REl - 0600683-02.2020.6.21.0096 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/07/2021 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

Trata-se da prestação de contas de candidata a vereadora relativa às eleições do ano de 2020.

As contas da recorrente foram desaprovadas com base no parecer técnico conclusivo (ID 28886683), no qual foram indicadas duas irregularidades: a) omissão relativa à despesa relacionada à Nota Fiscal n. 835, no montante de R$ 199,68, vinculada a gasto com combustível; b) dispêndio com aluguel de veículo em valor superior a 20% sobre o total de despesas da campanha.

A recorrente alegou que o aluguel do veículo para a campanha abrangia o combustível e, por isso, omitiu essa despesa em sua prestação de contas. Ainda, confessou a extrapolação no gasto com o aluguel do veículo e justificou como um erro involuntário.

Pois bem.

Adianto que as circunstâncias dos autos não permitem a aprovação das contas como requerido pela recorrente.

A emissão de nota fiscal sem o registro da despesa correspondente na prestação de contas revela indícios de omissão de gastos eleitorais, em violação ao art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

(…)

g) receitas e despesas, especificadas;

Embora a recorrente sustente a inclusão do combustível no contrato de locação, não há nenhum elemento nos autos que leve a essa conclusão. Mesmo que assim fosse, a prestação de contas deve conter a discriminação de todos os serviços e produtos contratados, com a apresentação da nota fiscal ou do recibo respectivo. Ou seja, sendo ou não verdadeira a alegação da recorrente, não a eximiria do dever de declarar/discriminar o gasto.

Nesses termos, a omissão de registro financeiro no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral há de ser considerada, tecnicamente, como recebimento de recurso de origem não identificada e, portanto, sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

Ainda, a sentença reconheceu que a despesa com aluguel de veículo automotor extrapolou o limite de 20% dos gastos de campanha, infringindo o disposto no art. 42, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 42. São estabelecidos os seguintes limites em relação ao total dos gastos de campanha contratados (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 1º):

(...)

II – aluguel de veículos automotores: 20% (vinte por cento).

No caso dos autos, a candidata realizou despesas com verbas do FEFC para o aluguel de veículo, na quantia de R$ 1.000,00. Porém, considerando o total de gastos contratados em sua campanha (R$ 2.025,80), o teto para despesas dessa natureza era de R$ 405,16. Assim, a prestadora ultrapassou o limite em R$ 594,84, o que representa extrapolação de aproximadamente 150% do valor máximo que poderia ser gasto com locação de veículos.

Nesse sentido, os argumentos da recorrente não a socorrem, uma vez que está caracterizado o ilícito quando o limite legal, objetivamente previsto, foi ultrapassado.

Por oportuno, trago à colação precedente deste Regional sobre o tema:

Recurso. Prestação de contas. Candidato. Limite de gastos. Art. 26 da Lei n. 9.504/97. Eleições 2016. Preliminar afastada. Somente é admissível a concessão de efeito suspensivo ao recurso quando a decisão atacada resultar na cassação de registro, no afastamento do titular ou na perda de mandato eletivo, consoante art. 257 do Código Eleitoral. Efeitos não vislumbrados na presente demanda, que julga contas eleitorais.

O teto percentual específico, determinado pela lei eleitoral, para aluguel de veículos automotores é de 20% em relação ao total de gastos da campanha. Limite extrapolado em acentuada porcentagem pelo prestador. Infringência que compromete a regularidade das contas. Desaprovação.

Provimento negado.

(TRE-RS – RE 247-61 – Rel. Dr. Luciano André Losekann – P. Sessão do dia 9.5.2017.) (Grifei.)

 

Cumpre ressaltar que a observância ao limite de gastos configura condição para a equiparação de oportunidades e para o tratamento isonômico entre os candidatos, impondo-se ao pretendente de mandato eletivo elaborar seus planos e estratégias de campanha de acordo com os ditames legais.

Assim, em decorrência do descumprimento da norma inserida no inc. II do art. 42 da Resolução TSE n. 23.607/19, que incide de forma objetiva, independentemente de boa-fé, desconhecimento do texto legal ou mero equívoco, o excesso cometido é falha grave, capaz de gerar a desaprovação da contabilidade, tendo em vista o comprometimento da regularidade das contas.

Por outro lado, embora a soma das irregularidades (R$ 199,68 + R$ 600,00 = R$ 799,68) representem 39,47% das receitas declaradas pela candidata (R$ 2.025,80), em termos absolutos, o montante envolvido representa valor irrisório.

O Tribunal Superior Eleitoral tem aprovado com ressalvas as contas de campanha sempre que o total das irregularidades represente valor absoluto diminuto, ainda que o percentual com relação à arrecadação seja elevado. Para tanto, a Corte superior adota como referência o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos), como uma espécie de "tarifação do princípio da insignificância", considerando a quantia o máximo absoluto entendido como diminuto, conforme demonstram os julgados abaixo colacionados:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATO. VEREADOR. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DOAÇÃO A TÍTULO DE RECURSOS PRÓPRIOS MEDIANTE DEPÓSITO BANCÁRIO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. VALOR DIMINUTO DA IRREGULARIDADE CONSIDERADO SEU VALOR ABSOLUTO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto, ainda que o percentual no total da arrecadação seja elevado. Precedentes. 2. No caso dos autos, embora o percentual da irregularidade seja elevado, aproximadamente 76%, seu valor absoluto (R$ 950,00) deve ser considerado módico, uma vez que inferior a R$ 1.064,10 (mil, sessenta e quatro reais e dez centavos – 1.000 UFIRs). 3. Manutenção da decisão. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 63967, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônica, Data 06.8.2019.) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. CANDIDATOS. DESAPROVADAS. DESPESAS COM INSTALAÇÃO DE COMITÊ DE CAMPANHA. COMPROVAÇÃO. REENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FATOS. POSSIBILIDADE. IRREGULARIDADES REMANESCENTES. PERCENTUAL INEXPRESSIVO NO CONTEXTO DA PRESTAÇÃO DE CONTAS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PRECEDENTES. PROVIMENTO MONOCRÁTICO DO RECURSO ESPECIAL PARA APROVAR, COM RESSALVAS, AS CONTAS DOS RECORRENTES. MANUTENÇÃO DA DECISÃO. AGRAVO DESPROVIDO.

1. O reenquadramento jurídico dos fatos, quando cabível, é restrito às premissas assentadas pela instância regional e não se confunde com o reexame e a revaloração do caderno probatório, providência incabível em sede de recurso especial, a teor do disposto na Súmula nº 24/TSE.

2. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para superação de irregularidades que representem valor absoluto diminuto, ainda que o percentual no total da arrecadação seja elevado. Precedentes.

3. Adota-se como balizas, para as prestações de contas de candidatos, o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) como espécie de "tarifação do princípio da insignificância" como valor máximo absoluto entendido como diminuto e, ainda que superado o valor de 1.000 UFIRs, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aquilatar se o valor total das irregularidades não superam 10% do total da arrecadação ou da despesa, permitindo-se, então, a aprovação das contas com ressalvas.

4. Tal balizamento quanto aos aspectos quantitativos das prestações de contas não impede sua análise qualitativa. Dessa forma, além de sopesar o aspecto quantitativo descrito acima, há que se aferir se houve o comprometimento da confiabilidade das contas (aspecto qualitativo). Consequentemente, mesmo quando o valor apontado como irregular representar pequeno montante em termos absolutos ou ínfimo percentual dos recursos, eventual afetação à transparência da contabilidade pode ensejar a desaprovação das contas.

5. No caso dos autos, o diminuto percentual das falhas detectadas (0,38%) – em relação ao valor absoluto arrecadado em campanha – não representa gravidade capaz de macular a regularidade das contas.

6. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 0601473-67.2018.6.24.0000, Acórdão, Relator Min. Edson Fachin, Publicação: DJE – Diário da justiça eletrônica, Data 07.5.2020.) (Grifei.)

 

No mesmo sentido, colho o seguinte aresto deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatados gastos declarados pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS – Prestação de Contas n 060069802, ACÓRDÃO de 14.7.2020, Relator DES. FEDERAL CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Publicação: PJE – Processo Judicial Eletrônico-PJE.) (Grifei.)

Assim, na hipótese dos autos, embora o percentual da irregularidade na prestação de contas da candidata seja superior ao utilizado (10%) como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas, o seu valor absoluto (R$ 799,68) deve ser considerado módico, pois inferior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos – 1.000 UFIR), sendo insuficiente para a desaprovação das contas.

Dessa forma, considerando-se o reduzido valor absoluto da irregularidade e a evidência de boa-fé da prestadora, as contas devem ser aprovadas com ressalvas, pois não ostentam gravidade suficiente para macular a sua confiabilidade.

Por fim, destaca-se que, embora haja previsão de recolhimento dos valores irregulares aos cofres do Tesouro Nacional, nos termos do § 9º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19, não tendo sido determinado pela sentença, e interposto recurso apenas pela candidata, não cabe, nesta instância, a determinação de ofício, sob pena de violação do princípio da reformatio in pejus.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de Sonia Raddatz Pawlowski.