REl - 0600130-09.2020.6.21.0078 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/07/2021 às 14:00

VOTO

A prestação de contas foi desaprovada devido à emissão de cheque não cruzado para pagamento de despesas eleitorais no valor de R$ 260,00, o qual foi compensado por pessoa jurídica diversa da pessoa física prestadora do serviço, e em razão de depósito de R$ 1.000,00, em espécie, na conta de campanha do candidato, sem informação do doador originário no extrato bancário, conforme consta do seguinte trecho da sentença recorrida:

[...]

Pois bem, compulsando os autos verifico que houve aporte de recursos de origem não identificada na conta bancária do candidato, no valor de R$ 1.000,00, em manifesta contrariedade ao disposto no art. 32, § 1º, V da Resolução TSE 23.607/2019.

Devidamente intimado para se manifestar sobre a irregularidade e juntar documentos, o prestador de contas quedou-se inerte (ID 72651875).

Trata-se de irregularidade grave que compromete a lisura das contas e a fiscalização pela Justiça Eleitoral, motivo pelo qual a desaprovação das contas e o recolhimento da quantia considerada irregular ao Tesouro Nacional, no montante de R$ 1.000,00, na forma dos art. 74, inciso III da Resolução TSE 23.607/19, é medida que se impõe.

De outra banda, em pese o cheque nº 85004, no montante de R$ 260,00, ter sido compensado por pessoa jurídica diversa da pessoa física prestadora do serviço e informado no Relatório de Despesas efetuadas, contrariando as normas previstas na Resolução TSE 23.607/2019 e comprometendo a confiabilidade e regularidade das contas, inviável seu recolhimento ao Tesouro Nacional dada a ausência de previsão legal nesse sentido, já que a despesa não foi efetuada com recursos públicos.

Por fim, saliento que o julgamento das contas apresentadas está adstrito às informações declaradas pelo prestador de contas e à movimentação financeira apurada nos extratos bancários vinculados à campanha eleitoral, não afastando a possibilidade de apuração por outros órgãos quanto à prática de eventuais ilícitos antecedentes e/ou vinculados, verificados no curso de investigações em andamento ou futuras, conforme previsto no artigo 75 da Resolução TSE 23.607/19.

[...]

 

Nesta instância, com o presente recurso, o candidato fez a juntada de dois novos documentos para afastar as irregularidades constatadas, relativos ao Contrato de Prestação de Serviço firmado com Iasmin Dutra da Silva (ID 20482133) e ao comprovante de depósito em conta-corrente, em dinheiro, do valor de R$ 1.000,00, no qual consta  o número do CPF do doador originário (ID 20482233).

Assim, cumpre registrar a viabilidade do conhecimento dos novos documentos, por se tratar de documentos simples, que não demandam reexame técnico.

Quanto à primeira irregularidade, houve desconto de cheque no valor de R$ 260,00, que não foi cruzado nem emitido de forma nominal, por uma empresa, Supermercado Weege Ltda., e não pela pessoa física Iasmin Dutra da Silva, a qual efetivamente prestou o serviço de assistente de campanha.

A sentença, embora tendo apontado a falha do procedimento, deixou de determinar o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional, entendendo ausente previsão legal nesse sentido.

Em suas razões, o candidato alega que a prestadora de serviço não possuía conta bancária aberta em seu nome e que, por tal razão, o cheque foi por ela repassado ao supermercado, que efetuou o desconto do valor (Contrato de Prestação de Serviço no ID 20482133).

 Embora o candidato tenha informado que o pagamento estaria comprovado por meio de tal contrato, não foi o fornecedor que descontou o valor, como indicado no extrato bancário (ID 20481533).

De qualquer sorte, o contrato com a prestadora de serviço não afasta a irregularidade, pois o art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 é expresso ao determinar, sem exceções, que os gastos eleitorais de natureza financeira só podem ser efetuados por meio de cheque nominal e cruzado.

No caso dos autos, o recorrente permitiu que terceiros recebessem receitas de campanha, como foi verificado nos extratos bancários (ID 20481533), sem esclarecer se a real fornecedora auferira o valor contratado.

A falha impediu que a Justiça Eleitoral efetuasse o rastreamento da operação, confirmando se o fornecedor de campanha era a mesma pessoa que recebeu o valor pago com cheques.

A regra foi incluída na legislação eleitoral justamente para impedir o endosso e propiciar à Justiça Eleitoral a verificação das receitas e despesas das candidaturas de forma segura. Sua inobservância caracteriza ofensa aos princípios da confiabilidade e da transparência das contas de campanha.

Desse modo, o prestador não esclareceu se a fornecedora de campanha, que realmente prestou o serviço para a candidatura, recebeu o valor repassado pela campanha, o qual foi utilizado por terceiro que não figura na presente prestação de contas – o Supermercado Weege Ltda.

De qualquer sorte, tratando-se de exigência legal comum a todos os concorrentes ao pleito e que não admite ressalvas, não poderia o candidato contratar produtos e serviços e realizar pagamentos fora das modalidades estabelecidas no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19: cheque nominal cruzado, transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, débito em conta ou cartão de débito da conta bancária.

Assim, considerando que a norma não faz exceções, merece ser mantida a sentença nesse ponto.

A respeito do depósito em dinheiro sem identificação do doador originário, na quantia de R$ 1.000,00, o recorrente alega que a doação foi registrada nos autos da presente prestação de contas e anexa com o presente recurso cópia do comprovante de depósito em sua conta de campanha, em que consta o CPF do depositante (ID 20482233).

O comprovante de depósito com a indicação do doador por seu CPF esclarece a origem do valor depositado na conta de campanha do candidato, afastando a irregularidade quanto a esse ponto.

Esse foi também o entendimento da douta Procuradoria Regional Eleitoral ao considerar sanada, em grau recursal, a segunda irregularidade constatada nas contas: “Quanto à segunda irregularidade, alusiva ao recebimento de recursos sem identificação do doador, o recorrente juntou comprovante de depósito (ID 20482233) com a respectiva identificação do CPF do doador, documento que, à primeira vista, permite sanar a irregularidade, devendo ser reformada a sentença neste ponto”.

Verifica-se, como bem apontado pelo Parquet, que foi sanada a falha quanto à origem do depósito em espécie da importância de R$ 1.000,00, razão pela qual a sentença merece ser parcialmente reformada, afastando-se também o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional.

A irregularidade não sanada, no valor de R$ 260,00, representa 10,8% da movimentação financeira declarada, na quantia de R$ 2.410,00.

Porém, não houve determinação de recolhimento do valor na sentença e, apesar do percentual significativo diante do somatório arrecadado, as contas podem ser aprovadas com ressalvas em atenção aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, pois o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

De acordo com a jurisprudência, os aludidos princípios permitem a aprovação com ressalvas em casos de irregularidades nominalmente diminutas (Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.9.2017; TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.07.2020).

Destarte, tendo em vista que a irregularidade não sanada perfaz quantia inexpressiva, entendo que o recurso comporta provimento parcial, atendendo-se ao pedido subsidiário de que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

Por fim, reitero que o juízo a quo deixou de determinar o recolhimento de R$ 260,00 ao erário.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar as contas com ressalvas e afastar a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.000,00, nos termos da fundamentação.