REl - 0600405-91.2020.6.21.0066 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/08/2021 às 14:00

 

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a sentença desaprovou as contas de campanha devido à utilização indevida de recursos do FEFC, no valor de R$ 1.680,00, para despesas com combustíveis, tecendo os seguintes fundamentos:

No Parecer Técnico foram apontadas as seguintes irregularidades:

a) Despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia;

b) Pagamentos com combustíveis e lubrificantes que foram efetuados com recursos do FEFC, contrariando o artigo 35, § 5º, “a” da Resolução 23.607 de 2019.

Com a manifestação do candidato e a juntada dos documentos complementares, a análise técnica do Cartório Eleitoral manifestou-se pela desaprovação das contas, por considerar que o candidato não logrou êxito em sanar a falha relativa ao uso irregular de recursos públicos, (pagamento de combustíveis), entendendo, portanto, não ser possível reverter o feito, por clara violação ao disposto no art. 35, § 6º, “a” da Resolução 23.607/2019, sugerindo o recolhimento da quantia de R$ 1.680,00 (um mil seiscentos e oitenta reais) ao Tesouro Nacional, na forma do art. 17, § 9º, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

O Ministério Público Eleitoral considerou que o gasto com combustível não está abrangido pela vedação do artigo 35, § 6º, "a", da Resolução nº 23.607/2019, por não haver indicativos de que seja combustível do veículo automotor usado pelo candidato na campanha, até por serem três veículos, de terceiros, decorrentes de cessão temporária e com o preenchimento do demonstrativo semanal de combustíveis (ID 6835805).

Destacou, ainda, ser importante observar que o próprio manual de prestação de contas da Justiça Eleitoral, no item 5.6 entende que o gasto com combustível pode ser computado como gastos eleitorais nessa hipótese, razão pela qual opinou pela aprovação das contas prestadas.

Não obstante a manifestação do Ministério Público Eleitoral, a irregularidade apontada é grave, fere a legislação eleitoral, e, como bem destacado no Parecer conclusivo, o valor absoluto da despesa quitada com recursos públicos (R$1.680,00) representa 84% do total de recurso movimentado pelo prestador durante a campanha, fundamento pelo qual devem ser desaprovadas as contas, por falha que comprometem a sua regularidade.

 

Como se percebe, o Juízo a quo embasou seu entendimento no art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19, que veda o uso de recursos públicos de campanha para a quitação de despesas com combustíveis de veículo de uso pessoal do candidato, conforme se depreende de sua redação:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…).

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

 

Por sua vez, em suas razões, o prestador de contas assevera que os automóveis não foram utilizados em uso pessoal, mas para fins de serviços de campanha, na forma autorizada pelo art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…).

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

I - veículos em eventos de carreata, até o limite de 10 (dez) litros por veículo, desde que feita, na prestação de contas, a indicação da quantidade de carros e de combustíveis utilizados por evento;

II - veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e o valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim; e

III - geradores de energia, decorrentes da locação ou cessão temporária devidamente comprovada na prestação de contas, com a apresentação de relatório final do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos em na campanha para este fim.

 

Para corroborar suas alegações, o candidato aponta três contratos de cessão de uso gratuito de veículo, todos pertencentes a terceiros e firmados em 30.10.2020, nos quais se verifica como objeto a cessão não onerosa dos bens “para divulgação de campanha eleitoral do CANDIDATO por meio de adesivos, placas, transporte de material e de apoiadores”, com valor estimado de R$ 400,00, em cada um dos ajustes formalizados (ID 27397383, 27397433 e 27397483).

Além disso, constam nos autos as notas fiscais compreendendo o volume e valor dos combustíveis adquiridos e referência às placas dos automóveis abastecidos (ID 27396183, 27396233, 27396283 e 27396333), bem como o “Demonstrativo de Despesas com Combustíveis Semanal” (ID 27394833).

Adicionalmente, com as razões, o recorrente acostou os respectivos Certificados de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV), relativos a cada um dos bens cedidos, comprovando a propriedade dos terceiros cessionários (ID 27398333).

Entretanto, os documentos e justificativas apresentados pelo candidato não guardam congruência com os demais elementos dispostos em sua prestação de contas.

Como se observa do “Relatório de Despesas Efetuadas” (ID 27395183), os gastos totais de campanha envolveram apenas dois fornecedores, quais sejam, Baltazar Luiz Zilio e Cia Ltda., com o qual foi despendido o montante de R$ 1.680,00 com combustíveis, e Comércio de Fogos Pavani, cuja nota fiscal discrimina a aquisição de “fumaça” (ID 27396083), no valor total de R$ 320,00.

Por outro lado, não houve a arrecadação de doações estimáveis em dinheiro (ID 27395033) e a totalidade das receitas financeiras manejadas pelo candidato consistiu em verba do FEFC, na quantia de R$ 2.000,00, transferida pela Direção Estadual do Republicanos (ID 27395133).

Diante deste cenário, torna-se inverossímil a alegação de que o prestador despendeu R$ 1.680,00 de recursos públicos em abastecimento de três veículos utilizados em atividades de logística da campanha, ou “para divulgação de campanha eleitoral do CANDIDATO por meio de adesivos, placas, transporte de material e de apoiadores”, sem que tenham sido registrados gastos ou arrecadações, sejam financeiras ou estimáveis, com qualquer tipo de material de propaganda ou com serviços de pessoal.

No aspecto, bem apontou o douto Procurador Regional Eleitoral:

O valor total de despesas com combustíveis (R$ 1.680,00) corresponde a 84% das receitas declaradas pelo candidato, não se afigurando razoável o elevado montante de recursos financeiros despendido apenas a esse título. De outra parte, embora o recorrente alegue que, em sua campanha, foram utilizados três veículos para “transporte de materiais e apoiadores”, não se verifica, no extrato da prestação de contas, indicação de nenhuma despesa com materiais de campanha. Ademais, em relação à contratação de pessoal de apoio à campanha, percebe-se que foi informado gasto de apenas R$ 320,00, mostrando-se desproporcional com o montante de despesas efetuadas para aquisição de combustíveis.

 

Cabe enfatizar, novamente, que o gasto de R$ 320,00 classificado nos registros contábeis como “atividades de militância e mobilização de rua” envolve, em realidade, efeito pirotécnico de “fumaça”, conforme revela a nota fiscal correspondente (ID 27396083), ou seja, nada se relacionando a eventuais pagamentos de motoristas ou pessoal para a realização de propaganda de rua.

Desse modo, as razões recursais são insuficientes para infirmar a conclusão da sentença no sentido de que o candidato se utilizou de recursos oriundos do FEFC, no valor de R$ 1.680,00, em despesas com combustíveis, cuja finalidade não restou suficientemente esclarecida, conforme acima exposto, devendo a quantia correspondente ser recolhida ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, como determinado na decisão do juízo a quo.

Outrossim, a irregularidade em tela representa 84% das receitas arrecadadas (R$ 2.000,00), inviabilizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para mitigar a repercussão das falhas sobre o conjunto da contabilidade, de sorte que se impõe a manutenção da sentença que julgou desaprovadas as contas.

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.680,00.