REl - 0600203-26.2020.6.21.0063 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/08/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a contabilidade de campanha de FELIPE ALVARENGA DITADI foi desaprovada, sendo-lhe imposto o recolhimento de R$ 3.307,00 ao erário, com fundamento no recebimento de recursos de origem não identificada (art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19), em razão das seguintes irregularidades: (1) aplicação de recursos próprios em campanha, na monta de R$ 1.159,50, sem a correspondente declaração de patrimônio anterior no registro de candidatura apresentada e (2) recebimento de três doações sucessivas, em espécie, no mesmo dia, oriundas da mesma pessoa física, no somatório R$ 2.147,50.

Passo à análise das irregularidades e das razões recursais.

 

1. Da aplicação de recursos próprios em campanha acima do patrimônio declarado no registro de candidatura.

 

Na hipótese, o magistrado a quo, reconhecendo que o candidato realizou aporte de recursos próprios em favor de sua campanha eleitoral, no montante de R$ 1.159,50, em patamar superior ao declarado por ocasião do registro de candidatura, entendeu caracterizado recebimento de valores de origem não identificada, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional daquela quantia, em sentença assim fundamentada:

Assim, compulsando os autos verifico que o(a) prestador(a) de contas cometeu irregularidade ao depositar o valor de R$ 1.159,50 (um mil, cento e cinquenta e nove reais e cinquenta centavos) na sua conta de doações para campanha, não tendo, todavia, declarado nenhum bem ou patrimônio no registro da candidatura, conforme relatado no parecer da Unidade Técnica. Logo, os recursos próprios aplicados em campanha são valores investidos pelo(a) candidato(a), cuja procedência é desconhecida.

 

Irresignado, o recorrente sustenta que possuía condições econômicas para destinar a sua campanha o valor em questão porquanto é servidor público do Estado do Rio Grande do Sul, juntando com a peça recursal os contracheques referentes aos meses de outubro e novembro de 2020 (ID 30216133 e 30216183), em que constam a remuneração líquida, respectivamente, de R$ 973,86 e R$ 1.004,93, bem como o comprovante de rendimentos do ano 2019, para fins de Imposto de Renda (ID 30216233), que registra o pagamento, pelo Governo Estadual, do montante tributável de R$ 17.858,46, naquele ano.

Assim, em que pese a ausência de declaração de bens no requerimento de registro de candidatura, o prestador comprovou, ainda que intempestivamente, sua capacidade financeira para realização do autofinanciamento no valor de R$ 1.159,50, uma vez que, na linha adotada pela Procuradoria Regional Eleitoral, “possui renda como servidor público do Estado do Rio Grande do Sul, somente não trazendo a declaração de rendimentos do ano-calendário 2020, pois ainda não havia iniciado o prazo para elaboração da mesma”.

Dessa forma, resta atendida a exigência contida no art. 61, parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.607/19, de demonstração idônea da licitude da procedência dos recursos, o que obste a sua caracterização como recursos de origem não identificada.

Nesse sentido, é importante referir que a situação patrimonial do candidato, declarada no momento do registro da candidatura, não se confunde com a sua capacidade financeira, a qual tende a acompanhar o dinamismo próprio do exercício de atividades econômicas, relacionando-se, portanto, mais diretamente, ao percebimento de renda, e não à titularidade de bens e direitos, consoante entendimento adotado pela Corte Superior Eleitoral:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO DE RECURSOS FINANCEIROS PRÓPRIOS. INCIDÊNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. VALOR MÓDICO DA INCONSISTÊNCIA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso especial eleitoral, mantendo aprovadas com ressalvas as contas de campanha referentes às Eleições 2016.

2. Hipótese em que o TRE/CE aprovou com ressalvas as contas de campanha do recorrido, candidato ao cargo de vereador nas Eleições 2016.

3. O acórdão regional alinha-se à jurisprudência desta Corte no sentido de que o patrimônio do candidato, declarado no momento do registro da candidatura, não se confunde com a sua situação financeira ou capacidade econômica, que é dinâmica e se relaciona aos rendimentos auferidos. Precedentes.

4. No caso, o TRE/CE assentou que, a despeito da declaração de ausência de bens por ocasião do registro de candidatura, é razoável concluir que a atividade de agricultora declarada pelo candidato justifique a aplicação em campanha de recursos próprios na ordem de R$ 1.153,72.

5. Desse modo, o acórdão consignou não se tratar de receita de origem não identificada ou de fonte vedada.

6. Além disso, o montante de recursos próprios utilizados na campanha é muito inferior ao teto de gastos estabelecido pelo TSE para o cargo pretendido (R$ 10.803,91).

7. A jurisprudência desta Corte inclina-se no sentido de que irregularidades em valores módicos, sem evidência de má-fé do prestador e que não prejudiquem a correta análise das contas pela Justiça Eleitoral, ensejam a sua aprovação com ressalvas. Precedentes.

8. A modificação da conclusão do TRE/CE quanto à ausência de gravidade da falha apontada exigiria o revolvimento do acervo fático-probatório constante dos autos, vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

9. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 73230, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 27, Data: 07.2.2020, pp. 31/32.)

 

Assim, a demonstração do exercício de atividade regular, com remuneração compatível com o crédito efetuado à conta de campanha, afasta a presunção de recebimento de recursos sem identificação de origem, na linha de precedente deste Regional:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS SEM A CORRESPONDENTE DECLARAÇÃO DE BENS NO REGISTRO DE CANDIDATURA. COMPROVADA A CAPACIDADE ECONÔMICA. DEPÓSITO EM ESPÉCIE DIRETAMENTE NA CONTA DE CAMPANHA. VALOR ACIMA DO LIMITE REGULAMENTAR. NECESSIDADE DE TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. DEMONSTRADA A ORIGEM DA DOAÇÃO. INFORMAÇÕES PRESTADAS. PROVIMENTO PARCIAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. Apresentação de novos documentos com o recurso. Possibilidade. Providência que contribui para o esclarecimento da movimentação financeira sem prejudicar o procedimento. Utilização de recursos próprios sem declaração de bens no registro de candidatura. Suspeita de ausência de capacidade. Irregularidade suprida pela apresentação da declaração de imposto de renda. Doação acima de R$1.064,10 mediante depósito em espécie, sem transferência eletrônica. Documentos comprovando saque de valor idêntico à doação um minuto antes do depósito. Prova que afasta a irregularidade. A divergência na identificação de doador, limitada à falta de preenchimento de seu nome completo, constitui mera inconsistência formal, incapaz de prejudicar a regularidade das contas. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 17411 PORTO ALEGRE - RS, Relator: MIGUEL ANTÔNIO SILVEIRA RAMOS, Data de Julgamento: 29/06/2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 116, Data 03/07/2018, Página 6.) (Grifei.)

 

Registro, outrossim, que o limite de gastos para o cargo de vereador no Município de Bom Jesus, nas eleições de 2020, consoante disponibilizado pelo Tribunal Superior Eleitoral no sistema Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, foi de R$ 12.307,75. Dessarte, o montante financeiro próprio utilizado pelo candidato não excede o teto de 10% deste valor, estabelecido no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, correspondente a R$ 1.230,78.

Por tais razões, na hipótese fática, descabe tomar-se como recursos de origem não identificada as verbas próprias vertidas à campanha, em especial, quando suficiente comprovada a capacidade econômica do prestador, devendo ser afastada a determinação de recolhimento das correspondentes quantias (R$ 1.159,50) ao Tesouro Nacional.

 

2. Do recebimento de três doações sucessivas, em espécie, no mesmo dia, oriundas da mesma pessoa física, acima do valor de R$ 1.064,10.

 

No tocante à segunda irregularidade, a sentença reconheceu o recebimento de doações financeiras acima do patamar legal de R$ 1.064,10, realizadas de forma fracionada, em três operações sucessivas, na mesma data, por meios distintos de transferência eletrônica ou cheque cruzado nominal, consoante tabela produzida pela unidade técnica na origem:


 

Irresignado, o recorrente sustenta, em síntese, que o apontamento em tela “é excesso de formalidade” e que “os documentos que revelam a regularidade das contas foram juntadas ao processo dos presentes autos de prestação de contas”.

O tema em questão encontra-se disciplinado no art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

(…).

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

(…).

 

Dessa maneira, segundo dispõem os §§ 1º e 4º em testilha, as doações em montante igual ou superior a R$ 1.064,10 devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal, devendo os valores ser recolhidos ao Tesouro Nacional, caso haja utilização dos recursos recebidos em desacordo com o estabelecido no dispositivo, ainda que identificado o doador.

Outrossim, os valores dos depósitos sucessivos realizados por um mesmo doador, em um mesmo dia, devem ser somados para fins de aferição do limite legal de R$ 1.064,10, em que facultado o crédito em espécie, tal qual prescrito no art. 21, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Por conseguinte, deve-se compreender os três depósitos efetuados no dia 12.11.2020 como uma única doação, em espécie, de R$ 2.147,50, em evidente afronta às normas de regência.

O escopo da regra é possibilitar o cruzamento de informações com o Sistema Financeiro Nacional, de modo a permitir que a fonte declarada seja confirmada por meio dos mecanismos técnicos de controle da Justiça Eleitoral.

Embora o depósito tenha sido realizado com a anotação do CPF do suposto doador, é firme o posicionamento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato bancário:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA ELEITORAL. VEREADOR. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. INCONFORMISMO. RESSARCIMENTO. VALORES DE DOAÇÃO. TESOURO NACIONAL.

1. A atual jurisprudência deste Tribunal é no sentido de que as doações acima de R$ 1.064,10 devem ser feitas mediante transferência eletrônica, nos exatos termos do art. 18, § 1º, da Res.-TSE 23.463, e o descumprimento da norma regulamentar não é reputado como falha meramente formal. Nesse sentido, já se assentou que "a aceitação de doações eleitorais em forma diversa da prevista compromete a transparência das contas de campanha, dificultando o rastreamento da origem dos recursos" (AgR-REspe 313-76, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 3.12.2018).

2.  O Tribunal a quo assentou que "foram realizados dois depósitos em espécie realizados diretamente na conta de campanha, acima do limite legal, em desobediência ao art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15" (fl. 143), acrescentando que tal irregularidade representou 74,95% do somatório dos recursos financeiros arrecadados e que seria inviável atender ao pleito de devolução da quantia aos pretensos doadores, em detrimento do seu recolhimento ao Tesouro Nacional, diante da falibilidade da identificação da origem desses recursos.

3. Em face da jurisprudência consolidada no tema, se não se admite a realização de depósito na "boca do caixa" para fins de prova da origem de doação, também a mera emissão do recibo eleitoral pelo candidato não possibilita, por si só, comprovar tal fato, o que ocorre justamente pela providência alusiva à transferência eletrônica entre contas bancárias, modalidade preconizada na resolução destinada a possibilitar a confirmação das informações prestadas.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 25476, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data: 02.8.2019.) (Grifei.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.

2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.

3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.

4. Concluir em sentido diverso especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.

6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.

7. Agravo regimental desprovido.

(TSE – AgR-REspe n. 251-04, Relator Min. Jorge Mussi, julgado em 19.3.2019, publicado no DJE, tomo 66, de 05.4.2019, pp. 68-69.) (Grifei.)

 

Consigno, a tal respeito, que a Corte Superior entende que a obrigação de as doações acima de R$ 1.064,09 serem realizadas mediante transferência bancária ou cheque nominal cruzado não se constitui em mera exigência formal, sendo que o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas, consoante precedente a seguir colacionado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO. DEPÓSITO BANCÁRIO. EM ESPÉCIE. VALOR SUPERIOR A R$ 1.064,10. TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. EXIGÊNCIA. ART. 18, § 1º DA RES. TSE Nº 23.463/2015. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO.

1. In casu, trata-se de prestação de contas relativa às eleições de 2016 em que o candidato ao cargo de vereador recebeu doação de recursos para sua campanha, por meio de depósito bancário, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

2. Nas razões do regimental, o Parquet argumenta que não foi observado o art. 18, § 1º, da Res.-TSE nº 23.463/2015, segundo o qual "as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação". 3. A Corte Regional, soberana na análise dos fatos e provas, atestou a identificação da doadora do valor apontado como irregular por meio do número do CPF impresso no extrato eletrônico da conta de campanha.

4. Consoante decidido nesta sessão, no julgamento do AgR-REspe nº 265-35/RO, a maioria deste Tribunal assentou que a exigência de que as doações acima de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) sejam feitas mediante transferência eletrônica não é meramente formal e o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas.

5. Considerando a maioria formada no presente julgamento nos mesmos termos do paradigma supracitado, reajusto o meu voto no caso vertente a fim de dar provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral para condenar o recorrido a recolher aos cofres públicos o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

6. A desaprovação das contas em virtude de eventual gravidade da irregularidade mostra-se inaplicável na espécie, em respeito ao princípio da congruência, uma vez que referida pretensão não foi objeto do recurso especial.

7. Agravo regimental acolhido para dar provimento ao recurso especial, com determinação de recolhimento ao erário do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

(Recurso Especial Eleitoral n. 52902, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação:  DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 250, Data 19.12.2018, pp. 92/93.) (Grifei.)

 

No judicioso voto do ilustre Ministro Luís Roberto Barroso proferido no julgado em questão, restou bem explicitada a razão da exigência de o aporte financeiro em campanha provir diretamente de outra conta bancária:

(....).

7. Entendo que a imposição de que as doações acima de R$ 1.064,10 sejam realizadas mediante transferência bancária não é mera exigência formal, mas busca assegurar a identificação da origem dos recursos que ingressaram na campanha eleitoral. A aceitação de depósitos em espécie, em valor acima do permitido, compromete a transparência das contas de campanha, dificultando o rastreamento da origem dos recursos. Não se pode esquecer que grande parte das transações irregulares realizadas no país envolve dinheiro em espécie, justamente pela dificuldade de rastreamento dos valores. O descumprimento da exigência, portanto, é causa de reprovação das contas de campanha, em especial se o montante envolvido é elevado, como no presente caso, em que supera a metade dos recursos arrecadados.

8. A realização de depósitos identificados por uma determinada pessoa nada prova a respeito de sua origem, que, inclusive, pode advir de fontes vedadas, na medida em que os recursos depositados em espécie não tiveram trânsito pelo sistema bancário. E exatamente esta a razão pela qual se exige que a doação seja realizada por meio de transferência bancária, mecanismo que permite o rastreamento de sua origem, minimizando as possibilidades de operações irregulares. Trata-se de exigência que amplia a segurança do modelo de captação de recursos de campanha autorizado pela legislação.

(Grifei).

 

Deveras, o TSE já assentou que “a ratio essendi da norma é identificar a origem de recurso arrecadado, com o rastreamento a partir da transferência eletrônica efetivada entre estabelecimentos bancários” (Recurso Especial Eleitoral n. 26535, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Relatora designada Min. Rosa Weber, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data 20.11.2018, p. 32).

Não se olvida que este Regional tem arrefecido o rigor dessas disposições normativas quando o prestador, por outros meios, atinge o fim colimado pela norma, qual seja, a demonstração segura da origem dos recursos, mormente por meio do oferecimento de comprovantes de saque em dinheiro da conta-corrente do doador e imediato depósito em espécie na conta de campanha, demonstrando que a operação de transferência bancária restou meramente decomposta em um saque seguido incontinenti de um depósito na mesma data.

Entrementes, na hipótese vertente inexiste comprovação adicional mínima sobre a origem dos recursos, impossibilitando que a falha seja relevada.

Dessarte, a ausência de demonstração segura da procedência dos recursos os caracteriza como de origem não identificada, cujo valor correspondente deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 21, § 4º, e art. 32, caput e § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Tendo em vista que a falha está consolidada em R$ 2.147,50, que representa 64,93% do total das receitas declaradas (R$ 3.307,00), mostra-se inviável a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade como forma de atenuar sua gravidade perante o conjunto das contas, na esteira da jurisprudência do TSE e desta Corte.

Dessa forma, na linha do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, impõe-se o provimento parcial do recurso, apenas para afastar a irregularidade concernente à aplicação de recursos próprios em campanha e, por consequência, reduzir a quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional para R$ 2.147,50, mantida a desaprovação das contas.

 

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso interposto por FELIPE ALVARENGA DITADI, para, mantendo a desaprovação das suas contas relativas ao pleito de 2020, reduzir para R$ 2.147,50 o montante a ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.