REl - 0600442-08.2020.6.21.0038 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/08/2021 às 14:00

VOTO

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Preliminarmente

Em sede preliminar, cumpre registrar a viabilidade do documento apresentado com o recurso.

Embora o Egrégio Tribunal Superior Eleitoral possua entendimento no sentido de que julgadas as contas, com oportunidade prévia para saneamento das irregularidades, não se admite, em regra, a juntada de novos documentos (TSE, AgReg no RESPE n. 239956, Relatora Min. Rosa Weber. DJE: 31.10.2016), este Tribunal Regional, sempre em juízo de exceção, tem se pautado pela potencialização do direito de defesa no âmbito dos processos de prestação de contas, especialmente quando se trata de documento simples que dispense a necessidade de nova análise técnica ou de diligências complementares, não apresentando prejuízo à tramitação processual.

O posicionamento encontra fundamento no art. 266 do Código Eleitoral e está amparado pela reiterada jurisprudência deste Regional, conforme ilustram as ementas das seguintes decisões:

Recurso Eleitoral. Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.463/15. Eleições 2016.

Preliminar afastada. É faculdade do juiz eleitoral a conversão das contas simplificadas para o rito ordinário, a fim de que sejam apresentadas contas retificadoras. Art. 62 da Resolução TSE n. 23.463/15. A falta de conversão, frente à possibilidade de prolação da sentença com os elementos constantes nos autos, não acarreta cerceamento de defesa. Oportunizada a manifestação do candidato acerca do parecer do órgão técnico, ocasião em que juntados documentos.

Conhecimento dos documentos apresentados em grau recursal, nos termos do art. 266 do Código Eleitoral.

A ausência de registro de doação ou cessão de veículo automotor é irregularidade sanável. Apresentação de retificação das contas, de modo a suprir a omissão e possibilitar a aprovação da contabilidade.

Provimento.

(TRE-RS – RE 522-39/RS, Relator: DES. FEDERAL PAULO AFONSO BRUM VAZ, Data de Julgamento: 14.3.2017.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. APRESENTAÇÃO INTEMPESTIVA DE DOCUMENTOS. CONHECIDOS, EXCEPCIONALMENTE, POR NÃO DEMANDAREM ANÁLISE TÉCNICA OU DILIGÊNCIAS ADICIONAIS. FALHA SANADA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Conhecidos, excepcionalmente, os documentos apresentados de forma extemporânea, por permitirem através de simples leitura, a aferição do saneamento ou não das falhas, independentemente de diligências adicionais, conforme a jurisprudência deste Tribunal para as eleições de 2018. Ressalvada a posição de que, respeitada eventual mudança normativa, este entendimento não deve ser mantido em relação às contas das eleições vindouras, caso em que as circunstâncias ora consideradas não serão relevadas, aplicando-se o instituto da preclusão.

2. Irregularidade na aplicação de recursos do Fundo Partidário. Tendo a parte juntado a microfilmagem dos cheques faltantes, possibilitando a aferição de que foram emitidos de forma nominal a fornecedor, tal como informado na prestação de contas, resta suprida a falha apontada pelo parecer técnico mediante a juntada de provas que não demandaram diligências complementares.

3. Aprovação com ressalvas.

(Prestação de Contas n 060240891, ACÓRDÃO de 02/12/2019, Relator: GERSON FISCHMANN, Publicação: PSESS – Publicado em Sessão) (Grifei.)

Prossigo, passando ao exame da questão de fundo.

Mérito

Trata-se da prestação de contas de candidata a vereadora, relativa às eleições do ano de 2020.

As contas da recorrente foram desaprovadas com base em parecer técnico conclusivo das contas (ID 24325083), no qual foi indicada irregularidade proveniente de omissão relativa à despesa na prestação de contas, identificada mediante confronto com nota fiscal eletrônica de gasto eleitoral, no valor de R$ 5.761,45, emitida pela empresa Fábio Couto Abel ME, na data de 13.11.2020 (n. 202000000000115).

No curso da instrução, a prestadora manifestou-se sobre o apontamento (ID 24325033), afirmando que a referida nota fiscal, originária de uma doação não concretizada de material de campanha, foi equivocadamente emitida pelo prestador e posteriormente cancelada.

Agora, na via recursal, a recorrente reafirmou a situação fática (ID 24325483) ao relatar que a empresa demorou para efetuar o cancelamento da nota, e juntou documento sobre o qual não há nenhuma manifestação no recurso (ID 24325533).

As circunstâncias dos autos não permitem, contudo, que a alegação possa surtir o efeito desejado pela prestadora – aprovação das contas ou aprovação com ressalvas.

Passo a explicar.

A emissão de nota fiscal sem o registro da despesa correspondente na prestação de contas revela indícios de omissão de gastos eleitorais em violação aos arts. 14 e 53, inc. I, al. “g” da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

(…)

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

(…)

g) receitas e despesas, especificadas; (Grifei.)

O não reconhecimento de despesa haveria de ser comprovado, v.g., com a demonstração do cancelamento da nota fiscal emitida, nos termos previstos no art. 92, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

§ 6º Na situação de eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, o prestador deverá apresentar a comprovação de cancelamento, junto com esclarecimentos firmados pelo fornecedor.

Na mesma linha a jurisprudência desta Corte:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. SUPLENTE. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. OMISSÃO DE DESPESA. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. BAIXO PERCENTUAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Omissão de despesas caracterizada pela existência de documentos fiscais sem o correspondente registro na prestação de contas. Falha grave que impossibilita a identificação da origem dos recursos utilizados para pagamento das despesas contratadas. Na espécie, apesar das alegações da prestadora acerca da emissão unilateral da nota fiscal e da argumentação sobre a responsabilização por ato de terceiro, não foi demonstrado o cancelamento do documento, de forma que se impõe o reconhecimento da omissão na prestação de contas. 2. As despesas omitidas na prestação de contas caracterizam recursos de origem não identificada, visto que foram ou serão pagas com recursos que deixarão de transitar pelas contas de campanha e de submeter-se ao controle da Justiça Eleitoral, o que atrai a imposição de recolhimento do valor equivalente ao Tesouro Nacional. Falha equivalente a 4,67% do total da receita declarada, possibilitando a aplicação dos precedentes desta Corte e do TSE que autorizam a aprovação com ressalvas das contas. (PC n. 0602542-21.2018.6.21.0000, j. em 05.11.2019, Relator: Gustavo Alberto Gastal Diefenthaler)

Necessário dizer, ainda, que o documento apresentado por ocasião do recurso pela candidata não comprova o cancelamento da debatida nota fiscal. Como bem ponderou o parecer ministerial (ID 25799283), a natureza do documento juntado não foi esclarecida pela recorrente, e não há certeza do que se trata ou mesmo de onde foi retirado.

Por conseguinte, a omissão de registro financeiro no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral há de ser considerada, tecnicamente, como recebimento de recurso de origem não identificada e, portanto, sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional, uma vez que não foi possível confirmar a procedência do valor empregado no pagamento do citado documento fiscal, inviabilizando a fiscalização da Justiça Eleitoral.

Desse modo, considerando que a falha identificada (R$ 5.761,45) importa em percentual superior a 2.351% das receitas recebidas (R$ 245,00), não há que se falar em proporcionalidade, e deve ser considerada falta grave que compromete o controle e a fiscalização dos recursos utilizados na campanha, de forma que a manutenção da sentença de desaprovação é medida que se impõe.

Nesse sentido, colho o seguinte aresto deste Tribunal em caso análogo:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. OMISSÃO DE DESPESAS. PERCENTUAL RELEVANTE. RECOLHIMENTO DO VALOR IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Omissão de despesas. Identificadas duas notas fiscais não registradas na prestação de contas do candidato. Ausência de manifestação do prestador durante o processo.

2. As despesas omitidas na prestação de contas foram pagas com valores não individualizados nos registros financeiros, caracterizando-se como recursos de origem não identificada. Falha grave, que representa 13,34% da arrecadação na campanha eleitoral, ensejando a desaprovação das contas. Recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional.

3. Desaprovação.

(Prestação de Contas n 060200610, ACÓRDÃO de 02/09/2019, Relator Roberto Carvalho Fraga, Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Data 04/09/2019) (Grifei.)

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença que desaprovou as contas de Sílvia da Rosa, relativas ao pleito de 2020.