REl - 0600464-77.2020.6.21.0099 - Voto Vista - Sessão: 06/07/2021 às 14:00

Eminentes colegas,

A questão versa sobre a proposta de alteração de jurisprudência firmada por esta Corte, nos autos da PC 0602974-40.2018.6.21.0000, na sessão de 09.12.2019, sob a relatoria do eminente Desembargador Eleitoral André Luiz Planella Vilarinho, na qual ficou estabelecido o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional do gasto eleitoral, quando não comprovada a sua quitação por meio das hipóteses estabelecidas no art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17, ou seja, por cheque nominal, transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário ou débito em conta.

Com a devida vênia ao nobre Relator, estou divergindo, neste caso, quanto à conclusão para afastar o dever de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, e, consequentemente, para alterar o entendimento jurisprudencial desta Corte.

A primeira consideração a ser feita é que não houve reforma do TSE quanto ao entendimento firmado por esta Corte nos autos da PC 0602974-40.2018.6.21.0000, conforme ressaltado pelo Ilustre Relator.

Consoante jurisprudência colacionada no voto, em especial o Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral n. 060226505, o qual analisou questão julgada pelo TRE-RS que versava sobre circunstância análoga, o TSE desproveu o recurso interposto pelo Ministério Público Eleitoral que pleiteava, justamente, a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional não deferida por este Tribunal.

Na realidade, a jurisprudência citada traz decisão do TSE vinculada a entendimento antigo desta Corte, entendimento anterior à alteração realizada na PC 0602974-40.2018.6.21.0000, no qual se atribuía valoração diversa à prova, situação, portanto, que levava a Corte à conclusão diferente quanto ao dever de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional pelo descumprimento art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17, hoje revogado pelo art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Importa ressaltar que nesse julgado, e nos outros trazidos pelo Relator, o TSE, em sua fundamentação, nos trouxe três orientações:

1) que a realização de despesas sem a observância dos meios previstos no art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/2017 não implica, por si só, a obrigação de restituir ao Erário os valores correspondentes;

2) que a obrigação de restituição ao Erário previsto no §1º do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17 pressupõe a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida; e

3) que os Tribunais possuem competência soberana na valoração da prova.

Veja-se que a discussão sob exame esbarra na valoração probatória, ou seja, na compreensão da Corte sobre a capacidade de uma prova demonstrar ou não, a devida utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) e assim, determinar ou não, seu recolhimento ao Tesouro Nacional.

E quanto a essa aferição, a Corte possui competência soberana.

Tanto é verdade que, no julgado suprarreferido, acaso esta Corte tivesse entendimento pela inidoneidade da prova ou sua incapacidade para demonstrar a correição do gasto eleitoral, e concluísse pelo recolhimento ao Tesouro Nacional pela não comprovação ou utilização indevida do FEFC, o TSE igualmente não reformaria a decisão do Tribunal por não deter competência para a análise fático-probatória.

Pois bem.

Na oportunidade do julgamento da PC 0602974-40.2018.6.21.0000, o Desembargador Silvio de Moraes, após pedir vista e acompanhar o Relator, observou que a análise da prova para a comprovação dos gastos eleitorais deveria se dar da seguinte forma:

Expostas essas premissas, a análise sistemática da Resolução TSE n. 23.553/17 permite inferir que a comprovação da devida utilização dos recursos do Fundo Partidário ou do FEFC abrange a adequada e suficiente demonstração, pelo candidato, de cada uma das etapas de realização do gasto, quais sejam:

a) a arrecadação, para a qual a normatização condiciona o uso de operações capazes de atestar a origem do recurso (art. 22 da Resolução TSE n. 23.553/17);

b) a contratação, que demonstra a existência e o objeto do gasto, por meio de apresentação da nota fiscal ou de outros documentos subsidiários, conforme o caso (art. 63 da Resolução 23.553/17); e

c) o adimplemento, necessariamente efetuado por formas que atestem que o débito foi efetivamente quitado junto ao fornecedor declarado nas contas (art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17).

A comprovação do gasto somente pode ser considerada a partir da demonstração segura de cada um desses elementos, indispensáveis ao aperfeiçoamento da própria despesa.

Nessa linha, no tocante à fase da arrecadação de recursos, este Tribunal tem firme jurisprudência no sentido de que o recebimento de doação de forma diversa de transação bancária identificada, conforme prescreve o art. 22, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17 para os valores acima do limite legal de R$ 1.064,10, sem prova alternativa quanto à fonte das doações, configura o recebimento de recursos de origem não identificada (RONI), sujeitando o prestador ao recolhimento da correspondente quantia.

Nesses termos, o seguinte julgado:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS OBRIGATÓRIOS PARA A ANÁLISE DA CONTABILIDADE. DOAÇÃO IRREGULAR. TRÂNSITO PARALELO DE RECURSOS. IRREGULARIDADES QUE COMPROMETEM 100% DAS RECEITAS DECLARADAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. A ausência de documentos obrigatórios, tais como os extratos da conta bancária, é mácula que contamina a contabilidade e impede a efetiva verificação do trânsito de valores na campanha eleitoral.

2. Doação financeira recebida de pessoa física, acima de R$ 1.064,10, realizada de forma distinta da opção de transferência eletrônica, contrariando o disposto nos arts. 22, inc. I, § 1º, e 34, § 1º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.553/17. Circunstância que caracteriza a receita como de origem não identificada, ensejando seu recolhimento ao Tesouro Nacional.

3. Doação de recurso próprio. Receita e despesa realizadas ao largo da conta bancária de campanha. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais, que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 10 e 11 da Resolução TSE n. 23.553/17, acarreta a desaprovação das contas e o recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

4. Irregularidades que representam 100% das receitas declaradas pelo prestador.

5. Desaprovação.

(TRE; PC 0603028-06.2018.6.21.0000; Relator Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga; julgado em

17.09.2019, DJE de 23.09.2019.) Grifei.

Tanto no art. 22, inc. I, quanto no art. 40, incs. I a III, da normatização referida, exige-se o atendimento a determinadas formas de operações bancárias, permitindo a verificação e a rastreabilidade dos valores. No primeiro dispositivo, a finalidade é a comprovação da origem dos recursos. No segundo, faz-se prova da quitação do débito e do destino da receita. Em ambos os preceitos, o cumprimento das transações bancárias enumeradas na Resolução é mecanismo instrumental à prova da licitude do manejo dos recursos.

Dessa forma, a simples apresentação do documento fiscal idôneo, ou outro equivalente, nos termos do art. 63, caput e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17, faz prova apenas da existência da contratação e de seus elementos intrínsecos, como o fornecedor, o objeto e o valor da despesa.

Contudo, o meio de prova é insuficiente para que se possa aferir objetivamente como ocorreu o manejo e direcionamento dos recursos públicos alegadamente utilizados.

Em outras palavras, a demonstração de efetivo pagamento ao fornecedor, por meio de procedimento bancário fiscalizável, é essencial à perfectibilização do gasto eleitoral, sem a qual não é possível concluir pela sua regularidade.

Aprofundando a compreensão do art. 40 referido, depreende-se a plena compatibilidade da norma com o posicionamento ora exposto.

Deveras, constata-se que as formas de pagamento inscritas no aludido dispositivo constituem meios pelos quais os recursos transitam necessariamente pelo sistema financeiro, permitindo o rastreamento dos valores pelos diversos órgãos administrativos de controle financeiro, como Banco Central e Receita Federal, com o repasse de informações aos órgãos técnicos de análise e fiscalização da Justiça Eleitoral. Além disso, as operações elencadas deixam inequívoca a destinação dos recursos, prevenindo manobras e intermediações tendentes à dissimulação ou ao desvio na aplicação das quantias de natureza pública, que somente devem direcionar-se exclusiva e efetivamente ao fornecedor contratado, nos exatos termos do documento apresentado para a comprovação do gasto.

Justamente, em face do indispensável trâmite pelo sistema bancário, a prova do curso dos valores deve ocorrer, a priori, por meio da apresentação dos extratos bancários ou dos extratos eletrônicos disponibilizados

pelo TSE, elementos essenciais à materialização das contas, consoante preceitua o art. 56, inc. II, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Contudo, constatando-se a omissão desses documentos quanto ao registro dos destinatários dos valores, a Resolução em questão permite ao prestador de contas oferecer documentos subsidiários, conforme recomendado, in casu, pelo órgão técnico, com supedâneo no art. 56, § 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17, que solicitou a microfilmagem do cheque nominal emitido ou o comprovante de transferência bancária.

O argumento de que a microfilmagem de cheques sequer é obrigatória na dicção fria da Resolução não elide a legitimidade da medida adotada pelo órgão técnico.

De fato, trata-se, como apontado pelo eminente relator, de “uma oportunidade conferida em benefício do prestador” para sanear as insuficiências probatórias dos extratos bancários. Assim, não logrando a parte o cumprimento deste ônus que lhe é facultado, o julgamento ocorrerá tão somente com base nos extratos, inaptos à prova da destinação dos recursos.

Assim, sendo prova complementar à deficiência dos extratos bancários, o suposto descompasso entre o prazo de diligências concedido ao prestador e o tempo necessário para o fornecimento dos documentos pelos serviços bancários não mitiga o ônus probatório do prestador de contas quanto à regularidade de suas despesas, pois lhe cabe postular fundamentadamente a dilação de prazo, se for o caso.

Igualmente, a possibilidade de circulação do cheque não lhe retira a aptidão como prova do beneficiário dos

recursos, uma vez que, a partir de eventual cadeia de endossos anotados na cártula, é possível aquilatar o caminho dos valores, desde o seu credor originário inscrito pelo sacador.

Portanto, a observância às determinações do art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17 é indispensável à comprovação da devida utilização dos recursos públicos, pois demonstra que o adimplemento contratual ocorreu a partir da fonte, na quantia, no prazo e para o fornecedor declarado nas contas.

Sem a comprovação completa, confiável e transparente sobre o destino dos recursos públicos manejados, incide o dever de restituição dos valores envolvidos ao Tesouro Nacional, com fulcro no art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17, que comina a medida quando houver a “ausência de comprovação da utilização dos recursos” ou “a sua utilização indevida”.

No mesmo sentido, a douta Procuradoria Regional Eleitoral tem reiteradamente manifestado neste Tribunal que os documentos previstos no art. 63, caput e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.553/17 não se prestam, de forma isolada, à comprovação dos gastos eleitorais, devendo, pois, ser corroborados pelos expedientes bancários informados no art. 40 e incisos da mesma Resolução. Isso porque somente a triangularização das informações, com dados provenientes de diversas fontes distintas, permite o efetivo controle dos gastos de campanha, a partir do confronto e da conferência dos elementos pertinentes.

Por sua vez, o precedente trazido no Resp n. 0600349-81.2019.6.00.0000, de relatoria do Min. Jorge Mussi, DJU de 05.09.2019, mencionado no voto do ilustre Des. Villarinho, não obstante afastado pelo voto-vista do eminente Des. Eleitoral Gerson Fischmann, a meu sentir corrobora o entendimento aqui expendido, na medida em que chancela as operações via bancos como necessárias à identificação dos beneficiários dos recursos, sob pena de restituição das dotações públicas ao Tesouro Nacional.

Com efeito, embora o caso concreto analisado no mencionado julgado tenha envolvido específica hipótese de terceirização da contratação de pessoal, a Corte Superior capitulou o fato como infringência ao art. 40 da Resolução TSE n. 23.553/17 e expressamente admitiu o recolhimento de valores advindos do FEFC por inobservância dos “modelos bancários de transação, pois apenas nesse quadro é que se pode identificar o verdadeiro destino final dos recursos”.

Retornando à hipótese sob julgamento, tendo em vista que as despesas destacadas pelo órgão técnico não registram a contraparte nos extratos bancários e que a candidata não logrou trazer aos autos as correspondentes microfilmagens dos cheques nominais ou comprovantes de transferência bancária, entendo pela ausência de devida comprovação da utilização dos recursos públicos, implicando a desaprovação das contas, com o dever de recolhimento da quantia de R$ 13.092,80 ao Tesouro Nacional, nos exatos termos do art. 82, § 1º, da Resolução TSE n. 23.553/17.

Com essas razões, e com a devida vênia aos votos divergentes, acompanho integralmente o VOTO do relator.

(Grifei.)

As razões expostas neste voto-vista integraram o voto do Relator.

Como se percebe, a partir de então a Corte passou a adotar um procedimento de valoração da prova para a comprovação da devida utilização dos recursos do Fundo Partidário ou do FEFC e, com isso, afastar o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional imposto pela norma eleitoral.

Assim, a jurisprudência atual da Corte não está divergente da atual jurisprudência do TSE, porque não impõe o dever de recolhimento ao Tesouro pelo simples descumprimento do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, mas sim pela inobservância do procedimento estabelecido por este Tribunal para a comprovação do gasto eleitoral, em relação ao qual possui competência soberana.

No caso dos autos, existiram gastos eleitorais com recursos do FEFC, realizados por meio de cheques não nominais e não cruzados, que foram descontados por terceiros.

Ou seja, além do descumprimento à forma de gasto prevista no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, restou comprovado pelas microfilmagens que os cheques não foram descontados pelos fornecedores do produto/serviço.

Para comprovar a regularidade do gasto, a prestadora juntou notas fiscais e a declaração dos fornecedores.

Consoante o procedimento para a comprovação do gasto estabelecido pela jurisprudência desta Corte, as notas fiscais teriam a capacidade de demonstrar a contratação do serviço, mas não a sua quitação. Já a declaração dos fornecedores constituiria elemento de caráter unilateral sem força probante.

Assim, a quitação do gasto eleitoral com o fornecedor não restou comprovada. Na realidade, ficou evidenciado o gasto de recursos do FEFC com terceiros, e isso não pode ser admitido pela Corte.

Nesse ponto, cumpre destacar que a própria jurisprudência do TSE não valida que o gasto eleitoral seja direcionado a pessoa diversa do fornecedor. Tal posicionamento fica evidenciado no julgamento do Recurso Especial Eleitoral n. 0600349-81.2019.6.00.0000, de relatoria do Min. Jorge Mussi, do qual extraio parte da fundamentação:

“o candidato pagou panfleteiros e militantes por meio de pessoa interposta (R$ 42.400,00 com valores provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e R$ 51.000,00 com outros recursos).

Todavia, a forma adotada não foi correta, pois tais pagamentos deveriam ser feitos diretamente aos prestadores de serviço por cheque nominal, transferência bancária ou débito em conta. Assim, ao aprovar as contas com ressalvas, houve ofensa ao art. 40, 41 e 42 da Res.-TSE 23.553/2017[1] pelo TRE/MA;

b) afronta ao art. 82, § 1º, da Res.-TSE 23.553/2017[2], pois a aprovação com ressalvas não obsta o recolhimento dos recursos indevidamente utilizados ao Tesouro Nacional;

c) prevalece na jurisprudência o entendimento segundo o qual o pagamento de fornecedores diversos mediante o saque de ‘cheque único’ é irregularidade grave, capaz de comprometer a confiabilidade da prestação de contas” (fl. 10).”

Assim, é evidente que a certeza quanto à falta de identificação entre os fornecedores dos produtos/serviços que deveriam receber o pagamento e os beneficiários dos recursos do FEFC gera indícios de utilização indevida das verbas públicas.

Por conseguinte, neste caso, a determinação do recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional está em consonância com a própria jurisprudência do TSE colacionada ao voto:

ELEIÇÕES 2018. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DESAPROVAÇÃO. DEPUTADO ESTADUAL. GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). MEIO DIVERSO DO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. ART. 40 DA RES.–TSE Nº 23.553/2017. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS IDÔNEOS. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. O Tribunal Regional, por unanimidade, desaprovou as contas de campanha relativas ao cargo de deputado estadual em virtude da utilização de recursos provenientes do FEFC por meio diverso do determinado no art. 40 da Res.–TSE nº 23.553/2017.

2. O pagamento em espécie de despesas eleitorais, conquanto implique descumprimento ao comando do art. 40 da Res.–TSE nº 23.553/2017, não tem o condão de, per se, gerar a devolução ao Erário dos valores utilizados, sendo imprescindível estar configurada sua malversação, nos termos previstos no art. 82, § 1º, da Res.–TSE nº 23.553/2017.

3. Não obstante tenha se caracterizado, in casu, o desrespeito ao art. 40 da aludida resolução, que impõe o pagamento de despesas de campanha por meio de cheque nominal ao fornecedor, transferência bancária com identificação da contraparte ou débito bancário, somente a utilização indevida ou a não comprovação dos gastos eleitorais gera a consequência jurídica prevista no art. 82, § 1º, da Res.–TSE nº 23.553/2017, isto é, a devolução dos valores ao Tesouro Nacional, medida acertadamente afastada pelo Tribunal a quo. (Grifei.)

Ademais, ressalta-se a importância de a Corte manter sua jurisprudência estável, íntegra e coerente, nos termos do art. 926 do CPC, zelando pela inexistência de decisões conflitantes.

Nesse sentido, sabendo-se que esta Corte possui jurisprudência no sentido de que a doação financeira acima de R$ 1.064,10, recebida de pessoa física (recurso privado), deve observar forma específica de comprovação (transferência eletrônica identificada), sob pena de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, não vislumbro por qual razão se entenderia pela desnecessidade de observância de forma específica para a comprovação do gasto eleitoral oriundo de recursos públicos.

De toda sorte, nada impede que esta Corte reveja o posicionamento estabelecido quanto ao procedimento para a aferição da prova, flexibilizando-o no tocante à comprovação da quitação do gasto eleitoral e, consequentemente, à aplicação do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Contudo, é fundamental, nesses casos, mesmo que não haja plena observância do artigo referido, como, por exemplo, o descumprimento da exigência de o cheque ser nominal e estar cruzado, que fique demonstrado de forma inequívoca que o gasto se deu com o fornecedor do produto/ou serviço.

Somente dessa forma estar-se-ia atingindo a finalidade da norma contida no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, que busca ligar o dinheiro ao produto ou serviço efetivamente prestado.

Com esses fundamentos, estou divergindo do eminente Relator e encaminhando o meu voto no sentido de negar provimento ao recurso interposto, mantendo a determinação de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional.