REl - 0600244-67.2020.6.21.0006 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/07/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos processuais, merece conhecimento.

Trata-se de recurso de MARIA CECILIA MARIN ZULIAN contra sentença que desaprovou suas contas da campanha eleitoral de 2020, em razão do pagamento de despesa com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC (gastos com combustível e com lubrificantes) no valor de R$ 195,00 (cento e noventa e cinco reais) –, despesa não passível de ser considerada gasto eleitoral, conforme a legislação de regência – art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Acrescento que as contas manejaram o valor total de R$ 1.660,00.

A tese recursal é a seguinte:

(...) a candidata poderia ter usado os valores da conta “outros recursos” para cobrir o gasto com combustível e os valores do FEFC para pagar outras despesas legais de campanha. Ou, ainda, não ter usado valor algum para despesa com combustível de seu veículo. Então, na hipótese de existir sobra de valor do FEFC teria sido devolvido para o Tesouro.

Desta forma, nada alteraria o resultado final, qual seja: o montante total de suas despesas que são hígidas e transparentes.

 

Destaco que o raciocínio não procede, pois a legislação considera os gastos com combustível e com manutenção do veículo como gastos pessoais do candidato, e expressamente veda o uso de verba de campanha para adimplir tal espécie de despesa, estando a disposição contida no art. 35, § 6º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(…)

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;

 

Contudo, ainda que a tese defensiva não mereça guarida, o recurso merece parcial provimento, pois em momento anterior à sentença a parte trouxe aos autos Guia de Recolhimento à União, acompanhada do respectivo comprovante de depósito bancário no valor da irregularidade.

Como se percebe, a circunstância acima narrada demonstra comprometimento com a Justiça Eleitoral e, sobretudo, com a transparência das contas de campanha perante a sociedade.

Desse modo, e muito embora não seja possível, no presente momento processual, conceder quitação à recorrente – em eventual cumprimento de sentença é que a AGU poderá, por exemplo, averiguar eventuais diferenças de valor, juros moratórios, etc., – o pagamento espontâneo deve militar a favor da recorrente. 

Ademais, o valor da irregularidade é efetivamente modesto, de modo que permite a aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, como revela o julgado do Tribunal Superior Eleitoral envolvendo cifra ligeiramente maior e em percentual semelhante ao caso dos autos:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRÍNCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a r$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo. Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data: 29.9.2017.)

 

Entendo, portanto, que as contas devem ser aprovadas com ressalvas.

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de MARIA CECILIA MARIN ZULIAN, relativas às eleições de 2020.