REl - 0600285-68.2020.6.21.0027 - Voto Relator(a) - Sessão: 03/08/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada na origem, em face da identificação de irregularidade concernente à forma de pagamento de despesas eleitorais, no valor de R$ 822,00, efetuado por meio de cheque nominal não cruzado, em infringência ao disposto no art. 31, inc. I, da Resolução n. 23.607/19, deixando a magistrada a quo, porém, de determinar o recolhimento da quantia apontada como irregular, “em razão de não se tratar de recursos oriundos do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e, também, por ausência de disposição específica na Resolução TSE 23.607/2019 quanto ao recolhimento desses valores”.

A sentença arrimou-se no parecer conclusivo apresentado pela unidade técnica, que apontou os seguintes gastos em desacordo com o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 (ID 28269883):

Com efeito, a forma de pagamento dos gastos eleitorais encontra-se disciplinada no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

 

Portanto, a norma em apreço possui caráter objetivo e exige, sem exceções, que o cheque manejado para pagamento de despesa eleitoral seja não apenas nominal, mas também cruzado.

Isso porque o cheque não cruzado pode ser compensado sem depósito bancário. Desse modo, não há transparência nem confiabilidade na identificação dos beneficiários dos gastos em questão, dificultando a rastreabilidade das quantias utilizadas na campanha.

A transgressão do preceito normativo não foi refutada pelo prestador que, inclusive, admitiu o erro ao deixar de cruzar os cheques empregados como meio de pagamento dos gastos eleitorais, caracterizando, de modo incontroverso, a irregularidade na forma de pagamentos de suas despesas.

A alegação de que a exigência em tela impediria a contratação de “pessoas mais humildes” para as atividades em campanha não enseja a mitigação da regra, pois a sua finalidade é, justamente, impor que a movimentação dos recursos ocorra por meio do sistema bancário, garantindo maior transparência às transações.

Entrementes, entendo que as contas devem ser aprovadas com ressalvas, pois, em que pese a irregularidade constatada represente 59,69% das receitas de campanha (R$ 1.377,00), o valor absoluto mostra-se reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR), que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Quanto ao tema, destaco excertos da decisão monocrática proferida pelo Ministro Luiz Edson Fachin, nos autos do RESPE n. 37447, em 13.6.2019:

Entendo que o limite percentual de 10% (dez por cento) adotado por este Tribunal Superior revela-se adequado e suficiente para limitar as hipóteses de incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

É de se harmonizar, contudo, a possibilidade de sobreposição dos critérios do valor diminuto e da aplicação dos princípios já citados. Em casos tais, deve prevalecer, até o limite aqui indicado, o critério de valor absoluto, aplicando-se o critério principiológico de forma subsidiária.

Assim, se o valor da irregularidade está dentro do máximo valor entendido como diminuto, é desnecessário aferir se é inferior a 10% (dez por cento) do total da arrecadação ou despesa, devendo se aplicar o critério do valor diminuto.

Apenas se superado o valor máximo absoluto considerado irrisório, aplicar-se-á o critério da proporcionalidade e da razoabilidade, devendo ser considerado o valor total da irregularidade analisada, ou seja, não deve ser desconsiderada a quantia de 1.000 UFIRs alcançada pelo critério do valor diminuto.

 

Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação do critério do valor nominal diminuto, que prepondera sobre eventual aferição do alcance percentual das falhas, de modo a afastar o juízo de desaprovação das contas quando o somatório das irregularidades se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10 (TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020, e REl n. 0600399-70.2020.6.21.0103, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann julgado em 20.05.2021).

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de campanha de SIMONE CRISTIANE NUNES LEAL, relativas às eleições de 2020.