REl - 0600359-32.2020.6.21.0057 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/08/2021 às 14:00

VOTO

Passo ao exame da preliminar de conhecimento parcial do recurso suscitada pela Procuradoria Regional Eleitoral, no sentido de que a parte deixou de atacar a questão envolvendo a irregularidade referida na sentença relativa à utilização indevida de verbas do Fundo Especial de Financiamento da Campanha (FEFC) para pagamento de despesa pessoal de combustível da candidata, a qual foi apontada uma vez que tal gasto não pode ser custeado com recursos da campanha, conforme estabelece o § 6º do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Adianto que tal preliminar não prospera. Por óbvio que a matéria não impugnada, pelo princípio do quantum devollutum quantum apellatum não será objeto de exame e decisão, ainda que o recurso tenha, ao final, pleiteado a reforma da sentença. O voto examina nos limites do que foi devolvido e, nestes limites o conhecimento é amplo e exauriente.

Assim, o recurso deve ser conhecido integralmente, ainda que a irresignação não tenha sido direcionada quanto a todas as irregularidades constatadas nas contas, pois, segundo a inteligência dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC, “a decisão pode ser impugnada no todo ou em parte” e a “a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada”.

Portanto, afasto a preliminar arguida.

No mérito, a prestação de contas foi aprovada com ressalvas devido à utilização indevida de recursos do FEFC no valor de R$ 310,00, relativo a gastos com combustível em carro próprio da candidata (R$ 160,00) e com gasolina para apoiadores sem o devido registro de evento "Carreata" com lista de veículos participantes (R$ 150,00).

Conforme já referido, observa-se que o recurso não se insurge contra a primeira irregularidade referida na sentença, a qual merece ser mantida, pois consta nos autos (ID 24355883 p. 19) que a recorrente abasteceu seu veículo durante a campanha com recursos do FEFC (ID 24354683, p. 4, cheque 850011; ID 24354633, p. 11, cheque 850011), infringindo o disposto no art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Com referência à segunda irregularidade, gasto com combustível para apoiadores em carreata, verifica-se que ao ser intimada acerca da ausência de registro do evento “Carreata” (ID 24354383 – item 5), a candidata ofereceu manifestação informando que houve retificação da prestação de contas com alteração do gasto para despesas com eventos de promoção de candidatura (ID 24354583).

No entanto, a unidade técnica apontou que não houve retificação da despesa para outra modalidade de gasto eleitoral diferente de “combustíveis e lubrificantes” e juntou ao parecer conclusivo nota fiscal eletrônica (ID 24358883) emitida por um posto de gasolina, na qual consta, na descrição da despesa, o item “30,6750 LT” relativo à “Gasolina Aditivada”.

Embora, nas razões recursais, tenha sido alegado que houve um equívoco na prestação de contas e que ocorreram eventos nos dias 05 e 23 de outubro e 12 de novembro de 2020, não foi apresentado qualquer documento para comprovação desse argumento.

Como não foram trazidos aos autos documentos probatórios que justifiquem a falha, não merece ser acolhida a tese recursal, uma vez que a legislação expressamente determina a apresentação de documento fiscal e indicação da quantidade de veículos e de combustível utilizado em evento de carreata, limitando, inclusive, a quantidade de litros por veículo.

Sem tais comprovações é vedado o uso de verba de campanha – de qualquer origem – para adimplir tal tipo de despesa, nos termos do art. 35, § 11, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):
(…)
§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:
I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

Desse modo, as razões recursais são insuficientes para infirmar a conclusão da sentença no sentido de que a candidata utilizou recursos oriundos do FEFC, no valor de R$ 310,00, em despesas vedadas pela norma de regência, como acima exposto.

Por fim, apesar de o recurso mencionar o esclarecimento de gasto com honorários advocatícios, não houve apontamento de irregularidade quanto à referida despesa na sentença, a qual não foi considerada para fins de ressalvas nas contas.

As duas irregularidades, relativas ao gasto com combustível em veículo próprio (R$ 160,00) e em carros de apoiadores sem o registro de evento (R$ 150,00), totalizam R$ 310,00, quantia que representa 3,95% do total de receitas declaradas (R$ 7.829,90).

De fato, correta a sentença ao aprovar as contas com ressalvas em razão de o percentual não ser significativo diante do  somatório arrecadado, em atenção aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como devido ao valor absoluto ser reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Ressalto que permanece a obrigação de recolhimento ao erário, na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, devido à sua incorreta utilização do FEFC verificada nas contas, como determinado na decisão do juízo a quo.

Diante do exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a aprovação das contas com ressalvas e a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 310,00, nos termos da fundamentação.