REl - 0600214-67.2020.6.21.0156 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/08/2021 às 14:00

VOTO

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

O juízo de origem desaprovou as contas do recorrente em virtude da utilização de recursos próprios, na campanha, em montante superior ao limite previsto no art. 27, § 1°, da Resolução TSE n. 23.607/19, condenando-o ao pagamento de multa equivalente a 100% da quantia doada em excesso.

Em suas razões, o candidato não negou o aporte para a campanha de R$ 2.570,00 (dois mil, quinhentos e setenta reais) com recursos próprios. Sustentou que os gastos com serviços contábeis não fazem parte da base de cálculo do limite de despesas de campanha, razão pela qual deveriam igualmente ser desconsiderados do montante utilizado para estabelecer a adequação ao teto de autofinanciamento de campanha.

Não assiste razão ao recorrente.

É certo que a lei permite a utilização de recursos próprios pelos candidatos em suas campanhas eleitorais, desde que atendidos os requisitos da forma e dos limites previstos em lei.

Assim dispõe o art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

Observe-se que o dispositivo supracitado, limita ao candidato o uso de recursos próprios até o limite de 10% calculado sobre o valor do teto de gastos do cargo ao qual o candidato concorreu.

Nesse sentido, trata-se de norma objetiva que regulamenta a arrecadação de campanha, aferido a partir de simples equação matemática em relação ao limite legal de gastos relacionados ao cargo em disputa.

Assim, o fundamento utilizado pelo recorrente, que busca uma redução de R$ 700,00 (setecentos reais) no total da irregularidade para estabelecer a adequação ao teto na doação de recursos próprios, não faz nenhum sentido e não há de prevalecer, porquanto faz confusão entre limite de gastos de campanha e limite de autofinanciamento.

Por elucidativo, transcrevo parte do parecer exarado pela Procuradoria Regional Eleitoral:

No mérito, não merece reforma a sentença, pois o(a) prestador(a) realizou doações para a própria candidatura em valor superior ao limite de 10% previsto para gastos na campanha que concorreu, descumprindo o art. 23, § 2-A, da Lei 9.504/97.

O fato não é negado pelo(a) recorrente, que tão somente alega ter arcado com despesas contábeis no montante de R$ 700,00, os quais, nos termos da Resolução de regência, não ficam sujeitos a limites de gastos, razão pela qual os recursos próprios utilizados para a satisfação de tais débitos também não poderiam se sujeitar ao limite imposto na sentença, visto que não se pode arcar com uma despesa sem que exista receita para tal. Menciona, ainda, que descontados os honorários contábeis, resta como excedente ao autofinanciamento apenas R$ 639,23, sendo o caso de aprovação das contas.

Não lhe assiste razão. Existem regras distintas a fim de disciplinar situações distintas. Uma delas trata do limite global de gastos, ao qual, de fato, não se encontram sujeitos “os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político”, nos termos do § 5º do art. 4º da Resolução TSE nº 23.607/2019. Tal norma se refere ao plano da despesa. Já a outra regra é aquela aplicada no caso, pertinente ao âmbito das receitas de campanha, e que estabelece, de maneira objetiva, que “o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer”.

Como referido, a regra prevista no art. 23, § 2-A, da Lei 9.504/97 é objetiva, somente é possível o autofinanciamento que importe em 10% do limite previsto para gastos nas campanhas dos diversos cargos. Esse limite, por sua vez, é estabelecido de acordo com a previsão contida no art. 18-C da Lei das Eleições. Definido o limite para o cargo em relação a determinado município, automaticamente está estabelecido o valor que o candidato pode aportar para sua campanha.

A regra que exclui dos limites de gastos as despesas com advogado e contador é uma exceção e, como tal, deve ser interpretada restritivamente. Assim, aplicável apenas para permitir que o candidato, no tocante ao total de suas despesas extrapole o limite legal no que diz com os referidos gastos.

Portanto, embora os gastos com contabilidade não estejam sujeitos ao teto de despesas eleitorais, tal situação não afasta sua natureza de ser um “gasto eleitoral”, e os valores advindos de recursos próprios e empregados nesses gastos, embora não se sujeitem ao teto estipulado para despesas de campanha, devem ser considerados na aferição do limite legal de autofinanciamento.

De toda a sorte, mesmo que fosse cabível a redução requerida, persistiria a irregularidade constatada.

In casu, o exame dos autos demonstra que o limite de gastos para o cargo de vereador no Município de Palmares do Sul estava fixado em R$ 12.307,75 (doze mil, trezentos e sete reais e setenta e cinco centavos). Nesse cenário, o candidato poderia ter utilizado, na sua campanha, recursos próprios no montante de até R$ 1.230,78 (mil duzentos e trinta reais e setenta e oito centavos).

Da análise do parecer conclusivo (ID 27814833), verifica-se que o candidato doou para sua campanha o valor de R$ 2.570,00 (dois mil, quinhentos e setenta reais), o que resulta na aplicação de R$ 1.339,23 (mil e trezentos e trinta e nove reais e vinte e três centavos) acima do limite fixado na legislação eleitoral.

Nesse contexto, julgo caracterizado o ilícito, uma vez que o limite legal, objetivamente previsto, foi ultrapassado.

Por conseguinte, a irregularidade apontada corresponde a R$ 1.339,23, o que representa 45,99% das receitas declaradas pelo candidato (R$ 2.911,93), motivo pelo qual não há que se falar em proporcionalidade ou razoabilidade, seja pelo valor absoluto ou pelo percentual da irregularidade, devendo ser mantida a sentença de desaprovação de contas.

No mesmo sentido cito precedentes das Cortes Regionais:

ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. CARGO. DEPUTADO FEDERAL. AUSÊNCIA. DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA. GASTOS. RECURSOS. FEFC. IRREGULARIDADE GRAVE. DESAPROVAÇÃO. 1. A ausência de documentação apta a comprovar a utilização de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha constitui falha grave, uma vez que se exige maior atenção quando se trata de recursos oriundos de verba pública, restando comprometido o efetivo controle das contas; 2. Inaplicabilidade dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade uma vez que o montante considerado irregular ultrapassa o teto de 10% estipulado pelo TSE. 3. Contas julgadas desaprovadas. grifei

(TRE-PA – PC: 060181035 BELÉM – PA, Relator: LUZIMARA COSTA MOURA, Data de Julgamento: 24/09/2019, Data de Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 185, Data 07/10/2019, Página 13)

 

ELEIÇÕES 2018. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATA. DESPESA IRREGULAR COM COMBUSTÍVEL. OMISSÃO DE DESPESAS. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. TRANSFERÊNCIA AO TESOURO NACIONAL. NÃO COMPROVAÇÃO DE BENEFÍCIO À CANDIDATURA FEMININA COM RECURSOS DO FEFC. DESAPROVAÇÃO.

(…)

Trata-se de irregularidade grave, sobretudo diante da relevância relativa do gasto eleitoral, equivalente a 15,75% do total das despesas contratadas, mostrando-se suficiente para acarretar a desaprovação das contas da requerente.

(TRE-DF – PC: 060220874 BRASÍLIA – DF, Relator: JOSÉ JACINTO COSTA CARVALHO, Data de Julgamento: 17/03/2021, Data de Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-DF, Tomo 58, Data 05/04/2021, Página 10-11.) (Grifei.)

Ainda, o juízo de primeiro grau aplicou a multa no montante de R$ 1.339,23 (mil e trezentos e trinta e nove reais e vinte e três centavos), que corresponde ao valor de 100% da quantia em excesso.

A determinação da multa é consequência específica da extrapolação do limite de doação de recursos próprios para campanha, estabelecido no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

[...]

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

De acordo com o entendimento estabelecido por esta Corte, o percentual de 100% estabelecido na sentença a quo não merece reparos, dada a necessidade de preservação do seu caráter sancionatório e pedagógico, em face da transgressão cometida.

Destaco, apenas, ser necessária a correção, de ofício, de erro material na sentença quanto à destinação da penalidade de multa ao Tesouro Nacional, uma vez que o valor de R$ 1.339,23 deve ser recolhido ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), nos termos do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso para manter a desaprovação das contas de Ildom Sérgio Gil da Silva, relativas ao pleito de 2020, bem como a condenação ao pagamento da multa em seu patamar máximo, correspondente ao valor de R$ 1.339,23, a qual, retificando-se erro material da sentença, deve ser destinada ao Fundo Partidário.