REl - 0600273-63.2020.6.21.0121 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/08/2021 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas devido à aplicação de recursos próprios no valor de R$ 1.971,36, excedendo em R$ 740,59 o limite de gastos para o cargo em disputa, no patamar de R$ 1.230,78, previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e devido à inobservância da forma de pagamento para quitar gasto custeado com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), no valor total de R$ 1.000,00, uma vez que o candidato efetuou saque eletrônico e depósito em espécie para o fornecedor.

A soma das irregularidades representa 58,58% do total da movimentação financeira declarada, no montante de R$ 2.971,36.

Em relação ao autofinanciamento, o candidato poderia utilizar até R$ 1.230,78, e aplicou na sua campanha recursos próprios no valor de R$ 1.971,36. Desse modo, correta a sentença cujo trecho cumpre transcrever:

[...]
Contudo, constatou-se a extrapolação do limite de utilização de recursos próprios em campanha. Consoante dispõe o art. 27, § 1º, da referida resolução, o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer. No caso em tela, o candidato ultrapassou o limite em R$ 740,59, o que representa 24,9% do total de receitas declaradas.

Como consequência para o descumprimento de tal limite, o art. 27, § 4º, na sequência, determina que a doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico. As alegações do candidato de que houve um entendimento equivocado da lei e de que poderia ter utilizado o art. 27 da Lei nº 9.504/1997 não prosperam. Primeiro, porque o limite se aplicava a todos os candidatos e foi estabelecido previamente à campanha, estando claramente definido na legislação, cujo conhecimento é dever do candidato. Segundo, porque o dispositivo invocado se refere a gastos de eleitores em apoio ao candidato de sua preferência, não doações do próprio candidato.
[...]

Nas razões recursais, o recorrente reconhece ter havido equívoco cometido pelo contador, mas seguir orientação equivocada por parte de sua contadoria não o exime de prestar contas conforme a norma de regência para as eleições municipais de 2020, nem de corrigir eventuais falhas inclusive com uma prestação de contas retificadora.

Ademais, não se trata de verificação de má-fé ou de conduta dolosa, nem de apuração de prática de abuso do poder econômico, mas violação à expressa disposição do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).
§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).
§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.
§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).
§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990  (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).
(...)

Desse modo, merece ser mantida a sentença nesse ponto, pois as razões recursais não trazem elementos suficientes para a reforma do entendimento do juízo a quo.

Quanto à forma na utilização de recursos do FEFC, no extrato bancário da conta em que transitaram esses valores (ID 27978733) consta o saque da quantia de R$ 1.000,00, a qual foi posteriormente depositada em espécie, na mesma data do saque, dia 13.11.2020, na conta bancária aberta em nome da pessoa física de Jonas Bublitz (ID 27977433), representante da empresa Escritório Bublitz Ltda. (ID 27976883), para pagamento de despesas com honorários de serviços de contabilidade, conforme contrato de prestação de serviços contábeis do ID 27978383.

Tal procedimento caracteriza violação ao disposto no art. 38, caput e incisos, da Resolução TSE n. 23.607/19, porque o pagamento somente poderia ocorrer por cheque nominal e cruzado, como consta das razões de decidir da sentença, transcritas a seguir:

Além disso, o candidato efetuou gastos por meio de saque eletrônico nas contas de campanha e depósito em espécie para o fornecedor ou prestador de serviços. Tal atitude está em desacordo com o art. 38, da Resolução TSE nº 23.607/2019, o qual reproduzo:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I – cheque nominal cruzado;

II – transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III – débito em conta; ou

IV – cartão de débito da conta bancária.

Em relação ao FEFC, sua utilização indevida sujeita o infrator à devolução do valor ao Tesouro Nacional, consoante art. 79, § 1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

No caso em tela, o candidato gastou R$ 1.000,00 (mil reais) em recursos do FEFC de maneira indevida, o que impõe a devolução ao Tesouro Nacional.

A referida irregularidade foi apontada pelo laudo técnico nos seguintes termos:

2. EXAME DE REGULARIDADE DE DESPESAS REALIZADAS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (ART. 53, II, C, DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019)

2.1. O candidato efetuou gastos por meio de saque eletrônico nas contas de campanha e depósito em espécie para o prestador de serviços, em desconformidade com o que determina o art. 38 da Resolução TSE nº 23.607/2019:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I – cheque nominal cruzado;

II – transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III – débito em conta; ou

IV – cartão de débito da conta bancária.

Em relação ao Fundo Especial de Financiamento de Campanha, sua utilização indevida está sujeita à devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da citada resolução. No caso em tela, o valor referente ao FEFC objeto de utilização indevida totaliza R$ 1.000,00.

O candidato alegou que “com apenas um (01) funcionário na agência, e sem cartão de débito e nem talão de cheque, não existiu outra forma possível para efetuar os pagamentos de fornecedores a não ser de efetuar a operação de saque eletrônico no CAIXA de Atendimento Pessoa Física e o seu imediato depósito ou transferência ao fornecedor”. Porém, a alegação não corrige a falha, pois o gasto do recurso público foi feito em descompasso com a Resolução TSE nº 23.607/2019.

Em suas razões, a parte recorrente reitera os argumentos tecidos em juízo de que não foi possível fazer depósito com cheque cruzado porque, em virtude da pandemia de COVID-19, houve dificuldade na abertura das contas bancárias e a agência possuía um único funcionário, circunstância que acarretou a necessidade de efetuação de um saque eletrônico e em seguida um depósito bancário ao fornecedor.

Além disso, foi apresentado um ofício do gerente adjunto da agência bancária informando que as movimentações foram realizadas diretamente no caixa da agência, devido ao atraso no recebimento dos talões de cheques e cartões das contas (ID 27979083). Embora o recorrente pretenda se eximir da responsabilidade pela observância das normas de financiamento da sua candidatura, descabe imputar as falhas à instituição financeira ou a eventuais transtornos causados pela pandemia do novo coronavírus.

O § 10 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 é expresso ao consignar que “o pagamento dos gastos eleitorais contraídos pelos candidatos será de sua responsabilidade”, assim como o § 2º do art. 45 da resolução estabelece que “o candidato é solidariamente responsável com a pessoa indicada no § 1º” (administrador financeiro) e com o profissional de contabilidade “pela veracidade das informações financeiras e contábeis de sua campanha”.

Destarte, a alegação de que o saque e depósito em espécie de recursos do FEFC foi realizado por falha na prestação do serviço pela instituição bancária, a qual atrasou a emissão de cheques, não é suficiente para afastar a irregularidade.

Sequer prospera o argumento de que os recursos do FEFC foram corretamente utilizados, pois o pagamento também se mostra irregular uma vez que a pessoa física que recebeu o depósito em dinheiro, Sr. Jonas Bublitz, não figura como fornecedora na escrituração contábil, pois o contrato de prestação de serviços contábeis foi firmado entre o candidato e uma pessoa jurídica, a empresa Escritório Bublitz Ltda.

Portanto, a sentença recorrida merece ser confirmada também nesse ponto,  estando correta a determinação de recolhimento dos valores ao erário.

Por fim, conforme concluiu a Procuradoria Regional Eleitoral, sequer é razoável e proporcional a pretensão de aprovação das contas com ou sem ressalvas, pois o valor total das irregularidades (R$ 740,59 + R$ 1.000,00) importa em R$ 1.740,59 e representa 58,58% das receitas recebidas, no montante de R$ 2.971,36 (ID 30362483).

Desse modo, diferentemente do alegado pelo recorrente, as irregularidades ultrapassam o valor de parâmetro que é de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR), o qual a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Assim torna-se inviável a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar a prestação de contas ainda que com ressalvas.

Ressalto que o pagamento da penalidade de multa de até 100% da quantia em excesso encontra previsão no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e o patamar estabelecido na sentença de primeiro grau em seu percentual máximo, correspondente ao valor de R$ 740,59, afigura-se adequado à falha verificada.

Com essas considerações, concluo que o recurso não comporta provimento, devendo ser mantida a desaprovação das contas e o recolhimento dos valores apontados como irregulares.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a desaprovação das contas, a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 1.000,00, e a fixação de multa no valor de R$ 740,59, nos termos da fundamentação.