REl - 0600010-10.2020.6.21.0031 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/07/2021 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão por que dele conheço.

Mérito

O PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO (PTB) do Município de Montenegro recorre da sentença proferida pelo Juízo da 031ª Zona Eleitoral que desaprovou a suas contas anuais, relativas ao exercício financeiro de 2019, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 150,00, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada, nos termos do art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23.546/17, e aplicou multa no percentual de 1% sobre a importância apontada como irregular, forte no art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19.

Conforme parecer técnico conclusivo (ID 12442583), foi apontada irregularidade consistente no recebimento de recurso de origem não identificada, no montante de R$ 150,00, por meio de depósito detectado, no extrato bancário, com o CNPJ do próprio partido como depositante.

Nos termos do art. 7º da Resolução TSE n. 23.546/17, as contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador, quando pessoa física, ou do CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou contribuinte ou no CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

§ 1º Para arrecadar recursos pela Internet, o partido político deve tornar disponível mecanismo em página eletrônica, observados os seguintes requisitos:

I – identificação do doador pelo nome e CPF;

II – emissão de recibo para cada doação auferida, dispensada a assinatura do doador; e

III – utilização de terminal de captura de transações para as doações por meio de cartão de crédito ou cartão de débito.

§ 2º As doações por meio de cartão de crédito ou cartão de débito somente são admitidas quando realizadas pelo titular do cartão

§ 3º Eventuais estornos, desistências ou não confirmação da despesa do cartão devem ser informados pela respectiva administradora ao beneficiário e à Justiça Eleitoral.

A infringência à norma impede o conhecimento da real origem dos valores recebidos, implicando a sua caracterização como de origem não identificada, na forma do art. 13, parágrafo único, inc. I, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.546/17:

Art. 13. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

Parágrafo único. Constituem recursos de origem não identificada aqueles em que:

I – o nome ou a razão social, conforme o caso, ou a inscrição no CPF do doador ou contribuinte, ou no CNPJ, em se tratando de partidos políticos ou candidatos:

a) não tenham sido informados; ou

b) se informados, sejam inválidos, inexistentes, nulos, cancelados ou, por qualquer outra razão, não sejam identificados;

II – não haja correspondência entre o nome ou a razão social e a inscrição no CPF ou CNPJ informado; e

(…).

O recorrente atribui o recebimento de depósito identificado com o CNPJ do próprio partido, apontado pelo órgão técnico, a falha da agência lotérica, que teria digitado o CNPJ da agremiação e não o CPF do depositante. Para fins de comprovação, junta, agora na via recursal, declaração da lotérica que realizou o depósito, informando a respeito do equívoco.

Entendo que tal alegação não socorre o recorrente, uma vez que caberia ao depositante a conferência dos dados por ocasião da transação bancária. Ademais, não há nos autos documentação que poderia, eventualmente, corroborar a sua tese, como, por exemplo, extrato bancário da conta-corrente de Juarez Vieira da Silva contendo o lançamento do débito correspondente ao depósito realizado na conta bancária do partido.

Importante referir, ainda, que o recibo emitido, por si só, não tem o condão de comprovar a origem do recurso, tanto que a legislação exige que as doações de recursos financeiros sejam efetuadas por meio de cheque cruzado ou transação bancária que identifiquem, obrigatoriamente, o CPF do doador ou contribuinte, nos termos do art. 8º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.546/17.

Na esteira da jurisprudência consolidada no âmbito deste Regional, os valores recebidos sem a correta identificação dos doadores originários devem ser transferidos ao Tesouro Nacional, como definido no art. 14, caput, da citada Resolução:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. DESAPROVAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. MULTA. PRELIMINAR DE NULIDADE PARCIAL DO FEITO AFASTADA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES ADVINDAS DE FONTES VEDADAS. PERCEPÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DESAPROVAÇÃO. DESPROVIMENTO. 1. Preliminar de nulidade parcial do feito rejeitada. Em que pese a suposta omissão de penalidade vigente no exercício sob exame, tratando-se de apelo interposto apenas pelo prestador, não é possível agravar sua situação jurídica em grau recursal, sob pena de violação do princípio da não reformatio in pejus. 2. Recebimento de doações oriundas de fontes legalmente vedadas. O prestador não logrou comprovar a filiação partidária do doador da receita impugnada, circunstância que afastaria a ilicitude da contribuição, nos termos do art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95. 3. Percepção de valores depositados na conta bancária da grei sem a identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do contribuinte, em dissonância com o previsto no art. 13, inc. I, da Resolução TSE n. 23.546/17. 4. Manutenção da sentença. Desaprovação das contas. Recolhimento ao erário. 5. Desprovimento.

(TRE/RS – RE n. 17-43 – Relator Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz – Julgado sessão de 07.4.2020.)

Por outro lado, mesmo representando 23,08% dos recursos arrecadados pelo partido no exercício de 2019, o valor de R$ 150,00, glosado como de origem não identificada, representa quantia irrisória, assim como o valor absoluto das contas despendido pela agremiação no curso do exercício de 2019, circunstância que autoriza a aprovação das contas com ressalvas, com fundamento nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Nessa linha, a jurisprudência:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2012. CRÉDITOS BANCÁRIOS SEM IDENTIFICAÇÃO DOS DOADORES/CONTRIBUINTES. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DESPESA. VALORES IRRISÓRIOS. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

Diante dos valores apresentados, seja em termos absolutos ou percentuais, as falhas identificadas não se mostram capazes de macular a prestação de contas como um todo, sendo o caso de sua aprovação com ressalvas, pela aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

Necessidade de recolhimento dos valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional, na forma estipulada pelo art. 6.º da Resolução TSE n.º 21.841/2004.

Aprovação com ressalvas das contas partidárias.

(TRE-RN, PC n 5363, ACÓRDÃO de 19.5.2016, Relator ALMIRO JOSÉ DA ROCHA LEMOS, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data: 23.5.2016.)

No mesmo sentido, a orientação do Tribunal Superior Eleitoral, conforme julgado abaixo colacionado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PROVIMENTO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. OMISSÃO DE DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. SERVIÇOS DE CONTABILIDADE. VALOR IRRISÓRIO EM TERMOS ABSOLUTOS. MÁ-FÉ NÃO DEMONSTRADA. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO DAS CONTAS COM RESSALVAS. DESPROVIMENTO.

1. É cediço que a omissão de doações estimáveis em dinheiro revela-se irregularidade apta a ensejar a desaprovação das contas. Precedentes.

2. Todavia, no caso vertente, conquanto a referida omissão de doação estimável em dinheiro referente a serviços contábeis corresponda quase à totalidade das despesas declaradas, a irregularidade apontada não revelou a magnitude necessária para atrair a desaprovação das contas, considerando que seu valor mostra-se ínfimo em termos absolutos - R$ 200,00 (duzentos reais). Nesse sentido: REspe n° 9561127-41/CE, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJe de 4.3.2015; AgR-REspe nº 235-44/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 20.9.2018 e AgR-REspe nº 206-79/RN, de minha relatoria, DJe de 6.9.2018.

3. Nos termos da orientação jurisprudencial desta Corte Superior, "com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização das contas" (AgR-REspe nº 2159-67/GO, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016).

4. A jurisprudência deste Tribunal tem admitido a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para viabilizar a aprovação de contas, com ressalvas, em hipóteses nas quais o valor da irregularidade é módico e ausentes indícios de má-fé do prestador e de prejuízos à análise da regularidade das contas pela Justiça Eleitoral. Precedentes.

5. Agravo regimental desprovido.

(RESPE – Agravo Regimental em Recurso Especial n. 39517, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE 06.52019.)

Por fim, necessário repisar que o juízo de aprovação com ressalvas das contas, embora não desobrigue o órgão partidário do dever de recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores recebidos sem identificação dos seus respectivos doadores, mostra-se incompatível com a incidência de multa, uma vez que, conforme esta Corte vem reiteradamente decidindo, o texto do art. 49 da Resolução TSE n. 23.546/17 prevê, de forma expressa, a desaprovação das contas como fato gerador da referida multa.

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso, para o fim de aprovar com ressalvas as contas do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) de Montenegro, relativas ao exercício financeiro de 2019, mantendo a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), com base nos arts. 14, caput, e 46, inc. II, da Resolução TSE n. 23.546/17.