REl - 0600599-33.2020.6.21.0053 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/03/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

No mérito, trata-se de representação por divulgação de pesquisa eleitoral fraudulenta e sem registro, divulgada no WhatsApp por HELTON VENDRUSCOLLO, então candidato a vereador no Município de Sobradinho.

A magistrada sentenciante deferiu pedido liminar determinando que o recorrente suspendesse imediatamente a divulgação de pesquisa sem registro em qualquer rede social e WhatsApp e, após o devido processamento da representação, proferiu decisão de parcial procedência, cujo excerto a seguir transcrevo:

No presente caso, impende ressaltar que a circunstância de ausência do devido registro da pesquisa eleitoral objeto da ação perante a Justiça Eleitoral não foi objeto de controvérsia, sendo que os próprios representados e a empresa realizadora da pesquisa confirmaram tal fato. Resta, então, definir se houve efetiva violação à legislação eleitoral na conduta do candidato Helton Vendruscollo.

Destarte, conforme as provas constantes dos autos eletrônicos, merece razão a pretensão do Representante, ao menos em parte, quanto ao representado Helton. Explico.

A divulgação da pesquisa eleitoral em grupo de whatsapp restou comprovada, bem com que inicialmente havia sido contratado para que sua finalidade fosse de divulgação exclusivamente interna para a coligação. Assim, o Representado arguiu em sua contestação que, além de ter sido divulgada por “equívoco”, e que o número dos integrantes do referido grupo não seria suficiente para, de alguma forma, desequilibrar a igualdade nas eleições.

Contudo, entendo que, em primeiro lugar, não merece sustento o argumento de equívoco na divulgação, uma vez que, no áudio juntado aos autos no doc. 24941625, o próprio Helton admite que “não deveria ter divulgado a pesquisa”, de maneira que não há como negar sua consciência na divulgação ilícita. De igual modo, sabendo que a divulgação se trataria de conduta ilícita, deveria ter mais cuidado no compartilhamento do conteúdo da pesquisa.

Em segundo lugar, o argumento de que a postagem em grupo de whatsapp seria incapaz de causar repercussão e influenciar o voto dos eleitores não pode ser aceito. No caso em tela, não se verificou o compartilhamento da pesquisa através de conversas restritas, mas a efetiva divulgação de pesquisa sem prévio registro em grupo com mais pessoas, sendo que é de conhecimento geral a facilidade de replicação de mensagens e conteúdos por aplicativo de mensagens, uma vez transmitidos.

Nesse sentido, é de entendimento do Tribunal Superior Eleitoral que a divulgação de pesquisa sem registro ou irregular no aplicativo whatsapp é comunicação dirigida para conhecimento público:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO SEM PRÉVIO REGISTRO.

1. A divulgação de pesquisa eleitoral, sem prévio registro na Justiça Eleitoral, em grupo do Whatsapp, configura o ilícito previsto no art. 33, § 3º, da Lei 9.504/97.

2. Para que fique configurada a divulgação de pesquisa eleitoral, sem prévio registro na Justiça Eleitoral, nos termos do art. 33, § 3º, da Lei 9.504/97, basta que tenha sido dirigida para conhecimento público, sendo irrelevante o número de pessoas alcançado pela divulgação e sua influência no equilíbrio da disputa eleitoral.

3. O acórdão desta Corte, proferido no julgamento do REspe 74-64, rel. Min. Dias Toffoli, DJE de 15.10.2013 -no qual se assentou que a emissão de opiniões políticas em páginas pessoais de eleitores no Facebook ou no Twitter não caracteriza propaganda eleitoral -, não se aplica aos casos de pesquisa eleitoral, sem prévio registro.

Agravo regimental a que se nega provimento.

RESPE - Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 10880 - VITÓRIA – ES. Relator(a) Min. Admar Gonzaga. Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 17/08/2017

Diante do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a representação, para, com fundamento no art. 33, § 3º, da Lei 9.504/97 c/c o art. 17 da Resolução TSE 23.600/19, no sentido de condenar HELTON VENDRUSCOLLO a pena de multa de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil e duzentos e cinco reais), por divulgação de pesquisa de intenção de votos sem o prévio registro na Justiça Eleitoral.

 

Pois bem.

Conforme evidenciado nos prints acima colacionados, a postagem ocorreu em grupo fechado de WhatsApp, não possuindo, na minha compreensão, aptidão para atrair a imposição da penalidade prevista no § 3º do art. 33 da Lei n. 9.504/97 (50 a 100 mil UFIR).

O fato é que a previsão supracitada sujeita os responsáveis (pela conduta de divulgação de pesquisa eleitoral irregular) à multa no valor de R$ 53.205,00 (cinquenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106.410,00 (cento e seis mil, quatrocentos e dez reais).

A envergadura de tal sancionamento impõe que a leitura do dispositivo ocorra em caráter restritivo e não extensivo.

Por certo que as pesquisas eleitorais possuem forte poder de influência sobre os eleitores, funcionando como termômetro das intenções de voto da população, especialmente pelo grau de idoneidade do complexo trabalho realizado pelas entidades de pesquisa de opinião pública.

Por conta dessa complexidade e potencial de influência, a legislação eleitoral impõe às empresas especializadas o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar um controle público e judicial das pesquisas, como se pode extrair do art. 33, caput, da Lei n. 9.504/97:

Art. 33. As entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações:

I - quem contratou a pesquisa;

II - valor e origem dos recursos despendidos no trabalho;

III - metodologia e período de realização da pesquisa;

IV - plano amostral e ponderação quanto a sexo, idade, grau de instrução, nível econômico e área física de realização do trabalho a ser executado, intervalo de confiança e margem de erro;

V - sistema interno de controle e verificação, conferência e fiscalização da coleta de dados e do trabalho de campo;

VI - questionário completo aplicado ou a ser aplicado;

VII - nome de quem pagou pela realização do trabalho e cópia da respectiva nota fiscal.

 

Igualmente por conta da natureza técnica das pesquisas e de seu potencial de influência sobre o eleitor, o § 3º do referido artigo estabeleceu uma elevada penalidade pecuniária para o caso de divulgação de pesquisa sem prévio registro.

Ocorre que a hipótese dos autos se distancia das situações fáticas que a referida sanção busca coibir. A postagem impugnada evidentemente não traz resultados de uma pesquisa eleitoral.

Salienta-se que a publicação foi compartilhada em pequeno grupo de WhatsApp, sem capacidade de influenciar no pleito. Registra-se que o referido grupo conta com apenas 21 integrantes, dentre eles inclusive familiares do recorrente e também o Sr. Márcio do Couto Padilha – candidato a vereador pelo partido opositor, autor da ata notarial anexada aos autos. Aliás, se o referido opositor não fizesse parte do grupo, sequer teríamos a presente representação, dada a irrelevância do fato.

Ora, a sanção por divulgação de pesquisa eleitoral sem registro pressupõe que a publicação seja essencialmente uma pesquisa com essa característica, com dados capazes de conferir seriedade à intenção de votos e divulgada com alcance do eleitorado.

Quanto à menção na sentença, de que o próprio recorrente “Helton admite que ‘não deveria ter divulgado a pesquisa’, de maneira que não há como negar sua consciência na divulgação ilícita”, tenho que, ao ouvir o áudio (ID 11258283), é fácil perceber se tratar de uma brincadeira. Verifica-se que o recorrente fala que não deveria ter divulgado a pesquisa porque agora as apostas iriam acabar. Ou seja, diante do seu resultado, ninguém apostaria mais por já saber quem seria o vencedor. Até pelo tom da voz é possível ver que se trata de uma brincadeira. Transcrevo o que constou no áudio quanto a este ponto:

“Que coisa, né? Mas acho que termina as aposta agora. Nem devia ter divulgado a pesquisa, né?”.

Portanto, pedindo vênia a entendimento diverso, entendo que se tratou de brincadeira em pequeno grupo privado de WhatsApp, não podendo ser tal áudio considerado como prova de consciência da ilicitude.

Consequentemente, tenho que a postagem se revestiu de mera manifestação pessoal, sem caracterizar o tipo previsto pela legislação sobre divulgação de pesquisa sem registro.

Nessa linha é a jurisprudência deste Regional:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. DIVULGAÇÃO DE PESQUISA ELEITORAL IRREGULAR. REDE SOCIAL. FACEBOOK. PROCEDÊNCIA PARA CONDENAR APENAS O AUTOR DA MENSAGEM. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS PARA CARACTERIZAR A POSTAGEM COMO PESQUISA. ART. 33 DA LEI N. 9.504/97. INAPLICABILIDADE DE MULTA. DESPROVIMENTO.

1. Inconformidade que visa à condenação e aplicação de multa a todos os representados, por divulgação de pesquisa irregular, visto que a sentença de primeiro grau foi procedente apenas com relação a um deles e improcedente quanto aos demais. Determinada na origem a exclusão da publicação. Não aplicada multa ao entendimento de que tal incidência dependeria do ajuizamento de ação penal específica.

2. Ato isolado do representado que realizou a publicação em seu perfil do Facebook, não havendo comprovação da participação das demais partes demandadas. Tratando de dispositivo que atribui penalidade ao infrator, é necessário que a participação no fato esteja cabalmente provada.

3. A análise da publicação é fundamental para a caracterização da pesquisa eleitoral, a qual deve cumprir os requisitos do art. 33 da Lei n. 9.504/97, e para a viabilidade de eventual aplicação da multa prevista no art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19. Sanção que não carece de ação penal específica, pois está prevista na lei, sendo a representação o meio processual adequado à obtenção da tutela pretendida.

4. Por conta da complexidade e potencial de influência das pesquisas eleitorais, a legislação impõe às empresas especializadas o prévio registro da metodologia de trabalho, a fim de viabilizar seu controle público e judicial. Entretanto, na hipótese, a postagem impugnada evidentemente não traz resultados de uma pesquisa eleitoral.

5. Não havendo elementos mínimos para que se caracterize a divulgação como verdadeira pesquisa eleitoral, incabível a imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

6. Provimento negado.

(TRE-RS - Rel 0600083-84.2020.6.21.0172, Relator: Des. Federal CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, Data de Julgamento: 21.5.2020.) (Grifo nosso)

 

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no mesmo sentido:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL COM AGRAVO. ELEIÇÕES 2016. PESQUISA ELEITORAL NÃO CARACTERIZADA. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a agravo nos próprios autos que visava impugnar decisão de inadmissão de recurso especial eleitoral.

2. A jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que, para que seja caracterizada pesquisa eleitoral, é necessária a indicação, dentro do rigor técnico-científico que a define, de percentuais, margem de erro, índices ou intenções de votos e alusão ao instituto responsável pelo levantamento. Precedentes.

3. O acórdão regional concluiu que a divulgação de gráfico de linha, composto por dois eixos, um vertical e outro horizontal, mostrando a evolução do desempenho da campanha dos diversos candidatos, desacompanhado da indicação de percentuais ou números, não caracteriza a divulgação de pesquisa eleitoral sem registro, mas, sim, propaganda eleitoral. A modificação dessas conclusões exigiria o reexame do conjunto fático-probatório, o que é vedado nesta instância especial (Súmula nº 24/TSE).

4. Tendo em vista que a decisão recorrida está em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal Superior, não se conhece do recurso por dissídio jurisprudencial (Súmula nº 30/TSE).

Agravo interno a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(Relator Min. Luis Roberto Barroso, AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 288-13.2016.6.26.0144 CLASSE 6 UBATUBA SÃO PAULO, DJE 25.02.2019) (Grifo nosso)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PESQUISA ELEITORAL. DIVULGAÇÃO DE DADOS DO GOOGLE TRENDS NA REDE SOCIAL FACEBOOK. IMPOSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A PESQUISA ELEITORAL. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DO ART. 33, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A norma contida no art. 33, § 3º, da Lei nº 9.504/97 desafia interpretação restritiva por encerrar hipótese de sanção, não sendo possível o seu alargamento para abranger situações que não foram expressamente previstas no dispositivo.

2. O recurso especial eleitoral interposto com o fim de reexaminar o conjunto fático-probatório dos autos não admite cabimento em razão da vedação contida na Súmula nº 24 do TSE. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do relator.

(TSE - AI: 06030074720186060000 FORTALEZA - CE, Relator: Min. Edson Fachin, Data de Julgamento: 07.5.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 111, Data: 05.6.2020) (grifo nosso)

 

Dessarte, não havendo elementos mínimos para a caracterização da divulgação de pesquisa sem registro, incabível a imposição da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 17 da Resolução TSE n. 23.600/19.

ANTE O EXPOSTO, voto pelo provimento do recurso, afastando-se a aplicação da multa arbitrada na sentença.