REl - 0600855-97.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/07/2021 às 14:00

VOTO

A prestação de contas foi desaprovada devido à omissão de registro de despesas no valor de R$ 1.500,00, quantia que representa 5,55% da movimentação financeira declarada, de R$ 27.000,00, sem que fosse possível verificar a identidade do doador originário dos recursos, conforme consta do seguinte trecho da sentença recorrida:

No tocante à falta de registro das despesas com advogado e contador, em que pese a juntada dos contratos firmados com os prestadores de serviços, as despesas não foram registradas na prestação. O prestador de contas alega que há orientação no manual de prestação de contas no sentido de que as referidas despesas não fazem parte dos limites de gastos eleitorais, nesse ponto assiste razão ao candidato. Nos termos do art. 4º, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/2019:

Art. 4º

[...]

§ 5º Os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político, não estão sujeitos a limites de gastos ou a limites que possam impor dificuldade ao exercício da ampla defesa (Lei nº 9.504/1997, art. 18-A, parágrafo único).

Contudo, embora não sejam considerados para o cálculo do limite de gastos, são considerados gastos eleitorais, conforme Resolução TSE n. 23.607/2019:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(...)

VII - remuneração ou gratificação de qualquer espécie paga a quem preste serviço a candidatos e a partidos políticos;

O prestador de contas assevera ainda que as referidas despesas foram pagas com recursos próprios do candidato, sem contudo comprovar o alegado. Como consequência, o valor correspondente ao da omissão é considerado como de origem não identificada, devendo ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32 da Resolução TSE n. 23.604/2019.

 

Em suas razões, a parte recorrente sustenta que deixou de registrar a despesa efetuada em virtude de ser esta a orientação do manual de prestação de contas. Aduz que não teve a intenção de ocultar tal gasto da Justiça Eleitoral, tanto que juntou às demonstrações contábeis os contratos feitos com os profissionais de contabilidade e advocacia.

Entretanto, como bem apontado pela Procuradoria Regional Eleitoral, tanto o parecer conclusivo (ID 30102183) quanto a sentença (ID 30102333) assentam que, embora conste no referido manual o § 5º do art. 4º da Resolução TSE n. 23.604/19, estabelecendo que despesas com contador e advogado não estão sujeitos a limites de gastos, estas devem estar presentes nas contas do candidato (ID 39263683).

Ademais, ainda que tenha anexado aos autos os contratos (ID 30100933 e 30100883), o recorrente não se desincumbiu de demonstrar a origem dos recursos para efetuar o adimplemento dos custos contábeis e advocatícios. Portanto, tais documentos não suprem a necessidade de comprovação da fonte dos valores utilizados para pagamento da referida despesa.

Todavia, apesar de o valor ser superior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIR), que a disciplina normativa considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), a irregularidade representa apenas 5,55% da receita declarada, permitindo, conforme jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para a aprovação com ressalvas.

Diante disso, colho excerto do bem-lançado parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral, que adoto como razões de decidir:

O recorrente alega que os gastos com assessoria contábil e jurídica “não constaram na prestação de contas, tendo em vista a orientação no manual de prestação de contas onde menciona que as mesmas não fazem parte dos limites de gastos eleitorais”. Salienta que tais gastos em nenhum momento foram omitidos, pois os respectivos contratos foram inseridos na prestação de contas via sistema SPCE. Postula, ao final, pela aprovação das contas com ressalvas.

De início, conforme muito bem pontuado pela sentença e pelo parecer conclusivo, o fato de as despesas com advogado e contador não estarem sujeitas a limite de gastos na forma do art. 4º, § 5º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, não conduz à conclusão de que não devem ser informadas na prestação de contas, bem como a origem dos recursos utilizados para satisfazê-las. Nesse sentido, é claro o § 3º do art. 35 da mesma Resolução, segundo o qual “as despesas com consultoria, assessoria e pagamento de honorários realizadas em decorrência da prestação de serviços advocatícios e de contabilidade no curso das campanhas eleitorais serão consideradas gastos eleitorais, mas serão excluídas do limite de gastos de campanha”. Tal disposição, aliás, reproduz literalmente o texto do art. 26, § 4º, da Lei nº 9.504/97.

Outrossim, não obstante os contratos referentes aos serviços contábeis e de advogado terem sido juntados na prestação de contas, tem-se que, além de as despesas correspondentes não terem sido registradas, o que a princípio constituiria um mero erro material, a unidade técnica também constatou que “não existem registros dos recursos no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE-Cadastro) e não foi possível confirmar a origem dos valores empregados no pagamento dos citados documentos”, razão pela qual tais recursos, que não transitaram pelas contas bancárias de campanha, foram considerados tecnicamente como de origem não identificada.

Nesse sentido, consoante o art. 32, § 1º, VI, da Resolução TSE nº 23.607/2019, “caracterizam o recurso como de origem não identificada: (...) os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução”.

Assim, caracterizado o recebimento de recursos de origem não identificada, está correta a sentença na parte em que reconheceu a irregularidade em tela, determinando o recolhimento do valor equivalente a R$ 1.500,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Contudo, a irregularidade em questão representa apenas 5,55% das receitas declaradas (R$ 27.000,00), ficando abaixo do percentual (10%) utilizado como limite para permitir a aprovação das contas com ressalvas na esteira da jurisprudência dessa egrégia Corte.

Acerca da incidência dos aludidos princípios sobre irregularidades nominalmente diminutas, cumpre trazer à colação precedente do Tribunal Superior Eleitoral apontando a possibilidade de aprovação das contas com ressalvas:

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREFEITO. DESAPROVAÇÃO NA ORIGEM. DOAÇÕES. RECURSOS PRÓPRIOS. DEPÓSITOS BANCÁRIOS. ART. 18, § 1º, DA RES.TSE Nº 23.463/2015. DESUMPRIMENTO. PERCENTUAL DIMINUTO DA IRREGULARIDADE APONTADA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MANUTENÇÃO DA DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO. 1. ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREFEITO. DESAPROVAÇÃO NA ORIGEM. DOAÇÕES. RECURSOS PRÓPRIOS. DEPÓSITOS BANCÁRIOS. ART. 18, § 1º, DA RES.TSE Nº 23.463/2015. DESUMPRIMENTO. PERCENTUAL DIMINUTO DA IRREGULARIDADE APONTADA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MANUTENÇÃO DA DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO. 1. ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREFEITO. DESAPROVAÇÃO NA ORIGEM. DOAÇÕES. RECURSOS PRÓPRIOS. DEPÓSITOS BANCÁRIOS. ART. 18, § 1º, DA RES.TSE Nº 23.463/2015. DESUMPRIMENTO. PERCENTUAL DIMINUTO DA IRREGULARIDADE APONTADA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MANUTENÇÃO DA DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO. 1. ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. PREFEITO. DESAPROVAÇÃO NA ORIGEM. DOAÇÕES. RECURSOS PRÓPRIOS. DEPÓSITOS BANCÁRIOS. ART. 18, § 1º, DA RES.-TSE Nº 23.463/2015. DESUMPRIMENTO. PERCENTUAL DIMINUTO DA IRREGULARIDADE APONTADA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. MANUTENÇÃO DA DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. PARCIAL PROVIMENTO. 1. A partir das eleições de 2016, a jurisprudência desta Corte Superior se firmou no sentido de que "as doações acima de R$ 1.064,10 devem ser feitas mediante transferência eletrônica, nos exatos termos do art. 18, § 1º, da Res.-TSE 23.463, e o descumprimento da norma regulamentar não é (AgR-REspe nº 254-76/RS, Rel. Min. reputado como falha meramente formal" Sérgio Silveira Banhos, DJe de 2.8.2019 e AgR-REspe nº 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018). O mesmo entendimento foi fixado no tocante às doações de recursos próprios dos candidatos (AgR-REspe nº 265-35/RO, Rel. designado Min. Rosa Weber, DJe de 20.11.2018). 2. No caso concreto, o recorrente efetuou dois depósitos que totalizam R$ 7.000,00 (sete mil reais), cuja expressão econômica, no volume da campanha, foi de 9,37% dos recursos movimentados. 3. Delineado esse contexto, a irregularidade não revela a magnitude necessária para ensejar a desaprovação das contas, diante do pequeno percentual que representa e por não comprometer a totalidade das contas apresentadas. 4. A iterativa jurisprudência deste Tribunal Superior tem assentado a possibilidade de aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para a aprovação das contas, com ressalvas, quando o percentual apontado como irregular for baixo e não comprovada má-fé do candidato. Precedentes. 5. Diante do reduzido percentual tido por irregular e à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, as contas devem ser aprovadas, com ressalvas, sem prejuízo da manutenção da determinação de ressarcimento ao Erário do valor movimentado de forma irregular. 6. Recurso especial parcialmente provido.

(TSE – RESPE n. 00003697420166080010 IBATIBA - ES, Relator: Min. Og Fernandes, Data de Julgamento: 04.6.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 170, Data: 26.8.2020, pp. 173-180.) (Grifei.)

 

Destarte, tendo em vista que as irregularidades perfazem quantia de percentagem diminuta, entendo que o recurso comporta provimento parcial, atendendo-se ao pedido de que as contas sejam aprovadas com ressalvas, ressaltando que permanece o dever de recolhimento ao erário, na forma do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, dos recursos de origem não identificada verificados na contabilidade.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar as contas com ressalvas e manter a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.500,00, nos termos da fundamentação.