REl - 0600560-25.2020.6.21.0089 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/07/2021 às 10:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, o juízo a quo aprovou com ressalvas as presentes contas de campanha, condenando o candidato à multa em razão da aplicação de recursos próprios acima do limite de 10% dos gastos previstos para o cargo em disputa.

O tema encontra a sua regulamentação no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

Grifei.

 

In casu, o candidato empregou recursos financeiros próprios na campanha, em espécie, na monta de R$ 1.000,00, bem como realizou a cessão do veículo de sua propriedade estimada em R$ 2.000,00.

Registram as contas, ainda, o recebimento de doação de terceiro, na ordem de R$ 194,50, em espécie, a qual não deve, por óbvio, integrar o cálculo de teto de autofinaciamento.

Portanto, considerados os recursos próprios do candidato, sejam financeiros ou estimáveis em dinheiro, o somatório utilizado alcança R$ 3.000,00.

Entretanto, o limite de gastos para o cargo em tela, no Município de São José do Inhacorá, era de R$ 12.307,75, estando o candidato autorizado a usar 10% deste valor em recursos próprios, ou seja, R$ 1.230,77, havendo, portanto, o excesso em R$ 1.769,23.

Em sua defesa, o recorrente alega que os recursos estimáveis, consistentes na cessão do veículo particular, não devem ser considerados como receitas próprias para fins de aferição do limite de gastos, pois não há “uma quantificação precisa deste valor”, sendo exceção trazida pelo § 3º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19.

As alegações, entretanto, não prosperam.

Com efeito, o art. 5º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe expressamente sobre a contabilização das doações estimáveis em dinheiro para efeito de cálculo de limite de gastos realizados pelo candidato, litteris:

Art. 5º Os limites de gastos para cada eleição compreendem os gastos realizados pelo candidato e os efetuados por partido político que possam ser individualizados, na forma do art. 20, II, desta Resolução, e incluirão:

[…].

III - as doações estimáveis em dinheiro recebidas.

Grifei.

 

Cumpre anotar, ainda, que, não obstante seja o uso de recursos próprios do candidato disciplinado no § 1º do art. 27, alocando-se no mesmo dispositivo que trata das contribuições de pessoas físicas, a ressalva contida no § 3º quanto às doações estimáveis em dinheiro se direciona apenas à hipótese prevista no caput, qual seja, às doações de terceiros, pessoas físicas, e não àquelas advindas do próprio candidato, reguladas pelo respectivo § 1º.

Ao não excepcionar os recursos estimáveis em dinheiro do parâmetro para aferição do limite de gastos de cada cargo em disputa, a norma visa garantir a igualdade, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, é uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais prévios dos candidatos, que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

No aspecto, pertinente trazer à colação as judiciosas considerações da Procuradoria Regional Eleitoral:

E a razão de ser da inclusão, no limite do autofinanciamento com recursos próprios, das doações estimáveis em dinheiro é assegurar o princípio da isonomia entre os candidatos. Caso assim não fosse, por exemplo, um candidato que não possuísse veículo automotor teria incluído, para o cômputo dos seus limites de gastos, as despesas realizadas com recursos próprios com aluguel de carro, enquanto o candidato que possuísse veículo não teria qualquer gasto incluído para aferição do mesmo limite legal, para a realização de idêntica atividade de campanha.

 

O posicionamento relativo à contabilização das receitas financeiras e estimáveis em dinheiro na verificação do atendimento do limite de gastos restou acolhido pelo Tribunal Superior Eleitoral, em pleitos anteriores, justamente com o escopo de assegurar tratamento isonômico entre os candidatos, conforme ilustra ao seguinte julgado:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE DE GASTOS. BENS ESTIMÁVEIS. FALHA GRAVE. MULTA. DESPROVIMENTO.

1.  Autos recebidos no gabinete em 25.8.2017.

2.  No caso, o TRE/SE julgou desaprovadas contas do agravante por exceder em R$ 1.805,12 o limite de gastos de campanha estipulado pelo TSE em R$ 10.803,91.

3.  É falha grave a atrair multa e rejeição do ajuste contábil ultrapassar em quase 18% o limite de gasto previsto no pedido de registro de candidatura, sem justificativas plausíveis para prática do ilícito, ainda que os valores em excesso se refiram a bens estimáveis em dinheiro. Precedentes.

4.  Agravo regimental desprovido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 16966, Relator Min. Herman Benjamin, Publicação: DJE de 15.6.2018.) Grifei.

 

Assim, impõe-se a confirmação da irregularidade, consubstanciada no valor de R$ 1.769,23 em excesso de gastos operados com recursos próprios do candidato, que representa 55,38% das receitas declaradas (R$ 3.194,50), inviabilizando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para mitigar a repercussão da falha sobre o conjunto da contabilidade.

Em relação à penalidade de multa, fixada na sentença em 100% da quantia em excesso, diante do valor não significativo da falha e da sua proporcionalidade no conjunto das contas, entendo que o montante se afigura razoável, adequado e proporcional à irregularidade verificada e às peculiaridades do caso.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a aprovação com ressalvas das contas de VILSON JOSE REIDEL, relativas às eleições de 2020, bem como a condenação à multa de 100% da quantia em excesso, equivalente ao valor de R$ 1.769,23.