REl - 0600553-37.2020.6.21.0023 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/05/2021 às 14:00

 VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de campanha, Eleições 2020, dos concorrentes aos cargos de prefeito e vice-prefeito, IVAN CHAGAS e PAULO CLÁUDIO DOLOVITSCH, no Município de Ajuricaba/RS.

A irregularidade refere-se ao recebimento de diversas doações, em descumprimento ao que preceitua o art. 21, § 1º e § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que somadas alcançam o valor de R$ 6.750,00.

Sustentam que não há ilegalidade nas doações recebidas, apenas erro quanto à forma de transferência dos valores. Ademais, como foram doações sucessivas e inferiores a R$ 1.064,10, não haveria irregularidade a ser sanada.

Sem razão os recorrentes.

No ponto, a Resolução TSE n. 26.607/19, que regulamenta a matéria, assim dispõe:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

 

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

 

Como se constata da leitura do dispositivo legal, as operações em questão estariam acobertadas pela legalidade se realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal, o que não ocorreu.

Ainda que cada um dos depósitos apresente valor inferior ao limite estabelecido, há que se considerar que foram feitos no mesmo dia e pelos mesmos doadores. A realização de depósitos sucessivos em dinheiro demonstra a clara tentativa de burlar a norma eleitoral, o que é expressamente vedado pela citada resolução.

Assim, não se trata de mero erro formal, mas de afronta à previsão legal que tem como objetivo assegurar a transparência das origens dos recursos que alimentam as campanhas eleitorais.

A inobservância de tal diretriz permite o ingresso de valores na conta do candidato sem a possibilidade de segura verificação da pessoa do doador, vez que o CPF de identificação lançado pelo depositante não reflete, necessariamente, o autor da contribuição – o que somente poderia ser garantido por meio das operações indicadas nas normativas legais.

Em desfecho, observo que a irregularidade representa 21,29% dos recursos declarados como recebidos, o que impossibilita a aprovação das contas, mesmo com ressalvas, circunstância que justifica seja mantido o juízo de desaprovação por comprometer, substancialmente, a confiabilidade e a transparência da movimentação contábil, na esteira da jurisprudência desta Casa:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. ELEIÇÕES 2016. DOAÇÃO EM ESPÉCIE. DEPÓSITO DIRETO NA CONTA DE CAMPANHA. EXTRAPOLADO LIMITE LEGAL. ART. 18, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.463/15. AUSENTE CPF DO DOADOR NOS EXTRATOS BANCÁRIOS. ELEVADO PERCENTUAL DA IRREGULARIDADE. ORIGEM DOS VALORES NÃO COMPROVADA. MANTIDOS A DESAPROVAÇÃO E O RECOLHIMENTO DO VALOR AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO. As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 somente podem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário. O candidato recebeu doação em espécie diretamente na conta de campanha, em desobediência ao disposto no art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15. Constatadas duas doações de recursos em espécies que, somados, ultrapassam o montante limite para doação eleitoral em dinheiro. Embora o valor de cada depósito seja inferior à quantia teto estipulada pela resolução, tratando-se de transações sucessivas, realizadas no mesmo dia, a avaliação deve ser considerada em conjunto, pelo total da movimentação, mediante a soma dos valores doados. Não verificado, ainda, o número de CPF identificador da pessoa física no extrato bancário. Inexistência de elementos nos autos a justificar a irregularidade. Caracterizado o recebimento de recurso de origem não identificada. Falha de elevado percentual, representando 58,53% dos recursos financeiros arrecadados. Manutenção do juízo de desaprovação das contas. Mantido o comando de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor indevidamente empregado na campanha. Desprovimento.

(TRE-RS - RE: 17481 TAVARES - RS, Relator: DR. SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Data de Julgamento: 21/11/2017, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 211, Data: 24.11.2017, Página 13.)

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a sentença em sua íntegra.