REl - 0600573-38.2020.6.21.0052 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/07/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e adequado, merecendo ser conhecido.

 

Mérito

A demonstração contábil de ANTONIO CEZAR HIPPLER relativa ao pleito de 2020, no qual disputou o cargo de vereador no Município de Mato Queimado, foi aprovada com ressalvas pelo Juízo da 52ª Zona Eleitoral de São Luiz Gonzaga, devido ao recebimento da quantia de R$ 1.500,00 sem origem identificada e à inobservância do limite definido para utilização de recursos próprios na campanha, do que decorreu a imposição do dever de transferir ao Tesouro Nacional o valor total de R$ 1.769,22, sendo R$ 269,22 a título de multa, por força do regramento posto nos arts. 21, §§ 1º e 4º, 27, §§ 1º e 4º, e 74, inc. II, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

A sentença merece ser parcialmente reformada.

De fato, o recebimento de R$ 1.500,00, por meio de depósito em espécie na conta bancária específica da campanha, efetivado no dia 1º.10.2020, contrariou a disciplina constante do art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

 

Na dicção do § 1º do art. 21, acima transcrito, as doações financeiras provenientes de pessoas físicas ou do próprio candidato, de valores iguais ou superiores a R$ 1.064,10, devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

Nesse particular, é oportuno referir que, para fins de identificação da origem das receitas eleitorais, a pessoa física do candidato não se confunde com a sua pessoa jurídica, à qual é expedido número de CNPJ para que possa abrir conta bancária destinada ao gerenciamento dos recursos arrecadados para o financiamento da sua campanha.

Dessa forma, muito embora o RECORRENTE tenha declarado que a importância em tela era proveniente de seu patrimônio pessoal, inexiste elemento indicativo dessa alegação, a exemplo de extrato bancário de conta-corrente de sua titularidade, que demonstrasse ter efetuado saque daquela quantia na mesma data, ou em data próxima, à da efetivação do depósito em espécie na conta bancária da campanha, que assegurasse um mínimo de certeza quanto à origem da receita movimentada durante o pleito, na linha de precedentes deste Regional relacionados a eleições anteriores.

A transação bancária irregularmente realizada pelo RECORRENTE inviabilizou a identificação da real origem da quantia de R$ 1.500,00, a qual foi integralmente utilizada para a quitação de dispêndios eleitorais, devendo, portanto, ser recolhida ao Tesouro Nacional, em atendimento ao art. 21, §§ 1º e 4º, c/c o art. 32, caput e § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, este último reproduzido na sequência:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(...)

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

(…).

 

Por outro lado, como ponderou a Procuradoria Regional Eleitoral, a conclusão pela ausência de identificação da origem da receita eleitoral em comento impede que a mesma seja considerada como proveniente do patrimônio do próprio RECORRENTE, porque, como anteriormente dito, não foi produzida prova nesse sentido nos autos, e a adoção simultânea de tais premissas levaria a uma inevitável contradição interna no julgamento.

Consequentemente, entendo que a inconsistência relativa à inobservância do teto imposto ao autofinanciamento da campanha no Município de Mato Queimado nas eleições de 2020 — fixado em R$ 1.230,78 —, assim como a imposição da penalidade de multa dela decorrente, arbitrada em R$ 269,22 pelo magistrado de primeiro grau, nos termos do art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, devem ser excluídas do comando decisório.

Logo, a irregularidade restringe-se à violação da norma contida no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, alcançando a cifra de R$ 1.500,00.

Sob esse aspecto, nada obstante a falha ostente significativa expressividade econômica e corresponda à totalidade das verbas auferidas pelo prestador, cenário em que este Regional, na linha da orientação firmada pelo Tribunal Superior Eleitoral, tem reiteradamente desaprovado a escrituração contábil de participantes do pleito, a matéria foi devolvida a este Colegiado por força da interposição de recurso exclusivamente pela defesa do candidato, restando inviabilizado o agravamento da sua situação jurídica no processo mediante a emissão de juízo pela desaprovação da contabilidade, por incidência do princípio da vedação da reformatio in pejus.

Registro, em desfecho, que a mera anotação de ressalvas no julgamento das contas não exime o RECORRENTE do dever de recolhimento da quantia de R$ 1.500,00, cuja origem não foi identificada, em consonância com o disposto no art. 79, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e provimento parcial do recurso interposto por ANTONIO CEZAR HIPPLER no sentido de, mantendo o juízo de aprovação com ressalvas das suas contas relativas ao pleito de 2020, reduzir o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), com fundamento no art. 74, inc. II, c/c o art. 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

É como voto, Senhor Presidente.