REl - 0600183-04.2020.6.21.0041 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/07/2021 às 14:00

VOTO

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

Trata-se da prestação de contas de candidato ao cargo de vereador do Município de Silveira Martins-RS, relativa às eleições do ano de 2020.

As contas do recorrente foram desaprovadas com base no parecer conclusivo de exame técnico (ID 27375433), no qual foi indicada a irregularidade de extrapolação no uso de recursos próprios previstos na campanha.

Em suas razões, o recorrente não negou o aporte para a campanha de R$ 3.002,20 oriundos de receita pessoal. Sustentou que o excesso só ocorreu pela valorização dos recursos estimáveis no cálculo e que o valor gasto com serviços de contabilidade deve ser desprezado do montante aportado com recursos próprios, por não ser considerado despesa de campanha. Asseverou que, assim, a quantia excedente seria ínfima, situação que levaria à aprovação das contas, mesmo que com ressalvas.

Não assiste razão ao recorrente.

Dispõe o § 1º do art. 27 da Resolução TSE Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A). (Grifei.)

Observe-se que o dispositivo supracitado restringe o uso de recursos próprios do candidato até o limite de 10% sobre o valor do teto de gastos estabelecido para o cargo ao qual concorreu.

Nesse sentido, trata-se de norma objetiva, que regulamenta a arrecadação de campanha.

Assim, o fundamento evocado pelo recorrente, utilizando uma norma de despesa para afastar a aplicabilidade de uma norma de receita, não faz nenhum sentido.

Por elucidativo, transcrevo parte do parecer exarado pela Procuradoria Regional Eleitoral:

Consoante muito bem frisado na sentença, existem regras distintas a fim de disciplinar situações distintas. Uma delas trata do limite global de gastos, ao qual, de fato, não se encontram sujeitos “os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político”, nos termos do § 5º do art. 4º da Resolução TSE nº 23.607/2019. Tal norma se refere ao plano da despesa. Já a outra regra é aquela aplicada no caso, pertinente ao âmbito das receitas de campanha, e que estabelece, de maneira objetiva, que “o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer”.

Ademais, embora os dispêndios com contabilidade não estejam sujeitos ao teto de despesas eleitorais, tal situação não afasta sua natureza de “gasto eleitoral”.

Ainda, cumpre referir que, ao contrário do alegado pelo recorrente, no cálculo para aferição do excesso de doação com valores próprios, não houve consideração de recursos estimáveis.

Tendo em vista que o limite de gastos, nas eleições de 2020, para o cargo de vereador no Município de Silveira Martins, foi estabelecido na quantia de R$ 12.307,75, ao utilizar recursos próprios no montante de R$ 3.002,20, o prestador extrapolou em R$ 1.771,42 o teto previsto na norma (R$ 1.230,78).

Desse modo, considerando-se que a irregularidade apontada (R$ 1.771,42) representa 59% das receitas declaradas pelo candidato (R$ 3.002,20), não há que se falar em proporcionalidade, razoabilidade ou insignificância, devendo a irregularidade ser considerada falta grave, que compromete o controle e a fiscalização dos recursos utilizados na campanha, de forma que a manutenção da sentença de desaprovação é medida que se impõe.

No mesmo sentido a jurisprudência:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. IRREGULARIDADES: 1 E 2) DIVERGÊNCIAS ENTRE AS INFORMAÇÕES ACERCA DAS CONTAS BANCÁRIAS DECLARADAS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS E AQUELAS CONSTANTES NOS EXTRATOS BANCÁRIOS. FALHA FORMAL. 3) DIVERGÊNCIAS ENTRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA REGISTRADA NA PRESTAÇÃO DE CONTAS E AQUELA CONSTANTE DOS EXTRATOS ELETRÔNICOS. FALHA NÃO PERSISTE. 4) AUSÊNCIA DE ESCLARECIMENTOS, COM DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS, SOBRE A ORIGEM E A DISPONIBILIDADE DOS RECURSOS PRÓPRIOS APLICADOS NA CAMPANHA. REMANESCE A FALHA. 5) GASTOS IRREGULARES PAGOS COM RECURSOS DO FEFC. DOCUMENTOS APRESENTADOS SANAM A FALHA. REMANESCE A IRREGULARIDADE DO ITEM 4, QUE REPRESENTA 21,80% DOS RECURSOS ARRECADADOS. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE E DA INSIGNIFICÂNCIA. DESAPROVAÇÃO E DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO.

(TRE/SP, PC n. 060042752, Acórdão, Relator(a) Des. Marcelo Vieira de Campos, Publicação: DJE, Tomo 18, Data: 27.01.2021.) (Grifei.)

Ainda, o juízo de primeiro grau aplicou multa no montante de R$ 531,42 (quinhentos e trinta e um reais e quarenta e dois centavos), correspondentes a 30% da quantia em excesso.

A determinação de multa é consequência específica da extrapolação do limite de doação de recursos próprios para campanha estabelecido no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

[...]

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

Veja-se que a norma determina que a multa será fixada em “até 100%” da quantia em excesso. Isso porque a aplicação da sanção deve guardar íntima relação com a irregularidade cometida, atendendo aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, sem perder a seu caráter sancionatório.

Assim, levando-se em consideração a natureza da irregularidade e o seu percentual (59%), entendo que, por razões de proporcionalidade, a multa deveria ser majorada para, no mínimo, 60% do valor excedido. Contudo, tendo em vista que o recurso foi interposto apenas pelo prestador de contas, em razão do princípio da non reformatio in pejus, deve ser mantido o quantum de multa estabelecido na sentença.

Destaco, apenas, ser necessária a correção, de ofício, de erro material na sentença quanto à destinação da penalidade de multa ao Tesouro Nacional, uma vez que o valor de R$ 531,42 deve ser recolhido ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), nos termos do art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença que desaprovou as contas de Athos André Kraemer, relativas ao pleito de 2020, e o condenou ao pagamento da multa no valor de R$ 531,42, a qual, retificando-se erro material da sentença, deve ser destinada ao Fundo Partidário.