REl - 0600485-92.2020.6.21.0086 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/08/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de JOSE HEINECK ao cargo de vereador nas eleições de 2020, no Município de Bom Progresso, consoante excerto a seguir reproduzido:

Irregularidades

1ª Existem despesas realizadas com combustíveis que o candidato esclareceu que se referem a abastecimentos realizados por ele e pagos com o recurso próprio do candidato, tramitando na conta-corrente e pago com cheque de campanha: Tratam-se de despesas pessoais, nos termos do art. 35 § 6º da Res. TSE nº 23.607/2019:

"§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

(...)

Deste modo, tenho que as contas não estão regulares e, tampouco, atendem a todas as exigências da legislação eleitoral.

Nos termos do art. 74, III, da Resolução 23.607/2019, quando constatadas falhas que comprometam a regularidade das contas, cabe a desaprovação.

III - DISPOSITIVO

Isso posto, DESAPROVO as contas de JOSÉ HEINECK, candidato a vereador do Município de BOM PROGRESSO, sob o nº 40000, pelo Partido Socialista Brasileiro - PSB, referente às eleições municipais de 2020, nos termos do art. 74, III, da Resolução TSE n.º 23.607/2019, ante os fundamentos declinados.

Inicialmente, observo que a unidade técnica, na instância de origem, identificou a existência de três despesas com combustíveis realizadas pelo candidato, no valor total de R$ 294,50, nos dias 13.11.2020 e 14.11.2020, a seguir discriminadas (ID 30991633):

A Resolução TSE n. 23.607/19, disciplinando a matéria concernente aos gastos com combustíveis e manutenção de veículo utilizado na campanha, assim dispõe em seu art. 35, §§ 6º e 11, litteris:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(...)

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

(…)

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

 

Como se depreende das disposições, as despesas do candidato com combustível, reputadas como de natureza pessoal, não se consideram gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha, ressalvadas as hipóteses previstas no art. 35, § 11, inc. II, do aludido diploma normativo, que contempla os veículos utilizados a serviço da campanha.

In casu, estão juntadas aos autos as notas fiscais referentes aos gastos de R$ 187,60 (ID 30990383), R$ 46,90 (ID 30990283) e R$ 60,00 (ID 30992383), emitidas contra o CNPJ da campanha.

Verifico, outrossim, por meio de pesquisa no sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais mantido pelo Tribunal Superior Eleitoral (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/86444/210000818500/bens), que o candidato declarou em sua prestação de contas a propriedade de três veículos automotores, a saber: FORD RURAL 2.3 ANO 1971, GM PRISMA 1.4 ANO/MODELO 2011/2012 e MOTOCICLETA HONDA BROS 160 ANO 2018.

Anoto que foram carreados ao feito os Certificados de Registro e Licenciamento de Veículo atinentes ao automóvel GM Prisma (ID 30990783) e à motocicleta HONDA NXR 160 BROS (ID 30990983), que demonstram estarem averbados em nome de JOSE HEINECK, bem como recibos eleitorais de doação estimável em dinheiro, dando conta da cessão temporária de mencionados veículos à campanha, sendo atribuída a cada uma das duas doações a quantia de R$ 400,00.

Igualmente, foi acostado aos autos o Demonstrativo de Despesas com Combustíveis Semanal (ID 30990033), dando conta de que, no período de 08.11.2020 a 14.11.2020, houve a contratação de três dispêndios no fornecedor Posto Bela Vista, consubstanciados na aquisição de gasolina comum, nos valores individuais de R$ 187,60, R$ 60,00 e R$ 46,90, resultando na soma de R$ 294,50.

Demais disso, examinando o Extrato da Prestação de Contas Final (ID 30990633), constato o registro de receita estimável em dinheiro, no importe de R$ 800,00, procedente de recursos próprios do candidato, bem como de despesa com combustíveis e lubrificantes, na cifra de R$ 294,50, paga por meio da conta bancária destinada à movimentação de “outros recursos”.

Entretanto, apesar do farto conjunto de documentos apresentados pelo candidato, torna-se implausível a alegação de que os recursos foram despendidos em abastecimento de dois veículos utilizados em atividades de logística da campanha, sem que tenham sido registrados arrecadações ou gastos, sejam financeiras ou estimáveis, com qualquer tipo de material de propaganda ou com serviços de pessoal, tal como na hipótese concreta.

Assim, resta claro que os abastecimentos em questão serviram ao uso pessoal do candidato, razão pela qual não poderiam ser pagos com recursos de campanha, nos termos do art. 35, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Malgrado o descumprimento da norma, observa-se que os gastos são módicos e envolveram recursos do próprio candidato. Assim, a falha, por si só, não tem o condão de prejudicar a transparência ou confiabilidade das contas, consoante bem pontuou a Procuradoria Regional Eleitoral:

Ocorre que haveria violação ao sentido da norma caso tivessem sido utilizados recursos de terceiro para pagamento da referida despesa. Tendo sido utilizado apenas recursos próprios, houve evidente equívoco por parte do candidato, pois bastaria que não tivesse feito ingressar os recursos na conta da campanha e tivesse pago a despesa sem contabilizá-la, que não teria praticado qualquer ilícito.

Destarte, entendemos que a irregularidade permanece, porém deve ensejar apenas a aprovação das contas com ressalvas.

 

Ademais, os apontamentos consolidam-se em R$ 294,50, cifra que, conquanto represente 19,6% das receitas de campanha (R$ 1.502,50), mostra-se em termos absolutos reduzida e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módica, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), possibilitando a aprovação das contas com ressalvas.

Quanto ao tema, destaco excertos da decisão monocrática proferida pelo Ministro Luiz Edson Fachin, nos autos do RESPE n. 37447, em 13.6.2019:

Entendo que o limite percentual de 10% (dez por cento) adotado por este Tribunal Superior revela-se adequado e suficiente para limitar as hipóteses de incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

 

É de se harmonizar, contudo, a possibilidade de sobreposição dos critérios do valor diminuto e da aplicação dos princípios já citados. Em casos tais, deve prevalecer, até o limite aqui indicado, o critério de valor absoluto, aplicando-se o critério principiológico de forma subsidiária.

 

Assim, se o valor da irregularidade está dentro do máximo valor entendido como diminuto, é desnecessário aferir se é inferior a 10% (dez por cento) do total da arrecadação ou despesa, devendo se aplicar o critério do valor diminuto.

 

Apenas se superado o valor máximo absoluto considerado irrisório, aplicar-se-á o critério da proporcionalidade e da razoabilidade, devendo ser considerado o valor total da irregularidade analisada, ou seja, não deve ser desconsiderada a quantia de 1.000 UFIRs alcançada pelo critério do valor diminuto.

 

Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação do critério do valor nominal diminuto, que prepondera sobre eventual aferição do alcance percentual das falhas, de modo a afastar o juízo de desaprovação das contas quando o somatório das irregularidades se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10 (TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020, e REl n. 0600399-70.2020.6.21.0103, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann julgado em 20.05.2021).

Com tais considerações, em consonância com o parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, resta impositivo dar-se parcial provimento ao recurso, a fim de aprovar as contas com ressalvas, com esteio no art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de JOSE HEINECK relativas ao pleito de 2020.