REl - 0600303-02.2020.6.21.0153 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/07/2021 às 10:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

Trata-se da prestação de contas de candidata a vereadora, relativa às eleições do ano de 2020.

As contas da recorrente foram desaprovadas com base no parecer conclusivo do exame técnico das contas (ID 24121183), o qual concluiu pela não comprovação do gasto de R$ 1.056,00, oriundos do FEFC e destinados à quota de gênero, utilizados para a contratação de publicidade para candidatos do gênero masculino, sem a indicação de benefício para a campanha da candidata, em desacordo com o disposto no art. 17, §§ 6º, 7º, 8º e 9º da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 17. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) será disponibilizado pelo Tesouro Nacional ao Tribunal Superior Eleitoral e distribuído aos diretórios nacionais dos partidos políticos na forma disciplinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (Lei nº 9.504/1997, art. 16-C, § 2º).

(...)

§ 6º A verba oriunda da reserva de recursos do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) destinada ao custeio das candidaturas femininas deve ser aplicada pela candidata no interesse de sua campanha ou de outras campanhas femininas, sendo ilícito o seu emprego, no todo ou em parte, exclusivamente para financiar candidaturas masculinas.

§ 7º O disposto no § 6º deste artigo não impede: o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino; a transferência ao órgão partidário de verbas destinadas ao custeio da sua cota-parte em despesas coletivas; outros usos regulares dos recursos provenientes da cota de gênero; desde que, em todos os casos, haja benefício para campanhas femininas.

§ 8º O emprego ilícito de recursos do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) nos termos dos §§ 6º e 7º deste artigo, inclusive na hipótese de desvio de finalidade, sujeitará os responsáveis e beneficiários às sanções do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, sem prejuízo das demais cominações legais cabíveis.

§ 9º Na hipótese de repasse de recursos do FEFC em desacordo com as regras dispostas neste artigo, configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidato que realizou o repasse tido por irregular, respondendo solidariamente pela devolução o recebedor, na medida dos recursos que houver utilizado.

De fato, restou incontroverso que a candidata contratou publicidade para candidatos do gênero masculino com recursos do FEFC destinados à quota de gênero. A controvérsia reside nos benefícios dessa contratação, se foram exclusivos às campanhas dos candidatos do gênero masculino ou se, de algum modo, reverteram à campanha da recorrente.

A candidata alega que a veiculação da publicidade em questão foi determinante para o seu sucesso no pleito, pois obteve votos em redutos que não eram seus.

Não assiste razão à recorrente.

Como bem pontuado no parecer conclusivo e referendado pela Procuradoria Regional Eleitoral, é impossível aferir algum tipo de benefício para a campanha da recorrente na contratação de publicidade para candidatos iniciantes na política, em detrimento do investimento exclusivo na sua própria campanha.

Frisa-se que a recorrente era candidata à reeleição, portanto, uma política experiente e conhecida, situação que reforça a ausência de verossimilhança na aquisição do benefício alegado.

Por elucidativo, transcrevo parte do parecer conclusivo:

(...)

Entretanto, no presente caso, a candidata pagou uma publicação (ID 74154601), no valor de R$1.584,00, utilizando-se de Recurso Especial de Financiamento de Campanha destinado às candidaturas femininas, conforme estabelecido pelo § 4º, do artigo 17, em benefício a seis candidatos ao mesmo cargo, sendo duas mulheres (Rubia Reisdorfer e Silvia Schabarum) e quatro homens (Pedrinho Gressler, José JoelCabreira da Silva, Germano Seger e Luis Roberto Schneider). Esta examinadora não vislumbra qualquer vantagem com a publicação dos candidatos masculinos para a candidata, sobretudo considerando que dois dos candidatos não eram detentores de mandato eletivo, iniciantes na política, portanto, e os outros dois, sequer foram eleitos. De forma que não se verifica qualquer contribuição ou influência de prestígio, em benefício da candidata, o vínculo de sua candidatura à dos candidatos em questão. Nesse prisma, a publicação, em parte, beneficiou cada candidato masculino, exclusivamente. Nesse caso, então, afasta-se o§6º do mencionado artigo.

Também não pode ser abarcado pelo seu § 7º, uma vez que não foi uma despesa comum entre os candidatos, já que a candidata pagou integralmente a contratação da publicação conjunta com recursos do FEFC, como pode-se ver dos documentos de contratação e comprovação da despesa (IDs 74154604 e59659211).

Constatada a irregularidade, o valor de R$ 1.056,00 deve ser recolhido aos cofres do Tesouro Nacional, nos termos do § 9º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ainda, embora a falha apurada (R$ 1.056,00) corresponda a 11,55% das receitas declaradas pela recorrente (R$ 9.141,16), em termos absolutos, a quantia envolvida é irrisória.

O Tribunal Superior Eleitoral tem aprovado com ressalvas as contas de campanha sempre que o montante das irregularidades represente valor absoluto diminuto, ainda que o percentual com relação ao total da arrecadação seja elevado. Para tanto, a Corte superior adota como referência o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), como uma espécie de "tarifação do princípio da insignificância", considerando a quantia o máximo absoluto entendido como diminuto, conforme demonstram os julgados abaixo colacionados:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. VEREADOR. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DOAÇÃO A TÍTULO DE RECURSOS PRÓPRIOS MEDIANTE DEPÓSITO BANCÁRIO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. VALOR DIMINUTO DA IRREGULARIDADE CONSIDERADO SEU VALOR ABSOLUTO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto, ainda que o percentual no total da arrecadação seja elevado. Precedentes. 2. No caso dos autos, embora o percentual da irregularidade seja elevado, aproximadamente 76%, seu valor absoluto (R$ 950,00) deve ser considerado módico, uma vez que inferior a R$ 1.064,10 (mil, sessenta e quatro reais e dez centavos – 1.000 UFIRs). 3. Manutenção da decisão. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 63967, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônica, Data 06.8.2019.) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. CANDIDATOS. DESAPROVADAS. DESPESAS COM INSTALAÇÃO DE COMITÊ DE CAMPANHA. COMPROVAÇÃO. REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. POSSIBILIDADE. IRREGULARIDADES REMANESCENTES. PERCENTUAL INEXPRESSIVO NO CONTEXTO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PRECEDENTES. PROVIMENTO MONOCRÁTICO DO RECURSO ESPECIAL PARA APROVAR, COM RESSALVAS, AS CONTAS DOS RECORRENTES. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. AGRAVO DESPROVIDO.

1. O reenquadramento jurídico dos fatos, quando cabível, é restrito às premissas assentadas pela instância regional e não se confunde com o reexame e a revaloração do caderno probatório, providência incabível em sede de recurso especial, a teor do disposto na Súmula nº 24/TSE.

2. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto, ainda que o percentual no total da arrecadação seja elevado. Precedentes.

3. Adota-se como balizas, para as prestações de contas de candidatos, o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) como espécie de "tarifação do princípio da insignificância" como valor máximo absoluto entendido como diminuto e, ainda que superado o valor de 1.000 UFIRs, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aquilatar se o valor total das irregularidades não superam 10% do total da arrecadação ou da despesa, permitindo-se, então, a aprovação das contas com ressalvas.

4. Tal balizamento quanto aos aspectos quantitativos das prestações de contas não impede sua análise qualitativa. Dessa forma, além de sopesar o aspecto quantitativo descrito acima, há que se aferir se houve o comprometimento da confiabilidade das contas (aspecto qualitativo). Consequentemente, mesmo quando o valor apontado como irregular representar pequeno montante em termos absolutos ou ínfimo percentual dos recursos, eventual afetação à transparência da contabilidade pode ensejar a desaprovação das contas.

5. No caso dos autos, o diminuto percentual das falhas detectadas (0,38%) – em relação ao valor absoluto arrecadado em campanha – não representa gravidade capaz de macular a regularidade das contas.

6. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 0601473-67.2018.6.24.0000, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônica, Data 07.5.2020.) (Grifei.)

 

No mesmo sentido, colho o seguinte aresto deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatados gastos declarados pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS – Prestação de Contas n 060069802, ACÓRDÃO de 14.7.2020, Relator DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE.) (Grifei.)

 

Assim, na hipótese dos autos, embora o percentual da irregularidade na prestação de contas da candidata seja superior ao utilizado como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas (10%), o seu valor absoluto (R$ 1.056,00) deve ser considerado módico, pois inferior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos – 1.000 UFIR5), sendo insuficiente para a desaprovação das contas.

Dessa forma, considerando-se o reduzido valor absoluto da irregularidade, as contas devem ser aprovadas com ressalvas, pois não ostentam gravidade suficiente para macular a sua confiabilidade.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de Rúbia Reisdorfer, relativas ao pleito de 2020, mantendo a determinação de recolhimento do valor de R$ 1.056,00 ao Tesouro Nacional.