REl - 0600498-23.2020.6.21.0044 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/07/2021 às 10:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

Trata-se da prestação de contas dos candidatos ao cargo de prefeito e vice-prefeito do Município de Unistalda-RS, relativa às eleições do ano de 2020.

As contas dos recorrentes foram desaprovadas com base no parecer conclusivo de exame técnico das contas (ID 28986083), no qual foram indicadas as seguintes irregularidades: a) extrapolação no uso de recursos próprios previstos na campanha; e b) extrapolação do prazo de 10 dias para abertura da conta bancária.

No tocante à primeira irregularidade, os recorrentes alegaram que não houve extrapolação no limite de doação com recursos próprios, pois o limite de gastos deve ser considerado de forma individual, para o prefeito e o vice-prefeito, na computação de arrecadação/gastos de campanha.

Não assiste razão aos recorrentes.

Dispõe o § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A). (Grifei.)

Observe-se que o dispositivo supracitado limita ao candidato o uso de recursos próprios até o patamar de 10% calculado sobre o valor do teto de gastos do cargo ao qual o candidato concorreu.

Pois bem. É inequívoco que a chapa majoritária é una e indivisível. Não existe eleição para o cargo de vice-prefeito, existe eleição para o cargo de prefeito. Portanto, o cargo concorrido foi o de prefeito, no qual o vice-prefeito compõe a chapa.

Na legislação eleitoral, há diversas referências nesse sentido, além de o tema ser pacífico na jurisprudência. Sendo assim, o limite do autofinanciamento se dá sobre a chapa, e não sobre cada candidato individualmente.

Nesse sentido, transcrevo o fundamento exarado pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer:

(...)

Diversos dispositivos da Resolução TSE 23.607/2019 indicam que, para verificação da observância do limite de gastos para o autofinanciamento na candidatura majoritária, devem ser computados conjuntamente os recursos próprios doados pelo candidato titular e pelo seu vice.

A prestação de contas do titular da chapa, abrange a do seu vice, o qual somente pode prestar contas sozinho, na inércia do titular (arts. 45, § 3º e 77, caput e parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.607/2019). Nesse sentido, veja-se que, no extrato da prestação de contas, os recursos próprios do candidato e do vice estão somados na mesma rubrica.

O candidato a vice não é obrigado a abrir conta bancária, mas se o fizer, os extratos deverão compor a prestação de contas do titular (art. 8º, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/2019).

No tocante aos recibos eleitorais, a arrecadação realizada pelo candidato a vice utiliza os recibos eleitorais do titular (art. 7º, § 8º, da Resolução TSE n. 23.607/2019).

O candidato a vice não pode constituir fundo de caixa (art. 39, parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.607/2019).

Para aferição dos limites de gastos para contratação de pessoal para prestação de serviços referentes a atividades de militância e mobilização de rua são consideradas as contratações realizadas pelo titular e pelo vice (art. 41, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/2019).

Veja-se que, para aferição do limite global de gastos da candidatura majoritária não se discute que são somadas as receitas do titular e do vice, tanto que esse utiliza os recibos do titular. E assim é, pois, como é cediço, a chapa majoritária é una e indivisível (art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.609/2019).

Neste sentido, não é estabelecido limite para candidatura de vice, mas apenas de, ao que interessa ao caso, Prefeito. Daí que todos os valores arrecadados são somados para verificação da observância do limite global.

Não deve ser diferente em relação ao limite para o autofinanciamento, que corresponde a 10% do limite global para dada candidatura, nos termos do art. 23, § 2º-A, da Lei das Eleições:

§ 2º-A. O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer.

Não há limite global previsto para gastos de campanha no cargo de vice, o limite é estabelecido para o cargo do titular. Portanto, a norma sobre o limite do autofinanciamento, que se baseia apenas no limite para o cargo de titular, se aplica aos candidatos da chapa majoritária conjuntamente.

Essa é a interpretação que se coaduna melhor com a finalidade da norma, que é a de assegurar maior equilíbrio financeiro entre os candidatos em disputa, em prestígio ao princípio da isonomia.

Se para os candidatos à eleição proporcional se entendeu que o percentual de 10% do limite legal de gastos da campanha é o adequado, não há razão para se entender que para a eleição majoritária o percentual seria de 20% (10% do titular e 10% vice).

(...)

Restou demonstrado no parecer conclusivo que os recorrentes ultrapassaram o limite de doação com recursos próprios para a campanha, em inobservância ao disposto no § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Tendo em vista que o valor do limite de gastos nas eleições de 2020 para o cargo de prefeito no município de Unistalda foi de R$ 123.077,42, ao utilizarem recursos próprios no montante de R$ 15.681,00, os prestadores extrapolaram em R$ 3.373,26 o teto previsto na norma (R$ 12.307,74).

Desse modo, considerando-se que a irregularidade apontada (R$ 3.373,26) representa 11,13% das receitas arrecadadas pelo candidato (R$ 30.281,00), não há que se falar em proporcionalidade ou razoabilidade, devendo a irregularidade ser considerada falta grave e que compromete o controle e a fiscalização dos recursos utilizados na campanha, de forma que a manutenção da sentença de desaprovação é medida que se impõe.

No mesmo sentido a jurisprudência:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. IRREGULARIDADES: 1 E 2) DIVERGÊNCIAS ENTRE AS INFORMAÇÕES ACERCA DAS CONTAS BANCÁRIAS DECLARADAS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS E AQUELAS CONSTANTES NOS EXTRATOS BANCÁRIOS. FALHA FORMAL. 3) DIVERGÊNCIAS ENTRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA REGISTRADA NA PRESTAÇÃO DE CONTAS E AQUELA CONSTANTE DOS EXTRATOS ELETRÔNICOS. FALHA NÃO PERSISTE. 4) AUSÊNCIA DE ESCLARECIMENTOS, COM DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS, SOBRE A ORIGEM E A DISPONIBILIDADE DOS RECURSOS PRÓPRIOS APLICADOS NA CAMPANHA. REMANESCE A FALHA. 5) GASTOS IRREGULARES PAGOS COM RECURSOS DO FEFC. DOCUMENTOS APRESENTADOS SANAM A FALHA. REMANESCE A IRREGULARIDADE DO ITEM 4, QUE REPRESENTA 21,80% DOS RECURSOS ARRECADADOS. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE E DA INSIGNIFICÂNCIA. DESAPROVAÇÃO E DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO.

(TRE/SP, PC nº 060042752, Acórdão, Relator(a) Des. Marcelo Vieira de Campos, Publicação: DJE, Tomo 18, Data 27/01/2021) (Grifei.)

Contudo, embora o § 4º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19 disponha sobre a necessidade de aplicação da sanção pecuniária de até 100% sobre o valor excedido ao limite legal, tendo em vista a inexistência de condenação por parte do juízo a quo e de recurso pleiteando a aplicação da sanção, incabível a imposição de ofício por esta Corte, em observância ao princípio da non reformatio in pejus.

Por fim, os recorrentes também não afastaram a irregularidade referente à extrapolação do prazo de 10 dias para abertura da conta bancária, contados da concessão do CNPJ pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, prevista no art. 8º, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 8º É obrigatória para os partidos políticos e os candidatos a abertura de conta bancária específica, na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil ou em outra instituição financeira com carteira comercial reconhecida pelo Banco Central do Brasil e que atendam à obrigação prevista no art. 13 desta Resolução.

§ 1º A conta bancária deve ser aberta em agências bancárias ou postos de atendimento bancário:

I – pelo candidato, no prazo de 10 (dez) dias contados da concessão do CNPJ pela Secretaria da Receita Federal do Brasil;

(...)

Em suas razões, limitaram-se a afirmar que a conta bancária fora destinada ao repasse de verbas do FEFC, sendo aberta apenas quando houve a necessidade do recebimento de tais recursos.

Na realidade, ao contrário do alegado pelos recorrentes, restou demonstrado nos autos que a conta bancária fora aberta para o recebimento de doações de campanha.

Ainda, segundo consta do parecer técnico, a concessão do CNPJ de campanha ocorreu em 22.09.2020 e a abertura da conta (banco 041, agência 360, conta 609814204) em 16.10.2020, portanto, com 24 dias de atraso.

É inquestionável que a intempestividade registrada impede a aferição da correção dos valores declarados na prestação de contas em relação ao período em que não houve a abertura da respectiva conta bancária.

Assim, embora a aferição desta irregularidade, por si só, não levasse ao juízo de reprovação, a análise conjunta das irregularidades constatadas reforça a necessidade da desaprovação das contas dos recorrentes.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença que desaprovou as contas de José Gilnei Manara Manzoni e Diulinda Ferreira Pires, relativas ao pleito de 2020.