REl - 0600848-55.2020.6.21.0094 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/08/2021 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

Trata-se da prestação de contas de candidata a vereadora, relativa às eleições do ano de 2020.

As contas da recorrente foram desaprovadas com base no parecer conclusivo do exame técnico das contas (ID 41020933), o qual concluiu pela irregularidade na transferência de valores oriundos do FEFC para candidaturas masculinas, sem a indicação de benefício para a campanha da candidata ou de candidaturas femininas, em desacordo com o disposto no art. 17, §§ 6º, 7º, 8º e 9º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 17. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) será disponibilizado pelo Tesouro Nacional ao Tribunal Superior Eleitoral e distribuído aos diretórios nacionais dos partidos políticos na forma disciplinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (Lei nº 9.504/1997, art. 16-C, § 2º).

(...)

§ 6º A verba oriunda da reserva de recursos do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) destinada ao custeio das candidaturas femininas deve ser aplicada pela candidata no interesse de sua campanha ou de outras campanhas femininas, sendo ilícito o seu emprego, no todo ou em parte, exclusivamente para financiar candidaturas masculinas.

§ 7º O disposto no § 6º deste artigo não impede: o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino; a transferência ao órgão partidário de verbas destinadas ao custeio da sua cota-parte em despesas coletivas; outros usos regulares dos recursos provenientes da cota de gênero; desde que, em todos os casos, haja benefício para campanhas femininas.

§ 8º O emprego ilícito de recursos do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) nos termos dos §§ 6º e 7º deste artigo, inclusive na hipótese de desvio de finalidade, sujeitará os responsáveis e beneficiários às sanções do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, sem prejuízo das demais cominações legais cabíveis.

§ 9º Na hipótese de repasse de recursos do FEFC em desacordo com as regras dispostas neste artigo, configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidato que realizou o repasse tido por irregular, respondendo solidariamente pela devolução o recebedor, na medida dos recursos que houver utilizado.

De fato, restou incontroversa a transferência de recursos do FEFC destinados à quota de gênero para os candidatos CELSO ARLINDO GIESE e MARCOS GIESE, sem a indicação de benefício para a campanha da candidata ou de candidaturas femininas, configurando desvio de finalidade, nos termos do § 8º do supracitado art. 17.

A recorrente alegou que transferiu os valores por desconhecimento de que deveriam ser aplicados somente em candidaturas femininas. Ainda, sustentou que o repasse dos recursos do FEFC ao prefeito beneficiou sua campanha, diante dos pedidos de voto, e que a cedência das quantias ao candidato à vereança possibilitou candidaturas femininas.

Contudo, como bem pontuado pela Procuradoria Regional Eleitoral, a recorrente não demonstrou nos autos que os valores do FEFC repassados às candidaturas masculinas foram, de alguma forma, revertidos em benefício da própria concorrente ou de candidaturas femininas.

Transcrevo parte do parecer do Parquet, o qual agrego ao voto como razões de decidir:

(…) De outra senda, não restou comprovada a alegada hipótese de pagamento de despesas comuns com candidato do gênero masculino, em benefício de ambas as candidaturas, a teor da exceção legal prevista no art. 17, § 7º, da Resolução TSE nº. 23.607/19.

A recorrente alega que não tinha informações de que os valores deveriam ser aplicados unicamente em candidaturas femininas. Acrescenta que não há qualquer elemento que comprove que os valores foram recebidos do fundo especial para candidaturas femininas.

Se a unidade técnica da Zona Eleitoral afirma que os recursos que a candidata repassou aos candidatos do sexo masculino eram oriundos da cota de gênero, não tendo a recorrente feito prova em contrário para justificar suas alegações, só resta a esta Procuradoria entender que, efetivamente, os recursos do FEFC recebidos pela mesma destinavam-se à ação afirmativa em questão, o que, diga-se, é o que costuma ocorrer.

Nesse sentido, é nítido o desvio de finalidade, concretizado na transferência de valor a fim de custear a campanha eleitoral dos candidatos, quando tais valores deveriam ser geridos exclusivamente pela candidata doadora. Ademais, a recorrente apenas alega a existência de benefício próprio na transferência dos recursos para outros candidatos, porém não faz qualquer prova a respeito.

Desse modo, restando caracterizada aplicação irregular de recursos públicos, deve ser mantida a sentença que desaprovou as contas e determinou o recolhimento da respectiva quantia irregular ao Tesouro Nacional. (...)

Assim, averiguada a irregularidade, o valor de R$ 1.302,56 (mil trezentos e dois reais e cinquenta e seis centavos) deve ser recolhido aos cofres do Tesouro Nacional, nos termos do § 9º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por fim, a falha constatada representa 33,46% das receitas declaradas pela recorrente (R$ 3.892,41), motivo pelo qual não há que se falar em proporcionalidade ou razoabilidade, devendo ser mantida a sentença de desaprovação de contas.

No mesmo sentido, cito precedentes das Cortes Regionais:

ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. CARGO. DEPUTADO FEDERAL. AUSÊNCIA. DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA. GASTOS. RECURSOS. FEFC. IRREGULARIDADE GRAVE. DESAPROVAÇÃO. 1. A ausência de documentação apta a comprovar a utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha constitui falha grave, uma vez que se exige maior atenção quando se trata de recursos oriundos de verba pública, restando comprometido o efetivo controle das contas; 2. Inaplicabilidade dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade uma vez que o montante considerado irregular ultrapassa o teto de 10% estipulado pelo TSE. 3. Contas julgadas desaprovadas.

(TRE-PA – PC: 060181035 BELÉM – PA, Relator: LUZIMARA COSTA MOURA, Data de Julgamento: 24.09.2019, Data de Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 185, Data 07.10.2019, Página 13.) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATA. DESPESA IRREGULAR COM COMBUSTÍVEL. OMISSÃO DE DESPESAS. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. TRANSFERÊNCIA AO TESOURO NACIONAL. NÃO COMPROVAÇÃO DE BENEFÍCIO À CANDIDATURA FEMININA COM RECURSOS DO FEFC. DESAPROVAÇÃO.

(…)

Trata-se de irregularidade grave, sobretudo diante da relevância relativa do gasto eleitoral, equivalente a 15,75% do total das despesas contratadas, mostrando-se suficiente para acarretar a desaprovação das contas da requerente.

(TRE-DF – PC: 060220874 BRASÍLIA – DF, Relator: JOSÉ JACINTO COSTA CARVALHO, Data de Julgamento: 17.3.2021, Data de Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-DF, Tomo 58, Data: 05.4.2021, Página 10-11.) (Grifei.)

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença que desaprovou as contas de Tania Terezinha Giese, relativas ao pleito de 2020, e determinar o recolhimento do valor de R$ 1.302,56 (mil trezentos e dois reais e cinquenta e seis centavos) ao Tesouro Nacional.