REl - 0600524-47.2020.6.21.0003 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/03/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo.

No mérito, trata-se de representação por divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, o que estaria em desacordo com o art. 33 da Lei n. 9.504/97. Consta que a coligação recorrida promoveu, em 26 de outubro de 2020, divulgação de pesquisa de opinião, utilizando-se para tanto da propaganda eleitoral gratuita em rádio, ao afirmar que estava vários pontos percentuais à frente dos demais candidatos, bem como que liderava as pesquisas, sem indicar a origem da informação e sem o prévio registro.

A sentença (ID 10420133) foi de improcedência, na medida em que o texto veiculado no programa de rádio conteria mera retórica, muito longe de uma pesquisa eleitoral efetiva. Observe-se o que constou na sentença:

Em suma, o candidato da coligação representada, em seu discurso, genericamente valoriza sua campanha e indica uma vantagem de maneira absolutamente especulativa, sem qualquer menção a dados ou resultados de uma pesquisa propriamente dita. A simples menção a índices satisfatórios de intenções de voto, contida na gravação, é incapaz, por si só, de confundir o eleitorado.

Em não sendo divulgada pesquisa, mesmo que de forma indireta ou transversa, descabido o argumento da representante sobre inobservância da necessidade de registro prévio e da carência de publicização da fonte, haja vista que não foram divulgados quaisquer dados. Sequer houve menção à liderança pelo candidato, diferentemente do clamado na inicial, mas apenas índices especulativos que seriam meramente satisfatórios.

Ademais, entendo que a utilização de recursos e estratégias que não ferem a legalidade é trivial e próprio da retórica política de campanha. Em um ambiente de debate democrático, no qual sabidamente é disponível a via da resposta, em mesmo palco e seara (horário eleitoral gratuito da própria representante), em que se franqueia a controvérsia e a explicação do contexto que a requerente entende adequado. Dessa dialética de opiniões e manifestações é que é feita a democracia, cabendo ao candidato da requerente, igualmente, exercer o seu protagonismo no debate, contrariando os argumentos e expondo sua ótica dos fatos para convencer os eleitores do acerto em escolher a si para o cargo almejado.

 

Em relação à multa, necessário analisar se a publicação (ID 10419183) efetivamente pode ser entendida como uma pesquisa eleitoral, a qual precisaria cumprir os requisitos do art. 33 da Lei n. 9.504/97. Tal análise é fundamental para que seja possível compreender a possibilidade de aplicação da penalidade prevista no art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

O fato é que a previsão supracitada sujeita os responsáveis (pela conduta de divulgação de pesquisa eleitoral irregular) à multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais). A envergadura da multa impõe que a leitura do dispositivo ocorra em caráter restritivo e não extensivo.

Por certo que as pesquisas eleitorais possuem forte poder de influência sobre os eleitores, funcionando como termômetro das intenções de voto da população, especialmente pelo grau de idoneidade do complexo trabalho realizado pelas entidades especializadas junto à opinião pública.

Por conta dessa complexidade e potencial de influência, a legislação eleitoral impõe às empresas de pesquisa o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar um controle público e judicial sobre aquilo que é divulgado, como se pode extrair do art. 33, caput, da Lei n. 9.504/97:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

 I - quem contratou a pesquisa;

 II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

 III - metodologia e período de realização da pesquisa;

 IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

 V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

 VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

 VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

 

Igualmente, por conta da natureza técnica das pesquisas e de seu potencial de influência sobre o eleitor, o § 3º do referido artigo estabeleceu uma elevada penalidade pecuniária para o caso de divulgação de pesquisa sem prévio registro.

Ocorre que a hipótese dos autos se distancia das situações fáticas que a referida sanção busca coibir. A postagem impugnada evidentemente não traz resultados de uma pesquisa eleitoral. Observe-se o que foi veiculado na rádio:

(00:32 – 1:23) Locutor: “Olá gente. Iniciamos o programa de hoje compartilhando contigo uma boa notícia para todos nós. Sabe de uma coisa? Nossa coordenação de campanha acabou de nos passar alguns índices satisfatórios sobre as intenções de votos da população marcelinense. Em um apanhado geral, estamos caminhando rumo a vitória da Coligação Um Novo tempo em 15 de novembro. Por isso convidamos você pra se unir a nós e também pra fazer do seu voto uma conquista vitoriosa. Eu, você, seu amigo, seu amigo, seu vizinho, todos estão juntos e podemos agora bater no peito e dizer: Eu voto no 15, um novo tempo vai chegar.”

 

O texto apenas revela a intenção de o candidato obter a vitória nas eleições, sem qualquer menção à realização de uma pesquisa eleitoral, com percentuais, oponentes e demais elementos caracterizadores de um levantamento técnico de intenções de votos.

Ausentes esses elementos, tenho que a postagem se revestiu de uma mera manifestação eleitoral, sem caracterizar o tipo previsto pela legislação de regência sobre a divulgação de pesquisa eleitoral sem registro.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no mesmo sentido:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2016. PESQUISA ELEITORAL NÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos que visava impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, para que seja caracterizada pesquisa eleitoral, é necessária a indicação, dentro do rigor técnico-científico que a define, de percentuais, margem de erro, índices ou intenções de votos e alusão ao instituto responsável pelo levantamento. Precedentes.

3. O acórdão regional concluiu que a divulgação de gráfico de linha, composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, mostrando a evolução do desempenho da campanha dos diversos candidatos, desacompanhado da indicação de percentuais ou números, não caracteriza a divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, mas, sim, propaganda eleitoral. A modificação dessas conclusões exigiria o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

4. Tendo em vista que a decisão recorrida está em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal Superior, não se conhece do recurso por dissídio jurisprudencial (Súmula nº 30/TSE).

Agravo interno a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(Relator Min. Luis Roberto Barroso, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 288-13. 2016.6.26.0144 CLASSE 6 UBATUBA SÃO PAULO, DJE 25.02.2019.) (Grifo nosso)

 

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO DE DADOS DO GOOGLE TRENDS NA REDE SOCIAL FACEBOOK. IMPOSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A PESQUISA ELEITORAL. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 33, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A norma contida no art. 33, § 3º, da Lei nº 9.504/97 desafia interpretação restritiva por encerrar hipótese de sanção, não sendo possível o seu alargamento para abranger situações que não foram expressamente previstas no dispositivo.

2. O recurso especial eleitoral interposto com o fim de reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos não admite cabimento em razão da vedação contida na Súmula nº 24 do TSE. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(TSE - AI: 06030074720186060000 FORTALEZA - CE, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 07/05/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 111, Data: 05.6.2020.) (Grifo nosso)

 

Dessarte, não havendo elementos mínimos para a caracterização da divulgação como verdadeira pesquisa eleitoral, incabível a imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

ANTE O EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo íntegra a sentença prolatada.