REl - 0600357-30.2020.6.21.0100 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/08/2021 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

EDUARDO PICOLOTTO e ADEMIR FAVARETTO, candidatos eleitos aos cargos de prefeito e vice-prefeito do Município de Água Santa em 2020, recorrem da sentença que desaprovou as contas de campanha. A sentença considerou como grave a emissão de cheque nominal, não cruzado, no valor de R$ 300,00 (trezentos reais), para pagamento de despesa com produção de jingle de campanha, ao prestador Guilherme dos Santos. Os recursos eram originários do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

A situação é regulamentada pelo art. 38 da Resolução n. 23.607/19, o qual determina:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

Ou seja, incontroverso que a regra foi desobedecida, pois o cheque foi sacado diretamente no caixa bancário, mediante endosso.

Como fundamento do recurso, os prestadores apontam para a existência, nos autos, de (1) microfilmagem da cártula, (2) recibo firmado pelo prestador do serviço Guilherme dos Santos e (3) contrato de prestação de serviço.

Adianto que me alinho à sentença para entender pela fragilidade das provas trazidas, pois elas foram construídas de forma unilateral e à margem do sistema indicado pela legislação de regência, de forma que não se prestam a comprovar com segurança a destinação do recurso público alegadamente empregado na campanha. Ainda que existam o recibo e o contrato de prestação do serviço, não há garantia de que o valor de origem pública tenha sido endereçado ao destinatário apontado formalmente.

Ademais, verifico a existência de outros fornecedores de temas musicais para a campanha eleitoral dos recorrentes, quais sejam, Amarildo da Silva Fernandes, cheque n. 5, valor de 1.000,00 (um mil reais) e Eudes Sansset, cheque n. 2, valor de R$ 500,00 (quinhentos reais). Nesses casos, ambas as despesas estão comprovadas corretamente, por meio das notas fiscais eletrônica n. 15 e n. 317 e com os nomes constantes nos extratos bancários como contrapartes (beneficiários dos pagamentos). 

Ou seja, além de destoar do procedimento praticado pelos próprios recorrentes perante outros fornecedores, a inexistência de nota fiscal e a ausência de contraparte nominada somente em relação a Guilherme dos Santos revela a inobservância do trânsito de valores entre contas exigido pela legislação. A comprovação segura da aplicação das verbas públicas usadas na campanha eleitoral se faz por meio dos documentos fiscais idôneos, corretamente preenchidos e movimentados conforme determinam as regras eleitorais, nos termos do art. 53, inc. II, al. "c", e art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, como bem esclarece o douto Procurador Regional Eleitoral:

Tal caráter meramente complementar dos documentos do art. 60 se extrai de dois pilares principais. Primeiro, tais documentos não possuem fé suficiente, uma vez que são de produção unilateral, ou, no máximo, bilateral, entre o candidato e uma pessoa qualquer informada como fornecedor de serviço ou de bem, o que claramente pode dar margem a burlas mediante a entabulação de relações simuladas, com o intuito de encobrir o real destino dos valores da campanha. Depois, porque os meios de pagamento previstos no art. 38 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos de campanha, e, por consequência, da veracidade do correspondente gasto. Com efeito, tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento dos valores, apontando-se, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades. Por outro lado, se os valores não transitam pelo sistema financeiro nacional, é muito fácil que sejam, na realidade, destinados a pessoas que não compuseram a relação indicada como origem do gasto de campanha.

Nessa linha de raciocínio, o reconhecimento da irregularidade impõe a manutenção do recolhimento do valor de R$ 300,00 (trezentos reais) ordenado na sentença hostilizada.

O pequeno reparo que a sentença merece é concernente ao juízo de desaprovação das contas. O valor em si mesmo é irrisório, inferior a R$ 1.064,10, e a prestação de contas alcançou o total de R$ 26.291,30 de arrecadação de recursos, de maneira que a falha compõe 1,14%, a permitir a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e a consequente aprovação com ressalvas das contas, conforme orientação do Tribunal Superior Eleitoral.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento parcial do recurso para aprovar as contas com ressalvas, mantendo a determinação de recolhimento de R$ 300,00 (trezentos reais) ao Tesouro Nacional.