REl - 0600603-39.2020.6.21.0031 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/05/2021 às 10:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

A sentença hostilizada desaprovou as contas de campanha ao cargo de vereador de FELIPE KINN DA SILVA, relativas às eleições de 2020, e a única irregularidade diz respeito ao recebimento de R$ 1.250,00 depositados em espécie na conta de campanha, na data de 30.10.2020, em duas diferentes operações, nos valores de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais) e de R$ 1.000,00 (mil reais).

O recorrente sustenta que não houve a intenção de fraude ou má-fé e indica que a depositante, Sra. Marlene Kinn da Silva, é mãe do candidato e possui capacidade financeira para a doação.

A falha identificada é daquelas cometidas em inúmeras prestações de contas, eleição após eleição, e, por inexperiência, ou ausência de auxílio especializado no manejo da contabilidade eleitoral, um número razoável de candidatos acaba por incorrer na irregularidade, a qual prescinde da perquirição de má-fé ou intenção de prática de fraude.

Dito de outro modo, tem natureza objetiva.

A Resolução TSE n. 23.607/19, que regulamenta a matéria para as eleições 2020, dispõe no art. 21, §§ 1º e 2º:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

 

Como se percebe, ainda que cada um dos depósitos apresente valor inferior ao piso estabelecido, há que se considerar que foram feitos dois depósitos "na boca do caixa", em um mesmo dia, pelo mesmo doador, de modo que consubstanciam uma única doação – a qual, em face disso, passa a exceder o patamar de R$ 1.064,10.

É a regra expressa no § 2º.

Assim, houve afronta à previsão legal que tem como objetivo assegurar a transparência da origem dos recursos que alimentam as campanhas eleitorais, e a inobservância da diretriz permitiria o ingresso de valores na conta do candidato sem a possibilidade de verificação da pessoa do doador, pois o CPF de identificação do depositante não necessariamente reflete o autor da contribuição.

Muito embora o recorrente traga os recibos dos dois depósitos efetuados pela doadora, não apresentou outros elementos que pudessem suprir a necessidade da transferência eletrônica – a capacidade financeira não é suficiente. Poderiam ter sido, por exemplo, demonstrados os saques bancários, no mesmo dia e no mesmo valor, para trazer vínculo direto entre a origem do dinheiro e as doações realizadas, mas tal circunstância não ocorreu na hipótese, uma vez que foi apresentada cópia de um cheque – despesa de campanha – no valor de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) que sequer corresponde ao valor total doado – R$ 1.250,00.

Portanto, configurada a irregularidade em seu valor integral – e não apenas em relação ao quantitativo excedente ao permitido, ou seja, R$ 186,00 (cento e oitenta e seis reais), como argumenta o recorrente, pois a falha configura o recurso como de origem não identificada em sua totalidade, conforme se depreende do disposto no art. 32, § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(...)

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador; (Grifei.)

 

Observo, a título de desfecho, que o recurso foi utilizado na campanha, sendo inviável a sua restituição ao doador e impondo-se o recolhimento ao Tesouro Nacional.

 

DIANTE O EXPOSTO, VOTO para negar provimento ao recurso.