REl - 0600155-08.2020.6.21.0018 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/07/2021 às 10:00

VOTO

A sentença aprovou as contas com ressalvas em decorrência do recebimento de dois depósitos bancários em dinheiro na conta da candidatura, nos valores de R$ 150,00 e R$ 200,00, cujo depositante foi identificado com o CNPJ de campanha do próprio candidato, o que caracteriza os valores como de origem não identificada, no total de R$ 350,00, os quais foram justificados como recursos próprios, embora o candidato tenha declarado não possuir patrimônio nem exercer atividade remunerada no pedido de registro de candidatura.

Inicialmente, entendo que assiste razão à Procuradoria Regional Eleitoral ao apontar que é contraditória a conclusão do juízo a quo de que os depósitos, no total de R$ 350,00, caracterizam, ao mesmo tempo, uso de receitas próprias em desacordo com o patrimônio declarado pelo candidato e aporte de recursos de origem não identificada.

Conforme refere o Parquet: “Ou não se sabe a origem e portanto não são doações do próprio candidato, ou são doações do próprio candidato e, logo, se sabe a origem. As duas irregularidades envolvendo a mesma doação (e a sentença reconhece que “os itens 2.2 e 2.3 acima referem-se ao mesmo fato”) não podem coexistir.”

Pois bem, em relação a esses depósitos, a questão concernente à falta de capacidade financeira foi devidamente esclarecida antes da sentença, com os documentos juntados ao ID 27507383, pois o prestador apresentou cópia do comprovante de salário, fornecido pela empresa Comércio de Medicamentos Brair Ltda., e o respectivo contrato registrado em sua CTPS, indicando como data de admissão 19.4.2017 (ID 27507783, págs. 4 e 5).

Assim, de fato, houve falha formal e caracterizadora apenas de ressalva nas contas quanto à omissão do exercício de atividade remunerada no requerimento de registro de candidatura, pois os documentos acostados pelo prestador esclarecem a sua capacidade econômica para realizar doações para a própria campanha.

Quanto ao recebimento de recursos de origem não identificada, a sentença aponta que esses depósitos de R$ 150,00 e de R$ 200,00, que totalizam a importância de R$ 350,00, não têm origem esclarecida nas contas, pois foram identificados com o CNPJ da candidatura, conduzindo ao dever de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, nos seguintes termos:

2.2 - Das Doações

Foram detectadas falhas no recebimento de doações, conforme demonstra a tabela a seguir (Item 1 do Parecer Conclusivo):

Em que pese a manifestação trazida aos autos, destaca-se que, conforme o art 31, § 3º, da Resolução nº 23.607/2019, os recursos recebidos em desacordo com a legislação não podem ser utilizados.

No presente caso, os valores foram recebidos em 5 de novembro de 2020 e utilizados em 9 de novembro de 2020.

Dessa forma, restou caracterizado o desatendimento dos requisitos da Resolução TSE nº 23.607/2019 por parte do prestador, ficando este sujeito à sanção correspondente:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador;

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras recebidas de outros candidatos ou partidos políticos;

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político;

Assim, o valor de R$ 350,00 deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 31, § 4º, da Resolução nº 23.607/2019.

 

A Procuradoria Eleitoral entende que a irregularidade merece ser relevada por ter sido praticada por equívoco, sendo crível a alegação de que os valores têm origem em recursos próprios, assim declarados no extrato da prestação de contas.

Embora o prestador tenha emitido dois recibos eleitorais para si mesmo (ID 27505933 e ID 27506033) e declarado no extrato das contas que o dinheiro é proveniente de recursos próprios (ID 27505833), com a demonstração da sua capacidade econômica, observa-se que nos extratos bancários os dois depósitos estão identificados com o CNPJ da candidatura.

Essa circunstância impossibilita à Justiça Eleitoral verificar a autenticidade da declaração de que o valor se trata de recurso pessoal aplicado na campanha.

A falta de confiabilidade e de transparência sobre a origem do recurso não fica afastada pela afirmação de que o depósito foi realizado pelo próprio prestador, pois o art. 21, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 expressamente determina que as doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado.

Portanto, ainda que o candidato demonstre a sua capacidade financeira para efetuar a doação e justifique a falha apontando equívoco de procedimento, em razão de o depósito estar identificado com o CNPJ da campanha e não com o CPF do doador, o certo é que a origem do recurso consiste em mera alegação que não se sustenta em prova fidedigna, permanecendo a irregularidade.

A exigência normativa de que as doações, mesmo que provenientes dos próprios candidatos, sejam feitas por meio de transferência eletrônica visa coibir a possibilidade de manipulações e de transações ilícitas, como a utilização de fontes vedadas de recursos e a desobediência aos limites de doação, o que não pode ser confirmado na espécie.

Outrossim, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência e a lisura da prestação de contas.

Dessa forma, a confiabilidade e a transparência das contas de campanha do candidato restaram severamente comprometidas pela irregularidade não esclarecida, sendo acertado o juízo de desaprovação das contas, conforme já decidido por este Tribunal:

Prestação de contas. Candidato. Arrecadação e dispêndio de recursos de campanha. Resolução TSE n. 23.406/14. Eleições 2014. Irregularidades, entre outras, prejudiciais ao exame da prestação de contas do candidato: ausência de recibos eleitorais; devolução de cheques sem apresentação do original ou da declaração de quitação do débito, caracterizando dívida de campanha não consignada e sem a devida assunção pelo partido; discrepância entre o total dos créditos e a identificação dos CPF/CNPJ observados nos extratos bancários eletrônicos constantes da base de dados da Justiça Eleitoral; depósito bancário identificado com o CNPJ da candidatura, o que caracteriza o recurso como de origem não identificada e impõe o recolhimento do valor arrecadado ao Tesouro Nacional. Desaprovação.

(TRE-RS - PC: 203114 PORTO ALEGRE - RS, Relator: DRA. GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA, Data de Julgamento: 21/01/2016, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 12, Data: 25/01/2016, Página 7.)

 

Desse modo, correta a sentença ao considerar o valor como recurso de origem não identificada e determinar o recolhimento ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Portanto, afigura-se razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, especialmente porque o total de irregularidades de R$ 350,00 representa 12,68% do conjunto da arrecadação de campanha, no montante de R$ 2.760,00.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença de aprovação das contas com ressalvas e a determinação de recolhimento de R$ 350,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.