REl - 0600266-62.2020.6.21.0027 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/07/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada pela magistrada a quo devido à constatação do descumprimento dos requisitos encartados no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. Consta no parecer conclusivo que diversos pagamentos foram realizados em desacordo com a norma, sendo impossível determinar que o valor total de R$ 1.072,00 foi direcionado aos destinatários, conforme declarado.

A sentença (ID 28441183), ao encontro do apresentado no parecer da unidade técnica (ID 28441183), refere que:

Dito isto, em exame técnico das contas apresentadas, foi verificada a realização de gastos de campanha no montante não desprezível de R$ 1.072,00 por meio de cheque nominal não cruzado, fato este incontroverso, conforme documentos acostados pelos prestadores de contas (fotos dos cheques não cruzados, manifestação de fl. 83 - ID 70749928)

Intimado a manifestar-se sobre o descumprimento da regra, o prestador de contas alegou que as despesas apontadas possuem recibos e fotos juntados aos autos e que isto comprova os pagamentos efetuados. Ainda, alegou que os gastos por meio de cheque nominal se deram em virtude de orientação da gerência do banco que estaria com apenas um caixa em funcionamento e que, como forma de evitar aglomeração de pessoas na agência para troca dos cheques e prevenção à COVID-19, teria orientado no sentido de se realizar os pagamentos de forma nominal apenas.

Cumpre aqui destacar que a Resolução 23.607/2019 não prevê a exceção de juntada de fotos dos cheques e recibos como meio de suprir eventual descumprimento da norma do art. 38, I, nem eventual orientação da gerência do banco tem o condão de derrogar a força normativa das resoluções editadas pelo Tribunal Superior Eleitoral, de cumprimento obrigatório por partidos e candidatos.

Quanto à questão levantada de se evitar aglomeração para desconto dos cheques na agência, cumpre destacar que a Resolução 23.607/2019 do TSE não prevê unicamente como forma de pagamento de fornecedores de campanha o uso do cheque nominal e cruzado, prevê também a transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, débito em conta, ou, ainda, cartão de débito da conta bancária. Utilizando-se um dos demais meios de efetivação de despesas constantes do rol do art. 38 também se atingiria o fim de evitar aglomeração na agência com o devido acato à norma do art. 38. Ademais, bastaria que os fornecedores não comparecessem à agência de forma simultânea, com o devido respeito ao número máximo de clientes dentro da agência, como é a praxe corriqueira das agências no período de pandemia. Com efeito, os argumentos trazidos não são bastantes para justificar o descumprimento da regra.

Além disso, cumpre destacar que o montante de R$ 1.072,00 pago de forma irregular não é desprezível em uma candidatura para vereador de um município pequeno. Não se trata aqui de mero esquecimento de cruzar o cheque ou de irregularidade parcial, referente a apenas alguns pagamentos. Trata-se de pagamentos realizados sistematicamente em desacordo com a Resolução 23.607/2019, alcançando elevado valor para os padrões do pleito a que se referem, fato este capaz de comprometer as contas de campanha apresentadas.

A conduta do prestador fez com que considerável parte dos recursos de campanha fossem despendidos de forma potencialmente incapaz de identificar o recebedor do pagamento efetuado. A forma de realização tornou os pagamentos imunes aos instrumentos de controle disponíveis à Justiça Eleitoral – caso específico dos extratos bancários e identificação da pessoa que está a descontar o cheque, visto que o cheque não cruzado permite o seu desconto por qualquer pessoa mediante apresentação do título de crédito e sua circulação a terceiros não pertencentes à relação jurídica de fornecimento de bens ou serviços de campanha. Destaca-se que a legislação indica claramente a intenção de que toda movimentação de campanha, seja a arrecadação, como a realização de despesas declarada esteja claramente identificada por meio das informações disponíveis no Sistema Financeiro Nacional, nesse sentido a previsão de efetivação do pagamento de despesas e repasses de valores por meio de cheque nominal cruzado, transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, débito em conta, ou, ainda, cartão de débito da conta bancária.

 

O recorrente sustenta que a destinação do recurso pode ser inequivocamente identificada pelas imagens dos cheques nominais juntadas aos autos, salientando que as pessoas indicadas nas cártulas correspondem aos fornecedores, ou seja, a quem foram destinados os recursos investidos no adimplemento dos gastos eleitorais declarados.

Sem razão o recorrente.

O prestador das contas não exibiu cópia de cheque nominal e cruzado ou comprovante de transferência bancária identificando os beneficiários dos gastos, na ordem de R$ 1.072,00, conforme determina o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ademais, segundo extrato bancário eletrônico disponibilizado pelo TSE no site http://divulgacandcontas.tse.jus.br não consta, no campo CPF/CNPJ, a contraparte que teria descontado os cheques. 

É dever do prestador a observância das normas eleitorais, em especial o regramento que se destina a garantir a higidez da contabilidade e o controle dos gastos eleitorais.

Como bem demonstrado pelo ilustre Procurador Regional Eleitoral (ID 38834383):

Outrossim, as irregularidades em tela não podem ser consideradas de caráter meramente formal ou de pouca gravidade, pois os meios de pagamento previstos no art. 38 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos de campanha, e, por consequência, da veracidade do correspondente gasto.

Com efeito, tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento dos valores, apontando-se, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.

Por outro lado, se os valores não transitam pelo sistema financeiro nacional, é muito fácil que sejam, na realidade, destinados a pessoas que não compuseram a relação indicada como origem do gasto de campanha. É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes distintas, que permite, nos termos da Resolução, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes.

 

Sem a informação completa e a apresentação de documentação idônea, não é possível assegurar que o gasto eleitoral cumpriu os requisitos, que a relação jurídica é real e, enfim, que não houve nenhuma irregularidade.

Conforme consta, as irregularidades representam 77,96% das receitas declaradas (R$ 1.375,00), motivo pelo qual devem ser desaprovadas as contas.

Ante o exposto, VOTO por NEGAR PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença em sua íntegra.