a seguir colacionado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO. DEPÓSITO BANCÁRIO. EM ESPÉCIE. VALOR SUPERIOR A R$ 1.064,10. TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. EXIGÊNCIA. ART. 18, § 1º DA RES. TSE Nº 23.463/2015. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO.

1. In casu, trata-se de prestação de contas relativa às eleições de 2016 em que o candidato ao cargo de vereador recebeu doação de recursos para sua campanha, por meio de depósito bancário, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

2. Nas razões do regimental, o Parquet argumenta que não foi observado o art. 18, § 1º, da Res.-TSE nº 23.463/2015, segundo o qual "as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação". 3. A Corte Regional, soberana na análise dos fatos e provas, atestou a identificação da doadora do valor apontado como irregular por meio do número do CPF impresso no extrato eletrônico da conta de campanha.

4. Consoante decidido nesta sessão, no julgamento do AgR-REspe nº 265-35/RO, a maioria deste Tribunal assentou que a exigência de que as doações acima de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) sejam feitas mediante transferência eletrônica não é meramente formal e o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas.

5. Considerando a maioria formada no presente julgamento nos mesmos termos do paradigma supracitado, reajusto o meu voto no caso vertente a fim de dar provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral para condenar o recorrido a recolher aos cofres públicos o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

6. A desaprovação das contas em virtude de eventual gravidade da irregularidade mostra-se inaplicável na espécie, em respeito ao princípio da congruência, uma vez que referida pretensão não foi objeto do recurso especial.

7. Agravo regimental acolhido para dar provimento ao recurso especial, com determinação de recolhimento ao erário do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

(Recurso Especial Eleitoral n. 52902, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação:  DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 250, Data 19.12.2018, pp. 92/93.) Grifei.

 

No judicioso voto proferido pelo ilustre Ministro Luís Roberto Barroso no julgado em questão restou bem explicitada a razão da exigência de o aporte financeiro em campanha provir diretamente de outra conta bancária:

7. Entendo que a imposição de que as doações acima de R$ 1.064,10 sejam realizadas mediante transferência bancária não é mera exigência formal, mas busca assegurar a identificação da origem dos recursos que ingressaram na campanha eleitoral. A aceitação de depósitos em espécie, em valor acima do permitido, compromete a transparência das contas de campanha, dificultando o rastreamento da origem dos recursos. Não se pode esquecer que grande parte das transações irregulares realizadas no país envolve dinheiro em espécie, justamente pela dificuldade de rastreamento dos valores. O descumprimento da exigência, portanto, é causa de reprovação das contas de campanha, em especial se o montante envolvido é elevado, como no presente caso, em que supera a metade dos recursos arrecadados.

8. A realização de depósitos identificados por uma determinada pessoa nada prova a respeito de sua origem, que, inclusive, pode advir de fontes vedadas, na medida em que os recursos depositados em espécie não tiveram trânsito pelo sistema bancário. E exatamente esta a razão pela qual se exige que a doação seja realizada por meio de transferência bancária, mecanismo que permite o rastreamento de sua origem, minimizando as possibilidades de operações irregulares. Trata-se de exigência que amplia a segurança do modelo de captação de recursos de campanha autorizado pela legislação.

(Grifei.)

Deveras, o TSE já assentou que “a ratio essendi da norma é identificar a origem de recurso arrecadado, com o rastreamento a partir da transferência eletrônica efetivada entre estabelecimentos bancários” (Recurso Especial Eleitoral n. 26535, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Relatora designada Min. Rosa Weber, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data 20.11.2018, p. 32).

Não se olvida que este Regional tem arrefecido o rigor dessas disposições normativas quando o prestador, por outros meios, atinge o fim colimado pela norma, qual seja, a demonstração segura da origem dos recursos, mormente, por meio do oferecimento de comprovantes de saque em dinheiro da conta-corrente do doador e imediato depósito em espécie na conta de campanha, demonstrando que a operação de transferência bancária restou meramente decomposta em um saque seguido incontinenti de um depósito na mesma data.

Entrementes, na hipótese vertente, inexiste comprovação adicional mínima sobre a origem dos recursos, impossibilitando que a falha seja relevada.

Indene de dúvida, portanto, a configuração da irregularidade, que afeta a transparência das contas, e a necessidade de recolhimento aos cofres públicos da importância eivada de mácula, porquanto efetivamente empregada pelo candidato em sua campanha.

 

2. Dos gastos com combustíveis sem o correspondente registro de locação ou cessão de veículos

A unidade técnica apurou que o candidato realizou despesas com combustíveis, no total de R$ 626,00, sem o correspondente registro de locação ou cessão de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia, conforme tabela a seguir reproduzida (ID 28683583):

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O magistrado singular entendeu que, embora tenha havido manifestação no sentido de que foi utilizado o próprio veículo, não há registro disso na documentação trazida aos autos.

No apelo, o recorrente sustenta que não realizou locação ou cessão de veículos e que os abastecimentos foram utilizados em seu próprio automóvel, não havendo omissão ou afronta à legislação vigente.

O Parquet Eleitoral entende que assiste razão ao recorrente, pois, sendo o candidato proprietário de automóvel, consoante declaração de bens apresentada no registro de candidatura, mostra-se plausível sua alegação de que os combustíveis tenham sido adquiridos para seu uso pessoal na campanha, e que, portanto, tais despesas são consideradas de natureza pessoal, não se encontrando sujeitas a registro na prestação de contas, nem podendo ser adimplidas com recursos da campanha. Desse modo, conclui que o montante deveria ter sido revertido ao partido, já que o gasto foi realizado com valores provenientes da conta “Outros Recursos”, mas que tal não é possível, tendo em vista que o recurso foi aviado somente pelo recorrente.

Esse é o panorama fático delineado nos autos quanto ao apontamento analisado.

A matéria encontra-se regulamentada no art. 35, §§ 6º e 11, da Resolução TSE n. 23.607/19, litteris: 

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…).

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

(…).

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

(...)

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

(...)

§ 4º Ficam dispensadas de comprovação na prestação de contas:

I - a cessão de bens móveis, limitada ao valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) por pessoa cedente;

II - doações estimáveis em dinheiro entre candidatos ou partidos decorrentes do uso comum tanto de sedes quanto de materiais de propaganda eleitoral, cujo gasto deverá ser registrado na prestação de contas do responsável pelo pagamento da despesa.

III - a cessão de automóvel de propriedade do candidato, do cônjuge e de seus parentes até o terceiro grau para seu uso pessoal durante a campanha.

§ 5º A dispensa de comprovação prevista no § 4º não afasta a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações constantes dos incisos I a III do referido parágrafo.

Portanto, as despesas com combustíveis para abastecimento de automóvel usado pelo candidato na campanha não se consideram gastos eleitorais, eis que possuem caráter pessoal e, via de consequência, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha.

De outra parte, tais despesas ostentam natureza eleitoral caso se destinem ao abastecimento de veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes de cessão temporária e declarados originariamente na prestação de contas, sejam exibidos documentos fiscais nos quais conste o CNPJ do candidato e seja apresentado relatório no qual figurem o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente, devendo, outrossim, os montantes atribuídos à cessão do automóvel ser lançados na escrituração.

In casu, os dispêndios em apreço não correspondem, de maneira livre de mácula, a qualquer das hipóteses acima pontuadas.

Se entendidos como de caráter pessoal, os gastos não poderiam ter sido pagos com recursos da campanha e lançados às contas.

Nessa hipótese, a simples declaração de propriedade de veículo automotor não supre a irregularidade apontada na decisão recorrida, sendo necessário o cancelamento ou o estorno das notas fiscais emitidas com o CNPJ de campanha para tanto.

Essa determinação está prevista no art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, segundo o qual “O cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular”, providência não realizada no caso.

É o entendimento desta Corte, conforme ementa do seguinte aresto:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. MAJORITÁRIA. DESAPROVAÇÃO. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RONI. OMISSÃO DE DESPESAS COM COMBUSTÍVEL. ACERVO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR A ORIGEM DO MONTANTE IRREGULAR. NECESSIDADE DE CANCELAMENTO DE NOTAS FISCAIS. VALOR ABSOLUTO INEXPRESSIVO. POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. REFORMA DA SENTENÇA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

(...).

3. Omissão de despesas. Emissão de notas fiscais sem que fosse possível verificar a identidade do doador originário dos recursos. Alegado gasto pessoal com combustíveis, no qual, por equívoco, a empresa fornecedora teria lançado nota fiscal com o CNPJ da candidatura quando deveria ter registrado o CPF do recorrente. Entretanto, a documentação anexada não supre a irregularidade, pois não basta a simples declaração do emissor alegando equívoco na elaboração do documento fiscal, sendo necessário o cancelamento da nota. Determinação prevista no art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19.

5. Provimento parcial.

(TRE-RS; REl n. 0600474-12.2020.6.21.0103; Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 01.07.2021) Grifei.

 

De outra sorte, se compreendidos as despesas como de cunho eleitoral, deveriam ter sido apresentados os documentos prescritos pelo art. 35, § 11, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, incluindo o termo de cessão temporária do veículo e o relatório semanal de abastecimento, o que não se observa nos autos.

Anoto que, consoante jurisprudência do egrégio Tribunal Superior Eleitoral, constitui falha apta a comprometer a regularidade do ajuste contábil a declaração de gastos com combustível sem o correlato registro da cessão ou do aluguel de veículos:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO FEDERAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA. OMISSÃO DE RECEITAS/DESPESAS. FALHA GRAVE.  DESAPROVAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. Embargos opostos contra decisum monocrático e com pretensão infringente são recebidos como agravo regimental. Precedentes.

2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, configura falha insanável, a ensejar a desaprovação das contas, o candidato declarar gastos com combustível sem, contudo, registrar a cessão ou o aluguel dos veículos respectivos, porquanto comprometida a regularidade do ajuste. Precedentes.

3. Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 060545195, Acórdão, Relator Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 56, Data 23.3.2020). Grifei.

 

Destarte, no ponto, não assiste razão ao recorrente, sendo reputados irregulares os gastos realizados com combustíveis, nos termos lançados na sentença.

 

III – Excesso na utilização de recursos próprios do candidato

O candidato declarou ter realizado em favor de sua campanha aporte financeiro de R$ 5.400,00, em conformidade com extrato de prestação de contas (ID 28683183) e recibos eleitorais acostados aos autos, os quais dão conta de doações, mediante transações bancárias, nos importes de R$ 4.900,00 (ID 28682633) e R$ 500,00 (ID 28682683).

O ilustre magistrado singular considerou extrapolado o limite de autofinanciamento previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, assim fundamentando sua decisão sobre o ponto, após transcrição da referida norma:

Irrefutável portanto a irregularidade mediante a identificação recursos próprios no valor de R$5.400,00 sendo o limite de gastos para o cargo no município de PAROBÉ R$50.661,28. Restou configurado o valor de R$333,87 acima do limite legal, o que representa 4,8% do total arrecadado para a campanha.

Ressalta-se que a resolução não exclui as doações estimáveis em dinheiro deste limite quando utilizados os recursos próprios do candidato. A exceção a que se refere o § 3º do art. 27 é somente quanto às doações de pessoas físicas.

No dispositivo da sentença, concluiu a julgador por deixar de aplicar a multa sobre o excedente utilizado no limite de gastos, com fundamento nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

O tema está previsto no art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme transcrevo:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

 

Dessa maneira, sendo de R$ 50.661,28 o limite de gastos para campanha ao cargo de vereador no Município de Parobé, nas eleições de 2020, consoante disponibilizado pelo Tribunal Superior Eleitoral no sistema Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, poderia o candidato custear sua campanha até o teto de R$ 5.066,13.

Contudo, daquele total de R$ 5.400,00 que o candidato teria usado para alavancar sua candidatura na disputa eleitoral, o montante de R$ 4.900,00 diz respeito ao depósito bancário em espécie já examinado na primeira irregularidade, o qual, por ter sido creditado por meio de depósito direto em espécie, foi considerado de origem não identificada, sendo, inclusive, determinado o recolhimento da quantia respectiva ao Tesouro Nacional por tal fundamento.

Portanto, entendo que descabe, por contraditório, tomar-se aquela quantia, antes reputada de origem não identificada, como efetivamente oriunda do candidato, para o fim de imputar-lhe a extrapolação dos limites de autofinanciamento de campanha, de sorte que não subsiste o presente apontamento diante do reconhecimento da primeira irregularidade analisada.

Assim, as falhas identificadas nas contas alcançam o somatório de R$ 5.526,00 (R$ 4.900,00 + R$ 626,00), que representa 79,90% das receitas arrecadadas (R$ 6.916,00), inviabilizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar com ressalvas as contas.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto por ELARIO CARLOS JAHN, apenas para afastar a irregularidade relativa à extrapolação do limite legal na utilização de recursos próprios, mantida a desaprovação das contas, bem como a determinação de recolhimento da quantia de R$ 4.900,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.