REl - 0600638-33.2020.6.21.0052 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/07/2021 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo.

Cuida-se de irresignação contra sentença que aprovou com ressalvas as contas de candidatura ao cargo de vereador, nas eleições de 2020, de MARGARETE DA SILVA DE SOUZA e determinou o recolhimento de R$ 1.909,23 ao Tesouro Nacional. A Procuradoria Regional Eleitoral opina pelo não conhecimento do recurso, ao argumento central de ausência de dialeticidade.

As razões são as seguintes, em seus exatos termos:

Insurge-se a recorrente, face a sentença prolatada, eis que equivocada, ou seja, a candidata extrapolou em 2,76%, o que equivale a R$: 339,23 (trezentos e trinta e nove reais e vinte e três centavos), do limite de gastos permitidos, com recursos próprios, conforme citado pela própria sentença recorrida, tratando-se de fato isolado, ou seja, a candidata teve gastos que superaram o limite permitido, não tendo alternativa, por ser fato atípico e sem dolo, a não ser cobrir com recursos próprios seus gastos eleitorais. Ocorre que houve equívoco ao determinar o recolhimento de R$: 1.909,23 (um mil novecentos e nove reais e vinte e três centavos), conforme dispositivo final da sentença, ou seja, o valor excedido a ser recolhido ao Tesouro Nacional é de R$: 339,23 (trezentos e trinta e nove reais e vinte e três centavos), o que equivale à 2,76% do valor excedido com doação de recursos próprios. Diante do exposto, buscando corrigir o equívoco constatado na presente decisão, requer sejam os autos remetidos à instancia superior, para julgamento de aprovação, sem ressalvas, eis que o valor a ser ressarcido pela candidata, caso haja essa determinação é de R$: 339,23 (trezentos e vinte e nove reais e vinte e três centavos) e não, SMJ, o valor que constou na decisão final, de R$: 1.909,23 (um mil, novecentos e nove reais e vinte e três centavos), corrigindo-se, assim, o equívoco e a contradição constatada nos termos da sentença. 

Desde já, destaco que estou em conformidade com o posicionamento externado pelo Procurador Regional Eleitoral, pois o recurso é desprovido de razões que justifiquem e demonstrem a insurgência contra a decisão.

Nesses termos, preenchidos os pressupostos de admissibilidade, recebo o recurso interposto, mas dele não conheço.

Com efeito, conforme o princípio da dialeticidade, cabe ao recorrente impugnar a sentença e atacar objetivamente os pontos que pretende ver reformados, o que a candidata deixou de fazer.

Destaco que, no caso em exame, a prestadora ateve-se a concordar que extrapolou o limite de gastos com recursos próprios em R$ 339,23 e confundiu a ordem de recolhimento de R$ 1.909,23 com um suposto erro do juízo sentenciante, ignorando o recebimento de R$ 1.570,00 em espécie e “na boca do caixa”, situação que caracteriza o percebimento de recurso de origem não identificada.

Tem-se, portanto, por inexistente o recurso.

Nesse sentido o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou:

“... a reprodução, na apelação, dos argumentos já lançados na petição inicial ou na contestação não é, em si, obstáculo bastante para negar conhecimento ao recurso (...). Desde que o recorrente fundamente sua irresignação e manifeste de forma clara seu interesse na reforma da sentença, rebatendo os fundamentos do julgamento prolatado pela instância de origem, não resta prejudicado o Princípio da Dialeticidade Recursal. ” (sic, AgRg no AREsp 175517 MS 2012/0092352-7 STJ, publicado em 27.06.2012.)

 

Na mesma senda, a Súmula TSE n. 26 enuncia que "é inadmissível o recurso que deixa de impugnar especificamente fundamento da decisão recorrida que é, por si só, suficiente para a manutenção desta".

Como se observa, exige-se que o recorrente rebata os fundamentos do julgado prolatado pela instância de origem a fim de que seja observado o já mencionado princípio da dialeticidade.

A respeito deste princípio, que rege o direito de recorrer, ensina NELSON NERY JR.:

Vige, no tocante aos recursos, o princípio da dialeticidade. Segundo este, o recurso deverá ser dialético, isto é, discursivo. O recorrente deverá declinar o porquê do pedido de reexame da decisão. Só assim a parte contrária poderá contra-arrazoá-lo, formando-se o imprescindível contraditório em sede recursal. 

O procedimento recursal é semelhante ao inaugural de ação civil. A petição de interposição de recurso é assemelhável à petição inicial, devendo, pois, conter os fundamentos de fato e de direito que embasariam o inconformismo do recorrente, e, finalmente, o pedido de nova decisão. Tanto é assim, que já se firmou ser causa de inépcia a interposição de recurso sem motivação. (...). Em nosso sentir, a exposição dos motivos de fato e de direito que levaram o recorrente a interpor o recurso, bem como o pedido de nova decisão em sentido contrário ao que restou decidido, são requisitos essenciais e, portanto, obrigatórios.

 

Na hipótese em análise, como já destacado, não havendo razões objetivas que confrontem a decisão atacada, diante do princípio da dialeticidade, descabe qualquer pronunciamento deste Colegiado, não se conhecendo do recurso.

Por fim, esclareço haver erro material na sentença que deve ser reparado de ofício, até mesmo porque, como demonstrado, a recorrente não se insurgiu contra os fundamentos da decisão que pretendeu hostilizar.

O reparo é concernente ao cômputo de valores como recursos de origem não identificada – RONI e, ao mesmo tempo, para fins de extrapolação do limite de uso de recursos próprios.

Em duplicidade, portanto.

De fato, os R$ 1.570,00 caracterizados como RONI deverão ser recolhidos ao Tesouro Nacional e, no ponto, andou bem a sentença; contudo, a multa de R$ 339,23 deve ser afastada, pois como bem indicado pela Procuradoria Regional Eleitoral em sua manifestação derradeira, "se a integralidade dos recursos declarados pelo candidato como recursos próprios foi tida na sentença como receita de origem não identificada, não há que se falar em autofinanciamento acima do limite legal, devendo ser afastada a multa aplicada".

 

Diante do exposto, VOTO por não conhecer do recurso e, de ofício, determinar o recolhimento de R$ 1.570,00 ao Tesouro Nacional e afastar a multa de R$ 339,23 a serem devolvidos ao Fundo Partidário.