REl - 0600096-35.2020.6.21.0110 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/07/2021 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo, assim como preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razões pelas quais dele conheço.

Mérito

O Diretório Municipal do PROGRESSISTAS (PP) de Tramandaí busca a reforma da sentença proferida pelo Juízo da 110ª Zona Eleitoral que julgou improcedente representação por propaganda eleitoral negativa.

De início, ressalto que, no tocante à propaganda eleitoral negativa, na jurisprudência da Corte Eleitoral Superior, o voto de reprovação (“não voto”), as críticas que excedem os limites da liberdade de expressão e informação, em contexto atrelado à disputa eleitoral e à divulgação de fatos que induzem o eleitor a não votar em determinado candidato, constituem referenciais à sua caracterização, aferida em face das circunstâncias de cada caso concreto.

Para o pleito de 2020, o legislador eleitoral expressamente associou a propaganda eleitoral negativa, inclusive no período da pré-campanha, às situações de ofensa à honra e à imagem de candidatos, partidos políticos ou coligações, ou de divulgação de fato sabidamente inverídico, tendentes a desigualar a disputa entre os concorrentes do pleito, em contexto que desborde dos limites delineados pelo princípio democrático dentro do espaço político-eleitoral e que, por essa razão, requeiram a imposição de restrição ao exercício da liberdade de pensamento e de expressão, segundo o teor do art. 27, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57-A). (Vide, para as Eleições de 2020, art. 11, inciso II, da Resolução nº 23.624/2020)

§ 1º A livre manifestação do pensamento do eleitor identificado ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatos, partidos ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos.

§ 2º O disposto no § 1º deste artigo se aplica, inclusive, às manifestações ocorridas antes da data prevista no caput, ainda que delas conste mensagem de apoio ou crítica a partido político ou a candidato, próprias do debate político e democrático.

Nessa senda de garantia do direito de liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º, inc. IV, da Constituição Federal), a intervenção da Justiça Eleitoral, por intermédio da remoção de conteúdos da internet, deve ser parcimoniosa, limitando-se à restauração do equilíbrio das forças em disputa, sempre que houver ofensa a direitos das pessoas que participam do processo eleitoral, ou a difusão de informações falsas, que induzam o eleitor em erro sobre dado relevante à formação da sua convicção, conforme dispõe o art. 38, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 38. A atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deve ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J).

§ 1º Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, as ordens judiciais de remoção de conteúdo divulgado na internet serão limitadas às hipóteses em que, mediante decisão fundamentada, sejam constatadas violações às regras eleitorais ou ofensas a direitos de pessoas que participam do processo eleitoral.

No caso concreto, o PROGRESSISTAS (PP) do Município de Tramandaí ajuizou representação em face de SALEH ASAD ABDALLA JÚNIOR e do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB), atribuindo aos representados a prática de propaganda eleitoral negativa, mediante a divulgação de vídeos contendo mensagens inverídicas a respeito da honra do então prefeito e candidato à reeleição pela agremiação recorrente.

Os vídeos que vieram instruindo a peça inicial expõem as opiniões do recorrido SALEH ASAD, o qual atribui à gestão que antecedeu a atual na prefeitura o projeto de revitalização da orla de Tramandaí.

O conteúdo encerra, ainda, alegações de que o atual prefeito “omitiu ao Fundo dos Funcionários Públicos de Tramandaí o repasse de R$ 11.139.807,47, o qual parcelou em 60 parcelas de R$ 185.663,46”. A conduta teria deixado “uma prefeitura praticamente quebrada”, o que teria viabilizado que a atual administração realizasse obras de revitalização da orla de Tramandaí projetadas pela administração antecedente.

Entretanto, entendo que andou bem a sentença ao julgar improcedente a representação. Transcrevo, por oportuno, o seguinte excerto da decisão ora atacada:

(...)

Sobre o mérito, observo que a liberdade de expressão deve ser a regra para o debate eleitoral e que críticas, mormente àqueles que ocupam cargos públicos, são inerentes a tal, como bem assevera o Ministério Público.

A campanha eleitoral para o pleito de 2020, tera início em 27 de setembro, e a manifestação veiculada na rede social através da pessoa do Dr. Abdalla - contra a qual se insurge o Progressista - não caracteriza propaganda ilegal, pois refere diz com projeto da revitalização da orla de Tramandaí que teria sido projetada pelo ex prefeito Edgar Munari Rapach e executada pelo atual gestor - que teria se valido, então de projeto de anterior -, cuja divulgação não infere ofensa ou propaganda negativa ao representante. Aliás, consoante destacado pelo MP, não se trata de fato sabidamente inverídico.

Nesse passo, relembrando o acentuado em decisões de outras representações, critica, sem ofensas pessoais, são inerentes ao debate eleitoral e as urnas, dirão, sobre o abono, do povo, a esse atual modo de governar, seja pela efetiva candidatura do atual gestor, seja de algum aliado seu.

Face ao exposto, julgo improcedente a Representação.

(...)

A análise do conteúdo dos vídeos revela o mero questionamento e a crítica, dentro de limites aceitáveis e inerentes ao jogo democrático, sendo, portanto, inapto a traduzir excesso passível de contenção ou sancionamento pela Justiça Eleitoral.

Nesse aspecto, é importante ponderar que, no que se refere ao direito de crítica à atuação de autoridades públicas, a preservação da liberdade de expressão é ainda mais ampla, porque a circulação de ideias e opiniões se apresenta como um instrumento legítimo de controle social da gestão administrativa e de formação de juízos críticos por parte do eleitor, sendo, por conseguinte, fundamental à própria conformação do Estado Democrático de Direito.

Nessa linha, entendo que não houve a veiculação de informação sabidamente falsa e tampouco de ofensa à honra, de modo que acolho os fundamentos expostos no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral e os adoto como razões para decidir (ID 9215983):

Entendemos que, no caso em tela, não restou caracterizada a propaganda eleitoral antecipada negativa passível de sancionamento.

Isso porque, do teor do vídeo veiculado no perfil “Vê Tudo TV Online-Tramandaí Litoral e Região” do Facebook, que foi anexado à petição inicial, verifica-se a intenção do representado SALEH ABDALLA em realizar crítica à atual Administração Municipal de Tramandaí, referente à execução do projeto da orla marítima em detrimento do Fundo dos Funcionários Públicos do município.

Com efeito, no vídeo anexado à inicial (ID 8785033), o representado ABDALLA alega que a administração deixou de repassar verbas ao Fundo dos Funcionários Públicos de Tramandaí, parcelando as contribuições patronais devidas em 60 parcelas, sendo que a gestão atual irá pagar apenas 12 parcelas, deixado para a nova administração 48 parcelas, totalizando 9 milhões de reais.

Em relação à crítica contida no vídeo, o partido representante, ora recorrente, anexou à inicial 2 (dois) vídeos (ID’s 8785083 e 8785133), em que afirma que os recursos utilizados na construção da orla foram recursos livres e não foram retirados do Fundo dos Servidores, uma vez que o fundo apenas recebe dinheiro da Prefeitura, não tendo como retirar dinheiro do fundo.

(…)

Desse modo, não haveria, no caso, afirmação “sabidamente” inverídica, como tal aquela qualificada como patente, que tenha relação direta com o pleito em questão, e, por via de consequência, ofensa à honra ou imagem de candidatos da coligação representante.

(…)

Desse modo, forçoso reconhecer que o representado ABDALLA não extrapolou o direito de crítica e de livre manifestação do pensamento.

(…)

Considero, igualmente, na presente manifestação, que, em uma discussão sobre a existência ou não de irregularidades praticadas pela Administração Municipal, em que reina a dúvida quanto a saber quem está falando a verdade, deve-se privilegiar o entendimento dado pelos atores jurídicos imparciais que se encontram mais próximos dos fatos, é dizer, o (a) Promotor (a) Eleitoral e o (a) Juiz (íza) Eleitoral, que, no caso, se posicionaram pela ausência de propaganda antecipada negativa.

Destarte, o desprovimento do recurso interposto é medida que se impõe.

(Grifos originais)

Por essas razões, estou encaminhando meu voto no sentido de negar provimento ao recurso interposto, mantendo a decisão de primeiro grau, por considerar não configurada a prática de propaganda eleitoral negativa em desfavor do recorrente.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença que julgou improcedente a presente representação.