REl - 0600667-83.2020.6.21.0052 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/07/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a prestação de contas foi aprovada com ressalvas pelo magistrado a quo, porquanto foram utilizados em sua campanha eleitoral recursos próprios superiores a 10% do limite de gastos para o cargo ao qual concorreu, sendo aplicada multa equivalente a 100% da quantia em excesso, consoante excerto da sentença a seguir reproduzido:

Ainda, verifico que a candidata utilizou o montante de R$ 2.214,00 (dois mil, duzentos e quatorze reais) de recursos próprios, contrariando o disposto no Art. 27, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/2019.

Considerando que o limite de gastos para o Cargo de Vereador no município de Caibaté, para este pleito, foi fixado em R$ 12.307,75 (doze mil, trezentos e sete reais e setenta e cinco centavos), a candidata, em obediência ao Art. 27, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/2019, só poderia ter utilizado 10% (dez por cento) desse montante com recursos próprios, ou seja, no máximo, R$ 1.230,78 (um mil, duzentos e trinta reais e setenta e oito centavos).

Portanto, pode-se concluir que a candidata extrapolou o limite permitido pela legislação eleitoral em 7, 99%, que equivale a R$ 983,22 (novecentos e oitenta e três reais e vinte e dois centavos), se considerado o limite total de receitas.

Utilizando dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, entendo que a multa prevista no Art. 27, §4º, da Resolução TSE n. 23.607/2019 deve ser aplicada em seu patamar máximo, já que a candidata excedeu em, aproximadamente, 68,89% limite de recursos próprios permitidos pela legislação eleitoral.

Ambas as irregularidades são consideradas graves e, via de regra, comprometem a análise das contas e a fiscalização pela Justiça Eleitoral, implicando desaprovação das contas.

Contudo, tenho que, neste caso concreto, é merecida, por parte deste juízo, a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois as irregularidades constatadas, por se tratarem de recursos privados, não são suficientes para gerar a desaprovação das contas da candidata.

Em virtude do exposto acima, a aprovação das contas com ressalvas e o recolhimento da quantia considerada irregular ao Tesouro Nacional, no montante de R$ 983,22 (novecentos e oitenta e três reais e vinte e dois centavos), na forma dos art. 74, inciso II c/c 79 da Resolução TSE 23.607/19, é medida que se impõe.

Saliento, outrossim, que o julgamento das contas apresentadas está adstrito às informações declaradas pelo prestador de contas e à movimentação financeira apurada nos extratos bancários vinculados à campanha eleitoral, não afastando a possibilidade de apuração por outros órgãos quanto à prática de eventuais ilícitos antecedentes e/ou vinculados, verificados no curso de investigações em andamento ou futuras, conforme previsto no artigo 75 da Resolução TSE 23.607/19.

 

Irresignada, a recorrente pugna pela aprovação das contas e pelo afastamento da multa. Conquanto reconheça a falha cometida, assevera que se trata de erro formal, tendo sido necessário o aporte de recursos próprios para satisfazer os débitos decorrentes da campanha. Ainda, argumenta que não houve má-fé nem mácula à lisura do pleito e que a multa, aplicada em seu patamar máximo, ofende os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

A matéria objeto de análise encontra-se regulamentada na Resolução TSE n. 23.607/19, a qual, em seu art. 27, dispõe:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990  (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

(...)

O limite de gastos para o cargo de vereador no Município de Caibaté, nas eleições de 2020, consoante disponibilizado pelo Tribunal Superior Eleitoral no sistema Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais, foi de R$ 12.307,75.

KELI ESCOBAR RODRIGUES PIRES, por sua vez, utilizou em sua campanha para a Câmara Municipal recursos financeiros próprios no montante de R$ 2.214,00, superando, portanto, o teto de 10% estabelecido no mencionado art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, equivalente a R$ 1.230,78.

Desse modo, restou caracterizada a irregularidade, que se perfectibiliza de forma objetiva, pelo simples excesso na utilização de recursos próprios.

Não merece guarida a tese construída pela recorrente de que se trata de erro formal e que deve ser aprovada sem ressalvas a contabilidade, segundo preceitua o art. 30, § 2º-A, da Lei n. 9.504/97:

Art. 30. A Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas de campanha, decidindo:

(...)

§ 2º-A. Erros formais ou materiais irrelevantes no conjunto da prestação de contas, que não comprometam o seu resultado, não acarretarão a rejeição das contas.

Ora, as contas não foram desaprovadas, e sim aprovadas com ressalvas, justamente com base no menor comprometimento da irregularidade sobre o resultado da contabilidade, sendo descabida a invocação do aludido dispositivo para o fim de serem, agora,  aprovadas sem ressalvas.

De outra banda, não assiste razão à recorrente quando assevera que, “para higidez dos pagamentos das despesas, nenhuma alternativa havia a candidata que não utilizar recursos próprios para suprir os pagamentos”.

A escassez de receitas financeiras para a campanha não justifica a transgressão à disciplina legal acerca da arrecadação e dos gastos eleitorais.

As normas de regência estabelecem um teto para autofinanciamento, válido para todas as candidaturas no município para o mesmo cargo, visando garantir o princípio da isonomia eleitoral, mitigando os efeitos da diferença de poder econômico entre os concorrentes. Assim, é despropositado pretender que o extravasamento do patamar legal, verificado no caso, não seja interpretado como irregular sob o fundamento de ser o único para atingir o fomento financeiro pretendido pela candidata.

Do mesmo modo, eventual ausência de má-fé, ainda que possa ser valorada por ocasião da dosagem da penalidade prevista para o caso, não constitui motivo para relevar a irregularidade cometida ou deixar de aplicar a norma sancionatória.

Por derradeiro, no tocante ao pedido de redução da multa imposta, entendo que melhor sorte não socorre a recorrente.

A penalidade foi fixada em seu grau máximo, porquanto a quantia excedeu em, aproximadamente, 68,89% o limite de recursos próprios permitidos pela legislação eleitoral, mostrando-se adequada e proporcional a sanção imposta à candidata no valor de R$ 983,22.

Logo, não merece reparo a decisão do juízo a quo que aprovou o ajuste contábil com ressalvas e aplicou multa de 100% sobre o montante que extrapolou o limite permitido para utilização de recursos próprios.

Ressalto, em desfecho, ser necessária a correção, de ofício, de erro material contido na sentença quanto à destinação de tal penalidade ao Tesouro Nacional.

Em realidade, uma vez que a sanção tem respaldo no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e no art. 23, § 3º, da Lei n. 9.504/97, deve o valor correspondente ser recolhido ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), como previsto no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95, e não ao Tesouro Nacional, como especificado no comando sentencial.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a aprovação com ressalvas das contas de KELI ESCOBAR RODRIGUES PIRES, relativas às eleições de 2020, e a condenação à multa no valor de R$ 983,22, mas determinando, de ofício, a correção de erro material na sentença, para que o recolhimento do montante seja feito ao Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), com fundamento nos arts. 27, §§ 1º e 4º, e 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19 e no art. 38, inc. I, da Lei n. 9.096/95.