REl - 0600271-75.2020.6.21.0030 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/05/2021 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

Mérito

No mérito, restou incontroverso que o ora recorrente, enquanto titular da chefia do Poder Executivo do Município de Santana do Livramento e concorrente à reeleição no pleito de 2020, fez veicular, entre os dias 15 e 31 de agosto de 2020, na página oficial da prefeitura, na rede social Facebook, nove matérias divulgando a manutenção de estradas rurais, a construção e os reparos de pontes, o asfaltamento de vias públicas, a aquisição de galerias, a manutenção e troca de lâmpadas, o aumento de nichos e gavetas no Cemitério Municipal, a conservação e limpeza de praças e locais públicos, a pintura de via pública e a instalação de bueiros, associadas à mensagem “Nós Não Paramos”, em evidente alusão à sua gestão administrativa.

As peças publicitárias em tela são vedadas e não poderiam ter sido divulgadas pela administração pública nos três meses que antecederam às eleições, nos termos do art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97, a seguir reproduzido:

Art. 73 São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[…]

VI – nos três meses que antecedem o pleito:

[…]

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

(Grifei.)

 

A regra em comento “constitui cláusula suspensiva do direito de divulgação de publicidade institucional pelos órgãos públicos” (ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 5ª ed., 2016, p. 613), incidindo sobre qualquer natureza de divulgações pretendidas pela municipalidade, independentemente de haver em seu conteúdo caráter informativo, educativo ou de orientação social, nos termos disciplinados pelo art. 37, § 1º, da CF/88.

Nessa linha, embora os administradores públicos estejam autorizados, no período de três meses anteriores ao pleito, a realizar propaganda institucional em virtude de grave e urgente necessidade pública, reconhecida pelo juízo eleitoral mediante pedido de autorização de publicidade, os conteúdos das publicações sobre as quais recaiu o entendimento condenatório no presente caso não se amoldam à exceção legal, traduzindo, antes disso, a exaltação das ações do administrador público concorrente à recondução no cargo de prefeito, com natural capacidade de prejudicar a igualdade entre os candidatos, razão por que, na lição de ZILIO (Op. Cit., p. 615), o art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei Eleitoral determina, como regra, “a vedação ampla e irrestrita à propaganda institucional no período proscrito”.

Assim, a ilicitude é extraída objetivamente da divulgação das matérias em período vedado, independentemente de promoverem a imagem de autoridades, da intenção ou finalidade eleitoreira da conduta ou do seu alcance sobre o eleitorado, na esteira de iterativa jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVOS INTERNOS EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CONDUTA VEDADA E ABUSO DE PODER. CONDENAÇÃO. AGRAVO DO PARTIDO REPUBLICANO DA ORDEM SOCIAL (PROS). REQUERIMENTO DE INTERVENÇÃO COMO ASSISTENTE SIMPLES NO FEITO, COM A FINALIDADE DE ASSEGURAR O DEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA DE AFILIADO EM ELEIÇÃO SUBSEQUENTE À TRATADA NA ESPÉCIE. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO NA DEMANDA. AGRAVO DE NELSON ROBERTO BORNIER DE OLIVEIRA. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL EM PERÍODO VEDADO. ART. 73, VI, b, DA LEI DAS ELEIÇÕES C/C O ART. 22, XIV, DA LEI DAS INELEGIBILIDADES. IDENTIFICAÇÃO DE BENS E DE SERVIÇOS PÚBLICOS COM A LOGOMARCA E AS CORES DA GESTÃO. ASSOCIAÇÃO À PESSOA DO PREFEITO. PERMANÊNCIA DURANTE O PERÍODO ELEITORAL. FATO INCONTROVERSO. ILÍCITO DE NATUREZA OBJETIVA. GRAVIDADE DAS CIRCUNSTÂNCIAS, AFETANDO A NORMALIDADE E A LEGITIMIDADE DO PLEITO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE OS CANDIDATOS. REEXAME DO CONTEÚDO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 24/TSE. AGRAVOS DESPROVIDOS. Do agravo do Partido Republicano da Ordem Social (PROS) 1. O ingresso de terceiro no processo, como assistente simples, exige a presença de interesse jurídico, a saber, a demonstração da existência de relação jurídica integrada pelo assistente que será diretamente atingida pelo provimento jurisdicional, não sendo suficiente o interesse econômico, moral ou corporativo. Precedente. 2. A Legenda não se desincumbiu de demonstrar o interesse juridicamente qualificado, no presente feito. O interesse na solução de outro processo, a saber, de registro de candidatura alusivo às eleições de 2018, indeferido em virtude dos ilícitos aqui discutidos, não evidencia interesse juridicamente qualificado a justificar seu ingresso no presente feito. 3. Ademais, manutenção da condenação do recorrente nessa demanda deságua na inelegibilidade, suprimindo qualquer interesse processual do Partido, dada a natureza personalíssima da reprimenda. 4. Agravo interno a que se nega provimento. Do agravo de Nelson Roberto Bornier de Oliveira 1. Nos termos da moldura fática delineada no acórdão regional, o ora agravante se utilizou da máquina pública para estampar em todos os bens e serviços do Município de Nova Iguaçu/RJ as cores e o novo símbolo associados a sua pessoa enquanto prefeito, em estado de permanência, concretizando a prática de publicidade institucional em período vedado. 2. As provas produzidas assentam robustez suficiente para demonstrar a ocorrência do abuso de poder político e a gravidade das circunstâncias que o caracterizam, afetando a normalidade e a legitimidade do pleito. 3. A revisão das conclusões da Corte regional acerca da configuração de conduta vedada e de abuso de poder político demandaria o revolvimento do arcabouço fático-probatório dos autos, providência vedada em sede de recurso especial, nos termos da Súmula nº 24/TSE. 4. Registre-se, ademais, que o art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997 veda, no período de três meses que antecede o pleito, toda e qualquer publicidade institucional, independentemente de termo inicial de veiculação e de suposta falta de caráter eleitoreiro, com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado e os casos de grave e urgente necessidade pública, reconhecida previamente pela Justiça Eleitoral. Precedentes. 5. Agravo interno a que se nega provimento.

(TSE - AI: 49130201661900000027 NOVA IGUAÇU - RJ, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 1º.07.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 156, Data: 06.8.2020.)

(Grifei.)

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2014. GOVERNADOR E VICE-GOVERNADOR. CONDUTA VEDADA. ART. 73, VI, B, DA LEI 9.504/97. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL EM PERÍODO VEDADO. ILÍCITO DE CARÁTER OBJETIVO. MULTA. BENEFICIÁRIO. INCIDÊNCIA. REJEIÇÃO.

Acórdão Embargado

1. Em julgamento unânime, esta Corte Superior proveu parcialmente recurso ordinário em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) para aplicar multa de R$ 5.350,00 a Luiz Fernando de Souza (Governador do Rio de Janeiro eleito em 2014), a Francisco Oswaldo Neves Dornelles (Vice-Governador) e à Coligação o Rio em 1º Lugar com base no art. 73, VI, b e §§ 4º e 8º, da Lei 9.504/97. 2. Assentou-se, em suma, prática de propaganda institucional, no sítio oficial do Governo do Estado, nos três meses que antecederam o pleito.

3. Francisco Dornelles opôs embargos de declaração.

Apreciação dos Embargos. 4. O suposto vício apontado denota propósito do embargante de rediscutir matéria já decidida, providência inviável na via aclaratória. Precedentes. 5. A divulgação de publicidade institucional em período vedado constitui ilícito de natureza objetiva e independe de conteúdo eleitoreiro. Precedentes. 6. Para incidência da sanção, não se exige que a conduta tenha sido praticada diretamente por partidos políticos, coligações e candidatos, bastando que qualquer um deles figure como beneficiário, nos termos do art. 73, § 8º, da Lei 9.504/97 e de precedentes desta Corte. Conclusão. 7. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE, Embargos de Declaração em Recurso Ordinário n. 378375, Acórdão de 27.9.2016, Relator Min. ANTONIO HERMAN DE VASCONCELLOS E BENJAMIN, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 199, Data: 17.10.2016, pp. 36-37.)

(Grifei.)

 

Ressalto que o fato de os expedientes publicitários não mais se encontrarem acessíveis na página oficial da Prefeitura de Santana do Livramento, na rede social Facebook, não constitui óbice ao reconhecimento e ao sancionamento da conduta vedada sob análise, por revelar, tão somente, ter havido a remoção dos conteúdos em cumprimento ao próprio comando emanado da sentença, que ordenou a imediata retirada da publicidade institucional vedada da página oficial do Executivo.

Ademais, a prática da conduta vedada, na hipótese dos autos, conforme delimitação do objeto da demanda procedida pelo órgão julgador, não abrangeu aquelas matérias estritamente relacionadas aos programas de combate à pandemia do novo coronavírus (COVID-19), desenvolvidos em âmbito local. Dessa forma, carece o recorrente de interesse recursal quanto à discussão da legitimidade e legalidade das publicações da administração afetas a essa temática, cuja licitude, aliás, foi expressamente assentada na sentença, com lastro na Consulta n. 0600098-44, respondida por este Tribunal, em acórdão de relatoria do Desembargador Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ.

No pertinente ao valor da penalidade de multa, arbitrado no patamar de R$ 5.320,50 para cada uma das nove publicações irregulares, totalizando o montante de R$ 47.884,50, penso, igualmente, que a sentença não merece reparos.

Nesse sentido, registro que a propaganda institucional irregular importou a promoção da gestão do recorrente em período bastante próximo às eleições, caracterizando o uso da máquina estatal com o propósito de beneficiar a sua candidatura, em detrimento dos demais concorrentes ao pleito majoritário, circunstância que, muito embora, como anteriormente dito, não seja elementar à caracterização do ilícito eleitoral, pode ser sopesada para fins de sancionamento da conduta vedada.

Além disso, como ponderaram o magistrado de primeira instância e o Procurador Regional Eleitoral, a publicidade institucional foi veiculada em meio a um conjunto de matérias relacionadas ao enfrentamento da pandemia do novo coronavírus (COVID-19), sobre a qual a atenção pública se encontra especialmente voltada desde o início do corrente ano, conferindo ainda mais visibilidade à propaganda ilícita, contexto em que a sanção pecuniária deve ser fixada em quantia adequada e suficiente à gravidade da utilização indevida da estrutura estatal em prol da candidatura do recorrente, que, à época, buscava a reeleição ao cargo de prefeito.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto por SOLIMAR CHAROPEN GONÇALVES, mantendo a sentença exarada pelo Juízo da 30ª Zona Eleitoral de Santana do Livramento, que reconheceu a prática da conduta vedada descrita no art. 73, inc. VI, al. “b”, da Lei n. 9.504/97, condenando-o ao pagamento da penalidade de multa no valor de R$ 47.884,50.

É como voto, Senhor Presidente.