REl - 0600804-86.2024.6.21.0032 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/07/2025 às 16:00

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso mostra-se tempestivo, visto que a intimação da sentença recorrida se deu em 10.12.2024, e o recurso fora interposto em 13.12.2024.

Mostrando-se adequado e preenchidos os demais pressupostos recursais, conheço do apelo e passo a analisar o mérito do recurso.

 

PRELIMINARES

Inicialmente, não prospera a preliminar de nulidade da sentença por ausência de intimação do candidato, para sanar as falhas apontadas, quando da intimação do procurador constituído.

Conforme consta nos autos, o patrono do recorrente foi devidamente intimado (ID 45854311) para sanar as falhas apontadas no relatório de exame, oportunidade em que deixou transcorrer in albis o prazo para manifestação (ID 45854312). Nesse sentido, uma vez que os poderes conferidos ao advogado na procuração foram suficientes para sua representação nos autos da prestação de contas, não há falar em intimação pessoal do candidato em virtude do silêncio do procurador constituído.

Diante disso, resta evidente que não houve cerceamento de defesa ou violação ao contraditório, sendo infundada a alegação de nulidade por ausência de intimação pessoal do recorrente.

Ainda, antes de adentrar no mérito do recurso, deve-se considerar a admissão dos documentos apresentados após a interposição do recurso eleitoral. Nesse ponto, consigno que, no âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal Regional Eleitoral tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura, primo ictu oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica.

In casu, tem-se por privilegiar o direito de defesa, de forma a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha, como denota-se das ementas oriundas deste TRE-RS, colacionadas a título exemplificativo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. CONHECIDOS OS DOCUMENTOS JUNTADOS NA FASE RECURSAL. DOAÇÃO ESTIMÁVEL DE SERVIÇOS CONTÁBEIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUITAÇÃO. DIVERGÊNCIA DE VALORES ENVOLVENDO TARIFAS BANCÁRIAS. MERAS IMPROPRIEDADES. REFORMA DA SENTENÇA. AFASTADA A MULTA E A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, referente ao exercício financeiro de 2020, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescido de multa. 2. Conhecidos os documentos juntados na fase recursal. No âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura, ictu primo oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica. Na hipótese, juntadas fotografias de cheques, de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento das irregularidades. 3. Ausência de comprovação de quitação de despesa. Apresentação de recibo de pagamento para comprovação de doação estimável de serviços contábeis, em desacordo com o prescrito pelo art. 9º da Resolução TSE n. 23.604/19. Entretanto, sendo inequívoco que o serviço doado se origina da atividade laboral da própria doadora e que o valor arbitrado não destoa de outros praticados para trabalhos semelhantes no município de origem, a falha é meramente formal, pois não prejudica a fiscalização sobre os contornos essenciais da doação estimável em questão, sendo suficiente a aposição de ressalvas. Inexistência de fundamento legal para a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da doação estimável de serviço, fruto do trabalho da doadora, declarada em valor razoável relativamente aos parâmetros do mercado local e não envolvendo recursos públicos ou de origem não identificada. 4. Divergência detectada entre o valor registrado como despesas com tarifas bancárias e o valor realmente apurado em análise. Reduzido montante da falha. Mera impropriedade, ensejadora de ressalvas às contas. 5. Reforma da sentença. As falhas identificadas constituem meras impropriedades, pois, alcançando montante módico, não impediram o exame técnico das contas e não resultam em dano ao erário, possibilitando a aprovação com ressalvas da contabilidade, na esteira de julgados desta Corte e do TSE (TRE–RS – PC 060028875, Relator.: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, Data de Julgamento: 15/06/2020, DJE de 23/06/2020). 6. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a multa e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - REl: 06000458320216210079 MANOEL VIANA - RS, Relator: Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 31.10.2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 202, Data 07.11.2023.) (Grifei.)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTAÇÃO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. DOCUMENTAÇÃO SIMPLES. DESNECESSIDADE DE NOVA ANÁLISE TÉCNICA. MÉRITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. JUNTADA DE NOTA FISCAL IDÔNEA. DESPESA DEMONSTRADA. AFASTADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas anuais do partido, exercício 2020, em razão de ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional e aplicada multa de 5% do valor irregular. 2. Conhecidos os documentos juntados com o recurso. Conforme pacífica jurisprudência desta Corte, a apresentação de novos documentos com o recurso, sobretudo na classe processual das prestações de contas, não apresenta prejuízo à tramitação do processo quando se trata de documentos simples, capazes de esclarecer, primo ictu oculi, as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. O posicionamento visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha e a celeridade processual e afastar excessivo formalismo. 3. Ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. A nota fiscal indicada é documento idôneo a demonstrar a despesa - a diferença é de ordem insignificante, um centavo, e foi emitida pela mesma empresa cujo pagamento parcial foi acolhido pela sentença. Existência apenas de falhas formais e de comprovações extemporâneas, de forma que as contas devem ser aprovadas com ressalvas. 4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - REl: 06000861020216210060 PELOTAS - RS, Relator: Des. Afif Jorge Simoes Neto, Data de Julgamento: 20.07.2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 135, Data: 26.07.2023.) (Grifei.)

 

Por essas razões, conheço dos documentos acostados no ID 45854357 e seguintes, consistentes em termo de cessão de veículo, extratos bancários, cupons fiscais emitidos por Comércio de Combustíveis Korsack Ltda. ME e notas fiscais emitidas por B&D Comunicação Visual Ltda., de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento, ao menos em parte, das irregularidades apontadas.

 

MÉRITO

As falhas que levaram à desaprovação das contas foram as seguintes: (a) gastos com combustíveis sem veículo correspondente declarado nas contas; (b) despesa com combustível paga com recursos públicos sem apresentação de documento fiscal da despesa no qual conste o CNPJ da campanha; e (c) existência de sobra de campanha de recursos de origem privada não devolvidos ao órgão partidário municipal, em desatenção às regras da Resolução TSE n. 23.607/19.

Sobre os gastos com combustíveis (no valor total de R$ 900,00, conforme Demonstrativo de Despesas com Combustíveis Semanal – ID 45854266) para veículo não cadastrado nas contas, a sentença concluiu pela irregularidade porque, ainda que o recorrente tenha apresentado termo de cessão de uso de veículo, houve omissão de receita estimável em dinheiro, por ausência de registro da referida cessão nas contas.

Com razão o juiz a quo. Isso porque, em que pese o recorrente ter apresentado termo de cessão de veículo firmado por Sandra Mara da Silva Chicatto (ID 45854378), não veio aos autos o comprovante de propriedade do bem cedido, em contrariedade à exigência expressa do art. 58, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, o que, por si só, impede que a falha seja afastada.

Ainda que assim não fosse, veja-se como a matéria dos gastos com combustíveis para abastecimento de veículo usado na campanha eleitoral encontra-se disciplinada no art. 35, §§ 6º e 11, da Resolução TSE n. 23.607/19, litteris:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

(...)

§ 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato:

a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pela candidata ou pelo candidato na campanha;

(…)

§ 11. Os gastos com combustível são considerados gastos eleitorais apenas na hipótese de apresentação de documento fiscal da despesa do qual conste o CNPJ da campanha, para abastecimento de:

(...)

II – veículos utilizados a serviço da campanha, decorrentes da locação ou cessão temporária, desde que:

a) os veículos sejam declarados originariamente na prestação de contas; e

b) seja apresentado relatório do qual conste o volume e valor dos combustíveis adquiridos semanalmente para este fim;

 

Ou seja, a falta de comprovante de propriedade do bem cedido, somada à omissão da declaração do veículo abastecido na prestação de contas, conforme exigido pelo art. 35, § 11, inc. II, al. “a”, da norma aplicável, configura despesa de natureza pessoal, que não está sujeita à prestação de contas e não pode ser custeada com recursos da campanha.

Trago à colação precedente do egrégio Tribunal Superior Eleitoral a respeito:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. GASTOS COM COMBUSTÍVEL. GASTO ELEITORAL. VEÍCULO NÃO DECLARADO ORIGINARIAMENTE. IRREGULARIDADE GRAVE. INCIDÊNCIA DO VERBETE SUMULAR 26 DO TSE.

(...)

7. Na espécie, o candidato efetivamente declarou como "gasto eleitoral" a despesa realizada com combustível, utilizando-se de recursos do fundo especial de financiamento de campanha para essa finalidade, de modo que não se aplica nessa hipótese a mencionada regra que dispensa a contabilidade ou o registro da cessão do veículo, mas, sim, o disposto no art. 35, § 11, da Res.-TSE 23.607, que estabelece regras específicas para que veículos sejam excepcionalmente abastecidos com combustível pago com recursos de campanha.

8.  Ou o gasto com combustível é tratado via de regra como "gasto de natureza pessoal" - de modo que não pode ser utilizado recurso de campanha para essa finalidade, dispensando-se inclusive a sua contabilidade e a emissão de recibo da cessão de veículo do cônjuge (arts. 7°, § 6°, III, e 35, § 6°, a, todos da Res.-TSE 23.607); ou, caso efetivamente seja o caso de "gasto eleitoral", deve-se obedecer às exigências do art. 35, § 11, da Res.-TSE 23.607, dentre as quais a de que o veículo seja originalmente declarado na prestação de contas. CONCLUSÃO Agravo regimental não conhecido.

(TSE; AgR-REspEl n. 0600624-16.2020.6.25.0027/SE, Acórdão, Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE, 04.04.2023.) (Grifei.)

 

Portanto, persiste a irregularidade.

Em relação à mesma aquisição de combustível, a sentença identificou outra falha, qual seja: a ausência do CNPJ da campanha nos cupons fiscais emitidos pelo fornecedor.

Em que pese a argumentação do recorrente, a emissão de nota fiscal de combustível contra o CPF do candidato, em vez do CNPJ da campanha, é irregularidade que somente pode ser imputada a ele, não sendo cabível a alegação de erro de terceiro que pudesse justificar a sanabilidade dessa falha.

Não é demais destacar que a despesa foi considerada de natureza pessoal e que, por esse motivo, o combustível não se sujeita à prestação de contas e não pode ser pago com recursos da campanha. Assim, no caso em análise, a anotação do CNPJ da campanha nos documentos fiscais de combustível, por si só, não seria suficiente para atestar a regularidade da despesa.

Diante do exposto, mantém-se a irregularidade.

Em relação à sobra de campanha e consequente determinação de recolhimento dos valores ao ente partidário, tenho que a sentença merece reparo.

Analisando os extratos bancários trazidos aos autos, nota-se que a conta destinada a movimentação de outros recursos foi zerada em 04.10.2024 (ID 45854364, 45854370 e 45854371), não havendo falar em sobra financeira de recursos, tampouco em devolução de valores ao partido político.

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O que ocorreu, em verdade, como argumentado pelo recorrente, foi erro formal que não compromete a regularidade das contas.

Desse modo, o montante irregular é de R$ 900,00, corresponde a 30% da movimentação financeira da campanha (R$ 3.000,00) e apresenta valor absoluto menor que R$ 1.064,10. Com isso, tenho que a referida quantia está abarcada pelos limites admitidos pela jurisprudência deste TRE-RS, considerando-se o valor inexpressivo da quantia irregular observada em termos absolutos, para aprovar com ressalva as contas de campanha do recorrente, como podemos extrair da ementa de julgado que colaciono a título exemplificativo:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. VEREADORA. DESAPROVAÇÃO. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS ORIUNDO DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. INOBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 38, INC. I, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. VALOR NOMINAL DIMINUTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO VALOR A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que julgou desaprovada prestação de contas de candidata a vereadora e determinou o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, devido à realização de gastos sem observância da forma prescrita no art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19 e da falta de documentos comprobatórios de despesas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

2. Aplicação irregular de recursos do FEFC. Ainda que demonstrada a regularidade no pagamento a dois prestadores de serviço, persiste a falha com referência ao cheque compensado sem a identificação da contraparte favorecida. Inobservância do disposto no art. 38, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19. Norma de caráter objetivo que exige, sem exceções, que o cheque manejado para pagamento de despesa eleitoral seja não apenas nominal, mas também cruzado. Sufragado o entendimento por este Tribunal de que os pagamentos por meio de recursos públicos devem ser demonstrados por documentos que permitam a rastreabilidade dos valores e a vinculação do crédito com o fornecedor declarado. Determinado o recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Irregularidade remanescente que representa 6,63% dos recursos declarados pela candidata. Ínfima dimensão percentual das falhas e valor nominal diminuto. Aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas, pois se trata de valor módico e inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10, utilizado por este Tribunal para admitir tal juízo.

4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Redução do valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional. (Recurso Eleitoral n 060048129, ACÓRDÃO de 10.10.2022, Relatora VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: DJE – Diário de Justiça Eletrônico, Data 11.10.2022.) Grifei.

 

Por fim, quanto à devolução de valores, destaco que, ainda que a falha mantida seja de R$ 900,00, diante da ausência do manejo recursal pelo Ministério Público e da impossibilidade de agravamento da posição jurídica do recorrente, está mantido na quantia de R$ 354,75 o recolhimento ao erário.

Diante do exposto, VOTO por dar parcial provimento ao recurso de ALDEMIR PEIXOTO DA SILVA, para reformar parcialmente a sentença, mantendo-se a determinação de recolhimento de R$ 354,75 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.