REl - 0600426-77.2020.6.21.0095 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/07/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e adequado, comportando conhecimento.

 

Conhecimento de Novos Documentos Juntados na Fase Recursal

Inicialmente, consigno que, no âmbito dos processos de prestação de contas, expedientes que têm preponderante natureza declaratória e possuem como parte apenas o prestador, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com amparo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, mesmo que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura possa sanar irregularidades e não haja necessidade de nova análise técnica.

Potencializa-se o direito de defesa, especialmente quando a juntada da nova documentação mostra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de forma a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha, como denota a ementa abaixo colacionada:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR. JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS COM A PEÇA RECURSAL. ACOLHIDA. MÉRITO. AUSENTE OMISSÃO. DIVERGÊNCIA ENTRE OS DÉBITOS CONSTANTES NOS EXTRATOS E OS INFORMADOS NA CONTABILIDADE. PAGAMENTO DESPESAS SEM TRÂNSITO NA CONTA DE CAMPANHA. IMPOSSIBILIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA MEDIANTE A JUNTADA DE NOVOS DOCUMENTOS. INVIÁVEL NOS ACLARATÓRIOS. REJEIÇÃO. 1. Preliminar. Admitida a apresentação de novos documentos com o recurso, quando capazes de esclarecer irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. 2. Inviável o manejo dos aclaratórios para o reexame da causa. Remédio colocado à disposição da parte para sanar obscuridade, contradição, omissão ou dúvida diante de uma determinada decisão judicial, assim como para corrigir erro material do julgado. Presentes todos os fundamentos necessários no acórdão quanto às falhas envolvendo divergência entre a movimentação financeira escriturada e a verificada nos extratos bancários bem como do pagamento de despesas sem o trânsito dos recursos na conta de campanha. Não caracterizada omissão. Rejeição.

(TRE-RS - RE: 50460 PASSO FUNDO - RS, Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 25.01.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 13, Data 29.01.2018, Página 4.) (Grifei.)

 

Por essas razões, conheço da documentação juntada com o recurso.

 

Mérito

A demonstração contábil de LEANDRO JOSÉ BENETTI relativa ao pleito de 2020, no qual disputou o cargo de vereador no Município de Paim Filho, foi desaprovada pelo Juízo da 95ª Zona Eleitoral de Sananduva, devido à omissão de despesas eleitorais nos valores de R$ 455,00 e R$ 35,00 e à utilização de recursos próprios em patamar superior a 10% do limite previsto para gastos de campanha no cargo disputado, infração da qual decorreu a imposição da penalidade de multa de R$ 419,22, fazendo com que o valor total a ser recolhido ao Tesouro Nacional somasse R$ 909,22.

A sentença merece ser parcialmente reformada.

Relativamente à omissão da despesa eleitoral de R$ 455,00, observo, inicialmente, que o prestador declarou a contração de serviços de contabilidade junto à empresa Essent Jus Contabilidade e Consultoria LTDA. (CNPJ n. 25.188.538/0001-00), equivalente à quantia de R$ 650,00.

Ao apresentar prestação de contas retificadora, o candidato buscou comprovar o aludido dispêndio eleitoral por meio da NFS-e n. 6669, emitida pela empresa Essent Jus Contabilidade e Consultoria LTDA. no valor de R$ 195,00, e da NFS-e n. 158, expedida por Organizações Contábeis Cavaletti Ltda. ME (CNPJ n. 02.063.771/0001-53) no montante de R$ 455,00, haja vista contemplarem, em seu conjunto, a totalidade da despesa de R$ 650,00 (ID 29574883, fls. 1 e 2).

Atento à divergência existente entre a fornecedora informada na prestação de contas e a empresa emitente da NFS-e n. 158, o magistrado de primeiro grau considerou apenas parcialmente comprovado o gasto, remanescendo sem demonstração fiscal idônea, em contrariedade ao disposto no art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19, a diferença de R$ 455,00, a qual qualificou como dispêndio não declarado na escrituração contábil, ordenando o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, nos moldes do art. 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Quanto a esse apontamento, consigno que, segundo informações constantes na página https://www.associadas.essentjus.com.br/, a Essent Jus Contabilidade e Consultoria LTDA. presta serviços digitais de contabilidade voltados à gestão financeira de candidatos e partidos políticos, por meio de uma rede de empresas associadas em todo o Brasil, dentre as quais a Organizações Contábeis Cavaletti Ltda. ME, cuja matriz se encontra sediada na Avenida Rio Grande, n. 804, sala 01, no Município de Paim Filho (http://www.contabeiscavaletti.com.br/site/empresa/).

Ademais, inexiste dúvida de que o candidato contratou o escritório de contabilidade local, porquanto também foi declarada despesa no valor de R$ 100,00 com serviços contábeis prestados por Organizações Contábeis Cavaletti Ltda. ME (ID 29574133), comprovada por intermédio da NFS-e n. 142 e do recibo da transferência eletrônica identificada (ID 29575033), contratação que, esclareço, não foi objeto de apontamento no julgamento das contas.

Diante desse cenário, mostra-se verossímil a alegação do candidato no sentido de ter havido equívoco na emissão das notas fiscais correspondentes aos serviços de contabilidade prestados à sua campanha, muito embora tenha deixado de apresentar o respectivo instrumento contratual que embasou o ajuste, a partir do qual seria possível esclarecer a forma de contratação e de remuneração estipulada a cada uma das empresas envolvidas e a eventual previsão de repasse financeiro entre elas.

De qualquer sorte, na hipótese, restou comprovado que a NFS-e n. 158, emitida pela empresa Organizações Contábeis Cavaletti Ltda. ME no valor de R$ 455,00, foi cancelada, como demonstra o carimbo aposto no documento (ID 29576633, fl. 5), em conformidade com o disposto nos arts. 59 e 92, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Logo, no contexto dos autos, é inviável vincular tal documento a uma despesa eleitoral autônoma que foi omitida na prestação de contas, assim como caracterizar o uso de recursos sem identificação de origem para o seu pagamento, não incidindo, por conseguinte, a ordem de transferência do valor de R$ 455,00 ao erário, com esteio no art. 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Considero, ainda, que o cancelamento da NFS-e n. 158 não impacta negativamente o exame da regularidade do gasto eleitoral contraído perante a fornecedora Jus Contabilidade e Consultoria LTDA. no montante de R$ 650,00, conforme discriminado na escrituração contábil.

Isso porque, para a quitação dessa despesa, foi emitido boleto bancário no exato valor de R$ 650,00, documento no qual constaram a empresa Essent Jus Contabilidade e Consultoria LTDA. como beneficiária do crédito e o recorrente como pagador (ID 29576583).

O boleto foi quitado por meio de operação identificada com os dados da prestadora Essent Jus Contabilidade e Consultoria LTDA., como mostra o extrato da conta-corrente da campanha disponibilizado no Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, na página do TSE na internet, assim como o recibo da transferência eletrônica (ID 29574883, fl. 3), documento que pode ser equiparado ao comprovante de pagamento bancário, elencado como meio alternativo à documentação fiscal para a comprovação dos gastos eleitorais no art. 60, § 1º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Dessa forma, nada obstante a ausência de documento fiscal comprobatório da integralidade dos serviços prestados pela empresa Essent Jus Contabilidade e Consultoria LTDA. no valor de R$ 650,00, a despesa foi devidamente escriturada, sendo que os elementos acostados aos autos comprovam suficientemente a sua contratação e a movimentação da receita financeira realizada para o seu pagamento, inexistindo, também sob esse enfoque, a obrigatoriedade de transferência da diferença de R$ 455,00 ao erário contida no comando sentencial, uma vez que preservadas a confiabilidade e a transparência das contas.

Em desfecho à análise deste tópico recursal, apenas para evitar eventual alegação de omissão no julgado, esclareço que a NFS-e n. 148 (ID 29576633, fl. 1), apesar de ter sido cancelada, como aduzido nas razões recursais, foi emitida pela empresa Organizações Contábeis Cavaletti Ltda. ME, no valor de R$ 455,00, em decorrência de serviços prestados à candidata Sidia Lurdes Martini Bessegato, não guardando relação de pertinência com os dispêndios efetuados pelo recorrente durante a campanha.

No tocante à omissão do gasto eleitoral de R$ 35,00, verifica-se ter havido erro material da sentença, porquanto não corresponde a nenhuma das irregularidades detalhadas no parecer conclusivo e tampouco foi localizado nos autos documento fiscal a ele referente, ao efeito de caracterizar a omissão do candidato quanto às informações prestadas a esta Especializada.

Embora não tenha havido irresignação do candidato quanto a essa despesa, o apontamento não subsiste como fundamento válido à configuração de contrariedade à legislação eleitoral, devendo ser desconsiderado na apreciação dos registros contábeis, afastando-se, de ofício, a ordem do seu recolhimento ao Tesouro Nacional.

No pertinente à inobservância do teto estabelecido para o autofinanciamento da campanha, o candidato efetuou gastos com recursos próprios no montante de R$ 1.450,00, extrapolando o limite de autofinanciamento para o cargo em disputa, o qual, no Município de Paim Filho, correspondia a R$ 1.230,78 (10% de R$ 12.307,75, marco informado pelo Tribunal Superior Eleitoral no Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, com base nas eleições municipais de 2016).

Irresignado quanto a essa irregularidade, o prestador sustentou que os honorários decorrentes da prestação de serviços advocatícios e contábeis não fazem parte da base de cálculo do limite de despesas de campanha, motivo pelo qual deveriam igualmente ser desconsiderados do montante utilizado para estabelecer a adequação ao teto de autofinanciamento de campanha, entendendo cabível o desconto dos dispêndios efetuados sob essas rubricas, no valor total de R$ 850,00.

Contudo, a argumentação não merece ser acolhida.

A matéria objeto de análise encontra-se disciplinada pela Resolução TSE n. 23.607/19, em seu art. 27, verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

 

Da leitura da norma acima transcrita, infere-se que a tese articulada na irresignação, consistente em que as despesas com serviços contábeis e advocatícios, por não se sujeitarem a limitações de gastos ou que possam causar dificuldade ao exercício da ampla defesa, deveriam ser desconsideradas do cálculo para estabelecer o limite de custeio de campanha com recursos próprios do candidato, não há de prevalecer, porquanto faz confusão entre limite de gastos de campanha e limite de autofinanciamento.

O art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe sobre o montante máximo de despesas para os cargos em disputa nas eleições de 2020, e o seu § 5º prevê que os gastos de contabilidade não se sujeitam a limites que possam impor dificuldade ao exercício da ampla defesa, conforme transcrevo:

Art. 4º O limite de gastos nas campanhas dos candidatos às eleições para prefeito e vereador, na respectiva circunscrição, será equivalente ao limite para os respectivos cargos nas eleições de 2016, atualizado pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), aferido pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou por índice que o substituir (Lei nº 9.504/1997, art. 18-C).

(...)

§ 5º Os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político, não estão sujeitos a limites de gastos ou a limites que possam impor dificuldade ao exercício da ampla defesa (Lei nº 9.504/1997, art. 18-A, parágrafo único).

 

Desse modo, a campanha do candidato fica adstrita ao limite de despesas imposto pela lei para o cargo ao qual concorre, mas pode esse teto ser extrapolado, desde que tal excesso seja utilizado exclusivamente para pagamento de serviços advocatícios ou contábeis relacionados à prestação de serviços em sua campanha eleitoral e em favor desta, ou a processo judicial pertinente, entendimento que está em consonância com a informação disponibilizada no sítio deste Tribunal na internet, no bojo de respostas aos questionamentos mais frequentes sobre prestação de contas nas eleições de 2020, consoante aludido nas razões recursais.

De outra banda, o art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 trata do autofinanciamento de campanha, estabelecendo que o candidato somente poderá empregar recursos próprios até o máximo de 10% do limite de valor previsto para gastos atinentes ao cargo em que concorrer, não havendo exceção a tal preceito.

Consequentemente, verifica-se que o limite para custeio da campanha com recursos próprios é objetivo, aferido a partir de simples equação matemática em relação ao marco legal de gastos relacionados ao cargo em disputa, de forma que as alegações expendidas pelo recorrente não encontram respaldo na legislação afeta ao tema.

Portanto, a exceção legal que permite extrapolar o teto estipulado para gastos de campanha com despesas relativas a serviços advocatícios ou contábeis não determina que o limite de utilização de recursos próprios (autofinanciamento) seja, pelas mesmas razões, aumentado.

Nessa perspectiva, o art. 45, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 é expresso ao estabelecer a responsabilidade solidária entre o candidato, a pessoa por ele eventualmente indicada para elaborar suas contas e o profissional de contabilidade que acompanha a arrecadação de recursos e a realização de gastos eleitorais, em relação às informações financeiras e contábeis de sua campanha, inclusive no que se refere à adequada interpretação e aplicação das disposições legais pertinentes, sendo inviável afastar a irregularidade cometida pelo RECORRENTE.

Assim, tendo o candidato ultrapassado o limite permitido para utilização de recursos próprios, não merece reparo a decisão de primeiro grau no ponto em que considerou ter havido excesso de arrecadação.

Registro que, no caso dos autos, o total de recursos utilizados na campanha é proveniente do candidato, motivo pelo qual ganha maior relevância a aplicação da lei no sentido de obedecer ao limite imposto, de modo a resguardar a paridade dos candidatos na disputa eleitoral, evitando situações de abuso de poder econômico.

Todavia, como o prestador utilizou recursos próprios na monta de R$ 1.450,00, o limite legal de gastos de R$ 1.230,78 foi extrapolado em apenas R$ 219,22, e não em R$ 419,22 como calculou o magistrado a quo, devendo ser corrigido, de ofício, o erro material da sentença quanto a esse aspecto.

Por conseguinte, em observância ao art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, também deve ser adequado de ofício o valor da penalidade de multa para R$ 219,22, o qual equivale a 100% do excesso, percentual adotado na sentença e que deve ser mantido nesta instância por inexistir justificativa à sua redução na hipótese concreta.

Relativamente ao juízo de desaprovação da contabilidade exarado em primeira instância, a pretensão recursal também merece ser parcialmente acolhida.

Sob esse prisma, o excesso de arrecadação de recursos próprios no montante de R$ 219,22 subsiste como única irregularidade nas contas.

Nada obstante este valor represente 15,11% das receitas arrecadadas pelo candidato (R$ 1.450,00), a sua expressividade absoluta é reduzida, sendo, inclusive, bastante inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR) que a disciplina normativa das contas considera módico, de maneira a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e a dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Nessa linha, a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e deste Tribunal admite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para afastar o severo juízo de desaprovação das contas quando, a despeito da elevada equivalência relativa da falha frente ao conjunto das contas, o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referencial a quantia de R$ 1.064,10, como colho das seguintes ementas:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016".

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 27324, Acórdão, Relator(a) Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data: 29.09.2017.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS, PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.7.2020.) (Grifei.)

 

Destarte, como a irregularidade perfaz quantia de diminuta expressividade econômica, entendo pela aprovação das contas com ressalvas em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, sem prejuízo do dever de recolhimento da sanção pecuniária no valor de R$ 219,22, em consonância com o disposto no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assinalo, ainda, ser necessária a correção, de ofício, do erro material da sentença quanto à destinação da penalidade de multa ao Tesouro Nacional, uma vez que a sua aplicação tem respaldo no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e no art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97, devendo o valor correspondente ser recolhido ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), como previsto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

Por fim, consigno que a regra disposta no art. 37, § 12, da Lei n. 9.096/95, sobre a qual recaiu o pedido de prequestionamento formulado pelo candidato para fins de acesso à instância recursal superior, não tem aplicação nos processos de prestação de contas de campanha, mas somente naqueles que versam sobre contas partidárias anuais.

A sua correspondência normativa no âmbito da disciplina das contas de campanha encontra-se no art. 30, § 2º-A, da Lei n. 9.504/97, o qual estabelece que erros formais e materiais irrelevantes, que não comprometem o resultado, não acarretam a rejeição da contabilidade eleitoral, regramento que restou observado no presente julgamento em que as contas estão sendo aprovadas com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e provimento parcial do recurso interposto por LEANDRO JOSE BENETTI, para aprovar com ressalvas as suas contas relativas ao pleito de 2020, afastando o dever de recolhimento da quantia de R$ 455,00 (quatrocentos e cinquenta e cinco reais) ao Tesouro Nacional e, corrigindo, de ofício, erros materiais da sentença, afastar a ordem de transferência da importância de R$ 35,00 (trinta e cinco reais) ao erário, assim como reduzir o valor da penalidade de multa para R$ 219,22 (duzentos e dezenove reais e vinte e dois centavos), o qual deve ser recolhido ao Fundo Partidário, com fundamento nos arts. 27, § 4º, e 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, c/c o art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.

É como voto, Senhor Presidente.