REl - 0600002-87.2021.6.21.0131 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/08/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo.

A sentença foi disponibilizada no PJE em 13.4.2021, tendo o prazo de dez dias para ciência no processo eletrônico a que se refere o caput do art. 55 da Resolução TRE-RS n. 338/2019 se encerrado em 23.4.2021, começando a contagem do prazo de três dias em 26.4.2020, segunda-feira. Dessa forma, interposto o recurso no dia 28.4.2021, verifica-se que foi observado o tríduo legal previsto no art. 258 do Código Eleitoral.

O recurso, pois, merece ser conhecido.

Preliminar de Ausência de Interesse de Agir

A presente Ação de Impugnação ao Mandato Eletivo tem por fundamento a ocorrência de fraude à cota de gênero realizada no registro da chapa proporcional do Partido Trabalhista Brasileiro de Nova Hartz para o pleito de 2020.

Segundo a petição inicial e reafirmado nas razões de recurso, haveria fortes indícios de que a candidata Elizete Junges teria sido incluída na lista de candidatos proporcionais ao pleito de 2020 com o único intuito de burlar o percentual mínimo exigido no art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97, circunstância que se demonstra diante da votação “zerada” da candidata e pelas contas eleitorais, pois não houve gerenciamento de qualquer valor pela concorrente.

A respeito do direito aplicado, segundo o § 3° do art. 10 da Lei 9.504/97, em relação às eleições proporcionais, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo.

O texto legal assim dispõe:

 

Art. 10. Cada partido ou coligação poderá registrar candidatos para a Câmara dos Deputados, a Câmara Legislativa, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais no total de até 150% (cento e cinquenta por cento) do número de lugares a preencher, salvo:

[…]

§ 3o Do número de vagas resultante das regras previstas neste artigo, cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% (trinta por cento) e o máximo de 70% (setenta por cento) para candidaturas de cada sexo.

 

Conforme reconhece o Tribunal Superior Eleitoral, “o incentivo à presença feminina constitui necessária, legítima e urgente ação afirmativa que visa promover e integrar as mulheres na vida político-partidária brasileira, de modo a garantir-se observância, sincera e plena, não apenas retórica ou formal, ao princípio da igualdade de gênero”, prevista no art. 5º, caput e inc. I, da CF/88 (Representação n. 29657, Acórdão, Relator Min. Herman Benjamin, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 53, Data: 17/3/2017, Página 133-135)

A cota de gênero no registro das candidaturas é ação afirmativa que busca contornar o problema da sub-representação das mulheres nas casas legislativas, de forma a corrigir a hegemonia masculina nas posições de tomada de decisão e o estabelecimento de uma distribuição mais adequada e equilibrada das representações de homens e mulheres nas esferas de poder.

Dada a importância do tema, a Corte Superior Eleitoral assentou o cabimento de AIME para apurar fraude quanto aos percentuais mínimos de gênero, ressaltando que a alegação da matéria pressupõe a obtenção de mandato eletivo pela parte demandada.

Quando do julgamento do REsp n. 19392, de Valença do Piauí, nos dias 14 e 19.9.2019, sob a relatoria do Ministro Jorge Mussi, o Tribunal Superior Eleitoral fixou o entendimento de que, ultrapassados os processos de registro de candidaturas e comprovada a fraude no atendimento às cotas de gênero em sede de AIJE ou AIME, a consequência jurídica é a cassação de todos os registros ou diplomas dos candidatos que compuseram a chapa proporcional, não sendo possível o alcance parcial da medida somente aos eventuais responsáveis diretos pelo ilícito ou aos concorrentes de determinado gênero, ainda que sob o pretexto de preservação das candidaturas femininas.

Conforme concluiu a Corte Superior, a aplicação de solução diversa permitiria que o partido, podendo selecionar os candidatos mais exitosos dentro de um maior grupo e chegando a um maior quociente partidário, sempre conservasse algum grau de benefício pelo lançamento de candidaturas femininas simuladas, em contrariedade ao objetivo prático do art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

Contudo, na espécie, mesmo que excluída a suposta candidatura fraudulenta, ainda assim seria mantida a proporção de 30% de candidaturas femininas pelo partido na sua chapa proporcional.

Com efeito, pela análise do Processo n. 0600194-54.2020.6.21.0131, correspondente ao Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do PTB de Nova Hartz, verifica-se que o partido lançou um total de 14 candidatos a vereador nas eleições municipais de 2020, dos quais cinco eram mulheres, quais sejam, Elizete Junges, Silvana Simões da Silva, Marlene da Silva, Iraci Nunes da Silva e Elenir Roseane Brites Marques, sendo os nove restantes homens.

Dessa forma, caso excluída a alegada candidatura fraudulenta de Elizete Junges, subsistiria um total de 13 candidatos, dos quais 4 mulheres, ou seja, um total de 30,76%. Logo, mesmo ante a suposta fraude no lançamento de candidatura feminina, restaria respeitada a proporção mínima de 30% exigida pelo art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97.

Equivale dizer, eventual inclusão fraudulenta de apenas uma candidata não importaria em lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma que estabelece a ação afirmativa em tela.

Dessarte, ainda que existisse fraude na alegada candidatura, não haveria violação à norma de modo a contaminar o pedido de registro de candidatura da agremiação, o DRAP do PTB.

Nessa linha de intelecção, com razão a douta Procuradoria Eleitoral ao sustentar a ausência de utilidade para a presente ação, pois, pela própria narrativa contida na petição inicial, resta afastado o pedido de cassação do diploma do vereador eleito pelo partido.

Assim, o processo deve ser extinto sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil, diante da manifesta ausência de interesse de agir.

ANTE O EXPOSTO, voto no sentido de reconhecer a ausência de interesse de agir, de modo a julgar extinta a ação, sem resolução do mérito, fulcro no art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil.