REl - 0600519-73.2020.6.21.0084 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/07/2021 às 14:00

VOTO

Inicialmente, cumpre verificar se o vídeo postado no Facebook pelo candidato Nilton Pires de Quadros enquadra-se como captação ilícita de sufrágio.

A publicação, realizada em 7 de novembro de 2020, cerca de uma semana antes das eleições, divulgava a seguinte mensagem, verbis:

Meus amigos e minhas amigas, estou aqui na frente do parque José Claudio Machado, consegui uma emenda parlamentar do deputado Giovani Cherini de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) para 16 piquetes, então meus amigos, eu provo e comprovo, mato a cobra, mostro o pau e deixo o couro do bixo estaqueado. Então meus amigos dia quinze é quinze, dois patinhos na lagoa e três coraçãozinhos, vinte e dois, trezentos e trinta e três, quero trabalhar por Tapes e continuar trabalhando, um forte abraço a todos os gauchos do meu Rio Grande.

De acordo com o recorrente, na referida postagem fica “evidente a captação ilícita de sufrágio por meio do uso de promessa de vantagem aos eleitores, qual sejam, os membros de piquetes beneficiados com a ‘suposta emenda’”, ressaltando que “não se exige a potencialidade da conduta para influenciar no resultado do pleito, ao contrário, pois suficiente a simples promessa de vantagem em troca de voto para que reste caracterizado o ilícito” (ID 18653883).

O recorrente, dessa forma, pretende defender a ideia de que a captação ilícita de sufrágio, ilícito civil, restaria demonstrada em função de o vídeo estar dirigido aos eleitores de Tapes.

Entretanto, conforme concluiu o juízo a quo na sentença recorrida, a postagem não caracteriza a infração, pois o enquadramento somente ocorre se a oferta de benefício for realizada de forma concreta e individual a eleitores determinados ou determináveis, e não de forma concreta a pessoas não identificadas, litteris:

A questão é singela. Para que fique configurado a conduta vedada do art. 41-A da Lei 9.504/97 não basta a promessa genérica de vantagem. É necessário a oferta de benefício a ser obtido concreta e individualmente poer eleitor determinado ou determinável.

Conforme bem destacado pelo Parquet o caso reflete típica promessa de campanha eleitoral que não pode ser enquadrada como fato típico a justificar a incidência do art. 41-A da Lei 9504/97.

Nesse sentido já se manifestou o TSE no julgamento do REspe n. 47444, cuja ementa colaciono abaixo:

ELEIÇÕES 2016. RECURSOS ESPECIAIS. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. DISTRIBUIÇÃO DE PANFLETOS. ISENÇÃO DE TAXA CONDOMINIAL. EMPREENDIMENTOS DO PROGRAMA HABITACIONAL MINHA CASA MINHA VIDA. PROMESSA GENÉRICA. PLATAFORMA POLÍTICA. VIABILIDADE EM TESE. MÁFÉ NÃO DEMONSTRADA. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO REGIONAL. DESPROVIMENTO. In casu, o Tribunal de origem manteve a improcedência da AIJE por entender que a promessa de isenção de taxa condominial realizada de modo genérico e com respaldo em decreto municipal não caracteriza captação ilícita de sufrágio e/ou abuso de poder econômico. O art. 323 do Código Eleitoral (CE), tido por violado, não foi debatido pela Corte Regional, o que atrai a incidência da Súmula n° 72/TSE. A fundamentação do recurso quanto ao alegado abuso de poder mostra-se deficiente, o que atrai a aplicação do disposto na Súmula n° 27/TSE. A quaestio juris submetida a esta Corte cinge-se, portanto, em saber se configura captação ilícita de sufrágio a distribuição de panfletos com promessa de extinção de taxa condominial em empreendimentos residenciais inseridos no programa Minha Casa Minha Vida. POI REspe n° 474-44.2016.6.26.02061SP 2 A incidência do art. 41-A da Lei n° 9.504/97 exige prova inconteste da ilicitude consistente na promessa de bem ou vantagem pessoal capaz de interferir na liberdade de voto do cidadão - bem jurídico tutelado pela norma. Na linha da jurisprudência desta Corte, para a configuração do ilícito previsto no art. 41-A da Lei 9.504/97, a promessa de vantagem pessoal em troca de voto deve corresponder a benefício a ser obtido concreta e individualmente por eleitor determinado ou determinável. Na espécie, conforme a moldura fática delineada no acórdão regional, não houve promessa de bem ou vantagem pessoal, consoante exige a norma em epígrafe, mas, sim, promessa dirigida a uma coletividade. A delimitação dos destinatários da propaganda eleitoral - moradores dos condomínios Nova Caraguá e Jetuba - não retira o caráter genérico da promessa, uma vez que a isenção da taxa condominial beneficiaria os condôminos indistintamente. Esta Corte já decidiu que as promessas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não são capazes de atrair a incidência do art. 41-A da Lei n° 9.504/97. É assente, no ordenamento jurídico pátrio, o postulado segundo o qual a boa-fé se presume, a má-fé se prova. No âmbito da propaganda eleitoral, e aqui se incluem as promessas de campanha, verificada a dificuldade de se provar a verdade ou a falsidade daquilo que foi divulgado, presente a boa-fé, deve-se decidir a favor do candidato, em homenagem à liberdade de expressão e à preservação dos direitos políticos. O material fático-probatório avaliado pelo voto vencido apenas compõe o acórdão recorrido quando não estiver em conflito com o que descrito no voto vencedor. Consoante se depreende do voto condutor do acórdão recorrido, não há falar em ilicitude da promessa de campanha em razão da impossibilidade do seu cumprimento, uma vez que "[ ... ] a conduta dos recorridos possui respaldo no Decreto Municipal n° 634/2017, o qual autoriza a realização de serviços públicos essenciais nos condomínios 'Nova Caraguá' e 'Jetuba', com o intuito de extinguir a taxa condominial" (fi. 385). Para alterar a conclusão perfilhada no acórdão regional, seria necessário o revolvimento do acervo fáticoprobatório dos autos, providência inviável nos limites do REspe no 474-44.2016.6.26.02061SP 3 recurso especial, consoante o disposto na Súmula n° 24rrSE. A viabilidade, ao menos em tese, do cumprimento do projeto político em favor dos eleitores da referida comunidade torna a promessa de campanha lícita. De acordo com a pacífica jurisprudência desta Casa, não evidenciada a similitude fática entre o acórdão hostilizado e a hipótese confrontada, é aplicável a Súmula n° 28/TSE. Conclui-se que, no caso, não há falar em captação ilícita de sufrágio, porquanto: i) trata-se de promessa de campanha promovida de modo genérico; ii) demonstrou-se a viabilidade, ainda que mínima, de sua concretização; e iii) os recorrentes a veicularam de acordo com o primado da boa-fé objetiva. Recursos especiais desprovidos.

Ante o exposto, na forma da fundamentação acima, julgo improcedente o pedido.

 

Desse modo, a bem-lançada sentença não merece reforma.

O art. 41-A, caput e § 1º, da Lei das Eleições, que trata do ilícito cível de captação ilícita de sufrágio, estabelece que a infração ocorre quando o candidato oferece bem ou vantagem para obter o voto do eleitor, tendo a jurisprudência, na interpretação do dispositivo, firmado o entendimento de que o eleitor deve ser, no mínimo, identificável para a caracterização da infração:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990.

§ 1o Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir.

Com relação ao fato da suposta distribuição de brindes, igualmente não há razão à parte autora. Isso porque sequer demonstrou a entrega dos referidos brindes aos eleitores, de modo que se torna inviável o juízo de subsunção.

Entretanto, não se pode cogitar a ocorrência de captação ilícita de sufrágio na hipótese dos autos, pois não houve qualquer promessa ou entrega de benesse a eleitores identificados ou identificáveis em troca de votos, houve tão somente a divulgação de possível conquista de uma emenda parlamentar.

Sem a identificação do eleitor corrompido, não se configura a prática de captação ilícita de votos. E, no caso, não houve a referida identificação, mas alegação apenas genérica de que "eleitores" estariam sendo corrompidos com o suposto oferecimento de piquetes em troca de votos.

Nesse sentido, confira-se a jurisprudência do e. Tribunal Superior Eleitoral:

Representação. Captação ilícita de sufrágio.

Na linha da jurisprudência deste Tribunal, recebem-se como agravo regimental os embargos de declaração opostos contra decisão individual.

Configura captação ilícita de sufrágio o oferecimento de bem imóvel em troca de voto, sendo prescindível, para a caracterização do ilícito, a individualização dos eleitores a quem a vantagem foi ofertada.

Embargos de declaração recebidos como agravo regimental e não provido.

(TSE -ED-RO n. 272650 - Boa Vista/RR - Rel. Min. ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES - DJE 10.10.2012.)

No mesmo sentido, a douta Procuradoria Regional Eleitoral, reafirmando a decisão de primeiro grau, também concluiu que no vídeo impugnado o recorrido se dirigiu de forma genérica a eleitores indeterminados, descaracterizando a infração, verbis:

Consoante se extrai do vídeo acostado aos autos, não há uma entrega/doação ou promessa/oferta de benesse em troca do voto do eleitor. O que se verifica é apenas uma propaganda eleitoral em que o candidato informa aos eleitores acerca de recursos que já obteve para determinada atividade existente no município, o que lhe credencia para o exercício do mandato eletivo. O candidato se dirige ao eleitor para dizer o que já fez e não para, em troca do voto do eleitor, lhe conceder algum benefício.

Assim, o fato não se enquadra na hipótese de incidência do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, que pressupõe promessa, oferta, entrega ou doação em troca de voto.

Portanto, a manutenção da sentença de improcedência é medida que se impõe.

 

Dessa forma, na esteira do parecer do Parquet nesta instância, entendo não demonstrada a captação ilícita de sufrágio no fato descrito na inicial, devendo ser integralmente confirmada a sentença que julgou improcedente a ação.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.