REl - 0600579-86.2020.6.21.0103 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/07/2021 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, está a merecer conhecimento.

COLIGAÇÃO SÃO JOSÉ DO OURO PARA TODOS, ACIOLI ATHANAZIO DUTRA e MAURO CEZAR DONDONI recorrem contra a decisão do juízo de origem que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral proposta em desfavor de ANTONIO JOSÉ BIANCHIN e VALENTIM GELAIN, candidatos reeleitos ao cargo de prefeito e vice-prefeito no Município de São José do Ouro em 2020, e COLIGAÇÃO SÃO JOSÉ DO OURO UNIDO PARA FAZER MAIS.

Os fatos apontados pelos recorrentes versam sobre a utilização de elementos característicos da identidade visual do município na campanha eleitoral dos recorridos, especificamente a imagem de um coração estilizado, as cores amarelo, branco e vermelho e a palavra “mais”.

O sistema legislativo busca a proteção da normalidade e legitimidade do pleito com vistas a resguardar a vontade do eleitor. Para tanto, a Constituição Federal, art. 14, § 9º, dispõe:

Art. 14. (…)

§ 9.º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

 

E a Lei Complementar n. 64/90, art. 22, prevê ação própria para fazer frente a situações de uso indevido, desvio ou abuso de poder econômico ou poder de autoridade:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

(...)

 

Na doutrina, é assente a ideia de que a configuração da prática de abuso de poder deve ser revestida de identificação da gravidade na conduta, de modo que o relevante "é a demonstração de que o fato teve gravidade suficiente para violar o bem jurídico que é tutelado, qual seja, a legitimidade e a normalidade das eleições" (ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral, 7ª Ed. Salvador: JusPodivm, 2020, p. 662).

Estabelecida tal premissa, antecipo que, na linha do posicionamento externado pela Procuradoria Regional Eleitoral, o recurso não merece provimento, pois, na hipótese, a gravidade das circunstâncias não está configurada. No campo probatório, os recorrentes acostaram imagem de três placas, uma delas em formato conhecido como outdoor. Os artefatos contam com o fundo amarelo-ouro e a frase “O ouro desta terra está no coração (desenho) de sua gente”. No outdoor, a palavra “mais” é destacada e vem acompanhada de realizações da administração municipal, e a placa localizada no centro administrativo evidencia o brasão do município. 

Ou seja, resta incontroverso que os recorridos utilizaram elementos visuais em comum com aqueles usados pela publicidade do Município de São José do Ouro, mas as práticas apresentadas não configuram abuso. Trata-se do emprego de símbolos que devem ser considerados de uso comum e livre, como a cor amarelo-ouro para a referência ao Município de São José do Ouro, ou a figura de um coração como emblema de amor ou cuidado – prática inclusive usada internacionalmente, tanto em campanhas eleitorais quanto comerciais, solidárias, beneficentes ou turísticas.

Nesse norte, não é possível estabelecer associação direta entre os elementos usados pelos recorrentes e o poder público, ou determinada administração. Aliás, constata-se que nem mesmo as cores e formas adotam absoluta identidade.

O mesmo ocorre com a expressão “mais”, inclusive com maior força, pois a campanha dos recorridos incorporou o termo na própria denominação da coligação, utilizou-a no tema musical da campanha e em meio à propaganda eleitoral veiculada na rádio. Entendo compreensível que, buscando a reeleição, a parte recorrida tenha apresentado como plataforma de campanha a proposta de fazer "mais" do que, no seu entender, havia feito. Ademais, trata-se também de expressão comum, que não guarda apelo distintivo em si mesma, pelo que entendo descabido o argumento de que seu uso colaborou com a prática de abuso de poder.

Nessa linha de raciocínio, ressalto que não encontro, individualmente ou de forma conjunta, identidade de elementos entre a publicidade institucional e as propagandas da campanha eleitoral, de modo que não é razoável considerar tenha havido prática de abuso de poder, a qual sabidamente acarreta as severas consequências de cassação dos diplomas/mandatos e inelegibilidade. Indico, apenas a título informativo, que os recorridos foram reeleitos com 74,42% dos votos.

Assim, ante a ausência de elementos que caracterizem abuso de poder, a manutenção da sentença é medida que se impõe.

Diante o exposto, VOTO para negar provimento ao recurso.