REl - 0600401-26.2020.6.21.0043 - Voto Relator(a) - Sessão: 11/03/2021 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos, está a merecer conhecimento.

Trata-se de recurso contra sentença que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE proposta contra WELLINGTON BACELO DOS SANTOS e SIDNEY DAS NEVES, candidatos à reeleição para os cargos de prefeito e vice-prefeito, respectivamente, e LEONIR SAN MARTINS FONSECA, Secretário de Obras. 

Em suma, os fatos apontados pelos recorrentes, os Diretórios Municipais do PARTIDO DOS TRABALHADORES e do PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO, ambos de Santa Vitória do Palmar, versam sobre publicações nas redes sociais dos recorridos que configurariam as práticas de conduta vedada e de abuso de poder.

Por outro lado, a tese da defesa, igualmente em síntese, apoia-se na compreensão de que as publicidades, por terem sido postadas em perfis pessoais dos recorridos, não caracterizariam irregularidades.

Penso que a questão fundamental, aqui, é a diferenciação entre propaganda institucional e propaganda eleitoral. Senão, vejamos.

No que diz respeito à propaganda eleitoral na internet, a Lei n. 9.504/97 traz bases legais a partir do art. 57-A:

Art. 57-A. É permitida a propaganda eleitoral na internet, nos termos desta Lei, após o dia 15 de agosto do ano da eleição (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

Art. 57-B. A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas seguintes formas: (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009) 

(...)

IV - por meio de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e aplicações de internet assemelhadas cujo conteúdo seja gerado ou editado por: (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

a) candidatos, partidos ou coligações; ou

(…)

 

E a legislação citada há de ser interpretada em conjunto com os contornos legais de limites de realização de publicidade institucional em período eleitoral, presentes, por seu turno, no art. 73, inc. VI, al. "b", também da Lei n. 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

(…)

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

 

Da leitura dos textos normativos, depreende-se que a publicidade institucional se encontra no âmbito da administração pública, depende de autorização do agente público para, por óbvio, com verbas públicas, fazer publicar atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos.

Ou seja, evidente que a propaganda político-eleitoral não se confunde com a propaganda institucional. Enquanto esta exige publicações oficiais, por determinação da administração pública, em página institucional (tratando-se de internet), aquela ocorre via "perfis" de usuários – candidatos ou partidos – que estão a participar da competição eleitoral.

E os próprios recorrentes (representantes) informam, desde a peça inicial (e reafirmam por ocasião do recurso), que as publicações combatidas foram veiculadas pelas páginas pessoais dos recorridos.

Com efeito, o que se verifica é a ausência de irregularidade, portanto.

Não se trata de página oficial e não há custeio mediante recursos públicos; não há espaço para caracterizar a propaganda combatida como publicidade institucional – sequer se trata de propaganda eleitoral irregular. Os candidatos à reeleição utilizaram-se, em verdade, dos legítimos argumentos de continuidade de gestão (que obviamente estavam a defender), trazendo notícias de obras e realizações da (então) administração em curso.

Esse mesmo, o entendimento do e. Tribunal Superior Eleitoral, em recurso especial de relatoria do Min. Luís Roberto Barroso:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. CONDUTA VEDADA. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. VEICULAÇÃO EM PERFIL PARTICULAR DE REDE SOCIAL. UTILIZAÇÃO DA MÁQUINA PÚBLICA NÃO DEMONSTRADA. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. DESPROVIMENTO.

1.Agravo interno contra decisão que negou seguimento a recurso especial eleitoral interposto para impugnar acórdão que manteve sentença de improcedência da ação de investigação judicial eleitoral por uso indevido dos meios de comunicação social e conduta vedada.

2.O desequilíbrio gerado pelo emprego da máquina pública é a essência da vedação à publicidade institucional prevista no art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997, que objetiva assegurar a igualdade de oportunidades entre os candidatos.

3.A veiculação de postagens sobre atos, programas, obras, serviços e/ou campanhas de órgãos públicos federais, estaduais ou municipais em perfil privado de rede social não se confunde com publicidade institucional autorizada por agente público e custeada com recursos públicos, a qual é vedada nos três meses que antecedem as eleições (art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997).

4.É lícito aos cidadãos, inclusive os servidores públicos, utilizarem–se das redes sociais tanto para criticar quanto para elogiar as realizações da Administração Pública, sem que tal conduta caracterize, necessariamente, publicidade institucional.

5.Da moldura fática do acórdão regional se extrai que: (i) houve divulgação de realizações do governo municipal, por meio de fanpage gerenciada pelo primeiro agravado, servidor público, fora do seu horário de trabalho; (ii) não há notícia do emprego de recursos ou equipamentos públicos para a produção e divulgação das postagens, integralmente feitas sob responsabilidade do agravado, inclusive no que diz respeito à digitalização de encarte distribuído pela Prefeitura antes do período vedado; e (iii) inexiste prova de que tenha havido o uso de algum artifício nas postagens impugnadas que permitisse caracterizá–las como redirecionamento dissimulado de publicidade institucional autorizada ou mantida por agente público em período vedado.

6.Acertada, portanto, a conclusão de que tal conduta está protegida pela liberdade de expressão (arts. 5º, IV e IX, e 220 da Constituição Federal) e não configura publicidade institucional.

7.Não se conhece de recurso especial eleitoral por dissídio jurisprudencial nos casos em que em que inexiste similitude fática entre as hipóteses tratadas nos acórdãos confrontados (Súmula nº 28/TSE).

8.O adequado desempenho do dever de fundamentação pelos órgãos judiciais colegiados não exige que, no julgamento, todos os argumentos trazidos por voto divergente sejam refutados pelos demais juízes. Proclamado o resultado, considera–se fundamentado o acórdão pela tese jurídica prevalecente nos votos que compuseram a maioria vencedora, como ocorreu, no caso, em relação à atipicidade da conduta.

9.Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 37615, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 74, Data 17.04.2020.)

(Grifo nosso)

 

Note-se que a peça recursal reproduz imagens de capturas de tela (prints) do Facebook, perfil de Wellington Bacelo, com servidores trabalhando; rua iluminada; obra de pavimentação, etc., sempre com caráter de propaganda eleitoral, de enaltecimento dos feitos de gestão, típico dos candidatos à reeleição, com o fito de se apresentar ao eleitor e expor o resultado de seu trabalho durante o mandato que, anteriormente, lhe fora confiado.

Na mesma toada são as publicações (em perfil pessoal) do Secretário de Obras do Município, Leonir San Martins Fonseca, referentes a serviços na rede de iluminação, a obra de pavimentação de rua, bem como notas de agradecimento ao prefeito, funcionários e outros secretários. Não há ilicitude.

Nesse sentido, o julgado trazido aos autos pela Procuradoria Regional Eleitoral:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2016. CONDUTA VEDADA. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. REDE SOCIAL. PERFIL PESSOAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE EMPREGO DA MÁQUINA PÚBLICA. PROMOÇÃO PESSOAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. DESPROVIMENTO.

1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que negou seguimento a recurso especial eleitoral.

2. Não há privilégio ou irregularidade na publicação de atos praticados durante o exercício do mandato; especificamente, porque veiculados sem utilização de recursos públicos em meio acessível a todos os candidatos e apoiadores, como é o caso das mídias sociais.

3. Além disso, a promoção pessoal realizada de acordo com os parâmetros legais não caracteriza conduta vedada, constituindo exercício da liberdade de expressão no âmbito da disputa eleitoral.

4. O emprego da máquina pública, em qualquer de suas possibilidades, é a essência da vedação à publicidade institucional prevista no art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997, objetivando assegurar a igualdade de oportunidades entre os candidatos. No caso, a moldura fática do acórdão regional não apresenta indícios de que houve uso de recursos públicos ou da máquina pública para a produção e divulgação das postagens de responsabilidade do agravado.

5. Agravo interno a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 151992, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 28.06.2019.)

 

Assim, os fatos indicados na ação não se subsomem à norma contida no art. 73, inc. VI, al. "b", da Lei das Eleições. As publicações consubstanciam simples divulgação de atos e obras públicas desenvolvidas na gestão do então candidato, pondo-se ao escrutínio da população para a continuidade de sua gestão, e veiculadas em espaço próprio de propaganda.

Por fim, descaracterizado o ilícito, não há perquirir por abuso de poder político ou econômico, como almejam os recorrentes, e o desprovimento do recurso, com a consequente manutenção da sentença, é medida que se impõe.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo íntegra a sentença por seus próprios fundamentos.