REl - 0600451-37.2020.6.21.0145 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/08/2021 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos, de forma que merece conhecimento.

1. Preliminar

A preliminar suscitada em contrarrazões pleiteia o reconhecimento de ausência de dialeticidade da peça recursal, que não teria enfrentado os fundamentos da sentença hostilizada.

Sem razão. 

Ainda que de modo sucinto, a peça recursal é clara ao apresentar as razões de irresignação. Indico trecho da argumentação apresentada com vistas à reforma da decisão:

"Na realidade, o vídeo – válido, conforme reconhecido na sentença – traz o posicionamento exato do tempo da negociação (imediatamente antes da data da eleição) e a forma que o representado Fernando exigiu que fosse feita – e logo depois desfeita. O vídeo, com todo o respeito as partes, fala por si só. Não pode ser negado nem ser negligenciado. Pergunta-se: qual a prova complementar que poderia ser produzida junto com o tripé vídeo, áudio e cópia do cheque? Só a pericial, se fosse o caso. Mas o argumento da defesa foi somente que o vídeo, por ter sido “fatiado em 17 arquivos”, poderia ter sido “adulterado”, argumento que sequer é levado em consideração na sentença, por inócuo. (...) Tais argumentos não foram suficientemente analisados na sentença. Apenas reproduzem-se incessantemente citações do eminente professor Rodrigo Zilio, completamente separadas do contexto. A leitura completa da sua obra conduz ao entendimento de que efetivamente houve abuso de poder político."

Desse modo, suficientemente demonstradas as razões de inconformismo, entendo atendido o requisito de dialeticidade.

Afasto a preliminar.

2. Mérito

Os diretórios municipais dos partidos PROGRESSISTAS e DEMOCRATAS de Ilópolis recorrem de sentença de improcedência proferida em ação de investigação judicial eleitoral - AIJE por abuso de poder político, cumulada com representações por prática de condutas vedadas e por captação ilícita de sufrágio contra EDEMAR PEDRO ROVADOSCHI e FERNANDO DAPONT, então candidatos à reeleição aos cargos de prefeito e vice-prefeito do Município de Ilópolis. Os recorridos lograram reeleger-se com 1.802 votos, equivalentes a 56,38% das manifestações válidas de eleitores daquele município.

A base fática trazida pelos recorrentes é o uso, em propaganda eleitoral, de símbolos governamentais, de bem público e de atos custeados pela administração pública municipal, os quais teriam redundado nas práticas de abuso de poder político, condutas vedadas e compra de votos, em afronta ao art. 22 da Lei Complementar n. 64/90  e aos arts. 40, 41-A e 73, I e IV, da Lei n. 9.504/97.

Esclareço que alguns dos fatos indicados pelos recorrentes são invocados como causa de pedir em tipificações diversas, de maneira que convém estabelecer as diferenças normativas e conceituais entre o abuso de poder político, a prática de conduta vedada e o cometimento de captação ilícita de sufrágio.

2.1. Abuso de poder político

O abuso de poder está previsto no art. 22 da Lei Complementar n. 64/90:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito.

A vedação ao abuso de poder objetiva preservar a legitimidade do pleito e, para sua configuração, considera-se precipuamente a gravidade da conduta, sem a necessidade da demonstração de que o resultado das urnas foi influenciado. É o que preconiza o art. 22, inc. XVI, da Lei Complementar n. 64/90, pois, para a caracterização do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o distinguem.

Nesse sentido é também a posição da doutrina majoritária, aqui representada pelo lição de José Jairo Gomes:

É preciso que o abuso de poder seja hábil a comprometer a normalidade e a legitimidade das eleições, pois são esses os bens jurídicos tutelados pela ação em apreço. Deve ostentar, em suma, a aptidão ou potencialidade de lesar a higidez do processo eleitoral. Por isso mesmo, há mister que as circunstâncias do evento considerado sejam graves (LC n. 64/90, art. 22, XVI), o que não significa devam necessariamente alterar o resultado das eleições. Nessa perspectiva, ganha relevo a relação de causalidade entre o fato imputado e a falta de higidez, anormalidade ou desequilíbrio do pleito, impondo a presença de liame objetivo entre tais eventos. (Direito Eleitoral. São Paulo: Atlas, 12ª ed. 2016, p. 663).

2.2. Condutas vedadas

Por sua vez, a prática de condutas vedadas consubstancia espécie tipificada de abuso de poder, considerada pela lei como tendente a desequilibrar a igualdade entre os competidores eleitorais e, no que toca ao caso sob exame, importam as redações dos arts. 40 e 73, ambos da Lei n. 9.504/97:

Art. 40. O uso, na propaganda eleitoral, de símbolos, frases ou imagens, associadas ou semelhantes às empregadas por órgão de governo, empresa pública ou sociedade de economia mista constitui crime, punível com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de dez mil a vinte mil UFIR.

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;

(...)

IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;

(...)

Conforme ZILIO (Direito Eleitoral, 7ª ed., Salvador, JusPodivm, p. 705 e seguintes), se está diante de comando legal que objetiva evitar a utilização indevida da máquina pública com interferência na igualdade de oportunidade entre candidatos. Busca-se impedir que interesses políticos prevaleçam em detrimento do bom andamento da Administração Pública, e injustificáveis favorecimentos são considerados pela lei como tendentes a afetar o bem jurídico tutelado, de forma que a mera constatação da prática já atrai a subsunção normativa.

2.3. Captação ilícita de sufrágio

A captação ilícita de sufrágio é ilícito cuja matriz legal está localizada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.

§ 1o  Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir. 

§ 2o  As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto.  

§ 3o  A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação. 

§ 4o  O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial.

O Tribunal Superior Eleitoral sedimentou, já há algum tempo, que para a caracterização da captação ilícita, necessários ao menos três elementos, a saber: “a) prática de uma das condutas típicas previstas no art. 41-A da Lei 9.504/97; b) o fim específico de obter o voto do eleitor; c) participação ou anuência do candidato beneficiário na prática do ato” (RE n. 956791655, Relatora Min. Fátima Nancy Andrighi, Pub. DJE de 16.09.2011, p. 43).

Estabelecidas tais premissas, passo à análise dos fatos propriamente ditos.

Os partidos recorrentes alegam que FERNANDO DAPONT, então candidato, teria dado ordens a Oclides Prevensi, cabo eleitoral apoiador da campanha dos recorridos, para que oferecesse R$ 5.000,00 a Rosimar Gonçalves Mosena, filiada ao PROGRESSISTAS e candidata ao cargo de vereadora. Para receber a quantia, Rosimar haveria de "abandonar" a campanha eleitoral dos recorrentes e votar na chapa dos recorridos. Os elementos de prova apresentados são gravações, tanto em áudio quanto em vídeo.

Antecipo que, no ponto, o recurso não merece provimento, ao fundamento central de ausência de robustez das provas apresentadas, quer da participação, quer da anuência dos candidatos pretensamente beneficiários. A par de inexistir determinação da data e da forma com que se deram as gravações, é impossível concluir que FERNANDO tinha conhecimento acerca de compra de votos, pois não há sequer a certeza de quem são os interlocutores.

No que se refere à gravação em áudio, o diálogo, de fato, trata de devolução de cheque no valor de R$ 5.000,00, ocorrido devido ao não cumprimento, por parte de Rosimar, do acordo. É possível ouvir uma voz masculina afirmar que FERNANDO (candidato a vice-prefeito) saberia do negócio, e que “Ede”, EDMAR PEDRO ROVADOSCHI, não teria conhecimento.

Ora, claro está que se trata de referência frágil, periférica, pois, além de não comprovar a ciência de FERNANDO, qualquer pessoa poderia ter gravado a conversa e nela realizar a afirmação. Lembro das severas sanções previstas para a prática da ilegalidade em questão, que exigem muito mais do que uma conjectura. 

Ademais, todo o conjunto probatório, fracionado em 26 (vinte e seis) arquivos, é lacônico e genérico no que pretendeu demonstrar da conversa que teria ocorrido entre Oclides e Rosimar. O vídeo oferece a imagem de uma mulher, Rosimar, sem que em momento algum exiba o interlocutor – que seria Oclides, conforme a narrativa da parte autora.

Novamente, prova precária em conteúdo.

E também no relativo à forma da apresentação, pois é inegável que o fracionamento de arquivos retira o contexto dos diálogos, ainda que não tenham sido adulterados ou fraudados. Não há certeza no que diz respeito à ordem correta das falas.

E igualmente o cheque de R$ 5.000,00, cuja cópia se faz presentes nos autos, é documento de difícil consideração como prova, pois os recorrentes afirmam que teria sido emitido por Oclides nominalmente a "Spezia”, Singlair Spezia, concorrente ao cargo de prefeito. Ora, o pagamento pela compra do voto de Rosimar a adversário dos recorridos é situação que, além de ilógica, não comprova a exigida ciência ou participação dos beneficiários e, conforme bem apontado no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, a candidata que teria sido cooptada integrava partido rival, circunstância que retira em muito a credibilidade do já frágil conjunto probatório.

Lembro que a captação ilícita de sufrágio consiste na promessa ou oferecimento de vantagem ao eleitor em troca de voto e mostra-se imperioso que o investigante comprove os ilícitos que alega de forma robusta e incontroversa, com provas sólidas que confiram credibilidade ao alegado, o que não ocorreu. Não há segurança quanto à identidade dos interlocutores. 

Igualmente, não deve ser modificada a sentença quanto ao não reconhecimento de abuso de poder. Os recorrentes afirmam que a propaganda eleitoral dos recorridos foi abusiva, na medida em que narrou atos de gestão realizados enquanto os candidatos estavam no comando do Poder Executivo no período 2017-2020. Como prova, foi acostada aos autos a propaganda eleitoral dos recorridos, uma espécie de informativo composto de 8 páginas e denominada pelos recorrentes como “uma verdadeira prestação de contas da Prefeitura”, na qual teria havido uso promocional da “distribuição gratuita de serviços de caráter social custeado pelo Poder Público”.

De fato, a publicação discorre sobre atos da primeira gestão de EDMAR e FERNANDO, pontuando realizações da administração através das secretarias da agricultura, obras, educação, transportes e viação, saúde e assistência social, e cultura e turismo.

Contudo, o proceder deve ser considerado legítimo, na medida em que apenas apontou as realizações da gestão então em curso, em comportamento típico das candidaturas à reeleição ou de situação, pois defensoras da continuidade de gestão. A título exemplificativo, o atendimento fisioterápico oferecido gratuitamente aos cidadãos, em conjunto com as atividades de outros profissionais dos ramos da saúde (médicos,  psicólogos, fonoaudiólogos, nutricionistas e dentistas), de modo incontroverso, compôs um conjunto de medidas de governo, as quais naturalmente foram enaltecidas pelos pretendentes à reeleição e que poderiam eventualmente ser objeto de críticas pelos adversários de oposição, dentro dos limites da legalidade e legitimidade do exercício da liberdade de expressão na disputa eleitoral.

Assim, não há como entender abusiva a vinculação da candidatura de situação à gestão em curso. Não há gravidade na conduta de divulgar, no âmbito da propaganda eleitoral, atos de gestão anterior, sendo lícita e razoável para a valorização da própria candidatura, como ocorrido.

Por fim, saliento que, contudo, o recurso merece provimento parcial no tópico relativo à prática de conduta vedada.

Refiro-me à utilização de imagens de interior de escola pública e centros de saúde, nas páginas 4 e 5 do caderno de propaganda eleitoral. As fotografias vêm acompanhadas de notícias de implementação de turnos integrais, reformas, cercamentos e ampliações de prédios públicos.

Aqui, houve prática de conduta vedada. Mais especificamente, ocorreu desobediência ao art. 73, inc. I, da Lei n. 9.504/97, dispositivo que proíbe a cedência ou o uso de bens móveis ou imóveis pertencentes à Administração Pública para campanhas eleitorais, exceto para realização de convenção partidária.

Explico.

Os recorridos divulgaram, no material de propaganda eleitoral, imagens internas de prédios públicos, escolas e centro de atendimento à saúde, com e sem a presença de cidadãos. No que concerne às imagens das escolas, há robusta prova de concessão de acesso privilegiado aos candidatos, distinção essa convertida em vantagem na elaboração da propaganda eleitoral e que, portanto, feriu o princípio da igualdade e a paridade de armas no pleito. Foram utilizadas as condições de agentes públicos (prefeito e vice-prefeito) em evidente e ilegal confusão com a situação de candidatos.

E a forma com que foram usados os bens públicos em propaganda eleitoral afrontou a legislação de regência igualmente no que diz respeito aos postos de saúde, pois pela mera visualização das imagens percebe-se a intervenção no cotidiano do atendimento ao público, o que desborda da utilização moderada de mera captação de imagens.  

Nesse norte, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, em caso de todo semelhante:

DIREITO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2014. CONDUTA VEDADA. ART. 73, I E III, DA LEI Nº 9.504/1997. BEM PÚBLICO. USO COMUM. CESSÃO OU USO. UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE – UBS. VISTORIA DAS DEPENDÊNCIAS. GRAVAÇÃO DE PROGRAMA ELEITORAL. PRESENÇA DA PRESIDENTE DA REPÚBLICA CANDIDATA À REELEIÇÃO. CAPTAÇÃO DE IMAGENS. REUNIÃO E ENTREVISTA COM MÉDICOS. CONDUTA VEDADA CONFIGURADA. SERVIDOR PÚBLICO. CESSÃO OU USO DE SERVIÇOS. CORPO CLÍNICO DA UBS. MERA APRESENTAÇÃO DO LOCAL A AUTORIDADES E ENTREVISTA SOBRE COTIDIANO DE TRABALHO. MINISTRO DA SAÚDE. INAPLICABILIDADE DO CONCEITO DE HORÁRIO DE EXPEDIENTE. CONDUTA VEDADA NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE IMPACTO E DE GRAVIDADE DO ILÍCITO RECONHECIDO. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. MULTA. APLICAÇÃO A CANDIDATO BENEFICIADO.
(...)
III – Mérito
5. Para fins eleitorais, entendem–se como bens públicos de uso comum os assim definidos pelo Código Civil e também aqueles aos quais a população em geral tem acesso. Escolas e bibliotecas públicas também já foram consideradas bens públicos de uso comum, desde que: (i) o local das filmagens seja de acesso livre a qualquer pessoa; (ii) o uso das dependências seja igualmente possibilitado aos demais candidatos (AgR–RO nº 1379–94/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 28.11.2016); (iii) a utilização do bem se restrinja à captação de imagens, verificada pela “ausência de interação direta entre os que são filmados e a câmera” e de encenação (RO nº 1960–83/AM, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 27.06.2017) e (iv) não haja interrupção da prestação do serviço ao público em virtude das filmagens. Precedentes. 6. Para que seja constatada a mera captação de imagens, é necessário que não haja a identificação expressa do estabelecimento público, servindo o local apenas como pano de fundo, a fim de ilustrar as propostas dos candidatos para as áreas relacionadas ao local das filmagens. 7. Art. 73, I, da Lei nº 9.504/1997. O conjunto probatório demonstra que a conduta dos representados extrapolou a mera captação de imagens, uma vez que: (i) medidas preparatórias para a visita foram adotadas ante a comunicação de que um representante do Ministério da Saúde realizaria uma visita técnica no local; (ii) a candidata circulou por áreas internas da UBS e realizou reunião em sala administrativa, espaços em relação aos quais não se pode presumir acesso do público em geral; (iii) as circunstâncias não permitem concluir que outros candidatos poderiam ter acesso idêntico. Assim, ficou configurado o uso de bem público em benefício da candidatura. (...) 9. Configurada a conduta vedada, a proporcionalidade e a razoabilidade devem nortear a aplicação das penalidades. No caso, a prática do ilícito previsto no art. 73, I, da Lei nº 9.504/1997: (i) não impactou significativamente no cotidiano de trabalho dos servidores públicos e de funcionamento da UBS; (ii) isoladamente, não possui gravidade no contexto de eleição presidencial, uma vez que redundou em cenas de pouco mais de um minuto na propaganda dos candidatos, não havendo nos autos indicativo de repercussão anormal da sua veiculação. Assim, é suficiente a aplicação da multa em seu patamar mínimo. 10. A multa deve ser aplicada individualmente a cada réu, uma vez que os §§ 4º e 8º do art. 73 da Lei nº 9.504/1997 preveem a condenação tanto do agente público responsável quanto dos partidos políticos, coligações e candidatos que se beneficiaram da conduta vedada, independentemente de autorização ou anuência para a prática do ato. (...) 12. São beneficiários da conduta, aos quais também se aplica a multa, nos termos do art. 73, §§ 4º e 8º, da Lei nº 9.504/1997: (i) Dilma Vana Rousseff, então Presidente da República, candidata à reeleição, que ademais participou da gravação da propaganda; (ii) Michel Miguel Elias Temer Lulia, então Vice–Presidente, candidato à reeleição; e a Coligação Com a Força do Povo, que se beneficiou da prática da conduta vedada, independentemente de sua participação ou anuência na prática ilícita. (...) 14. Pedido julgado parcialmente procedente, para aplicar, a cada representado, multa de R$ 5.320,50. 

(TSE – RP n. 119878, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 13.08.2020, DJe de 26.08.2020.)

Assim, configurada a conduta vedada, há de ser aplicada a sanção prevista pela legislação. Note-se, consoante o paradigma recém indicado, que as circunstâncias de desobediência aconselham a aplicação da pena de multa, pois a vantagem obtida pelos recorridos não é significativa ou dotada de gravidade. A irregularidade restringe-se ao uso das imagens de bens públicos em circunstâncias privilegiadas, situação que não causa dano ou prejuízo objetivo ao erário, como outras hipóteses de condutas vedadas, como, apenas a título exemplificativo, a cessão indevida de servidores públicos.

A hipótese, portanto, não comporta a aplicação das penas mais severas, a cassação dos diplomas, a declaração de inelegibilidade e a perda da função pública, sendo cabível e suficiente, no caso, a imposição da multa no seu patamar mínimo, equivalente a R$ 5.320,50, de forma individual a cada um dos recorridos.

Por fim, aponto o acerto da sentença hostilizada ao determinar o encaminhamento de cópia dos autos à autoridade policial para o fim de investigação daquelas condutas supostamente tipificadas como crime e alegadamente praticadas pelos recorridos. Os ilícitos de natureza penal devem ser analisados em expedientes próprios, nos quais haja a adequada veiculação da persecução penal e o resguardo das garantias processuais constitucionais criminais dos acusados.

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso para julgar parcialmente procedente a demanda e condenar, de modo individual, EDEMAR PEDRO ROVADOSCHI e FERNANDO DAPONT ao pagamento de multa no valor de R$ 5.320,50 (cinco mil trezentos e vinte reais e cinquenta centavos), pela prática de conduta vedada prevista no art. 73, inc. I, da Lei n. 9.504/97.