REl - 0600546-45.2024.6.21.0010 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/06/2025 00:00 a 27/06/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo, visto que a intimação da sentença se deu na data de 27.11.2024, e o recurso foi interposto em 30.11.2024.

Ademais, encontram-se presentes os requisitos ínsitos à tramitação processual.

Por isso, conheço do recurso e passo à análise do mérito.

 

MÉRITO

O exame dos autos revela que a única falha apontada pela unidade técnica e acolhida pelo juízo eleitoral diz respeito à diferença entre os valores pagos por hora ao mesmo prestador, em dois contratos distintos, firmados em períodos diferentes da campanha.

A justificativa apresentada pela recorrente é no sentido de que o primeiro contrato, celebrado em 26.8.2024, previa o pagamento de R$ 1.500,00 com recursos do FEFC por 12 dias de trabalho com jornada de 8 horas diárias; posteriormente, identificada a necessidade de prorrogação dos serviços, foi firmado novo contrato, para o período de 09.9.2024 a 05.10.2024, com pagamento diário de R$ 50,00 por 24 dias de trabalho, à razão de 6 horas por dia, custeado com recursos próprios.

A análise da planilha de ID 126336727 evidencia a prestação efetiva dos serviços, e o valor global despendido — R$ 2.600,00 — é compatível com campanhas de pequeno porte, não havendo notícia de contratação fictícia, ausência de execução ou de valores desproporcionais frente ao mercado.

Não há nos autos qualquer indício de fraude, desvio de finalidade, simulação contratual ou ausência de materialidade.

A contratação no total de R$ 2.600,00 por cerca de 40 dias de trabalho configura remuneração modesta, que não compromete a regularidade substancial das contas.

No entanto, apesar da boa-fé da candidata, da materialidade dos serviços comprovada e do valor total contratado ser módico, persistem dois elementos que impedem a aprovação plena e sem ressalvas das contas: (a) falta de justificativa formal documentada para a variação de valores, especialmente em contratos que envolvem recursos públicos; (b) divergência interna entre os próprios contratos, com informações contraditórias em relação à carga horária e à lógica remuneratória, o que compromete a coerência documental e impõe uma ressalva de natureza formal.

Com efeito, a Resolução TSE n. 23.607/19 exige que a contratação com verbas do FEFC seja acompanhada de documentação idônea e justificação clara de preços, o que não ocorreu de forma suficiente no caso (art. 53, inc. II, al. “c”; art. 60, §§ 1º e 3º):

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

[...]

II - pelos seguintes documentos, na forma prevista no § 1º deste artigo:

[...]

c) documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Partidário e com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), na forma do art. 60 desta Resolução;

[...]

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

§ 1º Além do documento fiscal idôneo, a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como:

I - contrato;

II - comprovante de entrega de material ou da prestação efetiva do serviço;

III - comprovante bancário de pagamento; ou

IV - Guia de Recolhimento do FGTS, informações do Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial), da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais Previdenciários e de Outras Entidades e Fundos (DCTFWeb) e da Escrituração Fiscal Digital de Retenções e Outras Informações Fiscais (EFD-Reinf). (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

[...]

§ 3º Havendo dúvida sobre a idoneidade do documento ou sobre a execução do objeto, a Justiça Eleitoral poderá exigir a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

Assim, embora não se configure irregularidade de natureza grave, a falha detectada afeta a regularidade formal das contas, não sendo possível aprová-las sem qualquer reparo.

Nesta altura, indispensável referir que a jurisprudência deste TRE-RS, no que tange a prestações de contas de campanhas eleitorais, tem considerado como inexpressivos os montantes que não ultrapassam determinados limites, tanto em termos absolutos quanto relativos, alternativamente.

Em termos absolutos, o valor de R$ 1.064,10 é observado como um limite para considerar a irregularidade como inexpressiva.

Em termos relativos, a jurisprudência deste sodalício também tem aceitado que irregularidades que não ultrapassem 10% do total de recursos arrecadados podem ser admitidas como inexpressivas, desde que não comprometam a confiabilidade das contas e que a boa-fé do prestador seja evidenciada.

A aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade é um fator determinante na análise dessas situações, permitindo a aprovação das contas com ressalvas quando as falhas são consideradas de pequeno impacto.

No caso em tela, verifica-se que a quantia apontada como irregular na prestação de contas da candidata perfaz um montante de R$ 1.500,00, grandeza que de longe supera o limite tradicionalmente reconhecido de R$ 1.064,10, para ser aceito em termos absolutos de inexpressividade financeira.

Porém, extreme de dúvidas que tal quantia não atinge o teto relativo igualmente reconhecido no percentual de 10% do total de recursos arrecadados pela candidata.

Note-se que os requisitos não são cumulativos, mas sim alternativos.

Neste sentido, refiro, a título exemplificativo, entendimento firmado em decisão deste Tribunal na qual bem elucida-se o caráter alternativo da possibilidade de reconhecimento de pouca monta a valores apontados em processos de prestação de contas “em relação à pretensão de aprovação das contas com ressalvas, com base na pequena expressão do valor irregular, a jurisprudência considera inexpressivo o montante que não ultrapassar: (a) em termos absolutos, o valor de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos); ou (b) em termos relativos, o percentual de 10% (dez por cento) do total de recursos arrecadados” (TRE-RS, REl n. 060002152, Relator: Des. Mario Crespo Brum, Publicação: 03.9.2024.

Ressalte-se, ainda que considerada uma falha na precificação dos contratos, sendo valor envolvido inferior a 10% da receita arrecadada, autorizada estará a aprovação com ressalvas da prestação de contas, consoante se depreende de julgado em tal sentido citado inclusive na sentença do Juízo a quo, “Irregularidade remanescente que representa 6,63% dos recursos declarados pela candidata. Ínfima dimensão percentual das falhas e valor nominal diminuto. Aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas” (TRE-RS, RE n. 0600481-29, Rel. Desa. Vanderlei Teresinha Kubiak, DJE de 11.10.2022.

Assim, gize-se, no caso em apreço, o valor discutido representa 9,46% das receitas da campanha, de tal modo que entendo constatáveis razões ensejadoras de aprovação das contas com ressalvas, merecendo, assim, provimento parcial ao apelo, a fim de reformar a sentença de primeiro grau nesse tópico, mas permanecendo a sanção de devolução pecuniária.

Ante o exposto, VOTO por DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por MARIANA SILVA CARLOS, a fim de aprovar com ressalvas as contas de campanha da recorrente, nos termos do art. 77, II, da Resolução TSE n. 23.607/19, mantendo-se a condenação de devolução ao Tesouro Nacional do valor de R$ 1.500,00.