REl - 0600443-98.2020.6.21.0100 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/06/2021 às 14:00

VOTO

Passo ao exame da preliminar de nulidade da sentença suscitada pela recorrente, em razão da falta de intimação para manifestar-se sobre o parecer conclusivo, e adianto que não prospera.

No parecer conclusivo, consta que, “após emissão do Relatório de Exame de Contas (ID 71243907), em conformidade com o art. 64, § 3º da Resolução TSE nº. 23.607/2019, a candidata foi diligenciada, mas não apresentou manifestação”.

Assim, do exame da tramitação dos autos eletrônicos nos sistemas PJe de primeiro e segundo graus, observa-se que a advogada da parte recorrente foi devidamente intimada da decisão que concedeu 3 (três) dias para manifestação sobre o parecer técnico preliminar de exame, deixando transcorrer o prazo in albis.

A comunicação ocorreu dentro do sistema PJe, pelo ato de intimação n. 4874296, com expedição eletrônica em 14.01.2021, às 17:44:48, e prazo até 18.01.2021, às 23:59:00.

Ressalto que a forma de intimação obedeceu à regra expressa prevista no § 4º do art. 26 da Resolução TRE-RS n. 347/20, segundo a qual as intimações nos processos de prestação de contas relativas às eleições de 2020 serão realizadas por meio de ato de comunicação, via sistema, no Processo Judicial Eletrônico (PJe), dispensando a publicação no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) e desobrigando, até 12.02.2021, a observância do prazo de ciência de 10 (dez) dias previsto no art. 5º, § 3º, da Lei n. 11.419/06 (Resolução TSE n. 23.632/20, art. 6º; Resolução TRE-RS n. 338/19, art. 51).

Ademais, o art. 69, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19 é expresso ao dispor que, sendo intimado do parecer preliminar, não há nova notificação do parecer conclusivo, quando as falhas constatadas na contabilidade permanecem as mesmas:

Art. 69. Havendo indício de irregularidade na prestação de contas, a Justiça Eleitoral pode requisitar diretamente ou por delegação informações adicionais, bem como determinar diligências específicas para a complementação dos dados ou para o saneamento das falhas, com a perfeita identificação dos documentos ou elementos que devem ser apresentados (Lei nº 9.504/1997, art. 30, § 4º).

§ 4º Verificada a existência de falha, impropriedade ou irregularidade em relação à qual não se tenha dado ao prestador de contas prévia oportunidade de manifestação ou complementação, a unidade ou o responsável pela análise técnica deve notificá-los, no prazo e na forma do art. 98 desta Resolução.

 

Dessa forma, uma vez que o relatório técnico conclusivo não inovou em relação ao relatório preliminar, não há que se falar em necessidade de nova intimação, face à preclusão para o saneamento dos vícios apontados.

Portanto, afasto a preliminar arguida.

No mérito, as contas foram desaprovadas em virtude da utilização de recursos de origem não identificada no valor de R$ 486,45, referentes a dois depósitos, em dinheiro, efetuados pela própria candidata na conta de campanha, nas quantias de R$ 452,45 (ID 27895633) e de R$ 34,00 (ID 27895783), em desacordo com a declaração de ausência de bens realizada no registro de candidatura e o disposto no art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

(…)

 

Quanto ao apontamento, a prestadora informou no registro de candidatura possuir a ocupação de agricultora e, com o recurso, acostou notas fiscais de venda de produtora rural expedidas em 2020 (ID 27896683), que comprovam ter a candidata auferido receita com a venda de leite in natura, demonstrando, assim, a condição econômica de realizar autofinanciamento para a campanha.

Por se tratar de documento simples, que não demanda reabertura da instrução para nova análise técnica, entendo que tais comprovantes podem ser conhecidos, ainda que a juntada tenha ocorrido de forma intempestiva e somente nesta instância recursal.

Portanto, embora a apresentação da prova de capacidade financeira tenha se dado intempestivamente, resta sanada a ausência de declaração de bens no requerimento de registro de candidatura com a demonstração de que a prestadora possuía condições econômicas para a realização do autofinanciamento em questão.

Ressalta-se que a jurisprudência deste Tribunal admite a superação de falhas dessa natureza quando o prestador consegue comprovar a regularidade da arrecadação dos recursos, consoante se extrai do seguinte precedente:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. ELEIÇÕES 2016. PRELIMINAR. ADMISSIBILIDADE DA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA COM O RECURSO. MÉRITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS RECURSOS ESTIMÁVEIS ESCRITURADOS. REGULARIDADE DA DOAÇÃO RECEBIDA À TÍTULO DE DE BEM IMÓVEL. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS EM VALOR SUPERIOR AO DECLARADO NO REGISTRO DE CANDIDATURA. DEMONSTRADA A CAPACIDADE ECONÔMICA DO DOADOR. COMPROVADA ORIGEM DA QUANTIA DEPOSITADA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Preliminar. Admissibilidade de novos documentos, acostados com a peça recursal, quando se tratarem de documentos simples, capazes de esclarecer de plano as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. 2. Não cabe ao prestador o dever de demonstrar a capacidade econômica de doador. Entrega tempestiva de documentos capazes de identificar a regularidade da doação de recurso estimável, recebido a título de cessão de bens imóveis. 3. Aporte de recursos próprios sem a correspondente declaração de patrimônio por ocasião do registro de candidatura. Elementos trazidos aos autos, sobretudo a apresentação de extratos de conta bancária particular da candidata e os comprovantes das operações de transferências dos valores, de forma a permitir a devida identificação da origem da quantia. 4. Considerados o valor absoluto dos recursos e os documentos apresentados em grau recursal, deve ser aprovada com ressalvas a contabilidade. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, diante da comprovação da origem dos recursos. Provimento parcial.

(TRE-RS - RE: 18704 DOM PEDRITO - RS, Relator: DR. JAMIL ANDRAUS HANNA BANNURA, Data de Julgamento: 22.02.2018, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 30, Data: 26.02.2018, Página 4.)

 

Dessarte, considerando o valor absoluto dos recursos e os documentos apresentados em grau recursal, entendo que a falha não inviabilizou a fiscalização das contas, tampouco a transparência e a confiabilidade da escrituração, merecendo ser afastado o dever de recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

Portanto, reputo a impropriedade como apenas uma ressalva no exame contábil em razão de a prova ter sido juntada apenas em grau recursal, mas considero comprovada a origem dos recursos.

Ressalto, por fim, que a desaprovação ou a aprovação com ressalvas não acarretam prejuízo aos direitos políticos dos candidatos, o que ocorre tão somente com a omissão no dever de prestar contas ou o julgamento das contas como não prestadas, conforme dispõe o art. 11, § 7º, da Lei n. 9.504/97.

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para aprovar as contas com ressalvas e afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.