REl - 0600813-48.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 13/04/2021 às 14:00

VOTO

Trata-se de representação por pesquisa eleitoral fraudulenta e sem registro divulgada no aplicativo WhatsApp por Lucas Jeske Lima Gonçalves, então candidato a vice-prefeito no Município de Santo Ângelo.

A magistrada a quo deferiu parcialmente a liminar, determinando a retirada da publicação da pesquisa do grupo de WhatsApp e, após o devido processamento da representação, proferiu decisão de parcial procedência, cujo excerto a seguir transcrevo:

Nos termos do art. 2º da Resolução TSE nº 23.600/2019, que reproduz o art. 33 da Lei nº 9.504/97, “a partir de 1º de janeiro do ano da eleição, as entidades e as empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, no Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais (PesqEle), até 5 (cinco) dias antes da divulgação(...)”.

O art. 17 da mesma Resolução prevê que “a divulgação de pesquisa sem o prévio registro das informações constantes do art. 2º desta Resolução sujeita os responsáveis à multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais) (Lei nº 9.504/1997, arts. 33, § 3º, e 105, § 2º)”.

No presente caso, restou demonstrado que o representado Lucas Lima (ID 37313738) divulgou a pesquisa eleitoral relativa à eleição majoritária de Santo Ângelo no grupo Ciclistas na política e que a pesquisa não estava registrada na Justiça Eleitoral (ID 37404510).

Por outro lado, não restou comprovada a participação da Coligação e de Bruno Hesse.

Certas, portanto, a autoria de Lucas Lima e a irregularidade da divulgação da pesquisa.

No tocante à multa, em que pese os argumentos da defesa, incide no presente caso.

Na hipótese, não se trata de mensagem trocada exclusivamente entre amigos ou família, de forma restrita ou privada, mas, sim, de divulgação de pesquisa em grupo de whatsapp, de diversificado público, tanto que chegou a conhecimento da coligação autora.

A publicação de pesquisa em grupo de whatsapp é passível sim da sanção pecuniária.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO SEM PRÉVIO REGISTRO. 1. A divulgação de pesquisa eleitoral, sem prévio registro na Justiça Eleitoral, em grupo do Whatsapp, configura o ilícito previsto no art. 33, § 3º, da Lei 9.504/97. 2. Para que fique configurada a divulgação de pesquisa eleitoral, sem prévio registro na Justiça Eleitoral, nos termos do art. 33, § 3º, da Lei 9.504/97, basta que tenha sido dirigida para conhecimento público, sendo irrelevante o número de pessoas alcançado pela divulgação e sua influência no equilíbrio da disputa eleitoral. 3. O acórdão desta Corte, proferido no julgamento do REspe 74-64, rel. Min. Dias Toffoli, DJE de 15.10.2013 -no qual se assentou que a emissão de opiniões políticas em páginas pessoais de eleitores no Facebook ou no Twitter não caracteriza propaganda eleitoral -, não se aplica aos casos de pesquisa eleitoral, sem prévio registro. Agravo regimental a que se nega provimento. (Recurso Especial Eleitoral nº 10880, Acórdão, Relator(a) Min. Admar Gonzaga, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 17/08/2017).

Além disso, como destacado pelo Ministério Público, é preciso considerar que a pesquisa foi divulgada pelo candidato, em cidade de médio porte, de modo que a divulgação dificilmente permaneceria no grupo em que se iniciou, podendo interferir no resultado da eleição.

No tocante ao quantum da multa, considerando os critérios de proporcionalidade e razoabilidade, em face da pronta remoção do conteúdo, deverá ser fixada no mínimo legal. Porém, em que pese o elevado valor, não é passível de redução aquém do mínimo.

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. PESQUISA ELEITORAL IRREGULAR. PRÉVIO REGISTRO. AUSÊNCIA. MULTA FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. REDUÇÃO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.1. Na espécie, a Corte Regional assentou que o ora agravado divulgou, em entrevista concedida a emissora de rádio, pesquisa sem prévio registro na Justiça Eleitoral, em ofensa ao art. 33 da Lei nº 9.504/97, e confirmou a multa aplicada pelo juízo eleitoral no valor de R$ 80.000,00 (oitenta mil reais).2. Consoante assinalado no decisum impugnado, não obstante a circunstância levantada pelo Tribunal de origem de que a divulgação foi feita em rádio de grande alcance, tal fato, por si só, é incapaz de justificar a fixação da multa acima do mínimo legal.3. Na linha da jurisprudência firmada nesta Corte Superior, "a fixação da multa pecuniária do art. 33, § 3º, da Lei n° 9.504/97, reproduzida no art. 17 da Res.-TSE n° 23.190/2009, deve levar em conta os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não sendo possível, no entanto, impor sanção em valor abaixo do mínimo legal" (AgR-REspe n° 1296-85/PB, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJe de 16.3.2011).4. À luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a redução da multa ao patamar mínimo de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais), conforme previsto no art. 17 da Res.-TSE nº 23.453/2015, mostra-se suficiente para reprimir adequadamente a infração praticada.5. Agravo regimental desprovido. (Recurso Especial Eleitoral nº 17725, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 29/10/2019, Página 9).

Como referido na decisão inicial, não cabe a requerida retratação.

ISSO POSTO, julgo:

a) IMPROCEDENTE a representação contra os representados Bruno Hesse e Coligação Compromisso com Santo Ângelo Renovar para Crescer; e

b) PARCIALMENTE PROCEDENTE a representação, para confirmar a liminar, quanto à determinação de exclusão da pesquisa do grupo de whatsapp, aplicando ao representado Lucas Lima a multa no valor de R$53.205,00, por força do art. 17 da Resolução TSE nº 23.600/2019.

 

Conforme evidenciado na imagem do ID 11143033 e no conteúdo da ata notarial do ID 11143083, a postagem ocorreu em grupo fechado de WhatsApp, não possuindo aptidão para atrair a imposição da penalidade prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 9.504/97, regulamentado pelo art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

O fato é que a previsão supracitada sujeita os responsáveis (pela conduta de divulgação de pesquisa eleitoral irregular) à severa multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais).

A gravidade de tal sanção impõe que a leitura do dispositivo ocorra em caráter restritivo, e não extensivo.

É fato que as pesquisas eleitorais detêm forte poder de influência sobre os eleitores, funcionando como termômetro das intenções de voto da população, especialmente pelo grau de idoneidade do complexo trabalho realizado pelas entidades de pesquisa de opinião pública.

Devido a essa complexidade e ao potencial de influência, a legislação eleitoral determina às empresas de pesquisa o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar o controle público e judicial dessas consultas, como se pode extrair do art. 33, caput, da Lei das Eleições:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I - quem contratou a pesquisa;

II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

 

De igual modo, por conta da natureza técnica das consultas e de seu potencial de influência sobre o eleitor, o § 3º do art. 33 estabeleceu uma elevada penalidade pecuniária para o caso de divulgação de pesquisa sem prévio registro.

Contudo, a hipótese dos autos distancia-se das situações fáticas que a referida sanção busca coibir. A postagem impugnada evidentemente não traz resultados de uma pesquisa eleitoral.

Ressalte-se que a publicação foi compartilhada em grupo de WhatsApp que conta com apenas 19 integrantes, afigurando-se irrelevante o alcance da divulgação para influenciar no resultado do pleito.

A condenação por veiculação de pesquisa eleitoral sem registro pressupõe que o conteúdo se caracterize essencialmente como pesquisa eleitoral, com dados capazes de conferir seriedade à intenção de votos e divulgação com alcance do eleitorado.

Nesse sentido, considero que se tratou de publicação em pequeno grupo privado de WhatsApp, não podendo ser equiparada a pesquisa difundida para o conhecimento geral.

Desse modo, entendo que a postagem se revestiu de mera manifestação eleitoral, sem configurar o tipo previsto pela legislação como divulgação de pesquisa eleitoral sem registro.

Nessa linha é a jurisprudência deste Regional:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. DIVULGAÇÃO DE PESQUISA ELEITORAL IRREGULAR. REDE SOCIAL. FACEBOOK. PROCEDÊNCIA PARA CONDENAR APENAS O AUTOR DA MENSAGEM. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS PARA CARACTERIZAR A POSTAGEM COMO PESQUISA. ART. 33 DA LEI N. 9.504/97. INAPLICABILIDADE DE MULTA. DESPROVIMENTO.

1. Inconformidade que visa à condenação e aplicação de multa a todos os representados, por divulgação de pesquisa irregular, visto que a sentença de primeiro grau foi procedente apenas com relação a um deles e improcedente quanto aos demais. Determinada na origem a exclusão da publicação. Não aplicada multa ao entendimento de que tal incidência dependeria do ajuizamento de ação penal específica.

2. Ato isolado do representado que realizou a publicação em seu perfil do Facebook, não havendo comprovação da participação das demais partes demandadas. Tratando de dispositivo que atribui penalidade ao infrator, é necessário que a participação no fato esteja cabalmente provada.

3. A análise da publicação é fundamental para a caracterização da pesquisa eleitoral, a qual deve cumprir os requisitos do art. 33 da Lei n. 9.504/97, e para a viabilidade de eventual aplicação da multa prevista no art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19. Sanção que não carece de ação penal específica, pois está prevista na lei, sendo a representação o meio processual adequado à obtenção da tutela pretendida.

4. Por conta da complexidade e potencial de influência das pesquisas eleitorais, a legislação impõe às empresas especializadas o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar seu controle público e judicial. Entretanto, na hipótese, a postagem impugnada evidentemente não traz resultados de uma pesquisa eleitoral.

5. Não havendo elementos mínimos para que se caracterize a divulgação como verdadeira pesquisa eleitoral, incabível a imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

6. Provimento negado.

(TRE-RS - Rel 0600083-84.2020.6.21.0172, Relator: Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 21.5.2020.) (Grifo nosso)

 

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no mesmo sentido:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2016. PESQUISA ELEITORAL NÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos que visava impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, para que seja caracterizada pesquisa eleitoral, é necessária a indicação, dentro do rigor técnico-científico que a define, de percentuais, margem de erro, índices ou intenções de votos e alusão ao instituto responsável pelo levantamento. Precedentes.

3. O acórdão regional concluiu que a divulgação de gráfico de linha, composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, mostrando a evolução do desempenho da campanha dos diversos candidatos, desacompanhado da indicação de percentuais ou números, não caracteriza a divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, mas, sim, propaganda eleitoral. A modificação dessas conclusões exigiria o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

4. Tendo em vista que a decisão recorrida está em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal Superior, não se conhece do recurso por dissídio jurisprudencial (Súmula nº 30/TSE).

Agravo interno a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(Relator Min. Luis Roberto Barroso, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 288-13. 2016.6.26.0144 CLASSE 6 UBATUBA SÃO PAULO, DJE 25.02.2019.) (Grifo nosso)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO DE DADOS DO GOOGLE TRENDS NA REDE SOCIAL FACEBOOK. IMPOSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A PESQUISA ELEITORAL. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 33, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A norma contida no art. 33, § 3º, da Lei nº 9.504/97 desafia interpretação restritiva por encerrar hipótese de sanção, não sendo possível o seu alargamento para abranger situações que não foram expressamente previstas no dispositivo.

2. O recurso especial eleitoral interposto com o fim de reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos não admite cabimento em razão da vedação contida na Súmula nº 24 do TSE. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(TSE - AI: 06030074720186060000 FORTALEZA - CE, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 07.05.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 111, Data 05.6.2020.) (Grifo nosso)

 

Com esses fundamentos, não havendo elementos mínimos para a caracterização da divulgação de pesquisa sem registro, incabível a imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

ANTE O EXPOSTO, voto pelo provimento do recurso, afastando a aplicação da multa fixada na sentença.